terça-feira, 30 de dezembro de 2008

1 é pouco e 2 são bons?

Eu não sou o tipo de cara que gosta de carros. Que sabe o modelo, o ano de fabricação, a potência do motor e tudo mais apenas ouvindo o som do tal bólido ou vendo um detalhe aparentemente irrelevante, como por exemplo a fechadura do porta-malas.

Eu, definitivamente, não gosto de carros. Nos últimos meses passei a saber diferenciar alguns modelos, mas nada muito espetacular. Um Uno alheio do meu, ou alguns tipos de Palio. Mas tudo isso era só para dizer que eu não sou fanático por carros.

Quer dizer... por carros, de uma forma geral, não. Mas tem uma parte dele que realmente me fascina: o limpador de pára-brisas. É sério. Desde pequeno, quando andava com mamãe no carro dela, achava demais o funcionamento daquele rodinho estilizado. Adorava quando chovia e eu via a palheta ir de um lado para o outro...

Aí eu percebi que era apenas o carro da mamãe que tinha um limpador de pára-brisa dianteiro. Todos os outros modelos que não o Uno tinham duas peças para o vidro. Entrei em um ferrenho jogo interno de argumentação: meu lado otimista, visionário e sonhador dizia que o modelo de palheta única era melhor. Já meu lado chato dizia o contrário, que éramos precários.

Eu explico: o lado Felipinho Held argumentava: “É bem mais legal ter só um limpador. A marca que fica no vidro é mais bonita, trata-se de um modelo único e é muito mais prático já que uma peça faz o trabalho de duas”. O lado Felipe Held, o Velho, rebatia: “Mas o outro é mais rápido, a cobertura de área do vidro é maior... e se todo mundo tem, é porque também é melhor”.

Quase todos dias eu pensava nisso indo da minha casa para a casa da minha avó e de lá para a escola. Então quase dez anos se passaram sem eu nem pensar nisso até que meu primeiro carro é justamente... tcha-ram, um Uno.

Tem vezes, no meio do trânsito, eu não tenho nada pra fazer e fico limpando o pára-brisa. Só pra ver ele funcionar – e também deixar o vidro bem transparente. Quando chove, fico mudando a cada quarteirão a velocidade do limpador. E... meu carro tem limpador de vidro traseiro, então a diversão é ainda maior! (eu pareço uma criança falando).

Mas aí teve um dia, eu peguei o carro da minha mãe e me deparei com um limpador de pára-brisas de palhetas duplas. Funcionava bem mais rápido. E eu voltei a me questionar qual a droga do tipo de limpador que era melhor.

Dia desses, indo para Barueri, estava no banco da frente de um dos carros do trabalho e estava chovendo forte. Limpador duplo. Fiquei ali olhando o funcionamento das peças por um bom tempo, vendo que o da direita era menor e ele só ajeitava a água para o outro, o da esquerda e maior, tirar do vidro.

Então o motorista do carro me olhou de rabo de olho, talvez se perguntando por que meus olhos brilhavam olhando as duas palhetas. E eu percebi que, para o meu próprio bem, era melhor eu parar de ficar perdendo tanto tempo pensando coisas tão bestas.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Assuntos superficiais e mal-explorados

O Campeonato Brasileiro acabou e geralmente não se tem nada para fazer no mundo do futebol. Não que se tenha normalmente, mas nesta época o noticiário é bem fraquinho.

Mas, por uma sucessão de folgas e férias na redação, fiquei a cargo do Palmeiras. Uma avalanche de boatos, muitas repetições e blablá. É legal, mas cansa um bocado. Telefone na mão, tentativa de falar com mil dirigentes... e F5 nos concorrentes para ver se não estou levando furo.

Apesar de ser muito mais fácil cobrir seu clube de coração, é meio estressante. E percebi meu estresse acumulado saindo do estacionamento, na Paulista. Percebi que havia um moleque de uns 8 anos no carro da frente virado para mim mostrando a língua.

Ficou nessa um bom tempo. Até que eu percebi que aquela língua feia era para mim e respondi bem chulamente: com o dedo do meio. Ficamos nessa por uns 10s, até que ele se escondeu. Depois voltou com a língua, e eu com o dedo.

Mostrei para o Mé, o carona do dia. Ele ameaçou me repreender: “Pô, mas é só um moleque tosco”, argumentou. Contra-argumentei: “Eu sei. Mas se ele estivesse dando um tchauzinho, sei lá, eu faria um jóia e tal. Ele sabe que mostrar a língua é feio. E este é o gesto mais feio que eu conheço”. O Mé concordou e também mostrou o dedo.

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Meu projeto de Único Trabalho Sério da Faculdade Trabalho de Conclusão de Curso foi aprovado sem restrição. Agora eu tenho caminho livre para começar uma biografia sem falar com a minha biografada. Faltam 11 meses para a entrega e... dá uma preguiça enorme começar.

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É extremamente engraçado quando você está no bar, sentado às mesas colocadas na calçada da Avenida Paulista, e passa um velhinho branquelo, barbudo e de cabelos e barbas brancas. Sempre tem alguém que chama a atenção de todos para a passagem do Papai Noel.

Mais engraçado ainda é quando você está no bar nas mesmas condições citadas anteriormente e o tal do Papai Noel se vira para o cara ao seu lado, quem puxou a atenção, e diz: “Pois eu tenho uma notícia bem ruim para você: o Papai Noel este ano não vai entregar presentes pra viados que nem você”.

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Em contrapartida, é decepcionante quando você espera o ano inteiro pela cesta de natal da empresa onde você gasta 50, 60 e às vezes até 75% do seu dia. E aí, na hora de pegar a cesta, recebe um panetone com umas bolachinhas.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

37,8ºC

Não sei bem o que me aconteceu, mas o fato é que estou com febre.

Quer dizer... eu até sei o que aconteceu. Se você somar noites de pouco sono a janelas abertas, uma alimentação à base de bananas nos últimos dias (estão baratas no mercado, veja só), o botãozinho do filtro de água gelada ligado e uns sorvetes aqui e ali... além de uma mudança brutal de temperatura... acho que algo tem que acontecer.

Percebi ontem que as coisas não iam lá muito bem. Sem muita explicação, no almoço, notei que meu rosto estava suando absurdos. Pensei que era por causa da mudança de tempo, sei lá por que imaginei isso... mas sei lá.

Eu não sei bem o que eu tenho, se resfriado, virose, gripe ou alguma outra coisa ou até mesmo frescura. O fato é que ficar com febre é algo bem interessante. Hum... interessante não, dã! Acho que é mais... ahn, curioso? Que seja.

Durante a febre, você tem uma alternância gigantesca de sensações térmicas. E nada é condizente com a temperatura ambiente. Pode estar um puta dum calor e você está lá, com frio. Aí realmente o clima esfria e você começa a suar desesperadamente, quase derretendo.

As temperaturas, aliás, não fazem mesmo sentido. Hoje, por exemplo, tomei o banho mais gostoso dos últimos tempos. E olha que o chuveiro aqui de casa tem apenas três temperaturas: quente, quente pra burro e água pra ferver macarrão. O chuveiro daqui de casa é horrível em tempos de verão.

Nesses momentos, todo o seu corpo dói. Dói o cotovelo esquerdo, apoiado na cama enquanto eu digito essas baboseiras. Dói a minha garganta. Dói o meu couro cabeludo, além de toda a minha cabeça. Doem também o joelho direito, as costas, o joelho esquerdo... Dói até o olho, quando tento olhar para o lado.

Mas sabe o que é mais legal em dias febris? A vontade de não sair da cama e o sono intenso. Um sono forte que bate mesmo sendo quase manhã para mim: as 9 da noite. E quer saber de uma coisa? Vou lá para minha cama, quentinha, fechar a minha janela e me enfiar debaixo de dois cobertores. Ligar o rádio em algum jornal e acordar só amanhã de manhã.

...

Ah, esqueci de falar que é horrível acordar com febre. Todos os sintomas descritos anteriormente se potencializam e a vida se torna um inferno. Mas deixa que com isso eu me preocupo amanhã de manhã.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Yo soy una mula, capítulo I

Várias vezes por semana, talvez até por dia, me dou conta de que minha certeza sobre mim mesmo é a maior furada.

Inúmeras coisas das quais eu estava crente que dariam tudo certo se mostram, passados alguns meses, semanas, dias, horas e até minutos, uma idiotice por completo.

Na maioria desses casos, fico sem reação aparente. Mas, por dentro, não deixo passar uma frase-lema para esses momentos: "Yo soy uma mula". Assim, em portunhol mesmo. Sei lá por que, mas o fato é que isso acontece.

Uma prova disso aconteceu essa semana. E, já me dando conta de que esse acervo de self-pataquadas poderia render pelo menos alguma coisa interessante, resolvi inaugurar esta série à parte deste blog: a seção Una mula, que poderá ser atualizada semanalmente ou diariamente. Embora, claro, eu espere que fique mesmo só neste primeiro capítulo.

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Tenho minha idéia de tema para o Único Trabalho Sério da Faculdade Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) já tem muitos meses. Um ano, se bobear. Até que um dia, um sábado qualquer após receber um bolo de tédio, resolvi fazer meu projeto.

Era agosto, eu acho. Quatro meses antes da entrega. Para deixar tudo pronto. Imprimi algumas cópias, mostrei uma para o meu professor de introdução a essa bagaça e outra para o Celso, que jogou pedra na cruz e como castigo recebeu a missão de me ajudar nessa parada meu orientador. Todos deram uns toques aqui e ali e pronto.

Aí eu tive a brilhante idéia de mostrar para o Erick, meu chefe, que por muitos anos cobriu tênis na carreira e poderia também me ajudar. Ele me deu muitas, muitas dicas. Apontou fontes interessantes e indicou um nome ou outro por aqui que poderiam ser de vital importância para a realização do projeto.

Fiz as anotações a lápis no papel e guardei tudo bonitinho na minha mochila, para “anotar tudo no arquivo do Word” quando eu chegasse em casa. E aí o tempo passou, o tempo passou, o tempo passou... o tempo passou mesmo, e eu sempre deixava essa atualização para amanhã. Chegou dezembro, dia da entrega do projeto, e eu lembrei que precisava dar um update no arquivo.

Tirei todos os papéis dobrados no bolso em questão da mochila. Encontrei muita coisa: apostilas de uma matéria picareta que eu nunca li, conversas por bilhetes com uma ou outra amiga de sala... até envelope de revelação fotográfica (uau!). Mas nada, nada do projeto de TCC.

Agora eu não lembro mais os nomes das fontes quentes que meu chefe indicou. Não sei mais quem é o cara que pode salvar a minha vida fazer a intermediação para eu conseguir falar com meu biografado. Não sei onde diabos aquela droga de papel foi parar. Agora, alforriado de férias da faculdade, estava pensando em começar tudo logo. Mas... e agora, cara-pálida?

Vou aproveitar essa semana e voltar para o meu chefe: “Então, Erick, a besta aqui perdeu aquele papel cheio de anotações pro trabalho, você poderia me passar de novo, por favor?”. Mas, por enquanto, fico com a voz de censura aqui dentro da minha cabeça, que me lembra: “Usted é una mula, Felipe Held”.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Não entendo qual é que é a da cebola

Estava pensando nisso hoje durante o almoço e percebi que... não cheguei a conclusão alguma. Sério, não me entra na cabeça direito a utilidade pública da cebola. E nem a injustiça por que passa a coitada.

Quando eu era pequeno, não gostava de cebola. Mas com o tempo aprendi a comer a minha tenebrosa comida – de quebra, todos os alimentos que antes eu detestava passaram a ter um sabor delicioso, desde que não preparados pelas minhas mãos de dedos finos e tortos.

E a cebola entrou nessa. Gosto de cebola. Quase incondicionalmente. Até que um dia estava almoçando com uma ex-namorada (que na época ainda não era ex, claro) e ela me disse, culpada: “Amor, tô comendo cebola. Você não se importa?”. Banquei o bonzinho e disse que não, claro. Porque eu não sabia o que aconteceria depois do almoço.

Mas tirando esse episódio, e as lágrimas que eu perdi descascando cebolas, gosto do tal vegetal em pauta neste blog. Só que... afinal, o que diabos é a cebola? Fruta não é, nem mesmo pseudo-fruto. Mas não tem aquela sustância pra ser um legume, como... uma cenoura, por exemplo.

Uma vez, no colégio, ouvi um professor dizer que a cebola era um conjunto de folhas modificadas e blablá. Então... a cebola é tipo um espinafre travestido, é isso? Bah, que palhaçada!

Só que, resumindo, a cebola é um vegetal – não pode ser carne, claro, e... até que me provem, não é algo industrializado. E, como vegetal, deve ter lá seus nutrientes. Mas minha mãe nunca falou “come cebola, filho, porque ela é rica em sei-lá-o-quê”.

