segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Show da virada

Embora espere ansiosamente pelo final do ano, o dia 31 de dezembro sempre me deprime um bocado. É quando eu estigmatizo todos os meus atos como os ‘últimos do ano’. Sempre foi assim, e não imagino que as coisas mudarão daqui pra frente. Até porque todas as horas que antecedem o reveillon são sempre iguais.

Uma das coisas mais marcantes do último dia da temporada é a São Silvestre. Não tem um ano sequer em que eu não faça questão de ficar na frente da televisão vendo alguns corredores brasileiros tentando parar os favoritos quenianos. Desde os inícios dos anos 1990, quando minha avó passava a tarde do dia 31 aqui em casa, até hoje em dia.

É sempre bom acompanhar a transmissão da corrida pela televisão, com os corredores passando por inúmeros pontos turísticos do centro de São Paulo até virarem na Brigadeiro e subi-la até a Paulista. Até cruzarem a linha de chegada com a mais do que a mais tradicional música de fundo das transmissões da Globo.

No ano passado foi diferente. Acompanhei as chegadas das três provas da São Silvestre direto da linha de chegada, pois havia sido escalado para trabalhar durante a corrida. Foi muito estranho ver Fernando Aranha (cadeirantes), Lucélia Peres (feminino) e Franck ‘canelas-de-sabiá’ Caldeira (masculino) se sagrarem campeões em frente ao prédio da Fundação Cásper Líbero sem a trilha sonora. Bateu um vazio: alguma coisa estava faltando.

Em anos ‘normais’, assim que acaba a corrida eu arranjo alguma coisa não muito útil para fazer. Jogo vídeo-game, toco violão ou guitarra, leio algumas páginas de um livro. Até que o relógio bate 20 horas e eu faço a barba e tomo banho pela última vez na temporada. Coloco uma roupa qualquer e fico na sala vendo televisão até a hora da janta.

Depois de comer, volto para o sofá e fico por lá até uns 20 minutos antes da meia-noite. Aí eu me levanto, vou para a janela do meu quarto e fico pensando em tudo o que aconteceu nos últimos 12 meses. É triste ver que as coisas passaram mais do que rapidamente. Também faço alguns planos para o ano que se iniciará. Quase nunca os cumpro, claro..

Então volto para a sala alguns instantes antes da meia-noite. Quando o novo ano se inicia, abraço meu irmão, meu pai, meu cachorro, tomo champanhe, ligo para a minha mãe, falo com a minha tia... Uns 20 minutos depois disso, desço e fico enchendo a cara com os amigos do prédio até o amanhecer. E volto para casa com a primeira ressaca do ano.

A São Silvestre (e o Cléber Machado chamou a antena da Gazeta de ‘uma das antenas da TV Globo)... voltando: A São Silvestre acabou de acabar e a música-tema praticamente não foi ouvida durante a dobradinha queniana de Robert Cheruiyot e Alice Timbilili. Talvez o mais importante seja a minha primeira viagem para o exterior, para local – ou locais – ainda a ser definido. Também já começo a pensar no trabalho que os Jogos Olímpicos de Pequim me darão quanto à cobertura e na depressão inerente a qualquer grande evento, com a volta à mesmice.

Pretendo levar uma vida bem mais saudável do que a levada em 2007. Dormindo cedo, acordando mais cedo ainda... fazer alguma coisa útil antes de ir para o trabalho.Viajar mais e aproveitar melhor o tempo de folga.

Talvez daqui a 366 dias eu volte à janela do meu quarto e pense no que eu consegui fazer ou não em 2008. E também terei a mesma preguiça ao pensar que terei que passar por março, abril, maio... e muitos outros meses até o próximo reveillon. É sempre igual e continuará sendo. Mas não é tão ruim quanto parece.

sábado, 29 de dezembro de 2007

O centro e a origem

De uns anos para cá, nutri um sentimento não muito agradável em relação ao centro da cidade – tanto que não ia para lá há um ano por livre e espontânea vontade. Que belo paulistano, não?

Mas eu tinha que ir ao centro ainda esta semana para fazer um documento não muito importante no Fórum João Mendes Jr. Só que, com tanto temor do centro, saí de casa sem mochila, ipod, celular e ou carteira. Tinha apenas um envelope com os documentos necessários, 12 mangos no bolso e mais 50 em uma das meias. Prevenção, oras!

Saí do metrô na Praça da Sé, virei à esquerda, depois à primeira direita, caí na Onze de Agosto, atravessei uma avenida movimentada e entrei no fórum. Embora já soubesse que deveria ir na sala 224, perguntei para a moça de colete vermelho. Ela nem chegou a me falar.

“De bermuda não pode entrar, desculpa. De bermuda você só pode ir na Nossa Caixa, na Rua 15 de Novembro, porque lá também dá para tirar esse documento. Para chegar lá você sabe, né? É só voltar para a praça, atravessar e logo você encontra o banco”.

Mesmo depois de atravessar a Praça da Sé novamente, percebi que não sabia encontrar a agência matriz e precisava pedir informações. Só que também sabia que pedir informações no meio da Praça era um risco, um chamariz para trombadinhas (na mesma hora me lembrei de uma amiga de uma cidade interiorana que veio fazer vestibular na capital recentemente e me contou que, enquanto não voltava para a sua terra, tinha a constante sensação de que seria assaltada).

Acabei parando em um bar na frente do Pátio do Colégio (lugar que eu conhecia vagamente) e pedi a tal informação. O caminho que o cara engravatado comendo um torresmo me indicou era simples: atravesse a rua, vire na primeira direita e desça. Fiz tudo como sugerido e não tive problemas para encontrar o banco. Sem fila, precisei de apenas alguns minutos para requisitar o documento e voltar para casa.

Poderia ter saído do banco e voltado diretamente para casa dentro do prazo estipulado anteriormente. Mas, ao sair da 15 de Novembro, percebi que estava diante de uma rua ligeiramente tortuosa, cheia de prédios e pessoas. Aquela que me chamou a atenção há uns 14 anos. De mãos dadas com o meu pai, perguntei qual era o nome dela. “É a Rua Direita. Direita, mas você pode ver que é torta!”, explicara.

E lá estava eu: diante da Rua Direita, onde começavam todos os memoráveis passeios com meu pai pelo centro da cidade, entre meus cinco e 12 anos. Tudo estava mais ou menos da mesma forma: o McDonald’s, as ruas, as pessoas, as mercadorias no chão... Não tinha como não reviver tudo aquilo de novo.

Segui caminho pela Rua Direita, porém torta, apenas para ver onde ela ia dar. Mas, enquanto passava pelas travessas, notava que estava diante de ruas cujos nomes estavam encravados na minha memória: Álvares Penteado, Quintino Bocaiúva, José Bonifácio!

Assim que passei pela José Bonifácio, vi à minha frente um prédio bastante familiar, mas cujo nome eu também não lembrava. Então passei pela Praça do Patriarca e emboquei em uma rua mais familiar ainda: a Rua São Bento. Pela lógica de que “deve passar no metrô São Bento”, decidi segui-la.

Percebi que estava no Largo São Bento e do lado do Prédio dos Correios – lugar não muito estranho para mim, já que costumava passar por lá para ir à Galeria do Rock em meus tempos áureos de Rock n’ Roll. Atravessei o Anhangabaú, subi a São João e passei em frente ao Rei do Mate, que servia o melhor mate com leite da cidade três anos atrás. Costumava ir lá com um velho, velho amigo.

Desta vez não parei para tomar o mate com leite. Atravessei a Líbero Badaró, virei à direita e voltei à Rua São Bento. Passei de novo pela Praça do Patriarca e retornei à Rua Direita, para a parte derradeira do meu passeio nostálgico. Derradeira mesmo: já eram 11h30 e eu deveria voltar para casa.

Antes de deixar a Rua Direita, vi um molequinho de no máximo quatro anos tentando acompanhar o ritmo das passadas largas do pai, que lhe segurava a mão. O adulto, porém, parou em frente a um prédio, pegou o filho no colo e apontou. “Sabe, filho, esse foi o primeiro prédio que construíram em São Paulo e no Brasil”. A mãe, que acompanhava o passeio entre pai e filho, ralhou: “Ele é muito novo! Você acha que ele vai lembrar disso?”.

Se aquele molequinho vai se lembrar disso no futuro eu não sei. Eu, mesmo tendo pegado a conversa sem querer, sabia que o prédio em questão era o Edifício Guinle. Meu pai me contou isso uma vez, quando eu devia ter por volta de quatro, cinco anos.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Inocentada

A data de 28 de dezembro não é tão insignificante assim como pode parecer. Além de ser o 362º do ano, o dia ainda é marcado por algumas comemorações importantes ao redor do mundo.

Foi em 28 de dezembro de 1813, por exemplo, que nasceu o Irineu Evangelista de Sousa, vulgo Barão de Mauá, aquele de quem todo mundo ouviu falar na escola, que queria industrializar o Brasil na época do café, mas esbarrou na burocracia da monarquia.

Quando Mauá já tinha 13 anos, o Iowa se tornou o 26º Estado dos Estados Unidos. Também na Terra do Tio Sam, 30 anos após a incorporação do Iowa, nasceu na Virginia Thomas Woodrow Wilson, que em março de 1914 sucedeu o xará Thomas Marshall e se tornou o 28º presidente norte-americano, cargo que ocupou até 1921.

Também no dia 28 de dezembro, mas em 1936, nasceu o empresário Abílio Diniz, hoje ricaço e dono do Grupo Pão de Açúcar, que detém o supermercado de mesmo nome, cujas filiais espalhadas pela cidade abastaecem as geladeiras e os armários da minha, da sua e da casa de todos.

Outra personalidade importantíssima para a vida de todos nós nasceu em 28 de dezembro, no ano de 1944: o ator mexicano Edgar Vivar, o não menos engraçado Senhor Barriga, pai do Nhonho, que ele também interpreta. Pois é, parabéns aos gorduchos amigos do Chaves, que hoje completam 63 anos.

No mundo do esporte, o 28 de dezembro é a data em que o ex-tenista australiano Patrick Rafter, ex-número um do mundo e bicampeão do US Open, em 1997 e 98. Em 1979, quem nasceu foi o norte-americano James Blake, atual 13º do ranking de entradas da ATP.

O dia 28 de dezembro também foi marcado por algumas mortes importantes, especialmente para a cultura brasileira: o poeta Olavo Bilac, em 1918, a atriz Daniela Perez e o escritor Otto Lara Resende (ambos em 1992).

Mas o que pouca gente sabe é que o dia 28 de dezembro é lembrado também pela Bíblia. De acordo com o livro mais vendido do mundo, foi nesta data que o Rei Herodes ordenou a morte de todas as crianças menores de idade em Belém na vã tentativa de acabar com o recém nascido Jesus. Há quem diga que foram mortos 3 mil crianças, outros apostam em 15 mil, enquanto tem aqueles que juram que foram apenas dez (e não 10 mil).

Em países de origem hispânica, como a Espanha, o dia ganhou importância em referência ao massacre: virou o Dia dos Santos Inocentes, também conhecido como Inocentada. Em outras palavras, virou o Dia da Mentira, assim como no Brasil e em outros países, como EUA e Japão, a data é comemorada em 1º de abril.

Quem costuma sempre fazer brincadeiras no dia 28 de dezembro são os jornais espanhóis, que têm a tradição de criar notícias absurdas. O esportivo Marca é o que mai se aproveita do fato para cravar notícias bombásticas que enganam o mundo inteiro.