Quais os nutritivos de uma cebola, alguém sabe dizer? Aquela coisa deve ser rica em sódio, eu acho. Só que... poxa, ninguém nunca disse que cebola faz bem pros olhos, pra memória, pro cabelo, pra pele, pra voz... só falam que faz você ficar com um hálito bem ruinzinho (e eu não tinha me lembrado justamente disso no almoço com a ex).

Poucas pessoas aliás gostam de cebola in natura. Eu, particularmente, adoro cebola cozida ou aquelas empanadas. Mas de uma maneira geral, a cebola serve apenas para temperar, dar um gosto a mais em todos os alimentos. A cebola é um ketchup à moda antiga, se bobear.

Eu quase senti dó da cebola pensando nisso. Só que nem tudo está tão ruim para ela, que não está sozinha nesse mundo: ela tem a companhia do alho, outro ser sem utilidade pública muito relevante. Assim como este texto.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Ainda não é verão

Mas é final de ano. E final de ano é uma delícia. Mesmo. Novembro e dezembro são, de longe, os meses dos quais eu mais gosto em todos os anos. Mais até do que abril, o mês que eu elegia como o me favorito quando pequeno pelo simples fato de que... eu faço aniversário em abril.

Mas abril não é legal. É um mês de outono, no meio do semestre... é aliás o meio do semestre. Depois de agosto, acho que abril é o mês mais chato do ano. Sério. E isso é uma pena, porque... eu faço aniversário em abril, lembra? Humpf.

Só que... não vamos falar de abril, ele está lá distante. Vamos falar do atual momento do ano, esse do início de dezembro. De verdade, é quando eu tenho os melhores motivos para sair de casa, respirar fundo e sentir que o mundo não está perdido. Simplesmente por causa da umidade do ar, que fica também com um cheiro diferente. Ah, eu adoro essa época do ano!

Outra coisa bem interessante de se fazer neste início de dezembro é sair do trabalho às 7 da noite. É mais do que revigorante sair na rua e ver o dia ainda claro, por causa do horário de verão, e quente. Tem vezes em que ainda tem sol, e tal. Sem contar que não tem aula na faculdade. Dá mais do que vontade de parar no bar e tomar uma cerveja com os amigos depois do expediente.

As primeiras horas da manhã também são bem bacanas neste finalzinho do ano. Os dias são tão mais claros do que o normal, o sol fica mais brilhante do que o normal e não necessariamente quente, até pelo menos umas 11 horas. Eu, que normalmente estou acostumado a acordar mesmo lá pelas 11h30, fico bem a fim de levantar mais cedo só pra ficar deitado na cama, com a janela aberta e vendo desenhos animados na televisão, pegando sol e vivendo por osmose.

Adoro ainda passear pela cidade à noite, lá pelas 8 ou 9 da noite. Sair de carro com a minha mãe para ver os enfeites de Natal pelas ruas. Eu adoro enfeites de Natal, e me entristece um tanto ver que o final de ano não é mais tão animado como uns dez anos atrás. Gosto também de ficar em casa, com calor, tomando picolé de limão com o ventilador ligado. Delícia.

Chega essa parte do ano, eu até tenho vontade de ir para a praia. Não tenho nenhuma relação muito afetuosa com a praia (tanto que só fui conhecer o mar ao vivo e a cores com quase 13 anos), mas tem dias em que eu penso que seria bem agradável acordar às 10 da manhã, ficar bebendo na praia até umas 5 da tarde... parar, descansar um pouquinho e voltar pra andar no calçadão de noite e tomar um sorvete.

Mas sei lá. Algo que foi bem, bem bom mesmo foi esse meu primeiro domingo de ‘férias’ da faculdade. Tinha acabado o futebol na televisão, eu fiquei jogado aqui na cama com a televisão ligada... até que tocou a musiquinha do Fantástico uma hora e não bateu aquele frio na barriga de que ‘amanhã começa tudo de novo’.

Amanhã, de fato, começa tudo de novo no trabalho. Completo até 2 anos de redação neste 1º de dezembro, embora desta vez não tenha pique de fazer um texto especial como no ano passado (suspiro). Só que ouvir a trilha do Fantástico e ficar tranqüilo é algo mais do que revigorante e animador.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Videogame novo

Tocar guitarra foi, por muitos anos, um dos meus métodos de espairecer todas as tardes e inícios de noite. Mesmo nas vésperas das provas que me assustavam mais no colégio (história e geografia, já que química, matemática e física eu tirava de letra), tocava um bom tempo de guitarra ou baixo para relaxar.

Mas o tempo passou, eu fiquei mais velho e chato e preguiçoso... e minha guitarra foi empoeirando no canto do meu quarto. Estava até desanimado em reaprender todas as músicas que eu sabia de cor, e em sonhar em ter uma banda e em fazer shows e todo esse sonho adolescente... era triste, eu sei.

Enquanto isso, meus amigos também aspirantes a músico se deliciavam com uma versão mais light e animada da guitarra: o Guitar Hero. Eu, que só tinha visto uma vez ou outra uma molecada jogando no reveillon de 2007/08 enquanto eu tomava cervejas e mais cervejas com meus amigos mais velhos aqui no prédio, não me empolgava nada. Era simples: apertar botãozinho no Playstation... bah, isso não era tocar guitarra.

Até que os meses de 2008 passaram e, não faz muito tempo, fui apresentado oficialmente ao Guitar Hero. Apesar de não ter jogado mais do que 30 minutos, admito que achei fenomenal. Eu, todo pomposo e metido a guitarrista, mal conseguia jogar no nível médio. No difícil, então, eu parecia estar na minha primeira aula de violão. Um desastre. Era um desafio virar um bom guitarrista no videogame.

Aí chegou o feriado, em que eu consegui combinar folgas da faculdade com o trabalho. Eu, enfim, tinha tempo para espairecer. E em vez de tirar minha guitarra do armário, comprei um CD do Guitar Hero e fui me meter a aprender a jogar aquela coisa.

Era quinta-feira de tarde quando eu comecei a arriscar minhas primeiras músicas. No nível fácil, tá bom, mas já era um começo. O tempo passou, o dia escureceu lá fora... e eu fiquei jogando até bem tarde. Lembrei do dia em que eu ganhei meu Super Nintendo, no Natal de... 96? É, acho que foi isso. Quando eu fiquei jogando Super Mario até altas horas da madrugada, querendo porque querendo passar de fase. Só mais uma. E mais uma. E mais uma.

Jogar Guitar Hero foi voltar uns 15 anos no tempo. Aquela coisa de ganhar um videogame novo e ficar até de madrugada entretido com o jogo. E depois acordar cedinho no dia seguinte para continuar jogando. Ter que se acostumar com os botões, os comandos... e o Winning Eleven, o único jogo de videogame em que eu me aventurava... ficou ali, quietinho no canto. E eu me empolgava com as mensagens de incentivo na tela: You rock! Pensava comigo mesmo: “Yeah, baby, I rock!”. Até me achei de novo um rockstar, veja só.

Mais do que isso, voltei a ter vontade de pegar meu violão de novo. Fazer um Sol (é a nota mais legal de fazer), uma pestana... pegar uma palheta de novo e tentar um riff famosinho. Tirar músicas antigas, músicas novas, todas que eu quiser e achar que posso tocar.

Quero voltar a tocar. Mas não hoje. Ainda falta uma prova para acabar o ano na faculdade, e... bom, já são 4 da manhã. Quem sabe na semana que vem? Até lá, me contento com o Guitar Hero.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Deve ser difícil fazer amigos se você mora no Kuwait

Quer dizer, talvez seja fácil fazer amizades com vários Mohammed Al-alguma-coisa que moram no mesmo país que você. Mas fiquei com essa impressão de que kuwaitianos são pessoas solitárias quando conheci o primeiro Mohammed Al-alguma-coisa, recentemente.

Eu estava lá, no cantinho do Pacaembu, enchendo a cara de Red Bull um dia desses. Tinha um bloco na mão esperando o Edgar Davids aparecer por milagre na minha frente e um papel, com a lista dos países participantes do tal evento de futebol freestyle que eu fui cobrir semana passada.

Estava quietinho no meu canto quando um moleque de 1,60m, pele cor-de-barata, narigão (acho que ele se identificou comigo), uma camisa de Portugal e um bigodinho veio gesticular pra mim. Falou só “I from” e apontou para a bandeira do Kuwait.

Arrisquei um inglês: “Oh, man, you are from Kuwait?”. Ele sorriu, fez com a cabeça que sim e ficou lá esperando para ser entrevistado por um brasileiro estagiário de jornalismo. Por que não? Nunca tinha falado com kuwaitianos, mesmo...

Só que foi extremamente difícil conversar com o Mohammed Al-alguma-coisa. Ele não falava patavinas de inglês e nem entendia o que eu falava. “Hablas español?”, arrisquei. Ele respondeu negativamente. Tentei o mais sobrenatural possível, em inglês: “Bom... você está com a camiseta de Portugal... fala português?”. É claro que ele disse que não.

Mas fiquei lá, tentando bater um papo com o moleque do Kuwait – que disse ter 16 anos, embora aparentasse ter quase uns 30. Entendi só o que eu já esperava ouvir: que o cara jogava bola na rua, não tinha onde praticar, sonhava em jogar na Europa e ser um novo Cristiano Ronaldo da vida. Mas precisei de uns belos 20 minutos de inglês slow-motion e muita mímica pra compreender.

O kuwaitiano pediu uma folha de papel e a minha caneta. Entreguei para ele, que rabiscou várias letras e depois rasurou, até me devolver uma versão final do e-mail dele: Mohammed Al-alguma-coisa@hotmail.com. Fiquei constrangido, não saberia adicioná-lo no MSN ou então enviar um e-mail pra ele, ainda mais... se ele não entendia nada de inglês. “Hi, Maomé, I Felipe. Jornalist, New York Times, Al-Jazeera. I from Brazil. Braaaazil. Pelé, Ronaldinho, Robinho, Carnival, Samba...”.

Por via das dúvidas, para fingir uma solicitude e me eximir da responsabilidade, dei um papel para ele com o meu e-mail também. Não o do MSN, que tem uma passagem em hebraico (judeus, muçulmanos... sacou?), mas sim o do trabalho. “Feel free to send me an e-mail, man”. Me despedi, ofereci minha mão para ser cumprimentado. Ele exitou, mas acabou aceitando o cumprimento ocidental.

O Mohammed Al-alguma-coisa, que não tinha feito amigos e sequer falado com ninguém no evento (os chicos da América Latina estavam todos contando piadas, os europeus batiam um papo animado e o negão sul-africano tinha até conseguido se agarrar com uma loirinha holandesa por lá), voltou para seu lugar nenhum para ficar sozinho brincando com a bola. Sem amigos.

Deve ser chato ser kuwaitiano. E, mais do que isso, deve ser chato não ter amigos. E as poucas pessoas de quem você tenta ser amigo... acabam te menosprezando, como eu sem querer acabei fazendo com o tal do Mohammed Al-alguma-coisa.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Quebra de rotina

Véspera de feriado. Acordei, olhei o relógio e vi que eram 12h15. Fechei a cara por não ter acordado a tempo dos Simpsons.

Desliguei o rádio, que passou a manhã inteira transmitindo a reconstrução do caso Lindemberg. Me espreguicei, levantei, fui de samba-canção para a cozinha, tomei um copo de água e parti para o banheiro.

Tomei banho. Tentei fazer um moicano com o cabelo com xampu. Saí, balancei a cabeça como um cachorro molhado, coloquei a roupa e deitei na cama. Abri o site do trabalho, vi minha notícia com o Davids estourada na capa do site. “Humm, bacana”.

Entrei nos sites concorrentes. Todos estamparam em suas capas a mesma notícia que surgiu da minha pergunta para o tal do holandês. “Humm, bacana mesmo”, repeti.

Saí de casa, peguei o metrô, desci na Paulista para o trabalho. Atravessando a Joaquim Eugênio e chegando no quarteirão para o trabalho, começou a tocar The middle, do Jimmy Eat World, no meu ipod.

Fiz o playback das últimas horas do dia: acordei, tomei um copo de água, não almocei, vi que tinha pautado todos os sites de esportes do meu conhecimento. E ainda estava tocando uma música bem interessante. Uh!

Respirei fundo. Ri sozinho atravessando a rua. Comemorei, comigo mesmo: o feriado estava chegando.

E olha que eu nem tinha visto que saí quase que em primeiro plano no UOL, enquanto o Davids respondia para mim a pergunta sobre seu sonho de jogar no Flamengo.



quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Carteirada

“Você é só um estagiário com cara de moleque”, me animou a Bonie quando eu reclamei com ela o fato de ter minhas entrevistas com Falcão e Bebeto interrompidas sem mais por assessores de imprensa na terça à tarde. Mas a história que veio depois dessa mensagem vale a pena ser contada (até pra tirar poeira deste blog).

O evento com Falcão e Bebeto era o Mundial de freestyle (embaixadinhas acrobáticas) patrocinado pela Red Bull. Um dos jurados seria o meio-campista Edgar Davids. Davids é holandês. Eu arranho um holandês. E isso me rendeu o credenciamento pra cobrir o evento e tentar bater um papo com o negão.

Fiquei enchendo o saco dos assessores da Red Bull para conseguir dez minutinhos para entrevistar o Davids. Não rendeu. O cara mesmo aceitou quando eu quase implorei pra ele dizendo “Meneer Davids, ik ben Felipe Held, een Braziliaanse journalist. Ik wil u interviewen? Het zal niet tijd, op slechts tien minuten! Is het mogelijk? (resumindo, quer dizer: Senhor Davis, eu sou o Felipe Herói, um fodido de um jornalista brasileiro que queria muito te entrevistar. Prometo que não vou te encher o saco por muito tempo, só por uns dez minutinhos)”.

Eu ensaiei essas quatro frases umas mil vezes com um pensamento ingênuo: se eu fosse para a Holanda e alguém me pedisse uma entrevista em português, eu seria o maior solícito com a tal pessoa. A recíproca não foi verdadeira, e mesmo o Bebeto me dando a maior força (disse “vai lá, o cara é mó gente boa, tenho certeza de que vai falar com você sim”), a tia-assessora do Davids não liberou uma exclusiva. É a vida...

Mas acabou que eu consegui me espremer entre uma dupla de jornalistas holandeses e oito mil brasileiros e ficar do lado do Davids na hora da coletiva em cima de um palco pequeníssimo. Aos trancos e barrancos, fiz três perguntas seguidas para o cara e tal. Depois, uma hora, consegui lançar uma outra pergunta. Aí a assessora apareceu e tentou levá-lo para longe dos urubus da imprensa mundial.

Aí vem a parte legal: ao meu lado, um jornalista reclamava com a assessora gringa por não ter feito uma pergunta para o Davids. Ela dizia que não podia fazer nada, a entrevista já tinha terminado. “But I am from Rede Globo”, ele argumentava. A mulher repetia sorrys e mais sorrys, e o cara ao meu lado continuava lá. But I have to talk to him, we are the number 1 in Brazil”.

Meio cínica, a gringa agradeceu o cara pela vontade da “emissora número 1 do Brasil” em falar com o Davids. Falou até em português e começou a levar o atleta para o vestiário. O cara da Globo, então, se virou para um assessor brasileiro com a maior cara de tacho e disse que não conseguiu fazer uma pergunta para o Davids.

Então o assessor brasileiro virou para a assessora gringa. Sotaque carioca: “Thish guy ish from the mosht impóhrtant televyjon in Brazil, he musht talk to Davidsh”. Eu quase interrmopi e falei para o cara “E eu sou da emissora menos assistida de São Paulo e mesmo assim fiz cinco perguntas pro Davids”, mas fiquei quietinho.

A gringa, então, se virou para o repórter e o chamou para conversar com o Davids. Eu, claro, fiz a egípcia, em fingi de Rede Globo e fui junto. O cara não falou nada de mais. Mas eu voltei para casa felizinho por ter conseguido fazer meu trabalho sem precisar dar carteiradas nos outros. :)

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Não mais do que isso

A day in the life é a primeira música que toca no CD que eu mais coloco para rodar no meu carro. Realmente gosto desse som, que na primeira estrofe tem uns versinhos do tipo “Well I just had to laugh, I saw the photograph”...

E era verdade, eu realmente vi as fotos. Algumas novas que eu nunca tinha visto. Você estava com um penteado diferente, com o cabelo maior e da cor natural. Tinha feições diferentes no seu rosto. Tinha até o piercing que você recolocou no nariz porque sabia que eu gostava de noserings.

Eu vi as fotos, e eu tinha apenas que dar risada. Na verdade... bom, na verdade eu não dei risada. Foi algo até pior do que isso. Eu vi suas fotos, suas várias fotos, e a reação imediata que eu tinha em todas elas era um pensamento estranho, que me incomodava: “Mas peraí, é... só isso?”

Por muito, muito tempo, eu tinha de você a imagem da mulher mais perfeita do mundo. Até seus defeitinhos eram os mais lindos para mim. Eu realmente te fiz a garota ideal na minha cabeça. Fantasia que por um bom tempo me incomodou, me chateou, me causou uma série de danos, vamos dizer assim.

Fiz da nossa história, nossa curta história, a história da minha vida. Gostava de contá-la por aí e tudo mais. E aí, um dia, eu olho para suas fotos e não consigo pensar outra coisa do tipo “Mas é só isso?”. Não te desmerecendo e tal, só que... era só isso, mesmo.

Senti alguma coisa semelhante àquele som orquestral no meio de A day in the life. Um barulho perturbador, até, que separa a parte monótona e non-sense da música em uma outra, agitadinha e bonitinha. “Woke up, fell out of bed, dragged a comb across my head; found my way downstairs and drank a cup; and looking up I noticed I was late”.

Humm… pois é. Percebi que eu deixei me atrasar por um bom tempo. Mas agora que... ahn, talvez eu esteja mais ‘acordado’, vou lá fora viver um pouquinho. Enquanto isso, você... fica bem. Talvez um dia a gente se encontre por aí, tome um café e bata um papo como bons amigos.

E só isso.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Eu, presidente dos EUA

Mamãe diz que eu sou inteligente. Sempre disse isso, e vez ou outra fala até que eu sou mais inteligente do que ela. Discordo totalmente: ela, quando tinha a minha idade, decidiu ser médica. Eu optei pelo jornalismo. Isso já basta, né?

Mas enfim. Estava fazendo eu absolutamente nada esta madrugada com o computador ligado e vi que o Orkut tinha um teste de QI. Meu tédio estava batendo alto quando eu resolvi fazer o tal teste.

Fiquei lá resolvendo os testes sem muita certeza de algumas das 30 respostas. Terminei dois minutos antes do tempo estipulado, cliquei em enviar e o resultado apareceu. E me surpreendeu: acertei 24 das 30 questões e tirei a nota 129. Eu era um superdotado.

Não acreditei muito e fui para o Google em busca de outro teste para provar para mim mesmo que aquele teste do Orkut era uma farsa. Achei um outro lá, com 60 questões. Era isso, com mais perguntas eu certamente erraria mais... e pronto: eu provaria que o primeiro resultado foi pura sorte.

Eram 45 minutos para responder a todos os testes. Terminei em 25 minutos, chequei as respostas... acertei 49 das 60. O meu quociente de inteligência era, na verdade, 138. Não podia ser.

Por curiosidade, fui também para o Google ver se achava algumas listas de QIs de pessoas mais famosas do que Felipe Held (o que, convenhamos, não é algo lá muito difícil de se encontrar por aí). E me surpreendi mais ainda.

Pelo que andei vendo, meu QI conforme o segundo resultado é superior ao de oito presidentes dos Estados Unidos: Ulysses Grant (110), John Kennedy (117), George Washington (118), Andrew Jackson (123), George Bush filho (125), Abraham Lincoln (128), Bill Clinton e John Adams (ambos 137).

Pelos resultados, eu ainda tinha coeficiente de inteligência igual ao do Thomas Jefferson, outro presidente da gringa e superior ao do governador da Califórnia: o austríaco Arnold ‘hasta la vista baby’ Schwarzenegger (135). Meu QI também se aproxima aos de Madonna (140) e Adolf Hitler (141).

Fiquei aqui pensando com meus botões: talvez mamãe esteja certa e eu possa até ser presidente dos Estados Unidos. Mas... não sei, não. Duvido que um futuro presidente dos Estados Unidos passe as madrugadas de domingo para segunda fazendo testes de QI na internet...

domingo, 9 de novembro de 2008

Reencontro nada bem-sucedido

Sempre que saio de São Paulo e vou a alguma cidade onde eu tenha algum conhecido, fico com a terrível sensação de que encontrarei a tal pessoa. A última vez que tive isso foi na Argentina, quando passei uns 11 dias esperando encontrar a minha antiga paixão argentina de infância em qualquer esquina de Buenos Aires, Olivos ou Ezeiza (descubra quem foi ela clicando aqui e aqui).

Muito tempo passou desde que encerrei minhas férias do outro lado da fronteira e voltei para o Brasil. Para o trabalho e tudo mais. Até que ontem fui para São Caetano do Sul passar alguns instantes da minha noite de sábado de folga.

Era o penúltimo dia da peça da Maria, que tinha me feito até convite oficial para ir vê-la no palco. Peguei meu carro, me perdi umas duas ou 20 vezes e cheguei ao lugar com uns 20 minutos de antecedência. Comprei minha entrada e esperei um tempo fora do teatro, onde estava batendo um ventinho bom.

Aí, pensando na vida, lembrei que estava em São Caetano. E que a Maria era a melhor amiga da Milena. “Hoje é o último sábado da peça, é bem provável que a Mi apareça por aqui. Ia ser bom, já que estou sozinho aqui e faz um tempão que a gente não se encontra”.

Não demorou cinco minutos, vi descendo do carro uma garota baixinha estilosinha, com cabelo liso meio curtinho, pele clarinha, uma blusa bacana e um jeitinho de andar peculiar. “Rá, sabia! Tinha certeza de que a Mi apareceria por aqui”, eu triunfei comigo mesmo. Eu era o máximo.

A garotinha veio se aproximando, e enquanto isso eu pensava em como falar oi de um jeito diferente. Até porque... bom, do meu último encontro com a Milena até hoje se passaram oito meses, e admito que eu estou um tantinho diferente. Achei melhor, então, não fugir muito do óbvio.

Quando a Milena se aproximou de mim, dei um sorriso e falei “Se Milena some, Felipe Held vem até aqui para te ver. É sempre assim”. Do outro lado, nada de sorriso, abraço, nada. A garota deu dois passos para frente e deixou aparecer uma tatuagem no ombro. “Ué, a Mikas não tinha tatuagem. E nem era tão altinha assim... e... aaaah não! Puuuutz, não é a Milena!!”.

Eu não era mais o máximo. Fiquei com a maior cara de cu dos últimos tempos. Pedi desculpas para a Milena-que-não-era-a-Milena, tentei cavar um buraco e não sair nunca mais de lá. Mas não dava. Então continuei lá fora, esperando para ver se a verdadeira Milena apareceria. E, se desses as caras, eu não ia falar oi nem nada. Só de raiva por ela não ser a primeira Milena.

O pior é que a pseudo-Mikas ficou o tempo todo do meu lado na ante-sala do teatro. E sentou na minha frente durante a peça da Maria. Estou encucado até agora com a gafe que eu dei.

Mas vale o esforço que a gente não faz por uma visita a São Caetano do Sul, por uma boa peça de teatro, e ainda mais com uma amiga e tanto estrelando uma mendiga loira.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Sábado, anos atrás

Foi estranho. Meu telefone tocou no meio da tarde, eu não estava esperando. Fui atender.

“Oi”, disse a pessoa do outro lado da linha.
“Hum, oi. Ué, você não tava brava comigo?”, perguntei.

“Sim, eu estava. Mas já passou. E aí, o que você vai fazer hoje?”, ela arriscou.
“Não sei, talvez o mesmo que eu estou fazendo agora: ficar deitado na minha cama jogando videogame”, respondi inocentemente.

“Humm, tá”, ela emendou, meio decepcionada.
“Que foi? Por quê, tem alguma sugestão?”, tentei.

“Ah, queria ir para o shopping. Vamos?”, convidou.
“Hum, pode ser. Então... 16h30, lá?”.

E tudo ficou marcado.

Tomei banho, fiz a barba duas vezes, penteei o cabelo umas quatro. Passei perfume, escolhi uma calça e uma camiseta legal. Não gostei do cabelo, coloquei um boné. Virei para trás e saí de casa.

Antes de encontrar a tal garota no shopping, comprei um Trident verde. Nunca se sabe, né? Então nos vimos na catraca do metrô, saímos andando um ao lado do outro e fomos para a cobertura do shopping. Ela também me ofereceu um chiclete, um Trident verde. Coincidências...

Ficamos conversando sobre a vida, nada de mais. Até que ela me convidou para ir ao cinema. “Tá passando Exorcista, vamos ver?”. Sem muita idéia, aceitei. Melhor do que ficar jogando videogame.