No ano passado, quando eu achava o dia 28 de dezembro apenas uma dia como todos os outros, o Marca colocou em seu site oficial que a Fifa havia recontado os votos da eleição de melhor do mundo e havia dado o prêmio ao francês Zinedine Zidane e tirado o troféu das mãos do zagueiro italiano Fabio Cannavaro. Uma bomba sem tamanho.

Lembro que aquele dia na redação, por volta das 8h30, estávamos apenas Paulo Amaral, setorista do Palmeiras, e eu, que comemorava meu 28º dia de estágio. Maravilhado pela possibilidade de fazer ligações internacionais do trabalho, sugeri que tentássemos ligar para a Fifa e pedir alguma aspa oficial, para não dar crédito para os madrilenos.

Liguei para Zurique, na Suíça, no telefone 222-7777. Após falar com a telefonista com um inglês dotado de belo sotaque germânico, fui repassado para o assessor de imprensa. E qual não foi a minha surpresa quando ele disse “No, no, absolutely not! This is a lie. Today is Dia dos Inocentes in Spain, which is a ‘fool day’, like April, 1st!”. Uma bomba ainda maior, já que todos os outros sites de esportes do Brasil e do mundo, assim como algumas emissoras de rádio, davam Zidane como o mais novo melhor do mundo.

Paulo Amaral e eu, ressabiados, compramos a idéia do assessor da Fifa e destoamos de todas as publicações do globo terrestre. Menos de 15 minutos depois, nossos xarás italianos do Gazzetta dello Sport retificavam a informação. Horas depois caía a máscara do Marca: era uma mentira. Aquele 28 de dezembro de 2006 foi o dia do meu primeiro ‘grande’ furo.

Passei o ano inteiro esperando por esta data e até passei a imaginar a mentira de 2007: “Poderiam fazer alguma coisa com o Fernando Alonso, talvez com o Rafael Nadal... é bem capaz que façam com o Ronaldinho saindo do Barcelona e indo para um outro time, mas seria tão previsível que ninguém acreditaria”, pensava.

Ao acordar, a primeira coisa que fiz foi entrar no Marca e ver qual a mentira da vez. E, para a minha decepção, foi “Milan poderia fechar em 1º de janeiro com Ronaldinho”. Uma decepção, apesar de haver uma outra notícia incrustada: a saída do Zambrotta.

Não colou, e vários comentários de leitores do site denunciam a Inocentada. Sem graça.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

Tradições natalinas

O Natal, como todo mundo já está mais do que cansado de saber, se mantém vivo até hoje pela tradição – tradição esta, aliás, que a cada ano é menos visível nas ruas das grandes cidades. No entanto, são alguns pequenos que o mantêm vivo até hoje.

O primeiro, é claro, são os presentes. Não faz muito sentido as pessoas trocarem lembranças apenas porque é o dia em que Jesus nasceu, de acordo com a educação que todos nós tivemos. Em todo caso, não tem quem não espere ansiosamente por abrir um embrulho no dia 24 de dezembro, antes da meia-noite. E receber um embrulho, abrir o pacote e se deparar com o presente é uma sensação tão boa que nunca vai se extinguir no ser humano – muito embora seja amenizado com o passar do tempo.

Outra coisa bem costumeira na época natalina é a meia-noite. É mais do que de praxe as pessoas (todas!) manterem um olho no especial de Natal da Globo e outro no relógio, esperando a virada para a meia-noite. Então os ponteiros se aproximam do 12 e, quando enfim se unem, todo se abraçam, trocam palavras ensaiadas porém positivas. Algumas vezes reais, até (muito embora grande parte das pessoas só se veja apenas em 25 de dezembro e, muito mais embora ainda, todos esses desejos valham apenas por 24 horas – a duração do Natal propriamente dito).

E, como não poderia deixar de ser, após o Natal há a ceia. Fartura. Aves, porcos, peixes, farofas, saladas, grãos, sementes, frutas lustradas e mais frutas que não parecem frutas, mas uma casca dentro da outra. Coca-cola! Silêncio durante a refeição. Raspar de talheres, segundo prato, silêncio, raspar de talheres... terceiro prato (há quem consiga). Raspar de talheres e barrigas estufadas. Pavês, pudins, bolos. Pandu cheio – agora de verdade. Sono.

Então chega o dia 25 propriamente dito às 11 horas da manhã, quando o mundo acorda de ressaca depois da ceia. Mas depois de alguns instantes, todos já estão preparados para mais uma aventura glutona. Aves, porcos, peixes, farofas, saladas, grãos... tudo de novo.

A noite do dia 25 de dezembro chega com a mesma intensidade que uma noite de domingo. Às vezes fica até a expectativa de ver a Glória Maria na telinha e a música do Fantástico. O fato de elas não aparecerem torna a noite pior do que a de domingo. O dia de Natal é um domingo fajuto.

Alguns povos até tentam amenizar essa sensação de fim de feira na data natalina. Uma das maneiras mais criativas é tradicionalíssima em países de origem anglo-saxônica (como Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, África do Sul, Austrália e Nova Zelândia): o Boxing Day. No dia 26 de dezembro, é costume os patrões darem a seus empregados alguns presentes, as lojas organizarem liquidações irresistíveis e, além disso, muitos eventos esportivos acontecerem.

Na Inglaterra há a sempre interessante rodada do Boxing Day na Premier League. Por fazer parte da tradição o duelo entre rivais locais, Londres costuma ser palco de vários dérbis. Este ano, Tottenham (norte da cidade) e Fulham (centro-oeste) se enfrentaram no White Hart Lane (estádio do Tottenham): massacre dos anfitriões por 5 a 1.

Os sul-africanos fazem diferente – e, em certos casos, de uma forma até que mais divertida. As famílias colocam toda a sobra das ceias em uma caixa (caixa, box, caixa...) e vão para a praia. Rola, então, um piquenique coletivo com todos os farofeiros. Não é divertido? É um bom jeito de fazer amizades, conseguir algumas paqueras... ou apenas encher o bucho com várias comidas diferentes.

Tem países que não são tão criativos como os anglo-saxônicos, e eles simplesmente criaram um segundo dia de Natal. É, isso mesmo, um Natal duplo – que acontece sobretudo em países de origem germânica e nórdica ou colonizados por esses povos ao longo da história: Alemanha, Dinamarca, Finlândia, Holanda, Lituânia, Noruega, Polônia, Suécia e Suriname.

Deve ser comilança e bebedeira em dobro, ressaca ao quadrado e clima de domingo ao cubo.

domingo, 23 de dezembro de 2007

O retorno dos bad boys (com cara de tiozões)

O futebol é talvez o esporte mais fácil de ser coberto no mundo do jornalismo esportivo. Mais até do que o levantamento de peso, que tem uma notícia a cada dois anos. Mas, ainda assim, é o que salva qualquer um em dias extremamente parados, como 23 de dezembro.

Modalidade mais popular no mundo inteiro, o esporte bretão é o único capaz de proporcionar cenas extremamente bizarras como as que vão a seguir, com a trilha sonora de A vida de Brian (1979), um dos clássicos do grupo britânico de comédia e cinema Monty Phyton.




A música, já utilizada neste blog anteriormente, merece destaque: chama-se Always look on the bright side of life, foi composta e gravada inicialmente por Eric Idle e encerra a trama vivida pelo 'messias' Brian Cohen, nascido duas manjedouras ao lado de Jesus e que também recebeu a visita dos três reis magos.

Resenhas à parte, voltemos ao futebol. Além de propiciar algumas risadas em vários vídeos do mesmo estilo espalhados pelo YouTube, o esporte ainda consegue agitar uma redação de esportes dois dias antes do Natal. Como? Pergunte ao Edmundo.

Após ouvir do Palmeiras que não continuará no Palestra Itália em 2008, o ídolo de 36 anos foi visto recentemente em uma balada no Rio de Janeiro vestindo a camisa do Vasco da Gama. Coincidentemente ou não, justamente o time de São Januário é o mais cotado para ficar com o camisa 7.

Se tudo der certo para o lado dos cruzmaltinos, o Animal poderá mais uma vez atuar ao lado de Romário, baixinho, técnico, manda-chuva, artilheiro dos mil gols e careca do Vasco (mais detalhes aqui). E, após a notícia ir para o ar, o Raul, editor escalado para dar destaque ou não para as groselhas publicadas por este estagiário que vos escreve, me chamou em seu computador.

O motivo? Ver um dos melhores vídeos do YouTube, com um clipe de um som gravado na época em que o Romário não tomava tônicos capilares e que o funk carioca era conhecido apenas como rap: 1995, ano que vivia a expectativa de a dupla brilhar no Flamengo.

Não deu certo, mas rendeu este video, visto e discutido durante longos minutos no 12º andar de um prédio na Paulista. E dono de uma letra, no mínimo, engraçadíssima.



Naquela época, Edmundo ainda era um jovem talento do futebol brasileiro, com 24 anos (muito pouco para um jogador de time grande nos idos de 1995), enquanto o já consagrado Romário, tetracampeão mundial, tinha 29.

Hoje, 12 anos depois, o Animal já comemorou 36 carnavais, enquanto o Baixinho é um quarentão, com 41. Se a dupla for reeditada, confesso que não seria nada mal uma regravação de Não tem cara de tiozão. Já pensou?

sábado, 22 de dezembro de 2007

Homem de negócios

Confesso que não sou um dos melhores torcedores em estádios. Prefiro muito mais sentar em algum lugar mais tranqüilo das arquibancadas e assistir ao jogo tranqüilamente a ficar no meio das torcidas organizadas gritando que nem um maluco.

Nada contra as manifestações de arquibancada: até acho algumas muito, muito boas (de outras torcidas, já que a do Palmeiras é uma das coisas mais bizarras do mundo dada a rivalidade imbecil entre uma facção e outra). Só acho que o meu grito não vai ser o fator-chave para o jogador acertar um lançamento, o time fazer um gol... esas coisas. A não ser quando tomo uma cerveja ou outra antes de entrar no estádio.

Para falar a verdade, nunca achei que poderia mudar o rumo de um time de futebol. Até uma manhã de sábado, em um dia que, assim como todos os outros do mês de dezembro, as notícias esportivas praticamente não existem.

Sozinho na redação, tinha à minha frente apenas um copo de café e uma pauta: NBA, Superliga (masculina e feminina), Campeonato Inglês e outros esportes. Antes de começar com a Liga Norte-americana de Basquete, porém, dou uma geral nos concorrentes. Em um deles, uma bomba: o Corinthians estava perto de contratar um atacante. Uau!

Deixei de lado o massacre do Boston Celtics e tentei ligar para alguns empresários envolvidos na negociação. Consigo falar com o primeiro logo de cara. Um cara bem educado para os meios futebolísticos, diga-se. Após confirmar o negócio entre Timão e jogador argentino, uma pergunta. "Você tem o telefone de algum diretor do Palmeiras?". Respondi que sim e perguntei de qual ele queria. "O que manda mais". Pensei alguns átimos de segundo. "Pode ser do Cipullo?". "Pode, pode sim".

Eu nem precisei perguntar por que o empresário queria o telefone: ele mesmo já me explicou. "É que eu vou oferecer agora um jogador pra eles". Hummm... quem?. "É o lateral-direito fulano de tal. Mas ó, não fala nada ainda que senão pode melar o negócio. Eu te ligo daqui a pouco e te falo o que rolou, combinado?". Combinado.