Entramos na sala. Era a sala 10, eu me lembro. Estava meio lotada, ficamos na zona do gargarejo ali na frente. Nas poltronas do canto. Assim que nos sentamos, baixei o braço que separava as nossas duas poltronas. Ela me olhou de um jeito estranho e disse um “Ah, então tá”. Eu era um idiota, admito.

O trailer começou e eu virei para a tela. Ela, então, se aproximou do meu ouvido e disse, manhosa: “Você não me abraçou mais”. Subi o braço da poltrona. Dei um sorriso e um abraço na garota. Mas não foi um abraço comum, como eu estava acostumado com as minhas amigas.

Senti algo diferente naquele abraço. Um movimento súbito e não-planejado do pescoço dela. Dei-lhe um beijo na bochecha. Mais um. Mais um. Um quarto. Já estava perto de sua boca. “Ih, então... é agora? Será que vai... será que... nossa! Mas e se ela não quiser? Bom, não vou falar nada”, conversei comigo mesmo.

O beijo seguinte não foi mais na bochecha dela. Demos um selinho e abrimos nossas bocas. Nem tive tempo de pensar se deveria colocar minha língua, a dela já estava na minha boca. “Então... isso é que... isso é que é beijar?”, eu pensava no mesmo momento.

Não falei nada para ela, que ela tinha sido responsável pelo meu primeiro beijo. Mas ela logo me disse ao pé do ouvido: “Nossa, você beija bem”. E eu ganhei meu dia, meu mês. E até a frustração das minhas paixonites passadas.

Acabei me lembrando dessa história hoje. Dia 6 de novembro foi o dia em que eu comecei a namorar aquela menina, a Ju, um certo tempo depois do nosso primeiro beijo. A gente não ficou lá muito tempo juntos, vivíamos momentos diferentes. Mas, por causa dela, já até me apaixonei por uma outra menina só porque ela tinha hálito de Trident verde.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Isqueiro do capeta

Era um dia feliz em Buenos Aires. Um domingo ensolarado e fazia um friozinho gostoso pra sair na rua e desbravar a capital argentina.

Acontece que fui longe demais no meu passeio flaneur e fui assaltado em frente à Casa Rosada. Essa história os (dois) leitores fiéis deste blog já sabe (entenda você também clicando aqui).

Do roubo, me restaram poucas coisas: alguns trocados em pesos, umas moedinhas, um maço de cigarros comprado lá mesmo em Buenos Aires e um isqueiro, que eu tinha levado do Brasil. Um isqueiro Bic, verde, grandão. Todo bonito e prático.

Fodido, fumei naquele dia uma porrada de cigarros, um atrás do outro. Estava nervoso, bem nervoso. Ora: moro em São Paulo e bem na Argentina fui sofrer meu primeiro assalto à mão armada?

Depois daquele domingo não vi mais o meu isqueiro. Nem me dei muito ao trabalho de procurar, acho que deixei ele cair em algum ônibus ou em alguma praça onde eu me deitei na grama pra ver o céu azul e limpo de Buenos Aires para pensar na vida.

Foi difícil pedir um isqueiro novo no quiozco lá perto do albergue. Pensei que não seria muito diferente do português, então cheguei para a moça e pedi um izquiero. Izzzzquiero. Izzzzz-qui-e-ro. Nada. Fiz então o gestinho tradicional de um isqueiro e a mulher explicou: “Ah, acendedor?”. O mundo era mais fácil do que eu esperava.

Tudo bem até aí. Comprei um isqueiro gringo, usei-o algumas vezes em Porto Alegre e até hoje estou com ele aqui no Brasil. Mas é apenas um... isqueiro. Normalzão, assim como todos os outros.

Só que aí, um dia desses, estava saindo do meu carro, abri a porta do banco de trás do carro para pegar a mochila... e vi uma coisa verde no tapetinho de borracha ali. Cheguei perto e... e lá estava o isqueiro que eu tinha perdido em Buenos Aires.

Não me pergunte como, não me pergunte por que, mas um isqueiro que eu tinha perdido na Argentina se teletransportou para o meu carro. E eu passei a ter medo daquele isqueiro.

domingo, 2 de novembro de 2008

Notícia que você não verá nos jornais de segunda

No meio de toda a correria da semana, recebi no finalzinho dela a incumbência de escrever a reportagem especial do Felipe Massa campeão da Fórmula 1.

Bom... o filho do seu Titônio não ganhou. Mas, de birra, coloco aqui o meu trabalho que, obviamente, não foi para o ar depois que o Lewis Hamilton estragou o domingo alheio.


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Massa vence Hamilton, desconfiança, chuva, tabus e Mundial de F-1
Por Felipe Held, alguém que quer matar o Timo Glock

O Brasil precisou esperar 16 anos e 365 dias (estamos em um ano bissexto, antes que eu seja achincalhado) para ver novamente um representante conquistar o Mundial de Pilotos da Fórmula 1. Neste domingo, no entanto, Felipe Massa levantou a torcida paulista com a vitória no Grande Prêmio de Interlagos e cravou seu nome na história da principal categoria do automobilismo como o quarto condutor do País a levantar a taça.

Massa chegou a São Paulo com remotas chances de se sagrar campeão: com 87 pontos, contra 94 do inglês Lewis Hamilton, o piloto da Ferrari reverteu a desvantagem neste domingo com uma corrida perfeita e, mais uma vez, fez de Interlagos o palco da grande zebra do ano.

Em 2007, feito parecido aconteceu no autódromo brasileiro: o finlandês Kimi Raikkonen faturou o título depois de vencer em Interlagos – com a ajuda de Massa – e descontou uma vantagem de justamente sete pontos de Hamilton, que falhou duas vezes e amargou o vice.

Agora, Massa foi premiado pela ajuda a Kimi e, ainda, quebrou alguns jejuns do automobilismo tanto brasileiro como mundial: o último título de um piloto nacional acontecera em 3 de novembro de 1991, com Ayrton Senna, em Suzuka, no Japão.

Um dia antes do 17º aniversário do tricampeonato do troféu, Massa colecionou a nona taça para o Brasil e entrou no rol com o bicampeão Emerson Fittipaldi (1972 e 74) e os três vezes vencedores Nelson Piquet (81, 83 e 87) e Senna (88, 90 e 91).

O piloto paulista de 27 anos ainda manteve a tradição brasileira de vencer pelo menos um título a cada década – apesar do longo jejum após a morte de Senna, em 1994, e da safra pouco vencedora de representantes na F-1: apenas Rubens Barrichello e Massa conseguiram se sobressair na categoria.

O mais novo campeão ainda se tornou o segundo piloto da história a conseguir comemorar um título mundial ao vencer o GP em sua própria casa: antes, apenas o italiano Nino Farina (em 1950) havia conseguido tal feito.

Com o título de Massa exatos 6.209 dias após o feito de Ayrton Senna, o Brasil segue como a segunda nação que mais vezes venceu a F-1 – e abre vantagem sobre a Alemanha, que tem o heptacampeonato de Michael Schumacher. À frente do País aparece apenas a Grã-Bretanha, com 12 troféus (sete de pilotos ingleses e cinco de escoceses).

O Mundial de Pilotos de 2008 ainda vem para Massa, coincidentemente, dez anos após sua estréia no kart, em 1998. Em 99, o paulista conquistou seu primeiro título em categorias de monoposto, na Fórmula Chevrolet brasileira.

Em seguida, Massa vez as malas e partiu para a Europa, onde se sagrou vencedor das Fórmulas Renault italiana e européia em 2000. Uma temporada depois, estreou de forma espetacular na Fórmula 3000 da Europa e abocanhou o título com oito vitórias em oito provas disputadas. Desempenho suficiente para, ainda em 2001, receber um convite para ser piloto de testes da equipe Sauber na Fórmula 1.

A primeira aparição de Felipe Massa na F-1 aconteceu, em 2002, no GP da Austrália, onde acabou abandonando. Seu melhor desempenho naquele ano foi o quinto lugar na etapa da Espanha, finalizando a temporada no 13º lugar, com quatro pontos.

A Ferrari, então, decidiu apostar no jovem brasileiro que dominou as categorias de acesso da F-1. Massa foi contratado para ser piloto de testes da escuderia italiana ao longo da temporada 2003 e retornou à titularidade de uma equipe em 2004, novamente pela Sauber.

O brasileiro, mais experiente e arrojado, quase apareceu no pódio: foi quarto no GP da Espanha. No total, Massa colecionou 12 pontos ao longo da temporada e ficou com o 12º lugar geral. Em 2005, apesar do desempenho inferior (foi quarto colocado no Canadá e somou 11 pontos, terminando a temporada na 13ª posição), assinou contrato com a Ferrari para o lugar do também brasileiro Rubens Barrichello.

Em seu primeiro ano no carro vermelho mais famoso do mundo, Felipe Massa chegou a seu primeiro pódio com a terceira colocação no GP de Nürburgring. O representante nacional ainda alcançou suas duas primeiras vitórias na carreira, na Turquia e – justamente – no Brasil, na despedida das pistas de Schumacher. O piloto do País encerrou o ano na terceira colocação do Mundial, com 80 pontos e sete pódios no total.

A performance de Massa melhorou em 2007, primeiro ano sem Schumi como o ‘queridinho’ da equipe e com a concorrência aberta com o finlandês Raikkonen. Foram três vitórias (Turquia, Espanha e Bahrein), dez pódios e 94 pontos e a quarta colocação da temporada. E Kimi foi o campeão.

sábado, 1 de novembro de 2008

Ticket to ride (away)

Ah,

Eu cheguei em casa esses dias um pouco cansado. Não, vai. Era bem, bem cansado. Mas ultimamente tenho andado meio eufemista, fingindo que tudo anda bem e tal. Talvez porque na verdade tudo ande realmente bem, e eu fique por aí tentando arranjar algum motivo pequeno para desestabilizar uma época bem legal.

Mas não vamos falar sobre as minhas besteiras, pode ser?

Bom, o fato é que eu estava realmente cansado e tinha chegado em casa. Esse é o nosso ponto de partida. Abri a porta de casa, acordei meu cachorro. Ele estava deitado no sofá, mas acordou e veio correndo para a porta fazer festa para mim. Dei um tapinha na cabeça dele, peguei o brinquedo da boca dele, joguei no fundo do corredor. Ele foi buscar, devolveu para mim e voltou para o sofá.

Vim para o quarto, meu irmão estava sentado na minha cama mexendo no computador. Este mesmo, que agora está no meu colo enquanto eu vivo mais uma noite de insônia com a janela aberta. Certeza de que isso não deve ser muito saudável, pegar vento às 4 da manhã.

Ih, mas olha eu fugindo do assunto de novo.

Acho que... é, acho que estou fugindo tanto para não falar que... que cheguei em casa e vi, no meu quarto, um pedaço de papel querendo cair da minha estante. Me aproximei, ele estava com as costas para cima. Todo surrado, dobrado e amassado, querendo amarelar.

Virei o tal do papel. Ele tinha me custado... ele tinha me custado R$ 15,55. Não lembro se paguei direitinho, com moedas contadas e tudo, ou se simplesmente dei uma nota de 50 para o caixa. O bilhete foi emitido às 14h22 de um sábado. Aquele sábado.

Nem lembrei que tinha comprado aquele bilhete e ido para a plataforma 7o8. Ou 758. Pode ser 708, não sei. A tinta já se apagou um tantinho, não dá para ler muita coisa naquele papel.

Apesar de que... ah, qual a diferença? Eu tenho lá minhas lembranças, minhas lembranças ruins, sempre que vejo esse papel. Deixa que ele se apague mesmo, é até melhor. Tenho muitos outros bilhetes mais interessantes guardados aqui no meu quarto. Que me trazem doces, doces lembranças.

Só me entristece um pouco o fato de não ser só a tinta do bilhete que está se apagando. Estão sumindo das minhas lembranças, aos poucos, o seu rosto, o seu olhar brilhante, o seu sorriso, a sua voz...

... não que isso seja ruim, na verdade.

domingo, 26 de outubro de 2008

Rock na escola

Tardes quentes de domingos me fazem ficar em casa quando estou de folga, apenas esparramado sobre o sofá em busca de algo na televisão que não seja tão corrosivo para a minha cabeça. Desta vez, sem futebol na televisão por causa das eleições, encontrei Escola de Rock em um dos Telecines. Maravilha.

Acho que foi a quarta vez que vi Escola de Rock, e, como sempre, tive aquela sensação de tirar minha guitarra e meu amplificador de cima do armário e arriscar alguns acordes. Mas, além disso, acabei me lembrando de um dos meus shows mais incríveis. Como nunca falei dele, vamos lá.

Era uma manhã de final de maio ou começo de junho, sexta-feira. Meus amigos de sala e eu, já no terceiro colegial, tínhamos resolvido nos inscrever no show de talentos da semana olímpica da escola. Depois de muitas idéias e desavenças quanto ao nosso repertório (todos eram metaleiros, menos eu), chegamos a um meio-termo que pudesse agradar não só ao pessoal da banda como aos jurados. Iríamos tocar duas músicas do Mamonas Assassinas e, por fim, Rock and roll all nite, do Kiss.

Apareci no colégio logo cedo, umas 7 da manhã, com a minha guitarra nas costas. Andei pelo ginásio praticamente vazio e subi para a sala de aula, onde estavam algumas amigas minhas – uma delas era minha grande paixonite da época, mas não estávamos nos falando já tinha algumas semanas. Depois o resto da banda chegou, assim como as meninas que iriam nos maquiar (parece coisa de viado, eu sei) e fomos para o salão nobre. Vazio, vazio.

Subimos para a coxia e lá começou toda a produção. Desenho aqui, tinta branca ali e acolá, mais tinta branca, pintura preta... peruca (eu era o único que não tinha cabelo comprido), batom (peraí, eu não vou passar batom! Vai, Held, o Chitão também passou. Tá bom, tá bom)... cabo, pedaleira, fonte da pedaleira... guitarra desafinada, afinação… palhetas, onde estão as minhas malditas palhetas puta que o pariu? Ok, uma aqui, uma ali... ok, achei minhas três palhetas. Esparadrapo nos dedos da mão direita (eu sempre me ferro tocando guitarra)… vocês são a próxima banda, vamos lá.

Achei que o salão estaria vazio, já que era manhã de sexta-feira e a presença dos alunos não era obrigatória na semana olímpica. Mas, assim que pisei no palco, vi o salão completamente tomado. Quanta gente tinha ali? 200? 300? Eu chutaria 300, tinha bastante gente em pé. Logo na primeira fila, no entanto, estava aquela tal paixonite. Do alto do palco tentei disfarçar, mas... ok, ela estava na minha frente.

Começamos a tocar, com muito pouca iluminação. Chopis Centi e Jumento Celestino correram bem, sem erros crassos ou acontecimentos fantásticos. Até que as luzes todas se apagaram por completo, o baterista fez a introdução, as guitarras entraram... as luzes piscaram e todos viram que estávamos vestidos de Kiss, tocando Kiss. Uh-la-lá.

Eu, na época, era bem tímido. Muito, muito mesmo. Mas perdia por completo a timidez quando estava em cima de um palco e com a minha guitarra pendurada. E, naquele momento, não tinha resquício algum de timidez ou insegurança. Tanto que, quando estávamos para chegar ao refrão, sugeri por meio de sinais para o restante da banda que ninguém cantasse ou tocasse, exceto o baterista. Deu certo, e o salão inteiro levantou e começou a cantar com a gente. Eu me senti um rock star.

Pouco depois chegou o meu solo. Dei alguns passos para a frente, fui para a beirada do palco e, quando vi, estava pertinho da minha paixonite. Tentei não errar, consegui. Ouvi um elogio da paixonite, dei um sorriso. Putz! Depois o show infelizmente acabou, recebemos aplausos e mais aplausos. Voltei para a coxia, tirei a peruca, limpei o rosto e saí do salão. Em êxtase, ainda.

Nunca fui lá muito popular no meu colégio, admito. Mas naquele dia foi incrível como tanta gente me reconheceu. Até uma menina da oitava série por quem eu tinha uma paixãozinha platônica me parou, perguntou “você era aquele cara que tocou Kiss agora há pouco, né?”. Respondi que sim e ela logo emendou “nossa, você tocou muito, adorei. Parabéns”. Era meu auge, eu estava no topo do mundo e da cadeia alimentar. Eu era um fenômeno.

Curti um pouco meus 15 minutos de fama e voltei para casa. Feliz, feliz da vida. Tínhamos ficado em segundo lugar no show de talentos e fomos convidados para nos apresentarmos na apoteose. Mas a essa segunda apresentação a paixonite não pôde ir. E eu, particularmente, não me senti tanto rock star.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Reaprendizado

Eram parceiros de almoço, os dois amigos. Todos os dias, no mesmo horário, se encontravam no mesmo lugar de sempre para irem almoçar e depois entrarem no trabalho.

Um dia, um dos amigos não apareceu. Era quinta-feira, fim de verão. O outro parceiro estranhou. Pegou o celular, caçou o número do outro na agenda e ligou, quase que preocupado, para saber o que havia se passado. Três toques depois, uma resposta.

“Opa. Fala, cara! Você não vem almoçar hoje?”.
“Ih, cara... foi mal, já almocei”.

“Beleza. Já tá vindo pro trabalho, onde você tá?”.
“No shopping”.

“Onde?”
“Muito, mas muito longe”.

“Onde fica isso?”
“Pega a Marginal, depois você vai na saída da Ayrton Senna. Anda uns 100 km e você chega”.

“Como assim, cara?”
“Tô de folga, velho. Vim viver um pouco”.

Um estalo de beijo.

”Bom, ela saiu do banheiro. Tô indo pro cinema, bom trabalho aí”.
“Parabéns, cara, hahaha! Aproveita!”.

domingo, 19 de outubro de 2008

Horário de verão

Um dos posts mais non-senses já escrito por aqui dizia respeito à mudança do horário de verão para o horário convencional. Besteiras à parte, sinto inveja quando releio meu relato sobre o ‘dia das 25 horas’ e percebo como eu estava com idéias de sobra para escrever bobagens – ainda mais em uma época de vacas magérrimas deste blog.

Mesmo assim, faço um parto forçado para relatar uma singela experiência sobre o outro solstício artificial criado pela estranha humanidade – aquele do dia mais curto do ano, quando adiantamos nossos relógios em uma hora para, teoricamente, gastarmos menos energia elétrica.

Era noite de sábado, eu tinha saído da redação, peguei o carro no estacionamento. Dirigir alguns quarteirões e fui até a Bela Cintra, onde teria o aniversário de uma grande, grande amiga. Eu, tolo, imaginei que encontraria vagas a torto e a direito nas alamedas do Jardins próximas à Paulista e perto do bar, mas sequer pensei que seria impossível encontrar um espaçozinho sequer para o meu singelo bólido.

Rodei várias vezes por vários quarteirões em busca de uma vaga, mas nada. Acabei me rendendo a um estacionamento Estapar na Haddock Lobo, a uma quadra do bar ao qual eu iria. E, acostumado ao Estapar 24 horas ao lado do trabalho, apenas entreguei a chave ao manobrista e peguei o comprovante. Até que ele me avisou.

- Senhor, fechamos às 3 horas, ok?
- Humm, acho que não vou ficar tanto tempo assim no bar, mas... ih, me explica. Vocês fecham às 3 horas do horário de hoje ou às 3 horas de amanhã?

- Nós fechamos às 3 hora da manhã, senhor.
- Sim, sim. Mas em relação a que horário?

- Ao horário... como assim, senhor?
- É porque daqui uma hora vai entrar o horário de verão. E eu imagino que não vai ser muito legal eu chegar aqui às 3 horas do horário de hoje, que seriam 4 da manhã, e não ter mais carro pra voltar pra casa por causa do horário.

- Ih, agora eu já não sei.
- Bom, e eu menos.

- E agora?
- Você pode checar para mim?

O manobrista foi checar com o cara que parecia ser o gerente responsável pelo estacionamento. O cara, é claro, também não sabia. Disse apenas que o estacionamento funcionava de acordo com a cantina ao lado. “E...?”, eu tive vontade de perguntar.

Acabou que o segurança da cantina, bem informado, explicou que o horário de verão seria adotado pelos estabelecimentos comercias apenas na manhã de domingo. Ou seja, eu poderia ficar tranqüilo no bar até as 3h30 (de verão) que eu não correria risco algum de voltar a pé para casa.

Enfim. O horário de verão começou. Eu simplesmente adoro o horário de verão, aquela coisa de sair do trabalho às 19 horas e ainda ter um solzinho convidativo para uma cerveja e umas risadas.

O único problema do horário de verão é que o dia mais curto do ano se torna incrivelmente curto. E o tempo... humpf, o tempo voa.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Filo: Arthropoda

Faz um tempo, almocei com a Bonie antes de entrarmos nos respectivos trabalhos. No restaurante, tinha uma bandejinha com camarões à nossa frente, e ela perguntou se eu gostava de camarões. “Humm... ah, até gosto”, respondi. Ela disse que não gostava, que eram nojentos. E eu passei a observar melhor os tais dos crustáceos.

Semanas e meses se passaram, e no self-service chinês que eu adotei como restaurante oficial para meus almoços antes do trabalho sempre tem um empanado de alguma verdura com um camarãozinho em cima. Todos os dias eu tiro o camarão de cima, como a tal da verdura misteriosa e fico olhando pro coitado do bicho. Ele não olha de volta para mim porque já teve a cabeça decepada. Ainda bem.

Mas comecei a ter alguns pensamentos sobre o camarão. Realmente é algo nojento. É aquela coisinha espichada, com uma casquinha por fora e uma carne branca por dentro. Para não correr o risco de... sei lá, um dia pegar um bichinho que não esteja totalmente limpo e ver alguma organela lá no meio, sempre coloco o camarão inteiro na boca e mastigo.

Só que... humm, sempre que mastigo um camarão, sinto as casquinhas das patas do bicho passeando pela minha boca. Não é muito, ahn, limpinho e tal, mas eu continuei todos os dias comendo o camarãozinho que enfeitava o tal do empanado.

Não entendo. Durante as Olimpíadas de Pequim, cansei de ver reportagens na televisão sobre as comidas exóticas da China. Em uma delas, na ESPN Brasil, o Marcelo Duarte entrevistou um cara que dizia que comer um escorpião era igual a comer um camarão: uma casquinha crocante por fora, uma carninha salgada por dentro. Isso ficou na minha cabeça.

Aí um dia desses saí do trabalho, parei no supermercado para fazer as compras da semana e vi que o camarão estava em oferta. Comprei uma bandeja por módicos R$ 4 e vim para casa pronto para fazer alguma gororoba com os crustáceos. Lavei minha janta, joguei um tempero, misturei com uns palmitos e joguei tudo para cozinhar.

Não sou nada fã da comida que eu mesmo faço, mas aqueles camarões pareciam até que saborosos. Coloquei tudo no prato, joguei um pouco de mostarda por cima para tirar o gosto ruim que minha comida tem e comecei a comer. As primeiras garfadas foram até que normais, e tal.

Aí uma hora vi um olhinho de camarão no prato. Ele começou a me encarar, e eu olhei para os outros crustáceos no prato. Várias perninhas, e lombos sem cabeça... casquinhas crocantes. Putz, certeza de que por ali deveria ter alguma organela perdida.

Continuei jantando, comendo dois camarões de uma vez para terminar logo. Lembrei do escorpião, e da barata que eu havia matado na véspera. Perninhas, casquinhas crocantes... organelas, urgh. Óbvio que não terminei a janta, os poucos camarões que sobraram foram para o lixo.

Ok, boa parte dessa minha sensação desagradável foi motivada pelo fato de ser a minha comida ali no prato. Mas não, os camarões são realmente desagradáveis. Crustáceos, do filo dos artrópodes (que também enquadra insetos)... putz, eu me sentia comendo insetos aquáticos. Lembrei daquele episódio do Chaves, em que todos da Vila comem os ‘inseptos’ com gasolina (a genialidade do melhor seriado já produzido pode ser encontrada aqui, aqui e aqui). Não, não deu.

Talvez amanhã eu acorde e nem me lembre mais do trauma dos camarões. Mas há também o risco de o camarão entrar para a lista de coisas que eu não como mas nem a pau, ao lado de melancia e pimentão.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Atrocidades

Acendi a luz e ela já estava lá, imóvel, olhando para mim. Já estava esperando por isso, mas não naquele momento. Tanto que ficou um bocado zonza quando o clarão da lâmpada piscou pela primeira vez.

Não estava esperando por aquele encontro. Tentei fazer de conta que tinha sido tudo mentira, coisa da minha imaginação. Apaguei a luz, dei um passo para trás... voltei à frente e liguei o interruptor novamente. Queria estar bêbado e ter fantasiado aquele encontro, mas não: ela continuava ali.

Eu... eu não tinha medo dela. Seria idiota ter medo de algo tão insignificante. Era apenas... preguiça. Minha vida naqueles cinco minutos subseqüentes seria muito mais fácil se ela nunca tivesse existido. Nem ela e nem toda a sua prole.

Mas... ela estava lá, e era melhor enfrentá-la. Eu sabia que tinha algumas alternativas, só que nem todas funcionariam. Ou seriam fáceis. Era um trabalho... não complicado, mas no mínimo desagradável.