Ao desligar o telefone, no entanto, alguns pensamentos passam pela minha cabeça. Eu poderia noticiar que o lateral-direito fulano de tal seria oferecido ao Palmeiras. Seria o primeiro jornalista do Brasil a cravar a notícia. Os outros sites repercutiriam o caso, assim como os jornais, os programas de rádio e de televisão...

Isso faria com que o nome de Palmeiras e do tal jogador ficassem em evidência na mídia. "Por obrigação" o clube poderia contratar o atleta e eu ser um dos principais responsáveis pelo acerto. Com a camisa 2, ele poderia se tornar um dos melhores jogadores da história da equipe, conquistar títulos e mais títulos. Ganharia um ou dois bustos no Parque Antártica. E, em reconhecimento pela influência na oferta, eu poderia até conseguir uns trocados de bonificação.

Ou então... com o nome em destaque e cotado para acertar com o Palmeiras, o jogador passaria a ser assediado por outras equipes. Concorrência aberta. Cifras cada vez maiores. Um acerto milhonário. Em reconhecimento, o empresário poderia até me dar, sei lá, 1% do valor do negócio como um "muito obrigado". Certamente seria muito mais do que os meus rendimentos de um decênio somados.

Mas por outro lado... uma notícia prematura poderia melar todo o negócio com o Palmeiras. E com várias outras equipes. O jogador perderia o espaço no cenário nacional e internacional, voltaria para sua terra de origem e não teria um contrato legal. Sua família passaria por necessidades... coisas assim. Ou então o empresário poderia me culpar por ter atrapalhado a negociação e... talvez até me processasse. Pediria uma indenização milhonária, que mesmo se eu trabalhasse intensamente durante um decênio seria sanada.

O que eu fiz? Parei de pensar e fiz a notícia do tal jogo do Boston Celtics. Melhor assim: não sou bom em negócios. Além disso, parece que o Palmeiras não se interessou muito pelo tal jogador e o negócio não saiu. Melhor ainda: ele nem era tão bom assim.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Injustiça literária

O discurso não é novo: a arte de escrever, embora seja considerado por muitos uma arte, não paga contas. Ou pelo menos não a da maioria dos escritores.

Os motivos são bem simples, e o principal deles é que o Brasil não possui uma cultura de leitura de livros. Ainda mais em um mundo como o de hoje em dia, em que há televisão a cabo com 150 canais, Internet com muito mais do que 1.001 utilidades.

Por conta disso também se cai no princípio básico da economia (e o único que eu sei): quanto maior a demanda, maior é a oferta e menor é o preço. Mas se a demanda for pequena, a oferta também o será. E o preço... ah, o preço vai aumentar. E a demanda vai continuar baixa.

Da última vez em que me informei sobre o preço para o lançamento de um livro (e isso foi em 2003, por aí), era algo em torno de R$ 10 mil o milhar de exemplares, se não me engano, em uma editora chinfrim. Tenho medo de pensar o valor hoje em dia...

Mas recentemente tive mais uma prova de que o crime, digo, a escrita não compensa. Em uma rápida passagem pela Fnac, encontrei em uma pilha meio jogada um dos livros com o qual eu flertava há algum tempo: Don Quijote de la Mancha, edição comemorativa do IV Centenário da Academia Espanhola, capa dura, 1.235 páginas de história e mais 101 de prefácios. Ao que tudo indica, importada.

Um extraterrestre talvez imaginasse a fortuna que R$ 28 representariam se passasse o código de barras do livro de Cervantes no leitor ótico. Eu, que ‘ganho’ aproximadamente esse valor por dia, achei exatamente o contrário. E não pude deixar essa chance passar.

Na fila do caixa, porém, me deparei com uma outra obra – talvez um marco da literatura mundial. História para pais, filhos e netos, do Paulo Coelho. Capa mole, 304 páginas. Tudo isso pela bagatela de R$ 42. Isso mesmo: apenas 14 pratas a mais em relação ao Dom Quixote.

Fiz algumas contas rápidas. O livro do Cervantes me custaria 28 reais por 1.336 páginas. Depois da sessão ‘Regra de três, pra que te quero?’, a relação desejada: R$ 0,02/página. Dois centavos por página! O do PC, pouco menos dos que R$ 0,14/página. Sete vezes a mais do que o Dom Quixote.

Não digo que a solução deveria ser aumentar o preço da história do famoso fidalgo para, sei lá, R$ 590; mas sim baixar o valor dos demais. Até porque... nada contra o Paulo Coelho, mas é um exagero qualquer livro dele ser, em números relativos, sete vezes mais caro do que um marco da literatura mundial.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Inseguranças e alívios

Não foram muitas mulheres que nos últimos 19 anos receberam flores enviadas por mim. Tudo isso por uma série de motivos que não vem ao caso agora. Nas poucas vezes que enviei, porém, a mesma história se repetiu. As únicas coisas que eram invariavelmente diferentes eram a floricultura e o funcionário. Sempre.

O resto nunca muda. Passo dias procurando alguma floricultura perto dos lugares que eu costumo freqüentar. Alguma das minhas duas casas, colégio, faculdade, trabalho... casa de quem receberá as flores. É uma escolha complicada, feita apenas na última hora.

Antes de definir a floricultura, aliás, tenho inúmeros pensamentos de deixar tudo isso de lado e trocar as flores por um ingresso de cinema. É muito mais fácil. Já cheguei também a consultar floriculturas online e colocar algumas flores na cesta. Claro que sempre mudo de idéia antes de fazer tal bobagem.

Mas depois que escolho a loja cujas flores presentearão amiga, paquera ou mãe, me dirijo ao local. Entro na loja, começo a observar alguns arranjos ou vasos na vã tentativa de mostrar que sei exatamente o que vou pedir. Até que me atendem e a minha farsa é revelada. “Posso ajudar?”, o vendedor (ou vendedora) pergunta. E eu já deixo claro que praticamente nem sei o que estava fazendo e que queria apenas tal arranjo de flores.

O funcionário da floricultura às vezes pergunta para quem são as flores e, após ouvir a minha resposta, recomenda alguns cartões. E pede para que eu escreva a dedicatória enquanto ele (ou ela) faz a anotação burocrática do meu pedido.

Os cartões de floriculturas são extremamente cruéis para mim, uma pessoa que tem sérios problemas em passar uma mensagem em poucas palavras (vide o tamanho dos posts deste blog). Passo alguns minutos olhando profundamente o cartãozinho, a caneta (que é intimadora, pois significa que um erro é fatal) e o meu rosto no espelho até que uma idéia vem à mente. Escrevo-a rapidamente, fecho o envelope e entrego para o florista.

Pago a encomenda e saio da loja imaginando a cara de surpresa que a destinatária fará. Será que ela vai gostar? O que vai achar? E... e a família dela, será que vai pensar. Aliás, será que ela vai receber? E a mensagem que eu escrevi? Tudo isso, é claro, apenas evidencia a insegurança deste que vos escreve.

Minha paranóia textual acaba tomando conta do caso. Lembro que coloquei uma vírgula aqui ou acolá na curta mensagem. “Se ela perceber isso, pode entender tudo diferente. Pode até se zangar. Putz, e aquele verbo? Era no presente ou no pretérito perfeito do subjuntivo ? Os sentidos também podem ficar diferentes. Putz, que merda que eu fiz!”. E fico com isso na cabeça durante algumas horas.

Até que as flores são enviadas e a destinatária em questão (ou alguém muito próximo a ela e a mim) me notifica. “Adorei as flores! E o cartão, nossa, que cartão! Obrigada!”. E respiro aliviado. “Ela não percebeu aquela vírgula e nem o tempo do subjuntivo. Que sorte!”.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Hierarquia

Uma coisa que está implícita no convício social: os lugares no carro determinam hierarquicamente quem é quem em um grupo de amigos ou até mesmo em uma família. É algo tão inerente ao ser humano que quase ninguém percebe isso hoje em dia. Ou, se nota, não dá a devida importância.

No banco do motorista sempre senta o motorista, obviamente. E, curiosamente, a pessoa que dirige é geralmente aquela mais segura de si, dos seus atos e de suas palavras. Até porque é preciso um bocado de autoconfiança para dirigir em uma cidade caótica como São Paulo.

Ao lado do condutor, no banco do passageiro, vai sempre aquele ser que possui mais afinidade com a figura principal do veículo. Esposa, marido, namorada, namorado, melhor amigo ou amiga. Sempre. E os bancos de trás ficam relegados às pessoas que, teoricamente, são os coadjuvantes do relacionamento.

Em uma família isso é bem claro: os pais ocupam os bancos da frente e os filhos vão atrás. Na ausência de um dos chefes da família, o banco da frente é geralmente assumido pelo filho mais velho. Eu, por exemplo, não me sinto nada bem vendo meu irmão mais novo no banco da frente ao lado da minha mãe. Nada de ciúme bobo ou algo do tipo, mas apenas nível hierárquico: primogênitos na frente, oras.

Em um círculo de amigos também. O dono do banco do passageiro é sempre a namorada (ou namorado) do motorista (ou da motorista). Se não há um par afetivo na história, o melhor amigo (ou amiga) assume o posto. Em muitos casos há uma amizade bastante intensa e um outro tipo de relação. Costuma-se, assim, haver um rodízio. Que muitas vezes não é combinado, faz apenas parte da intuição de cada um.

Assim também é possível perceber o quanto você está em alta com seus amigos. Se você vai na frente com relativa freqüência, parabéns. Caso haja um revezamento justo, melhor ainda: são todos bem amigos. Só que se você já está acostumado a conversar com as pessoas da frente apenas olhando pelo retrovisor, tome cuidado... seu moral não está muito alto. E se você for o dono do carro, relaxe: sempre haverá alguém para andar ao seu lado.

São raras as pessoas que fogem à regra e abrem mão de seu nível hierárquico (o que apenas reflete uma das características humanas: quem abre mão do poder?). Eu já me arrisquei a mudar de ‘posição social’ voluntariamente algumas vezes anos atrás: quando um amigo mais velho, que já dirigia, se propunha a dar carona a algumas de minhas paqueras para casa.

Muitas vezes deixava de ir na frente para fazer companhia às garotas no banco de trás. Não dava muito certo: a mudança social abrupta assustava-as, e muitas vezes achavam que eu estava profundamente apaixonado, a ponto de abrir mão do lugar de direito do carro. Um erro fatal para inocentes relacionamentos juvenis.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Relações trabalhistas

Cada pessoa tem um hábito diferente quando chega ao trabalho.

Tem alguns que chegam e fazem questão de cumprimentar um por um. Há também aqueles que apenas fazem uma saudação coletiva, enquanto ainda tem um ou outro que passa reto por todo mundo e senta no seu espaço reservado sem falar um a sequer.

Na hora de ir embora também. Tem os que vão de mesa em mesa falar até logo, alguns que dizem um tchau geral, outros só balbuciam alguma despedida aos que estão no caminho... e nem sempre os hábitos são os mesmos na hora de cumprimentar e despedir. Mas não é esse o mérito da questão.

É simples. Embora todos os funcionários tenham costumes diferentes ao saudar os companheiros de trabalho no início ou no final do expediente, uma coisa é comum a qualquer um: a pausa no trabalho para ir ao banheiro. As pessoas se tornam muito mais simpáticas... e cúmplices, talvez.

Nunca reparou? Pois preste atenção: você pode ter visto a pessoa uma, duas ou quarenta e nove vezes naquele dia. Ela pode até sentar ao seu lado e vocês conversaram o tempo todo. Mas se duas se encontram no caminho do banheiro, a reação é a mesma para qualquer outra pessoa: um levantar de sobrancelhas, um sorriso e algum comentário. Ou talvez um apelido inventado às pressas: “Opa! E aí, campeão!”. Um que está na moda, por motivos óbvios, é este: “Ê, curintia! (que tem também a variante ‘Ê, segunda!’)”