Eu poderia gritar alto falando para ela ir embora. Seria a forma mais ineficiente, eu sabia que deveria ser mais incisivo. Isso, mais enérgico. Violência física? Hum, também. Só que... e depois? Faria uma sujeira e tanto, sangue (ou seja lá o que for aquela coisa) espalhado por todo lugar. Não.

Acabaram me restando duas saídas opostas. A primeira, ignorá-la e me retirar. Sabia que ela se cansaria de ficar ali por muito tempo e logo em seguida iria embora – sabe-se lá para onde. Ou então... é, eu poderia... sim, cometer um... um... assassinato.

“Enérgico, lembra?”, pensei comigo mesmo. Escolhi a segunda opção. E eu sabia o que escolher para isso: morte lenta, a pior de todas. Ela ficaria desesperada, tonta, asfixiada... estrebucharia, agonizaria... tudo isso até chegar ao seu triste fim.

Abri o armário. Lá no fundo, peguei o frasco que seria mortal. Me aproximei e ela percebeu o que iria acontecer. Tentou se afastar lentamente, mas não conseguiu. Estava condenada.

Um leve esguicho e lá estava ela: tonta e desesperada, desesperada e asfixiada. Bateu com a cabeça na parede, começou a estrebuchar. Estava agonizando. Eu, assistindo a tudo isso, me deleitava. Na verdade era um misto de culpa e satisfação. Um deleite diferente.

Passaram-se cinco minutos e a agonia estava terminada. Ela, imóvel. Eu, com a ficha criminal suja. Mas com a casa limpa.

Baratas invadindo sua cozinha em uma noite quente não é uma coisa legal.

domingo, 12 de outubro de 2008

Cosmopolitan e uísque

A mesa era para dois. Ela puxou uma cadeira, colocou a blusa sobre o recosto e se sentou. Ele não quis se sentar à frente dela, com uma mesa de distância para ela; colocou sua cadeira quase que ao lado da garota.

O garçom ofereceu o cardápio. Ela nem olhou e pediu um cosmopolitan. Vodca, sucos de limão e morango... drink de mulher. Ele, fazendo pose uma perna pousada sobre a outra, convocou um uísque. “On the rocks”, explicou.

Enquanto o garçom saía com os pedidos, ele esticou o braço e o apoiou nas costas da cadeira da garota. Estava desconfortável, mas à espera de um sinal por parte dela. Ela notou, mas não teve reação. Nem pediu para que ele tirasse o braço, nem se apoiou firmemente na cadeira para ser abraçada... nada.

As bebidas chegaram. Bebiam enquanto conversavam efemeridades. Um virado para o outro, ele desconfortável com o braço na cadeira dela e ela impassível. Ficaram nessa situação de não-chove-e-não-molha por um bom tempo. Algumas horas. Pediram mais drinks – os mesmos –, e nada. Só saíram quando o garçom avisou que o bar ia fechar.

A conta veio, ele olhou o valor e tirou o cartão do bolso para pagar. Ela relutou, falou em dividir... ele não deixou, reiterou que bancaria. “Você já foi a minha companhia, tenho que compensar”. Ela ainda tentou um “mas você não precisa pagar pela minha companhia”, mas não adiantou.

Levantaram-se. Ele tropeçou na própria cadeira, mas conseguiu sair vivo do bar. Vivo, mas não abraçando a garota. E com um saldo bem menor na conta.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Cinza

O mundo não parava de girar. Fazia tempo que ele ouvira isso, ainda era uma criança quando aprendeu que a Terra estava sempre em movimento. Nunca tinha duvidado, até sentir muitos anos depois que... tudo tinha parado. Tudo, tudo mesmo.

Na verdade, não era bem assim. Nem tudo havia parado. As coisas ao seu redor se moviam de uma forma incrivelmente rápida. Apenas as coisas que o envolviam estavam... paradas. Religiosamente paradas. Caoticamente paradas. Sacalmente paradas. Insuportavelmente paradas. Uma calmaria terrível.

Até que... até que um dia acordou, já não era cedo. Era bem tarde, para falar a verdade. Saiu da cama, colocou uma calça e uma camiseta, ligou a televisão e se deixou cair sobre o sofá. A programação da televisão seguia a mesma toada da calmaria. Nada de espetacular àquela hora da manhã, perto do almoço.

Deu alguns passos, foi para a cozinha e não achou nada de interessante na geladeira. Olhou pela janela, viu um dia cinza. Cinza, nada atraente. Mas resolveu desafiar aquele dia de aparente marasmo, correu a porta e foi para a varanda. Sentiu um bafo quente bater em seu rosto e chacoalhar seus cabelos. Deu um sorriso.

Apoiou-se no parapeito e aspirou o ar fundo. Novo sorriso. Estranho como estava dando sorrisos assim, a esmo. Apalpou os bolsos, viu que ainda havia um cigarro solitário no maço já amassado - bem amassado. Caçou um isqueiro em um outro bolso, deu a primeira tragada. Acompanhou o desenrolar da fumaça no ar. Abriu as feições, já estava sorrindo descontroladamente.

De lá de cima, forçou os olhos e viu todos aqueles carros parados muitos andares abaixo. Freavam, paravam quando todos os semáforos se avermelhavam ao mesmo tempo. Voltavam a andar quando o verde piscava e lentamente desapareciam de vista. Os pedestres, nas calçadas, marchavam em um ritmo ainda mais calmo. Era uma calmaria generalizada.

Ele também percebeu que vivia uma calmaria naquele momento. Mas apenas naquele momento. Ficou tonto quando percebeu que, na verdade, tudo estava girando. Tinha voltado a girar com o resto do mundo. Não sorriu desta vez, mas gargalhou. Havia deixado a calmaria – temporariamente ou não; ele não se importava com o tempo.

Olhou mais uma vez para cima. O céu continuava acinzentado, aparentemente triste. Não para ele, que vivia aquele momento como se fosse o mais ensolarado dos dias. Lembrou das aulas de Literatura do colégio, que o ensinaram a cor-local. Ironizou a cor-local. Riu da cor-local.

Perguntava-se: quem disse que um dia nublado não pode ser estonteantemente bom?

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Boa vizinhança

A Dona Taé era uma velhinha legal. Ela é a vizinha de cima, que mora no 23. Deve ter vindo do Japão quando pequenininha, há uns 300 anos.

Desde que eu me dou por gente, ela morava sozinha. E minha mãe sempre reclamava que a velha não tinha nada para fazer e decidia, no meio da noite, empurrar os móveis de um lado para o outro da casa.

Mesmo assim, era uma velhinha que não dava muito trabalho para os vizinhos de baixo, pois não pulava, não corria pelo apartamento... e sempre pudemos ter uma vida social

E 12 anos se passaram assim, até que um dia um neto gay dela se mudou para o apartamento aqui de cima e passou a fazer companhia pra Dona Taé. Percebi isso um sábado, às 8h30 da manhã, quando o imbecil ligou o acústico da Cássia Eller no talo. E com Malandragem no repeat.

Ficou nisso até o meio-dia, 3h30 da mesma música; todo sábado era a mesma coisa. Foi o suficiente para eu ter um ódio mortal do novo vizinho. E jamais conseguir gostar de Cássia Eller, sobretudo de Malandragem.

Mais uns anos voaram e um dia eu já devia ter uns 16 quando a bisneta da Dona Taé também se mudou para cá. Era uma pentelha de uns quatro anos de idade que pulava, e corria, e gritava. Teve uma vez, eu estava fazendo lição de casa à tarde e ela, lá embaixo, tentava jogar uma bola vermelha no apartamento dela, no segundo andar. Bateu na minha janela umas três vezes, até eu aparecer com cara de bravo e a mãe mandar a filha parar.

Uns seis meses depois a pestinha foi para o Japão, e eu dei graças a Deus. O neto gay da Dona Taé também sumiu do mapa, ainda bem. Ambos voltaram uns dois anos depois, e a maldita pivete voltou ainda pior.

Teve um domingo, já era umas 21h30, ela começou a pular com os calcanhares no chão. Peguei uma vassoura aqui em casa e comecei a cutucar o cabo no teto, para ver se alguém se tocava e mandava a fedelha parar. Nada: ela ficou ainda pior. Só de raiva, contei os minutos até dar 22h10, a menina não parou. Liguei na guarita do prédio e disse “oi, eu sou o morador aqui do bloco 10 e... eu estou ouvindo gritos, e barulhos fortes no apartamento 23. Acho que está tendo uma briga forte, você pode ver o que é?”. Cinco minutos depois, o barulho tinha acabado. Para sempre.

Humm... para sempre também não. Hoje, meu dia de folga, fui dormir às 6 da manhã e estava decidido a hibernar até umas 14 horas. Besteira: às 8h30, acordei com porretadas, marteladas... quase um armagedon. A Dona Taé resolveu mudar o piso do quarto acima do meu. Tentei me enfiar embaixo do travesseiro, dos cobertores, até pensei em ir pra debaixo da cama. Vassouradas não adiantaram, e nem meus gritos pela janela de “caralho, porra, pára com essa merda, enfia esse piso novo no olho do...” e daí pra cima.

Nunca falei tantos palavrões após acordar. Fiquei uns 20 minutos reclamando, dando vassouradas no teto, xingando o navio que trouxe a droga daquela velha maldita pro Brasil há 980 anos só pra acabar com o meu tão sonhado dia de folga.

Droga.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Vida moderna

Duas pessoas com idéias completamente diferentes em um mesmo momento é um dos grandes problemas da vida em sociedade. É um imbróglio ainda maior quando você está frente a frente com o outro idealizador. Hum... tá, vai, eu explico.

Tinha ido votar na manhã de domingo. Desci uns quarteirões aqui no meu bairro, digitei meus números na urna eletrônica e voltei para casa. No caminho, relativamente vazio em uma das calçadas já próximas do meu condomínio, vi um cara vindo exatamente na minha direção.

Como eu sei que não sou transparente e imaginei que ele também não fosse, tive a idéia de seguir a norma básica implícita na lei dos pedestres: mantenha-se à direita. Cheguei bem perto do muro, mas o cara teve uma idéia completamente diferente: manteve-se à esquerda dele. Logo, se manteve na minha frente.

Vi que estávamos prestes a nos chocar dentro de uns cinco passos e fui um pouco para a minha esquerda. Ele, sabe-se lá por que, teve a idéia de ir para a direita. Dei, então, uma chegada para a minha direita. Ele, para a esquerda dele. Demos mais dois passos e ficamos frente a frente.

Parei. Ele também. Ameacei sair pela direita e ele, pela esquerda. Esbarrão. Parei, ele também. Tentei a saída pela esquerda e ele, pela direita. Novo encontrão. Paramos novamente. Esbocei dar um passo para a minha direita mais uma vez, e ao mesmo tempo ele ameaçou a esquerda. A vida em sociedade não estava mais dando certo, aquela calçada era muito pequena para nós dois.

O cara lá deu uma risada, falou “ooopa” e enfim tomou seu rumo. Eu não estava muito contente com esse problema tão grande para dar um passo e não falei nada, apenas abaixei a cabeça e apressei o passo. Era um domingo, estava um dia chuvoso e eu não estava lá tão bem humorado.

Ter uma idéia completamente diferente de alguém é uma droga. E fica pior ainda se isso acontecer em um domingo e você estiver com um péssimo humor. Mas é algo inerente à vida modera, talvez.

Ou... sei lá. Foi só mais uma mostra de que eu realmente tenho uma morte lenta aos domingos. E a não ser que algo realmente... ahn, surpreendente aconteça aos domingos, nada vai me fazer odiar menos o último dia do final de semana.

sábado, 4 de outubro de 2008

Banho de shoyu

Sexta-feira, noite. A semana estafante tinha acabado parcialmente (os plantões no sábado e do domingo não me permitirão desfrutar de uma folga completa), e... bom, sempre gosto de fazer alguma coisa na noite de sexta (mais do que no sábado, aliás).

Juntando isso ao fato de que eu não comia nada desde o almoço de quinta-feira, fui jantar em um rodízio de comida japonesa, perto de casa. Todas as perspectivas de uma boa chepa, não fosse o fato de eu parar o carro na frente do restaurante e ouvir do manobrista que o local fecharia em 10 minutos. “Ok, aquele casal acabou de entrar... não vão fechar a porta do lugar tão cedo”, pensei. E entrei.

Já conhecia aquele restaurante japonês, vez ou outra vou almoçar lá com minha mãe e meu irmão. Como de costume, pedi um suco de laranja e um temaki (vulgo sushi gigante) de atum e os pratos quentes vieram. Eu, mostrando todas as minhas habilidades com o hashi (os pauzinhos), peguei uma guioza (um bolinho de carne) e comecei a encher o pandu.