Não interessa se você já o viu durante seis horas de expediente, passou a hora do almoço com o indivíduo ou coisas do tipo. Está implícito em qualquer relação trabalhista que evitar uma saudação no caminho do banheiro é uma tremenda grosseria.

E por quê? Talvez porque muitas pessoas sejam cúmplices indo ao banheiro e essas saudações queiram apenas significar algo do tipo “É, eu também não estava com vontade de ir ao banheiro, mas precisava andar um pouco e respirar novos ares. Só não conta pro chefe”.

E se o encontro casual não acontece no caminho, mas no banheiro em si, sempre há algum assunto clássico. Algo do tipo elevador: “Calor, né?”, “Putz, tá foda hoje”. E, claro, um que está sendo bem usado nos sanitários e toaletes do mundo inteiro ultimamente é “E o Timão, hein?”.

Nunca os assuntos são profundos – até porque... quem seria o indivíduo que começaria uma densa conversa na fila da pia do banheiro. A conclusão disso tudo? Golpes de Estado, partidos políticos ou qualquer revolução são coisas que jamais podem ser iniciadas com um encontro no toalete.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Recorte de jornal

(clicando na imagem ela fica maior, a ponto de ser lida)

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Limitações

Reza a lenda que eu não tinha muito mais do que três anos recém completados quando aprendi a ler. Até hoje não sei como tudo começou, mas meus familiares têm essa história na cabeça.

Alguns meses mais tarde já sabia rabiscar algumas letras em um papel. Tudo isso sem ir para a escola – lugar que eu passei a freqüentar apenas com quatro para cinco anos.

Aprendi a falar, ler e escrever relativamente cedo. Consegui criar uma estrutura mental bacana para hoje, a alguns meses dos 20 anos, ter uma paixão enorme por pensar, criar e... coisas assim – textualmente falando. Consigo me comunicar até que bem com as pessoas, tenho um diálogo interessante com quem me interessa, às vezes tenho idéias que acho muito, muito boas (e que nem sempre são assim de fato, diga-se)...

Enfim. Sinto que tenho uma pequena inteligência dentro de mim, em algum lugar bem obscuro que ainda não foi descoberto. Talvez isso tenha um pouco a ver com o fato de a linguagem estruturar o pensamento. Coisas que Noam Chomsky, Roland Barthes e LM Sá Martino podem explicar melhor.

Só que as coisas mudam um pouquinho se fizermos uma pequena alteração: o idioma. Percebi que se a minha suposta capacidade de pensamento e comunicação me satisfaz bastante em português, em outras línguas não é bem assim. E eu me sinto bastante (e bota bastante nisso) limitado tentando me expressar utilizando algo que não a última flor do Lácio.

Mesmo eu tendo feito inglês durante um tempo até que interessante e conseguido pegar um diploma que, dizem, me permitiria cursar qualquer universidade nos Estados Unidos, Inglaterra ou outro país de língua inglesa, não me comunico como gostaria. De vez em quando, especialmente na rua, tento pensar algumas coisas em inglês. Não é tão difícil, mas também não é tão fácil como em português.

E ultimamente tentei enviar um e-mail para um grande amigo que foi para Londres há alguns dias. Enquanto digitava, constatei algo: meu vocabulário para criar é algo muito mais do que restrito. O que é estranho, porque consigo entender livros, reportagens e textos em geral em inglês, além de filmes... Mas se estava acostumado a ter conversas bastante filosóficas e profundas com esse amigo, notei que em inglês não iríamos muito além do papo esporte-mulher-esporte-mulher-trabalho.

Em espanhol as coisas não são muito diferentes. Senti que tenho mais dificuldades ainda em castelhano do que em inglês quando fui bater um papo com um dirigente da Real Federação Espanhola de Tênis. Conseguimos ter um pouco de conversa. Entendia tudo o que ele me dizia, mas tinha extrema dificuldade para formular frases. E olha que as línguas são parecidas; e eu também não tenho dificuldade alguma em ler e entender textos e conversas em castelhano.

A conclusão disso tudo? Se em português consigo pensar algumas coisas e ter algumas idéias que nem toda a população tem, se vivesse em países como Espanha, Inglaterra, Chile ou Escócia talvez apenas me comunicasse precariamente. Na Holanda e na Bélgica, com meu nível ‘alfabetizando’ em holandês, talvez tivesse a capacidade de apenas sobreviver. Enquanto isso, em países como Alemanha, França, Suécia, Rússia, Japão e China, eu seria tão comunicativo como um arbusto.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Prodigalidade

“Olha, filho, fica nos degraus porque você não sabe nadar”.
“Ah, mãe, a água é boazinha! Não tem perigo, olha”.

Alguns passos depois...

“Mãe! MÃE!! Mãe, tô me afogando! Essa água é assassina!”.

...

Se bem me lembro, foi mais ou menos assim a minha primeira experiência com piscinas. Aconteceu em alguma manhã de janeiro há alguns 15 anos, na maior piscina do Círculo Militar.

Apesar da experiência traumática e quase fatal para um garotinho de quatro ou cinco anos, não fiquei com medo da água. Pelo contrário. Fiz aulas de natação, aprendi um nado mambembe e passei a adorar passar as férias de janeiro no clube.

Era uma tradição. Acho que grande parte da minha paixão pelos últimos meses do ano aconteceu por causa da expectativa criada com a ida ao clube (que sempre significou piscina). Até que chegava janeiro, minha mãe tirava férias e eu torcia veementemente para que o sol saísse todas as manhãs para que pudéssemos ir nadar.

Também por conta do clube o cheiro de bronzeador me remete a algumas das melhores lembranças da infância. Muito bom. Misturando isso ao cheiro de cloro da piscina, melhor ainda. E bem peculiar, confesso. Mas cada dia no clube era inesquecível.

Até que os anos passaram. Meus pais se separaram, minha mãe se mudou para um prédio com piscina e decidiu se desfazer do título do clube. “Já tínhamos piscina, ora, não precisávamos mais de clube”, dogmatizei. E, conseqüentemente, meu gosto por piscinas foi diminuindo gradativamente.

Os anos continuaram passando. Eu terminei o colégio, passei na faculdade, comecei a fazer jornalismo, arranjei um estágio na GE.Net, mergulhei de cabeça no mundo dos outros esportes, passei a ter um carinho especial pelo tênis.

Enquanto isso, o esporte com raquetes e bolinhas no Brasil seguiu aos trancos e barrancos e a Confederação Brasileira de Tênis decidiu alavancar a modalidade. Fez uma parceria com a Federação Suíça em junho e, em dezembro, marcou uma entrevista coletiva para anunciar o começo de uma associação com a Real Federação Espanhola e outros países latino-americanos. O local? O Circulo Militar.

Tudo isso junto resultou no meu retorno uns oito anos depois a um dos lugares mais perfeitos da minha infância. Nostalgia era pouco quando eu passei pelo estacionamento na rua. Depois, assim que passei a catraca, fiz questão de desviar meu caminho até a sala da coletiva e fui dar uma volta pelo clube. Ah, eu ainda sabia os caminhos de cor. A revistaria, onde eu comprava o Almanacão de férias da turma da Mônica, ainda estava lá. Ah!

Mas o momento mais, digamos, emocionante, foi voltar a ver as piscinas. Tão azuis como da última vez...e tão vazias como da última vez. As cadeiras para banhistas continuavam dispostas da mesma forma. Talvez fossem as mesmas cadeiras. Assim como as velhinhas nas mesas na porta do restaurante. Parecia até que eram as mesmas.

Mas... alguma coisa estava diferente. As piscinas maiores, que eu sempre achei incrivelmente fundas, não pareciam ser tanto assim. E o lugar onde eu quase me afoguei parecia ser ainda mais raso do que realmente era. Da mesma forma que a plataforma para mergulhos, as escadas para o restaurante das piscinas... estranho.

Andei mais um pouco e entrei no corredor poliesportivo, onde crianças brincavam nas quadras. Dei alguns passos e já estava em outra alameda. Antes o corredor parecia ser maior. As quadras também. Vai ver é a globalização, que vem reduzindo as distâncias do mundo. Só podia ser.

Dei mais uma volta e passei pelo vestiário masculino. Me chamou a atenção a entrada, que não parecia estar tão bem cuidada anos atrás. As percebi que tinha sido reformado. Dentro também: estava mais iluminado, com sessões coloridas de armários... os locais de banho estavam mais limpos... e até o guarda-volumes, que sempre me pareceu sombrio e assustador, estava mais convidativo. As coisas mudam!

Minha opinião também. Ultimamente, costumava dizer por aí que, se um dia ganhasse na loteria ou achasse muitos mil reais na rua, a primeira coisa que faria era comprar um título no Clube Pinheiros, que dispensa qualquer apresentação. O Paulistano também, por ter a melhor feijoada e ser bastante convidativo. Mas o único que me deu vontade de voltar foi o Círculo Militar - dono da medalha de ouro do Campeonato Mundial de Bocha-2006, prêmio que é a menina dos olhos da sala de troféus do clube.

Apesar de tudo, porém, o Círculo Militar havia perdido um detalhe. A porta giratória, que sempre me amedrontou na entrada (o medo de ser barrado na porta do clube era enorme naquela época), parecia não estar lá. “Ih, mas faz tempo que tiraram. Nem lembrava mais”, me disse um porteiro quando perguntei.

Uma pena. Eu lembrava.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Lugares (in)comuns

O mundo tem se tornado um lugar bem esquisito nos últimos tempos.

Costumo dizer para algumas pessoas mais íntimas que o mundo é estranho. Tão estranho que tem se tornado bastante previsível de uns tempos para cá.

Verdade. Basta ver que, em novembro, a velha profecia se realizou e um dia extremamente seco se converteu em uma chuva torrencial apenas porque era 2 de novembro.

Algum tempo atrás, também tive a sensação de que encontraria uma antiga amiga no metrô só porque tinha sonhado com ela na noite anterior. Daí pra mais. Algumas pessoas mais próximas sabem certos detalhes incrivelmente bizarros do meu dia-a-dia.

Enfim. São inúmeras aventuras e desventuras, vários entendimentos e desentendimentos. Tudo muito inusitado, engraçado, triste, broxante. Várias coisas ao mesmo tempo. Mas nada tão bizarro que se compare a algo como isso:

Durante o fim da minha infância até a metade da minha adolescência, tive um grande amigo. Vivemos muitas coisas juntos: começamos a beber, conhecemos garotas, namoramos algumas dessas garotas, desabafávamos, reclamávamos da vida, conhecíamos lugares novos. Chegamos até a viajar – o que, para uma pessoa que viajou raríssimas vezes como eu, é algo que coroa uma amizade (já falei dele aqui).

Mas como toda amizade que começa na infância, acabou perdendo a intensidade e praticamente terminou. Chegamos a nos encontrar pela rua depois de um tempo (aliás, nos dois últimos de nossos encontros casuais, tive a sensação de que o encontraria). Só que nossa amizade não foi reatada. E ele acabou indo viver em Minas.

Até que hoje conectei no MSN e alguns instantes depois ele também conectou. Não sei por que, tive vontade de mandar uma mensagem para ele. Antes de digitar alguma coisa, vi que na data da nossa última conversa, eu falei que tinha acabado de ser aprovado no estágio na Gazeta.