O garçom, que de japonês não tinha nem o branco dos olhos, logo viu e se prontificou a tirar a tábua das guiozas. Sei lá o que aconteceu, ele virou a bandeja e derramou todo, mas todo o shoyu em cima da minha mochila. Olhei, fiz que não vi esperando ele se prontificar a limpar, ou pedir desculpas, ou sei lá. O cara simplesmente ficou me olhando, esperando que eu explodisse. Continuei na minha, mas puto.

O cara voltou à minha mesa pouco tempo depois, trazendo um potinho de shimeji (cogumelos). Olhou para minha mochila, olhou para mim, virou as costas e voltou para a cozinha. Vez ou outra passava na minha mesa, olhava de mim para a minha mochila e da mochila para mim e esperava ser xingado. Continuei fingindo uma calma enorme, embora... minha mochila estivesse coberta de shoyu.

Uma hora, eu quase explodindo de raiva, ele passou perto e eu pedi um pano úmido. Ele me trouxe um perfex seco, mas foi o suficiente para eu fazer uma ceninha de levantar, passar o pano sobre a mochila, olhar feio para ele... e esperar, pelo menos, um pedido de desculpas. Poxa, eu não ia maldizer as próximas 30 gerações do cara, mas um “foi mal” não seria ruim, né?

Ele não falou um A sequer, só continuava olhando da mochila para mim e de mim para a mochila. Pensei em vários tipos de protestos: chamar o gerente e reclamar, pedir um pano úmido para outro garçom e dizer “é que seu colega fodeu a minha mochila e nem pediu desculpas”, não pagar os 10%, dar alguma indireta no tal do garçom-cagão... e até reclamar com o sindicato dos clientes de rodízios japoneses. Mas meu temaki não tinha chegado, e eu preferi não correr riscos de receber um sushi gigante cuspido.

O jantar correu bem, e consegui compensar as muitas horas sem alimentos. Após pagar a conta (com os 10%, achei melhor não dar showzinho e bancar o babaca), levantei da cadeira, peguei a mochila e reclamei “Hunf, shoyu. Caralho”. Ironicamente, no mesmo momento o cara passava na minha frente para abrir a porta para mim. Abriu, eu saí sem falar “boa noite”, “obrigado” ou “vai se foder”. Foi meu protesto pacífico.

O problema é que eu tenho duas mochilas. A minha preferida, uma da Risca que eu tenho desde o primeiro ano da faculdade, está rasgada. A minha reserva, uma grandona da Wilson... está coberta de shoyu.



Não vivo sem uma mochila nas costas, me sinto extremamente vulnerável e despreparado quando saio na rua sem uma mochila. Mas... humpf.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Fortuna

Teve um dia em que eu voltei para casa feliz da vida, por motivos tecnicamente irrelevantes. Encontrei ainda alguns amigos no caminho, e todos comentaram o quanto eu estava esquisito. Acharam que eu tinha bebido – de fato eu tinha, mas horas antes. Naquele momento, no entanto, eu estava simplesmente... feliz.

Acontece que eu tenho um defeito enorme de sempre contestar a minha felicidade. Fico sempre à espera de que algo aconteça para pô-la em prova. E naquele dia, na garagem do prédio indo para casa, eu vi algo brilhando para mim. Curvei o corpo um pouquinho e encontrei uma moeda.

Era apenas uma moeda, tudo bem. Mas era... era uma moeda pequena, dourada, de 10 centavos. Coloquei no bolso e quase explodi: “Putz, até dinheiro eu achei! Isso sim é que é ficar feliz”. Toda essa felicidade, é claro, tinha um significado um bocado além da razão, mas que eu só fui entender muito tempo depois.

Para falar a verdade, só fui perceber algo semelhante na Argentina. Lá há alguns ditados legais sobre moedas, especialmente as pequenas e douradas. São ditos populares bem interessantes. Cascatas, sinceramente.

Mas enfim. Guardei aquela moeda em um lugar especial, no meio da bagunça do meu quarto. E minha felicidade durou por um certo tempo, até que eu me esqueci da moeda e a minha vida acabou voltando ao normal. E os dias, as semanas e os meses voaram.

Passou mais um tempo e, recentemente, teve um dia em que eu acordei tão empolgado quanto naquele tempo passado. Saí de casa e fui para o trabalho todo determinado com alguns pensamentos na cabeça. Até que cheguei ao quarteirão do metrô e vi algo no chão. Um papel verde, dobrado e surrado, quase voando com o vento. Nem parei o passo, apenas abaixei, peguei a nota de R$ 1 (pode não parecer, mas elas ainda existem) e pus no bolso.

“Voltei a achar dinheiro, caramba!”, pensei. “Algo deve estar para acontecer, sei lá”. Eu não sabia bem, para falar a verdade, o que poderia acontecer. Até pensei em guardar aquela nota para sempre, como se fosse o Tio Patinhas guardando a sua moedinha de sorte.

Bastou um dia ruim dar as caras e eu acabei gastando a nota por aí. Tsc, tsc.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Nada é perfeito, o retorno

Fui há algumas semanas a um Palmeiras x Vasco no estádio. Aquela coisa: Shrek virou para mim, perguntou se eu ia fazer alguma coisa à noite, eu disse que não e decidimos ir ao jogo. Simples assim, não fosse o puta frio que quase me congelou na arquibancada. Mesmo assim, meu time venceu por 3 a 0, passou para as oitavas-de-final e combinamos de voltar para a partida contra o Sport Áncash, um clube do Peru.

Duas semanas se passaram até que, na terça-feira, lancei para o Shrek: “Amanhã tá de pé, né?”. Ele confirmou, assim como mais três amigos: Allan, Tomiate e Luquinhas. Desta vez, eu estava sem disposição alguma para sair correndo do estádio à meia-noite a tempo de ir para o metrô. Fui à tarde para o trabalho de carro, e pronto. Seria minha primeira ida ao estádio no volante.

No finalzinho do expediente, troquei alguns e-mails com a Pri e disse que não iria para a faculdade à noite. “Você vai pro jogo debaixo de chuva? Que disposição!”, ela me disse. Espiei pela janela da redação, virei para o lado e perguntei se estava chovendo. Antes que me respondessem, um trovão ecoou pela Paulista. Estava respondido.

Antes de ir embora, recebi um convite aparentemente irrecusável para tomar um café. Relutei, quis aceitar, quase aceitei... mas me lembrei do compromisso firmado semanas antes e fui obrigado a recusar. Tudo bem, vai; outros cafés virão.

No caminho até o estacionamento, olhei para meu tênis já molhado com a chuva forte que caía e me lembrei de um outro jogo em que tinha ido. Também quarta-feira, também à noite, também com o Shrek... e eu estava vestindo também o mesmo tênis, a mesma calça... “Hunf”, foi o que eu consegui pensar sobre as terríveis lembranças daquela partida (relatadas neste espaço).

Enfim. Nem peguei tanto trânsito assim e tudo deu bem certo (apesar de uma perdidinha aqui e outra ali no caminho) até deixar o carro no West Plaza. Entramos no estádio (embora tenhamos nos tornado personae non gratae no Palestra), encontramos Tomi, Allan e Luquinhas na arquibancada... e tudo parecia estar maravilha.

Um cara da arquibancada, então, resolveu arremessar pacotinhos de amendoim doce para o resto da torcida. Estranho. Um envelope caiu na minha mão, seria a janta perfeita. “Nunca aceite nada de estranhos”, disse uma voz na minha cabeça. Claro que não ouvi e comi os poucos amendoins por lá. Deu uma azia, mas pelo menos não acordei em uma banheira de gelo e sem um rim, como pensei que poderia acontecer.

Até que... até que a chuva chegou. Uma puta chuva. Uma chuva infernal. E eu, apenas com uma camiseta de manga curta... fazia tempo que não passava tanto, mas tanto frio assim. Nem tinha uma capa para me proteger, fiquei ligeiramente ensopado. E o jogo, bom... o jogo estava horrível.

Molhado, com frio e puto com o jogo, pelo menos ainda pude ver o Palmeiras marcar o gol da vitória aos 44 minutos do segundo tempo, sacramentar um gelado 1 a 0 e se classificar para as quartas-de-final. Mas eu ainda estava molhado, com frio... bom, eu estava muito molhado mesmo.

Tirando o fato de todos os vidros do carro ficarem com frescura de embaçarem e só aceitarem voltar ao normal com o ar-condicionado (o que aumentava meu frio em escalas gigantescas e diminuía a potência do motor 1.0 pela metade), tudo certo. Pelo menos não fui assaltado, como naquele 12 de março. Até que cheguei em casa, tomei um banho quente delicioso... e deitei na minha cama.

Mas... humpf, deveria ter ido tomar café.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Missa

Tem acontecimentos que não gosto de falar por aí (claro), e apenas alguns amigos mais próximos acabam sabendo de detalhes mais castos, sórdidos, bizarros ou marcantes da minha vida. Mas este... bom, confio aos dois leitores diários deste blog e aos 48 pára-quedistas que caírem aqui por meio de uma busca no Google.

Aconteceu um domingo desses, quando eu estava saindo de casa logo cedo para o trabalho. Assim que abri a porta do prédio, senti um vazio – que foi crescendo enquanto eu me aproximava do portão do condomínio. “Quando foi a última vez que eu fui à igreja? Hum... bom, já faz tempo. Tirando aquelas na Argentina, com a menina suíça porque ela queria ver a arquitetura latina... mas à missa, putz, tem tempo”.

Continuei com esse pensamento tentando me lembrar da data exata. “Acho que foi em 2005. É, isso, na Primeira Comunhão do meu irmão. Ah, mas... teve também a missa de sétimo dia do pai do meu amigo. Não, não... a última mesmo foi a missa da minha formatura, verdade”. Ou seja, quase três anos. “Bom, tá na hora de ir, não?”.

Admito que não sou lá um cara muito religioso. Já fui mais, muito mais, quando era mais novinho. Mas aí depois eu fiz a minha Primeira Comunhão, com 11 anos, e acabei desaparecendo da igreja que tem aqui do lado de casa.

Além disso, nunca fui lá de cumprir promessas: nas minhas rezas antes de dormir (antes, eu rezava um Pai Nosso, uma Ave Maria e ainda uma oraçãozinha de minuto – hoje em dia, se eu me lembro, faço um Sinal da Cruz), vez ou outra pedia alguma coisa bem idiota (do tipo passar de ano sem recuperação) e... ok, nunca cumpria.

O pensamento da igreja perdeu espaço logo depois nos meus pensamentos quando fui chegando ao trabalho. Segui minha rotina de sempre, trabalhei lá umas sete ou oito horas e decidi voltar para casa. Liguei o rádio no jogo do Palmeiras, abri a porta de casa, do meu quarto e desfaleci na cama.

Só fui acordar exatamente às 18 horas. “Putz, bem que eu poderia ir à igreja, né? É bem a essa hora que começa a missa”. Então coloquei uma calça jeans, uma camiseta branca e andei os três quarteirões até a capelinha aqui do lado. Sentei em um banco lá no fundo e fui acompanhando as falas no jornalzinho.

Comecei a olhar em volta durante os sermões e vi que até tinha bastante gente na igreja, tão apinhada como antes. Mas percebi que... bom, uma boa parte das pessoas por lá era de pessoas aparentemente pobres. Difícil achar alguém que parecia ter uma condição social melhor. Passou a impressão de que a maioria das pessoas ricas não tem por que ir à igreja, né?

Notei que algumas das músicas cantadas durante a missa eram diferentes em relação àquelas que eu ouvia há uns dez anos, quando ia para a missa das 18 horas acompanhado do meu pai. Para falar a verdade, senti um pouco a falta dele ali. Era a minha primeira missa sozinho, aliás.

Então chegou a hora da eucaristia. Fui para a fila depois de um tempinho e me lembrei da primeira vez em que recebi a hóstia. Por um momento me senti pré-adolescente de novo, mas olhei para trás e não vi meu pai lá com um sorriso contido. Estremeci.

Não sei se sou só eu, mas me sinto completamente baqueado quando coloco a hóstia na boca. Penso na vida, penso na minha avó, no meu pai... penso em tudo, menos em mim. Fiquei realmente ... realmente pensativo naquela hora. Ajoelhado, tentei extravasar o choro que tinha tentado sair na hora da fila. Não consegui. Isso me deprimiu.

A missa acabou logo depois, e eu voltei para casa. Com as mãos nos bolsos e bem, bem tranqüilo comigo mesmo.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

30/set; 5.844 dias depois

Um dia desses eu cheguei em casa um pouco estressado. Nada de lá muito relevante, mas assim que parei meu carro na vaga na garagem, não tive muita vontade para sair de lá. Desliguei o motor, aumentei o som e me deixei ficar jogado no banco, apenas olhando o nada e pensando na vida.