Ao ver que já fazia um ano que não nos falávamos, acabei não mandando nada naquele momento. No entanto, mantive uns dois ou três assuntos paralelos durante a noite, mas com quatro janelas abertas. Ainda pensava em tentar falar alguma coisa com ele.

Minhas três companhias virtuais foram dormir praticamente ao mesmo tempo. Fui fechando as janelas uma a uma, até que... até que, na hora de fechar a janela da conversa não iniciada com o tal amigo, o impensado: “Carlos !! diz: aíí heldekaa!” A mesma saudação idiota de anos atrás. Impensado, impossível, improvável. E extremamente engraçado.

E que apenas justifica a minha tese inicial: o mundo tem se tornado um lugar bem esquisito nos últimos tempos. E bota esquisito nisso.

Atualizado (1h09): Apesar de ter que acordar às 6h45 na terça-feira, não consegui dormir cedo. Para gastar meu tempo de insônia, decidi assistir a alguns episódios de Seinfeld. Antes de chegar ao AV 2 da televisão, passei pelo SBT e qual não foi a minha surpresa ao ver dezenas de modelos boazudíssimas de biquíni rebolando ao som do hino do Palmeiras. Bizarro; o mundo continua bizarro.

Atualizado II (1h11): Não bastasse ver as modelos dançando o hino do Palmeiras, o Fantasia me propiciou algo ainda mais bizarro menos de dois minutos depois. O cara que ia participar da brincadeira pediu a palavra para se declarar para a Helen Ganzarolli. E o fez: em italiano. Às vezes, acho que eu sou o anormal da história.

domingo, 9 de dezembro de 2007

Sobre os dias ruins

Tem dias em que a primeira coisa que eu faço ao abrir os olhos é fechá-los novamente. Inconscientemente, como se isso fosse me proteger de toda aquela sensação mais do que incômoda de que as horas fora de casa serão terríveis.

Mas isso, infelizmente, não funciona. Segundos após abrir os olhos, o despertador dispara o velho som estridente e me impede de ficar na cama. Deixo a cama ainda cambaleando, tropeçando... e o pior: espirrando. Nada pior do que começar o dia com um ataque de rinite.

A alergia dura muito tempo – o suficiente para me deixar de mau humor. Na sensação de que o ataque me tirou preciosos minutos, começo a fazer as coisas rapidamente para evitar o atraso. Besteira: percebo que estou pronto com dez minutos de adiantamento. O que resta? Ligar a televisão na primeira baboseira no afã de o tempo passar.

Ao sair de casa, porém, tenho o enorme desejo de voltar. As avenidas estão vazias, assim como as ruas, alamedas, paralelas, transversais... Isso me deprime. É como se todo aquele espaço, antes apinhadíssimo, fosse meu. Um desperdício.

Toda essa sensação de solidão me dá vontade de ligar para alguém. Tem vezes em que até saco o celular da mochila e dou uma olhada rápida pela lista. Melhor não. Talvez ninguém entenderia o que estava acontecendo.

Mas a humanidade, embora não esteja na rua, não foi dizimada: ela se escondeu no metrô. Para minha infelicidade, já que um banco vazio seria o ideal na tentativa de dormir mais alguns minutos e acordar com um humor melhor. Mas o único banco teoricamente disponível é ocupado por algum cara nem um pouco altruísta, que repousa a mala de viagem ou a sacola de compras no assento. Resta-me, então, ficar em pé e lutar contra o sono.

Apenas uma coisa poderia me despertar e recuperar o humor: doses cavalares de cafeína. Mas todas as minhas fontes de cafés grandes estão fechadas. Maldade: até o Popeye descola latas de espinafre quando mais precisa. Eu, enquanto isso, tenho que me contentar com um banho de água gelada no rosto. Não deve fazer bem.

É quando eu sinto que todas as coisas conquistadas até hoje foram fáceis demais, ao passo que todos os meus principais objetivos são praticamente impossíveis de ser atingidos. Isso sem falar em todas as pequenas felicidades cotidianas desperdiçadas à toa. São nesses dias em que eu tenho as piores crises existenciais.

É justamente nesse momento que me dá vontade de me render simultaneamente a três dos meus principais vícios: ficar deitado, fazer palavras cruzadas e ver programas de esportes. Não é pedir muito, é? Sei que não. Mas o homem jamais vai ser feliz aos domingos.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Batidas

Ela tropeçou ao tentar executar um passo de dança em uma festa: ao tentar colocar o pé esquerdo no chão, tropeçou no direito e perdeu o equilíbrio.

Mas sua alegria não terminou no chão. Enquanto caía, foi amparada por um cara para quem ela estava olhando já há alguns instantes.

Sua alegria, em contrapartida, terminou minutos depois, quando foi para o banheiro lavar o rosto: encontrou a melhor amiga nos braços do tal cara. E não, a amiga não tinha perdido o equilíbrio ao tentar executar um passo de dança.

Ao presenciar a cena, desistiu de lavar o rosto. Preferiu voltar ao balcão do bar e pedir mais uma batida. “Com menos fruta e mais vodca dessa vez, querido”, pediu ao garçom, com a voz bastante enrolada.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Mãos trêmulas

“A balada tah uma droga. Queria vc aqui, querido. Te ligo qnd chegar em casa. Depois a gnt se fala. Bjos”, escreveu a garota, com as mãos trêmulas e um pouco umedecidas de suor, após trair o namorado pela segunda vez na noite. Era aniversário de uma amiga.

Um telefone celular despertou do outro lado da cidade quando uma mensagem de texto chegou, e o dono do aparelho teve um arrepio. Não, não foi por causa do vibra-call. Foi porque, naquele mesmo instante, a mulher a quem ele se agarrava lhe deu um puxão nos cabelos da nuca após receber um beijo no pescoço.

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Esquisitice

Confesso que tenho certos hábitos excêntricos. Esquisitos, para ser sincero.

Tenho sérios problemas para conquistar algumas metas irrelevantes que traço para o meu cotidiano. Quando as alcanço, no entanto, não consigo ir além. É como se eu me contentasse com pouco. Um exemplo? Fácil.

Uma vez, reencontrei uma garota depois de muito tempo. Ela não era nada mal; pelo contrário: simpática, charmosa... e, com o tempo, ficou com mais cara e corpo de mulher. Claro que combinamos de sair. Ela me passou o novo número do celular dela. Passei o meu também e acertamos que ligaria primeiro aquele que tivesse o primeiro tempo livre. Fechado.

Fui eu quem teve o primeiro tempo livre. Estava na fila do cinema na véspera de um feriado e liguei para ela. Chamou, chamou, chamou... só não caiu na caixa postal porque, de acordo com a voz eletrônica, aquele número não dispunha de tal facilidade.

Mais tarde ela me mandou uma mensagem desculpando por não ter me atendido. O motivo? Estava viajando com a família e o celular passava grande parte do tempo fora de área. Mas me ligaria, então, dentro de uma semana.

O tempo passou e ela não me ligou. Dois finais de semana depois me mandou um e-mail com um convite para um cinema na semana que se iniciaria. Perguntei se poderia ser na quarta-feira, seria mais fácil. Ela aceitou.

Na véspera de nosso encontro ela me ligou no comecinho da noite, mas acabei não atendendo, sem querer. Confesso que senti minha mochila se mexendo no chão da sala de aula por volta daquele horário. Contudo, me dei conta da chamada apenas quando cheguei em casa, às 23h30. Decidi não retornar a ligação... ela acordaria cedo, coitada, não iria acordá-la.

A quarta-feira chegou e eu tentei ligar para ela umas três vezes: caixa postal. Às pressas, mandei um e-mail reforçando o lugar e o horário para o nosso encontro. Só que ela não apareceu. Humm... tudo bem, não havíamos combinado por telefone. Seguimos esse ritmo de desencontros durante mais um mês. Quando eu tinha tempo livre e ligava, ela não atendia. Quando ela me ligava, eu é que não atendia.

Até que um dia tudo mudou. Eu tinha acabado de sair do cinema, sentei em um banco na mesma praça de sempre, abri um livro e percebi que não estava muito a fim de lê-lo. Saquei o celular, procurei o número dela na agenda e disquei.

Foram cinco toques longos até eu pensar em desligar o telefone mais uma vez. Até que uma voz masculina – e ligeiramente afeminada, diga-se – atendeu. Antes que eu pudesse perguntar se tinha sido engano e desligar aliviado, a voz se prontificou: um instante, por favor.

Até que atendeu a voz feminina por que eu esperava.

- Oi, Fê!
- Hahahha, oi! Decidiu atender o telefone hoje, então?
- É, meu, que coisa! Mas e aí, tudo bom?
- Ah, tudo, e você?
- Também... como vai essa força?
- Ahnn... oi?
- Como vai essa força?
...

Foi quando a ligação foi interrompida: meus créditos tinham terminado. Pensei em comprar algum cartão telefônico e ligar para ela, mas... não. Meu objetivo já estava cumprido. Digo... ela era, para mim, a garota que não atendia o telefone. Poderíamos até combinar por e-mail algum outro encontro... poderíamos dar início a um relacionamento descompromissado ou até mesmo a um namoro.

Mas... depois que ela atendeu o telefone, qual era a graça da nossa relação?

domingo, 2 de dezembro de 2007

Espera

Fui um garoto tímido desde os primórdios. Nas minhas primeiras lembranças sociais, apareço me escondendo da vizinha do apartamento ao lado ou então me vem à mente a vergonha de sair do meu universo primitivo (carro da minha mãe) e entrar na escolinha para o primeiro dia de aula.

Essa minha timidez diminuiu em bons números com as minhas primeiras amizades. Mesmo assim, nas festinhas de aniversário nos buffets infantis, ela voltava a ficar evidente: se chegava um pouco tarde e um grupinho já estava com uma conversa consolidada, tinha uma enorme dificuldade para me enturmar. A solução? Chegar mais cedo e participar da formação dos grupinhos. Muito mais fácil.

Por causa disso, acabei desenvolvendo o hábito de ser pontual. E essa minha pontualidade, em vez de ser vista como uma qualidade, acaba apenas evidenciando meus principais defeitos sociais, dentre eles a tal timidez, a gigantesca insegurança e uma certa ansiedade – coisas que poucas pessoas acreditam que eu tenha.

Quando combino alguma coisa com alguém, sempre acabo chegando uns cinco minutos antes. Sempre bom estar lá antes, eu acho. O problema é que quase ninguém pensa assim, e muitas vezes as pessoas acabam chegando muito além do estipulado. Muito mesmo.

Uma das piores coisas para uma pessoa tímida e insegura é ficar plantada em um mesmo lugar por muito tempo. Às vezes tento disfarçar, dou voltas no quarteirão e até finjo chegar atrasado. Mas nem sempre isso dá certo, e acabo ficando parado no mesmo lugar.

Os dez primeiros minutos da espera são normais e até passam bem rápido. Depois da primeira olhada no relógio e de constatado o princípio de atraso, porém, a insegurança começa a bater. Por que o atraso? Será que a pessoa desistiu? Ou... pode ser o trânsito. Eh, pode ser o trânsito. Mas e se aconteceu alguma coisa? Puxa, já faz 20 minutos que a gente combinou, por que não avisou?

Nesse momento, tento a minha cartada mais vã possível: o celular. Mas, como todo mundo já deve saber, o celular só costuma funcionar quando você está no meio de uma prova, de uma entrevista de emprego, em uma reunião, no trabalho ou no elevador. Quando mais se precisa dele, resta apenas a caixa postal.