Fiquei um tempo assim, quando então comecei a brincar de apertar os pedais do freio e da embreagem. A colocar as marchas, a brincar de dirigir com o carro parado na vaga. Como eu gostava de fazer com o carro da minha mãe – ironicamente, um bem parecido ao meu – quando eu tinha uns cinco anos.

Passei lá um tempinho, ouvindo a música em um volume aceitável e brincando de dirigir. Até que girei a chave, joguei uma água no vidro e ativei o limpador de pára-brisa. Fiz isso mais uma vez, e mais uma, e mais uma... Eu me divirto com o limpador de pára-brisa, para falar a verdade. Tem uns 15 anos que eu sou assim.

Em uma das vezes em que girei o contato para limpar o pára-brisa, acendi o farol e vi à minha frente um dos jardinzinhos do meu condomínio. Meus amigos e eu costumávamos correr por ali nos idos de 1997, 98, 99... quando brincávamos de esconde-esconde ou polícia-e-ladrão. Era divertido, eu tinha uns esconderijos bem legais.

Naquela época ninguém podia subir muito tarde. Todos éramos muito, muito amigos. Todos jogávamos futebol, depois conversávamos sobre a partida, depois brincávamos de esconde-esconde, conversávamos sobre novos esconderijos ou sobre aquela vez em que não-sei-quem salvou o mundo e fez tal pessoa contar mais uma vez.

Hoje ninguém mais corre por aquele jardinzinho, nem mesmo a molecada pequena. O lugar está todo bonito, com a grama bem-aparada, algumas plantas e tal. Na nossa época, no máximo tinha grama e uns galhos jogados no chão. Era divertido, a gente sempre corria por ali.

Na nossa época... na nossa época muita coisa era diferente por aqui. O parquinho não tinha grama, era todo de areia. A gente se sujava à beça, levava bronca porque estragava as meias... mas sempre valia a pena. Desbravar o esgoto (um canal que leva a água da chuva até um terreno baldio no final do condomínio) era sempre uma aventura. Legal também era quando aparecia um cachorro vira-lata por aqui, todo mundo adotava o mascote e se divertia com ele. Faz vários anos que eu não vejo um cachorro se perder por aqui.

Hoje em dia eu não vejo muita coisa por aqui, mesmo. Mal vejo meus amigos. Vários já se mudaram para outros prédios. Tem um que foi para Campinas; outro, para Botucatu... muitos outros que estão fazendo faculdade aqui em São Paulo e ainda moram no nosso condomínio, mas têm horários diferentes do meu. Quanto muito a gente se encontra para tomar uma cerveja na sexta à noite. Era mais legal quando a gente fazia vaquinha e comprava esfiha para comer na pracinha.

Muita coisa mudou. Sinto falta de viver tudo aquilo de novo, uma época em que não tínhamos preocupação alguma. E... bom, eu estava ali, jogado no banco do meu carro esperando o mundo acabar em barrancos.

Por sorte, o mundo não acabou. E ainda virou alguns dias até chegar hoje. É 30 de setembro, 2008 e tal. Faz 16 anos, eu estava em um quarto de hospital com minha avó, meu avô e meu tio, sentado na beira da cama da minha mãe esperando para conhecer meu irmão. Aí chegou aquela coisinha mirradinha, de cabelos loirinhos e tal no colo da enfermeira. Chorão, banguela. Segurei no colo. Aquela era... meu... irmão.

Minha mãe se esbalda de rir quando conta a primeira coisa que eu disse ao ser apresentado ao meu irmão. Como não vi os dentes dele, comentei na hora que deveríamos levá-lo urgentemente ao Doutor Acley (que era o dentista da minha mãe na época) dar um jeito no meu irmão. Eu lembro vagamente desse momento, para ser sincero.

Do último dia de setembro de 1992 até 2008, puxa, como o tempo passou. Meu condomínio mudou, os jardins daqui mudaram, a pintura dos prédios também. Meus amigos mudaram e se mudaram também.

A única coisa que não mudou muito é aquela coisa de que, sempre que eu olho para o meu irmão, vejo uma coisinha mirradinha de cabelos loiros (mesmo ele já estando quase do meu tamanho). Ele sempre vai ser meio chorão, aos meus olhos. E tarraqueta, azedo, manhoso. Ainda mais quando ele está no banco da frente do meu carro quando estamos indo à dentista.

Hoje vou ver meu irmão com 16 anos. Quando entrar em casa, me desvencilhar do cachorro que fará festa ao me ver e eu olhar meu irmão, acho que vou ver novamente aquela coisinha tarraqueta banguela. Acho que essa sensação não vai mudar.

Ainda bem.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Resposta ao internauta

Faz uns dias, o Feedburner me mostrou que uma pessoa qualquer acessou o Cavaleiro com Solitária em busca de informações sobre como chamar uma garota para sair. Ele digitou “como chama uma garota pra sai” e voilá, caiu aqui de pára-quedas, já que o Google aponta meu blog como a quarta opção de busca para uma pergunta esdrúxula como esta.

Seja lá como for, não é raro que buscas assim resultem em acessos estranhos neste espaço. Toda semana tem uma ou outra pessoa que aparece por aqui a fim de receber a fórmula para alguma das coisas mais difíceis desse mundo. Se eu soubesse como chamar exatamente uma garota para sair, não acharia que sou um cara tão mal-resolvido como às vezes penso. Mas... vou tentar responder à sua dúvida, caro garoto de 12 anos que não sabe algo que eu também não sei.

Chamar uma garota para sair requer uma boa conversa, uma boa desculpa e, acima de tudo, muita paciência. Nunca diga exatamente que você a está chamando para sair, porque ela simplesmente lhe dará alguma desculpa furada e você passará o sabadão à noite vendo Zorra Total. Tente ser misterioso, se conseguir. Mas eu sei que não rola.

Para falar a verdade, chamar uma garota para sair nunca é uma boa solução para conseguir sair com a tal garota. Elas sempre têm um arsenal incrível de coisas para fazer no exato momento em que você a convida para fazer algo. Eu, por exemplo, já recebi respostas do tipo “vou ao enterro da minha tia” ou “a minha avó acabou de quebrar a perna e eu tenho que ir para lá”. E você, panaca como eu, continua insistindo.

Mas calma, o mundo não vai acabar apenas porque é praticamente impossível chamar uma garota para sair. Há uma solução, e apenas uma, para você conseguir sair com quem você realmente quer: não chame. É sério. A melhor coisa a fazer é a egípcia e, simplesmente, esperar ela chamar. O máximo que pode acontecer é ela nunca fazer isso e vocês nunca mais se falarem, mas é um risco que se corre.

Digo isso por experiência própria. Parando para pensar, acho que nunca consegui trocar um beijo com alguma garota que eu chamei pra sair (ok, pode achar que o titio aqui é um fracasso com o sexo frágil). Algumas até toparam sair, mas... não, nunca rola.

O melhor mesmo é esperar um convite. Ele sempre vem, basta saber aguardar e dar as brechas certas para que isso aconteça (gostar de café é uma boa se você já tiver mais de 18 anos... mas como você deve ter no máximo 15, contente-se com um milk-shake de Ovomaltine do Bob’s).

É estranho, mas é a mais pura verdade. Esse mundão doido em que a gente vive está com os valores completamente invertidos. Agora, são as garotas que têm que nos chamar para sair. É a vida, mas... ah, e não é que sempre vale a pena esperar?

domingo, 28 de setembro de 2008

Sumiço

E se um dia eu desaparecesse da sua vida?

Assim... sumisse. Pedisse para alguém te falar que me mudei para o México, parasse de atender seus telefonemas, parasse de freqüentar os mesmos lugares que você... simplesmente fingisse que perdi também teu endereço, teu número de telefone, todas as cartas que você me mandou... e fingisse para mim mesmo que você nunca existiu?

Todos os dias eu ando pela rua e me perguntou se já está na hora de sumir não só da sua vida, mas da de várias pessoas. Eu gosto de bancar o desaparecido de vez em quando, ver se as pessoas realmente vão me procurar depois disso.

Raras são aquelas que vêm atrás de mim, pra falar a verdade. Antes eu me emburrava um pouquinho, depois com o tempo eu passei a perceber que a maioria das pessoas é apenas composta por figurantes que têm falas predefinidas e logo depois voltam para o limbo da coxia.

E você? Será que você viria atrás de mim? Iria se lembrar de mim se visse alguma coisa na rua, se ouvisse alguma música que você sabe que eu ouvia... ou se alguém te dissesse alguma coisa que eu dizia? Não sei, fico em dúvida. Eu realmente lembraria. Eu sempre lembro muita coisa, e quase todas bem inúteis. Às vezes, tenho a sensação de que a minha vida é, na verdade, um apanhado de lembranças.

Eu não sei, mas acho que você não viria me procurar, não faria um esforço maior e nem bolaria um jeito de me surpreender – tipo fazer vigília na frente do meu trabalho, ou na porta da minha casa. Melhor não, mesmo. Eu te acharia meio louca, mesmo.

E sabe o que é pior? Eu sumiria, você não me procuraria... mas eu te procuraria. Eu sempre faço isso. Por mais que eu prometa para mim mesmo que nunca mais vá atrás de uma pessoa de cuja vida eu decidi sumir, eu sempre acabo mandando um e-mail perguntando as novidades.

Humpf.

sábado, 27 de setembro de 2008

E-mail não enviado, um tempo atrás

Hey,

Sabe? Queria te contar uma coisa. Ou várias. Ou... sei lá, talvez sejam várias coisas resumidas em uma, não sei. E antes que você ache que eu enlouqueci de vez, deixa eu começar a explicar.

Ouvi aquela sua música pela primeira vez... ah, eu lembro exatamente o dia em que ouvi aquela sua música pela primeira vez. Eu estava lá, um pouco desconfortável e espremido em uma cama que não era a minha. Acordei com você se levantando cuidadosamente ao meu lado, passando por cima de mim e indo tomar banho.

Enquanto o chuveiro fazia barulho, eu fiquei lá deitado apoiando minha nuca sobre o travesseiro e sobre as palmas das mãos e pensando como era um homem de sorte. Depois você entrou no quarto, ligeiramente iluminado pelo sol que também se comprimia pelos buraquinhos da veneziana, e estava enrolada em uma toalha verde. Achou que eu estava dormindo, tirou a toalha, colocou um vestido (e como eu gostava daquele vestido!), calçou os chinelos e foi para a sala.

Saí do quarto não muito tempo depois. Também tomei um banho e fui para a cozinha, onde tomamos café-com-leite e comemos pizza amanhecida. Você, então, colocou o mini system com um CD que começou com o vocal calmo do Paul e um violãozinho. “Essa música diz muito de mim, sabia?”, você me disse. E cantarolou toda a música enquanto me olhava tomar café-com-leite e comer aquela pizza horrível de pêssego.

Aquela música ficou na minha cabeça por um bom tempo. Alguns meses. Todos os dias ouvia aquela música várias vezes. Geralmente quando eu devorava vários cigarros lamentando cada acorde da música e esperava o tempo de entrar no trabalho. Chegou um dia que eu decidi odiar aquela música, e simplesmente parei de ouvir.

Um tempo passou, até que um dia eu estava no meu carro indo para o cinema com uma outra garota. Estava ouvindo Ohio, do Bowling for Soup (aquela que começa tipo She said she needed a break, a little time to think. But then she went to Cleveland, with some guy named Leelan that she met at the bank). Logo depois começou a tocar aquela música, que me pegou meio desprevenido (não lembrava que tinha gravado o som naquele CD).

A garota ao meu lado disse que a música era bonitinha, perguntou de quem era. “É do Paul”, eu falei. “Paul? Que Paul?”. “Paul... McCartney”, expliquei. Ela fez uma cara de quem já tinha ouvido falar aquele nome (claro, poxa!). Tentei clarear a mente dela “Sabe? John, Paul, George, Ringo...”, elucidei. “Hum... de que banda eles são?”, ela perguntou. “Beatles!?”, respondi meio sarcástico.

Ela, então, disse algo que realmente me incomodou. “Sabia que eu nunca ouvi Beatles?”. Olhei incrédulo, soltei uma exclamação. “Como assim você nunca ouviu Beatles?”, indaguei. “Ah, nunca... nunca ouvi nenhuma música deles, acredita?”. Aquilo me chocou, de verdade. Coincidentemente ou não, aquele foi o último dia em que fomos ao cinema.

Mais um tempo se passou e, um dia desses, acordei com uma enorme vontade de ouvir essa música. Tomei banho, fui para o trabalho feliz da vida ouvindo aquela música, vivendo um outro dia. E não me lembrei de você um instante sequer.

Não lembrava mais que aquela era a sua música. Acho que a transformei na minha música.