Depois de ficar tanto tempo no mesmo lugar com as mãos nos bolsos, percebo que os dedos começam a suar. Tiro as mãos do bolso, estralo os dedos, esfrego-os. Ter barba nessa hora ajuda, e acabo sempre puxando alguns fios do queixo. Também penso em uma música e começo a marcar o ritmo com os pés. Incessantemente.

Enquanto isso, as pessoas em volta começam a perceber que você está esperando alguém. Muitas delas sabem isso, e boa parte delas começa a desconfiar de que você levou um bolo. Começo a olhar para os lados, esperando ver a qualquer momento a pessoa com quem combinei. Meus bolsos começam a pesar. As pernas, a tremer. É preciso arranjar alguma coisa para fazer.

Depois de alguns instantes, a salvação: a pessoa esperada chega, ou então a primeira do grupo combinado. As mãos param de suar, as pernas param de tremer e a vida, pouco a pouco, vai se reajustando.

Quase ninguém acredita quando eu digo que sou tímido e inseguro. “Você, que consegue se aproximar de alguém com tanta facilidade e fazendo tantas piadas? Ah, conta outra, vai!”.

É que nenhuma delas me espiou enquanto eu esperava por alguém.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Perfeição sonolenta

O momento de mais segurança da minha infância era a noite. Apesar das ameaças de bicho papão, bruxa Reizel, homem do saco e chupa-cabra, me sentia protegido dormindo na mesma cama que a minha mãe.

Ela, desde quando eu era pequeno, foi a minha protetora. E se eu acordasse no meio da noite com medo de qualquer coisa, bastaria abraçá-la forte que qualquer preocupação se esvairia. Era mágico.

Mas os anos passaram, eu cresci, passei a dormir na minha cama, meus pais se separaram e eu fiquei morando com meu pai... demorou até que eu voltasse a dividir a mesma cama com alguma mulher. Levou muitos anos, até que...

Faz um certo tempo. Deve ter sido em alguma noite perdida em um passado não muito distante. Depois de beber um bocado (naquela época, um copo de vinho já era demais para nós), pegamos no sono rapidamente vendo o filme preferido dela em seu quarto.

Não sei exatamente quando fechei os olhos e comecei a sonhar. Lembro-me apenas de acordar no meio da noite, ainda de madrugada, com um leve chute no tornozelo. Ao me virar para o lado, tive uma das visões mais bonitas que já vi até hoje: era uma garota linda, muito mais do que eu já achava. Com os olhos cerrados e os lábios entreabertos, me passava uma serenidade imensa, ao passo que a respiração ligeiramente ofegante me deixava preocupado: estava tendo um pesadelo?

Tentei virar para o outro lado e voltar a dormir. Não consegui. Fui tentado a voltar meus olhos para ela, que jazia a poucos centímetros de mim. Naquele momento, já estava virada para o outro lado, ainda mais encolhida: devia ser por causa de um pesadelo.

Com ela de costas para mim, comecei a notar a beleza de suas curvas. Engraçado. Só naquela hora consegui pensar na profunda beleza daquela garota... e também na perfeição da obra divina.
De tanto olhar, comecei a notar também alguns defeitos. Pequenas falhas bestas, mas que me surpreenderam a princípio: como um ser tão perfeito poderia ter aqueles defeitos? Mas bastaram alguns minutos mais de observação para que aqueles ‘pequenos erros de fabricação’ se tornassem os mais belos que eu já tinha visto até então.

Não consegui mais dormir e fiquei contemplando-a durante o resto da madrugada. Ao mesmo tempo em que tinha um desejo incomensurável de abraçá-la e jamais largá-la, fazia questão de respirar o menos possível e evitar movimentos desnecessários para não a acordar. Ainda levantei da cama, sorrateiramente, para ligar a televisão para ver a transmissão da Fórmula 1. Assisti a toda a corrida sem volume, claro.

Mas naquele momento acabei me lembrando das últimas noites em que tive uma mulher ao meu lado: quando dormia na cama da minha mãe. Antes, eu era o ser inofensivo que precisava de proteção. Naquele momento, com a garota, me sentia na obrigação de protegê-la e cuidar-lhe.

Depois do automobilismo, fui para a cozinha e preparei o leite com a pequena mancha de café de que ela gostava. Com a bebida ainda quente, levei para a cama e acordei-a.

Acordá-la talvez tenha sido uma das coisas mais cruéis já feitas por mim até hoje. Ela abria os olhos ainda atordoada com a claridade, enquanto eu via pela última vez aquela perfeição meio sonolenta. Algo que eu jamais encontrei novamente.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Corrente blogueira

Ter me livrado da Fuvest para todo o sempre (ou pelo menos até 2009) fez com que eu não me sentisse na obrigação de ler as obras obrigatórias que eu tive que ler ao longo de 2004 e 2005 para as provas que definiriam meu futuro.

Mas alguns meses atrás, enquanto matava as horas antes de entrar no cinema, descobri um sebo nos arredores da Paulista. E em uma das estantes apinhadas de livros – alguns deles com as bordas das páginas corroídas pelas traças –, encontrei uma obra obrigatória para o vestibular deste ano: Dom Casmurro.

Como na minha época a obra obrigatória do Machado era Memórias Póstumas, não li Dom Casmurro. Após uma rápida folheada, me senti na obrigação de desembolsar as 12 pratas e levá-lo para casa.

E era justamente este livro que aparecia sobre a minha impressora, ao lado do monitor, quando li a convocação do Emanuel para uma corrente literária. Como funciona?

1ª Pegar um livro próximo (PRÓXIMO, não procure)
2ª Abrir na página 161
3ª Procurar a quinta frase completa
4ª Postar essa frase em seu blog
5ª Não escolher a melhor frase nem o melhor livro
6ª Repassar para outros cinco blogs

Seguindo os pedidos, temos como quinta frase completa na página 161:

As for Manduca, I don’t think it was as a sin to have anti-Russian opinions, but if it was, he will have been expiating now for forty years the hapiness he had for two or three months – from which he will conclude (too late) that it would have been much better just to groan, and have no opinions at all.

Antes que ninguém entenda, a explicação: o exemplar de Dom Casmurro à venda naquele sebo era em inglês. Não tive dúvida ao desembolsar la plata: além de ser uma obra do Machado, ainda me serviria para continuar praticando o idioma bretão, já que não faço aulas há um bom tempo.

E agora a parte mais difícil: escolher cinco nomes para dar seqüência à corrente. Nãi sei se algum dos meus cinco escolhidos lerá ou fará isso, mas deixo a agradável tarefa para Júlio Simões, André Marmota, Pedro Pracchia, Bruno ‘Neguinho’ Gonçalves e o pessoal do Martini Seco.

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Grand Champions Brasil, o retorno

Durante os últimos dias me perguntei, dentre outras coisas, sobre a existência ou não deste post. Como podem ver, optei por escrevê-lo. Pois bem, vamos a ele.

Momentos após acordar na quinta-feira (quando lia a coluna do Veríssimo no jornal, para ser mais exato), já imaginava como seria esse texto. Seria mais uma análise contra o jornalismo futebolístico e a favor da divulgação dos outros esportes. Só que as coisas mudaram, e o que consegui não foi mais do que a continuação do meu desabafo in loco, não mais in loco.

Achei que toda a minha saga de desventuras tinha terminado quando conseguir, depois de muito batalhar, um adaptador para ligar meu laptop no Ginásio do Ibirapuera no Grand Champions Brasil (Brasil, hem!?), na última quinta-feira. E, claro, me enganei: queimei a língua pela segunda vez no dia (a primeira havia sido ao tomar uma xícara de leite muito quente na coletiva antes do torneio).

Aliás, a coletiva. Nunca tinha ido a um hotel tão bonito como o Sofitel São Paulo, em uma região entre os bairros de Moema, Ibirapuera e um bocado de Vila Mariana. Lá, além de conseguir algumas notícias bacanas com o Fernando Meligeni, vi de perto e até entrevistei o Bjorn Borg, um dos principais jogadores de tênis da história. Para simplificar: ele fez um pouco mais do que tudo isso que o Roger Federer já fez ou está fazendo, mas com uma raquete pesada de madeira e sem roupas da Nike. E com uma baita concorrência.

Uma das perguntas que fizeram ao Borg na coletiva era sobre as chances que ele achava que tinha em superar o Bruguera e ganhar o Grand Champions Brasil. Ele disse algo do tipo “I’m here to win”.

Pois bem, de volta ao Grand Champions, já no Ibirapuera. Quando cheguei ao meu cubículo de imprensa e terminei de instalar meu laptop e, com a ajuda fundamental do Seu Jairo, da Jovem Pan, montei a minha redação. Alguém já viu como é a cabine de transmissão de imprensa, aquela que tem o Galvão Bueno e o Arnaldo César Coelho de terno e gravata, felizes da vida e em um lugar bem chique? Pois então... a que tinha Felipe Held era assim.

Foto: Felipe Held/Cavaleiro com Solitária
Outra coisa de que me dei conta era a condição das tomadas. Apenas a minha das cabines de imprensa disponíveis possuía uma tomada utilizável. Todas as outras tinham algo que parecia um ninho de minhocas ou uma mecha de cabelos da Medusa. Lamentável.

Foto: Felipe Held/CCS

Outra coisa: o placar do ginásio, desligado, não mostrava a pontuação da partida. Qualquer descuido e babau. Mas até que consegui contornar essa situação conseguindo o nobre favor de uma amiga sorocabana que ligou no Sportv e passou a me informar a situação do marcador.

Mas então começou o jogo entre Meligeni e Mats Wilander, que prometia ser o mais engraçado da noite. E o Fininho, que antes do jogo já tinha anunciado que seria mais descontraído do que o normal, não fez por menos. Apesar de não ser oficial, foi um dos melhores jogos de tênis que eu já vi. Consegui acompanhar a partida inteira enquanto escrevia o relato. Profissionalmente, uma catarse.

Então me ajeitei na escadinha de banheiro improvisada à espera do início do jogo entre Borg e Vilas. O 23º da história dos dois tenistas, que decidiram Roland Garros duas vezes na década de 1970. Uma das maiores rivalidades do tênis masculino na história. A minha maior esperança no Grand Champions Brasil... Uma... uma...

Uma interrogação brotou na minha cabeça quando o Borg entrou em quadra e pediu o microfone. Até pensei comigo mesmo, em tom de piada: “Ele é sueco e não fala português, o que vai querer dizer pra todo mundo aqui? Ele vai, sei lá, falar que é gay ou então que também está envolvido no escândalo de apostas do tênis. Ou então...”

Aconteceu a terceira opção: ele desistiu do torneio. O motivo? Uma lesão no braço, contraída há algumas semanas. Sim, caro leitor, Bjorn Borg, a lenda viva do tênis, desistiu do Grand Champions Brasil. Já sabia que iria desistir, mas ainda assim a organização da competição fez marketing em cima do duelo Borg e Vilas, cobrou 90 pratas dos espectadores que foram ao Ginásio do Ibirapuera naquela noite de quinta-feira... uma palhaçada.

Poucas pessoas já me viram falar tanto palavrão em um espaço de tempo tão reduzido como aqueles 10s que sucederam o anúncio da desistência do Borg. Não pude extravasar, mas peguei três álibis na arquibancada: o simpático Pedro Portes, o carrancudo Aílton Sérgio e o idoso e quase surdo Alberto V. (uma das coisas que aprendi nos primeiros meses de faculdade era não fazer isso. Claro que na hora nem me importei).

Cheguei em casa à 0h32 absolutamente morto. Morto, mas extremamente feliz. Apesar de tudo, consegui ter essa vista.

Foto: Felipe Held/CCS

E de graça, apesar de muitíssimos contratempos.

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Sobre a gripe

Não sou do tipo de pessoa que se deixa abater por qualquer coisa. Muito embora esteja satisfeito com alguma coisa, procuro não deixar que isso se reflita no meu dia-a-dia e tento continuar levando uma vida mais ou menos normal.

Mas, confesso, tenho um ponto fraco. Fraquíssimo, para falar a verdade: a gripe.

Desde pequeno desenvolvi uma tendência incrivelmente enorme para adquirir doenças leves. Ainda que eu nunca tenha tido problemas como cárie, bronquite, gastrite, sarampo ou qualquer coisa do tipo, sou incrivelmente vulnerável aos resfriados. Uma droga.

Ficar resfriado talvez seja uma das piores coisas do mundo. Tudo começa de madrugada, quando você acorda no meio da noite com o nariz entupido e um pouco de frio. De manhã, o princípio de dores no corpo constata o início da doença.

Com o passar das horas, a dor de cabeça e a preguiça até para falar evidenciam ainda mais o mal que ainda o acometerá. O primeiro dia de gripe termina com um sono incrivelmente forte. Enquanto as horas passam de forma muito lenta, consegue-se sonhar com coisas estranhas, especialmente com suas células combatendo os vírus que aterrorizam seu organismo.

Não é raro deixar esse sono pesado com febre na manhã seguinte – quando é iniciado o pior momento do resfriado. Enquanto se sua bastante e os olhos ficam extremamente pesados, o mundo fora de sua cabeça parece conspirar contra você. As pessoas ficam ainda menos simpáticas, o metrô fica ainda mais lotado, o frio é ainda mais frio e o calor, putz, o calor é ainda mais quente.

Mas o pior e tudo mesmo é cumprir obrigações com gripe. Se já é ruim ficar em casa esperando os sintomas baixarem, é terrível ter que ir para a escola ou, então, para o trabalho. A capacidade de concentração é reduzida a um ponto quase nulo, a predisposição natural do ser humano é substituída por uma moleza fortíssima e uma iminência de sono. Tudo isso combinado com enjôos, tonturas e muita, mas muita coriza. Terrível.

Só que tudo começa a melhorar depois do expediente. O almoço e a sesta combatem os germes que fazem a festa em seu organismo e a vida volta a ficar feliz. E, embora os sintomas gripais continuem evidentes por mais uns quatro ou cinco dias, o mundo retorna às suas origens.

No entanto, nada apaga a tragicidade dos primeiros momentos da gripe. Para evitá-la, já tentei tomar aquelas pastilhas efervescentes de vitamina C, parei de tomar gelado, de andar descalço pela casa e de tomar chuva, evitei tomar friagem... nada funcionou. Além disso, percebi que pequenos detalhes relevantes da vida foram suprimidos em nome da gripe. Não valia a pena.

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Desabafo in loco

Quando vi pela primeira vez o anúncio de que Bjorn Borg, Guillermo Vilas e Mats Wilander viriam a São Paulo disputar partidas de tênis, não pensei em outra coisa que não “Putz, não tem como perder”. O tempo passou e, hoje, o evento teve início hoje e eu fui credenciado para cobrir o primeiro dia.

Fenomenal a idéia da Nossa Caixa, do Hotel Sofitel, da Hugo Boss e do meu sempre achincalhado Sportv em trazerem tenistas de tal magnitude para um país em que, há alguns anos, o tênis é só aquela coisa bacana que a gente coloca nos pés. Mas nem tudo são flores.

Sempre achei que ao longo do percurso a algum lugar recebemos dicas do que nos espera. Pois vindo para o Ginásio do Ibirapuera, uma seqüência de coisas aconteceu. Primeiro, Túlio Vidal e eu esperamos durante dez minutos o elevador especial no 12º andar até de serviço ter a boa vontade de aparecer. Não apareceu e tivemos que fazer baldeação de elevadores até a garagem, além de nos atrasarmos para a saída. Já foi o bastante para me deixar com a cara um pouco amarrada.

Já no carro, mais um empecilho: o cartão do motorista não foi aceito pela cancela, e esperamos mais uns cinco minutos até que fôssemos liberados. Ok, ok. O evento já estava prestes a começar, mas e daí?

Do prédio da Gazeta até o Ginásio do Ibirapuera não se gasta mais do que dez minutos de carro. A não ser às 17 horas, quando o trânsito é ligeiramente insuportável. A adivinha a que horas estávamos na rua? Na Manuel da Nóbrega, rua da arena, mais trânsito. Por incrível que pareça, pior do que na Paulista.

Ao aportarmos no ginásio, mais uma decepção. A sala de imprensa, para os jornalistas escreverem os relatos do jogo, não dava para a quadra e nem tinha uma televisão para que acompanhássemos os jogos. Era preciso escolher: escrever ou ver o jogo. Acabei não escolhendo nenhuma das duas e fui procurar um outro lugar onde ficar.

Depois de subir vários lances de degraus, cheguei às cabines de rádio e televisão. Só que em nenhuma das várias disponíveis havia uma cadeira. E é difícil digitar em pé, ainda mais em um laptop. Depois de andar que nem uma besta de um lado para o outro, indicaram um lugar reservado para a imprensa. Maravilha! Ou... ou não.

Quando entrei no lugar reservado a nós, pobre mortais credenciados, tirei o laptop da mochila e o liguei. Antes de começar a montar, comecei a procurar uma tomada. Claro que não achei nenhuma. Perguntei para a tiazinha da recepção, que me indicou a algumas gostosinhas que vestiam minissaias e usavam vários quilos de maquiagem. E uma delas me apontou para um outro cara.

Enquanto isso, Sergi Bruguera e João Cunha Silva (quem?) dividiam o tempo em quadra com pegadores de bola, Dácio Campos e até Ícaro de Paula, o repórter vesgo global, mas que não é dotado de humor como o original.

O cara da organização enfim me atendeu. Ao ouvir o meu desabafo – algo como “a sala de imprensa não tem nem televisão. Nas cabines, só veríamos o jogo pela televisão... seria muito mais fácil cobrir o evento da redação, mas preferimos vir aqui prestigiar (essa palavra sempre funciona)... mas é difícil, não tem como trabalhar. E a bateria do laptop dura o quê, 1h30? –, o rapaz ocupado se limitou a gracejar: “Esse ginásio é de 1900, você tem que entender. E olha que a bateria do seu laptop tá durando mais do que a minha, que não passa de 30 minutos”.

Entre falar todos os palavrões que já aprendi em português, inglês, espanhol, holandês e outros que eu poderia inventar e sair batendo o pé, fiquei com a segunda opção. E expressar toda a minha insatisfação.

Rodei de um lado para o outro. Em um ataque de insanidade, cheguei até a sair do ginásio e ir ao Pão de Açúcar mais próximo (na Brigadeiro, a 400m do local) para ver se achava um adaptador para plugar o laptop na cabine de imprensa. Obviamente, o grupo do Abílio não vendia adaptadores.

De volta ao Ibirapuera, comecei a aporrinhar todos os assessores. Embora tenha me queimado com todos eles, consegui às 19h13 uma tomadinha que me deixaria ligar o laptop na rede elétrica. Com muita ajuda do Seu Jairo, da Jovem Pan, consegui improvisar o meu local de trabalho nesta noite de quinta-feira. Com direito até a uma escadinha encontrada no banheiro servindo de cadeira.

E enquanto o mundo do tênis festeja a realização de um evento como o Grand Champions Brasil (ênfase no Brasil, de acordo com a trupe de comentaristas), um estagiário tenta, inutilmente, revelar as histórias de bastidores. Ah, besteira!

Obs: Atualizado aqui, em 27/11.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

O melhor da festa

São poucos os momentos vividos no passado que eu guardo até hoje na minha memória, ligeiramente debilitada com o tempo. Uma das melhores lembranças que tenho até hoje, no entanto, me remete a uma festa de uma amiga de uma amiga minha do colégio.

Tinha 13 anos naquele mês de maio, se não me engano. E foi naquela noite de sábado que aprendi a lição mais importante da minha vida.

Não, não foi naquela festa que conheci a garota da minha vida. Também não foi lá que dei meu primeiro beijo, que vi meu xaveco dar certo ou coisa do tipo. E não foi lá que tomei meu primeiro gole de álcool.

Na verdade, a coisa mais sábia que aprendi até hoje veio depois da festa, quando já estava de volta no carro com a minha mãe. Como de praxe, ela perguntou como tinha sido a festa e eu, sem fugir do protocolo, respondi com um “ah, legal” bem xoxo.

“Você parecia estar mais empolgado hoje à tarde, antes de sair de casa”, ela disse. Concordei e, em seguida, ouvi a coisa mais profunda até hoje. “Sabe, filho, o melhor da festa é esperar por ela”. Claro que no momento não percebi que isso pautaria a minha vida nos próximos anos e, provavelmente, nas próximas décadas.

Nas últimas duas semanas, por exemplo, contava os dias esperando o dia da entrega do último trabalho da faculdade. Fiz todas as leituras ‘obrigatórias’, resenhas, reportagens e apresentações com apenas um pensamento: ‘menos um. Tá acabando, tá acabando’.

Quarta-feira passada, entreguei o último trabalho. A sensação de alívio e libertação que vivi naquele e nos dois dias seguintes são praticamente indescritíveis. Pensar que não teria mais que passar 3h30 diárias dentro de uma sala pequena e quente vendo muitas aulas que beiravam o insuportável era algo sensacional. Afinal, era aquilo que eu mais esperava desde fevereiro, quando as aulas começaram.

Até que hoje cheguei em casa às 14 horas depois do trabalho e, momentos depois, me peguei riscando uma caixa de fósforos. Assim, compulsivamente. Riscava o palito, esperava a chama consumir uma parte considerável da madeira, apagava, jogava-o no lixo e acendia outro... foi a minha diversão durante alguns momentos. Notei enfim que, assim como nas festas, o melhor das férias é esperar por elas.

Foi quando, mais uma vez, lembrei daquela conversa no carro com a minha mãe. Talvez ela não saiba, mas aquela frase construiu grande parte da minha personalidade e influenciou uma série de atitudes que eu tomei ao longo dos últimos seis anos.

Muito mais importante do que os ensinamentos de, por exemplo, não falar palavrões, não mastigar de boca aberta, falar obrigado ou respeitar os mais velhos.

domingo, 18 de novembro de 2007

Recepção do 12

Era o segundo domingo consecutivo em que eu trabalharia. Não bastasse isso, era também o segundo domingo consecutivo em que eu acordava às 4h45 da manhã e iniciaria o meu trabalho antes de o sol nascer.

Não preciso dizer que acordei como um zumbi, fui peguei o metrô ainda mais sonolento e andei pela Paulista ainda meio grogue. E foi só quando eu cheguei à recepção do prédio da fundação que eu acordei de vez. O motivo? Um papo com o porteiro.

A recepção do prédio mais famoso da Paulista estava uma zona, com os porteiros-seguranças recebendo as entregas dos vários jornais que os vários setores da FCL assinam. Me dirigi ao homem de preto mais próximo e, automaticamente, lancei um “Opa, tudo bom? Vê a chave da recepção do 12, por favor?”. Em outras palavras, eu precisava da chave pra abrir a redação, localizada no 12º andar. Não é difícil.

O porteiro olhou para mim com cara de espanto. Muito espanto. E pediu para eu repetir. “A chave da recepção do 12”, obedeci. Se antes ele achava que não tinha entendido direito, desta vez a suspeita fora confirmada. E não restou a ele fazer a pergunta mais óbvia naquele momento para ganhar tempo. “A chave? Pra quê?”. Respirei fundo e expliquei educadamente (eu acho): “Pra abrir a redação, que tá trancada”.

O truque de ganhar tempo não havia funcionado para ele. Sem saber o que responder para um cara ainda meio sonâmbulo que pedia uma chave, restou ao porteiro repetir as minhas palavras. “A chave... do 12... que 12?”. “O 12º andar”, expliquei. “Ah, a chave... da sala 12!”. Corrigi: “Isso, a chave... mas do 12º andar”. “Hum... chave... chave... chave do 12, né?”

Não pensei que poderia ser um porteiro novo: já o havia visto outros dias. Foi então em que eu achei que tudo poderia ser armado. O Serginho Mallandro poderia ter sido contratado novamente pela Gazeta e iniciado a gravação das pegadinhas com os próprios funcionários de empresa.

Ou então (e o mais provável), a Carol, também escalada para madrugar no domingo, tinha chegado antes de mim, tomado posse da chave e o porteiro apenas me achou com cara idiota e decidiu curtir um pouco comigo. Até porque aquela cara de espanto dele não poderia ser tão anormal apenas por causa de uma chave. Claro, tava combinado!

Mas essa minha teoria foi por água abaixo quando meu sorriso meio impaciente que queria dizer “já saquei a piada” não foi correspondido pelo porteiro, que me perguntou: “E por que você não tá com a chave?”. Evitei a resposta e apenas indiquei. “Olha, naquela caixinha costumam ficar as chaves... não tem nada lá não?”

Ao pegar a caixa de madeira com várias chaves, o porteiro se sentiu aliviado. Deu para ver no olhar dele. Até que ele sacou a primeira chave e leu na placa metálica. “Porta dos fundos, 12º... é essa, né?”. “Humm... não, essa é outra. Eu queria a da recepção”. Ele sacou outra chave. “E essa daqui, com o nome desse cara? Serve?”. “Também não. Esse é o chefe geral e essa deve ser a chave dele. Olha, mas se a da recepção não tiver aí, serve a dos fundos mesmo, vai”.

Para a minha sorte, a famigerada recepção do 12 estava lá. Bastava apenas assinar o livro de controle e pronto, estava livre. Ou não.

“Assina aqui, por favor. Qual o seu nome?”. “Felipe”, respondi. “Hum... Felipe... Felipe Massa?”. “Eh, quase isso. Talvez um dia, quem sabe?”, brinquei. E o porteiro entrou no clima. “Já pensou se você fosse o Felipe Massa? Aposto que não ia ter que vir trabalhar de domingo e ainda tão cedo”, filosofou.

Coloquei a caneta no papel para assinar e, escrevi Felipe, ainda pensando o que eu não estaria perdendo se fosse um piloto de Fórmula 1. Ao terminar meu primeiro nome, escrevi o M e parei. “Ué, não tem M na minha assinatura. Puts, eu não tenho M em nenhum sobrenome”, pensei, antes de falar para o porteiro. “Olha aí! Você falou tanto que eu quase escrevi Felipe Massa aqui!”, brinquei, já rindo.

O porteiro, antes na defensiva, conseguiu o que queria e me lançou um olhar triunfante. Se pudesse, tenho certeza de que ele falaria “Eu posso não saber o que é a recepção do 12, mas pelo menos não esqueço meu nome”.

sábado, 17 de novembro de 2007

Improbabilidades possíveis

Andar de metrô todos os dias nos últimos oito anos fez com que eu tivesse inconscientemente a sensação de que posso encontrar alguém conhecido a qualquer momento. Tanto que, sempre que estou desacompanhado, mantenho meus olhos atentos para um possível encontro.

E tudo isso não deixa de ser uma grande besteira. Por quê? Bom, para isso vão ser necessárias algumas contas. Vamos lá?

São Paulo tem 10,8 milhões de habitantes, sendo que cerca de 1.936.141 pegam o metrô diariamente. Destas, ‘apenas’ 324 mil freqüentam as mesmas estações que eu. Por dia. E digamos que meu senso comum contenha, sei lá, 500 pessoas.

As plaquinhas nas estações também dizem que o tempo máximo de espera por um trem na plataforma é de três minutos. Logo, temos 20 trens por hora. E se o horário de funcionamento do transporte público subterrâneo é de aproximadamente 20 horas, temos que, por dia, são 400 trens fazendo a viajem em um sentido. Como são dois os sentidos (o que vai e o que volta), temos 800. E eu, ultimamente, tenho pegado quatro deles (indo e voltando duas vezes, é bom citar).

Agora, as contas propriamente ditas; a começar por uma regra de três para supor quantas pessoas do meu campo de conhecimento, teoricamente, freqüentam as mesmas estações que eu. 324 mil estão para 10,8 milhões assim como x está para 500. Depois de muito quebrar a cabeça, cheguei à conclusão de que x = 0,000015.

Agora... se aproximadamente 0,000015 passam pelas mesmas estações que eu diariamente, quais as chances de encontrá-las? 0,000015: 800 (trens) = 0,00000001875. Calma, o número não pode ser tão baixo assim... quer dizer, como ultimamente eu tenho feito quatro viagens por dia, multipliquemos essa cacetada de zeros por quatro. 0,00000001875 x 4 = 0,000000075.

Ah, outra coisa que eu acabei de lembrar. Um trem tem seis vagões. Dividindo esse número mínimo por seis...0,0000000125? E por mais 500, que é o tamanho do meu ciclo social, 0,00000000025... Multiplicando por 100 para ter números percentuais, chegamos a 0,0000000025%. Ou seja, uma chance praticamente nula de eu encontrar uma determinada pessoa.

Ok. Apesar de a matemática jogar contra, nutro tal expectativa com certa veemência. E tenho até divido essa possibilidade de encontro em seis grupos: 1. pessoas que eu evito; 2, pessoas que eu não gostaria de encontrar; 3. pessoas com quem tanto faz me encontrar ou não; 4. pessoas que eu gostaria de encontrar; 5. pessoas com quem seria muito divertido de se encontrar e, por fim; 6. pessoa por quem (há pouco mais de um ano) nutro um desejo incontrolável de um encontro (algo que, aliás, nunca aconteceu).

Esses encontros são capazes de mudar o meu ânimo para o restante do dia. Se encontro certas componentes do grupo 3 ou então pessoas dos grupos 4 ou 5, costumo ter um dia mais agradável. Do 1 e do 2, além de alguns do 3, fazem com que meu dia não seja tão bom.

E foi o que aconteceu hoje: voltando da Gazeta, tive a sensação de que encontraria alguém, embora meu pensamento estivesse absorto na construção da notícia da Masters Cup de tênis, cuja final acontece amanhã (bem) de manhã.

Enquanto esperava o metrô na plataforma, imaginava algumas coisas para o iminente tetracampeonato do Federer e o Green Album tocava nos meus ouvidos. O trem chegou, abriu as portas e eu, ainda com as mãos nos bolsos, tive meu olhar, antes errante, desviado para uma garota com um piercing de argola no nariz (meu confesso ponto fraco).

Depois de perceber o piercing de argola no nariz, olhei para o restante do rosto da garota. Cabelos, olhos, bochechas, lábios... humm, conhecia aquele rosto. Droga. Uma antiga, frustrada e conturbada paixão platônica colegial. Grupo 1. Talvez até menos, se houvesse designação possível.

Nossos olhares, que se cruzaram por instantes de segundo, refletiram toda a nossa decepção. Ambos sabíamos que a chance de nos encontrarmos era de apenas 0,0000000025%.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Teste de fidelidade

A primeira lembrança que eu tenho de um corte de cabelo data dos primeiros anos da década de 1990. Se bem me lembro, ainda nem estava na escola. Deveria ser 1991, não sei.

Se não sei a data com exatidão, compenso em alguns detalhes do lugar. A começar pela dificuldade de a minha mãe achar uma vaga da rua. Logo depois de entrar, subia uma escadinha de uns quatro ou cinco degraus e me deparava com uma das coisas mais legais da minha infância: um viveiro bem grade, repleto de papagaios, agapornis e outros parentes dos papagaios.

Não percebia o tempo passar. Apenas ficava olhando as aves coloridas voarem de um lado para o outro. Mas então chegava a minha vez e me dirigia ao salão. A cadeira, na verdade, tinha um formato de carrinho, com um volante. Apesar de desde pequeno eu não ser fãs de carros, adorava.

Mas não demorou muito, meus pais descobriram um lugar perto de casa. Era a uns três ou quatro quarteirões de casa, em uma ladeira logo depois do metrô. Chamava Ditinho, nome do proprietário, que cortava cabelos na última cadeira do salão. O meu barbeiro oficial, no entanto, era o Jorge, da cadeira do meio. À esquerda ainda tinha o Calado.

Passei grande parte da minha infância cortando cabelo no Ditinho. Lá tive uma das minhas maiores surpresas ao ver que o Calado, que sempre cortava o cabelo do meu tio, não era mudo: ele falava. E embora o Jorge sempre cortasse o meu cabelo, o Ditinho, um velhinho baixinho, de bigodinho e quase careca, dizia que me considerava quase um neto. Dizia que eu era um menino especial, de uma inteligência extraordinária, que se daria muito bem na vida.

Nunca acreditei no Ditinho até o dia em que ele pediu para que a minha mãe, grávida, estendesse a mão para ele. Ele sacou um pingente do bolso e, estranhamente, o objeto começou a girar, girar e girar... “Vai ser um menino”, disse. E meses depois nasceu o meu irmão.

Anos depois o Jorge e o Calado deixaram o salão, e comecei a cortar meu cabelo com o Ditinho. Até que um dia, não sei por que, comecei a ir em outro lugar. Se não me engano, dos meus 8 a 12 anos cortei o cabelo em outro salão, em um lugar onde não me sentia à vontade. Embora fosse dois quarteirões depois do Ditinho, sentia que era uma das viagens mais longas. Resumindo: não suportava cortar o cabelo.

Até que um dia voltei ao Ditinho. Não consegui mais chamá-lo de Ditinho, mas de Seu Dito. Mesmo assim, passei a cortar o cabelo com mais freqüência e... com mais alegria, para falar a verdade.

Apesar do meu retorno ao velho reduto, por volta dos 15, 16 e 17 anos dividia o meu corte de cabelo entre o Ditinho e um ou outros dois salões, que cobravam um pouco menos do que os R$ 10 que eram de praxe com o Seu Dito e que tinham barbeiros que cortavam meu cabelo mais curto do que o Seu Dito, que sempre se mostrou assustado com a possibilidade de cortar demais e deixar a minha cabeleira ficar espetada.

Sempre que cortava o cabelo em um outro salão e depois voltava ao Ditinho, me sentia relativamente mal. Não contava para ele que tinha feito o corte em outro lugar, mas ele sempre comentava: “ih, a última pessoa que cortou seu cabelo cortou muito curto, né?”. Ficava sem graça e sempre inventava uma desculpa: “Eu tava viajando e meu cabelo começou a me incomodar. Tive que cortar e aí fizeram isso”.

Era muito ruim a sensação de trair o barbeiro que me conhecia desde pequeno. Até que um dia tomei vergonha na cara e assumir essa relação monocapilar, com apenas um barbeiro. E ele, apesar dos 81 anos, diz que uma das melhores sensações que teve foi o de passar a máquina zero no meu cabelo no dia depois do trote da Cásper.

E até hoje mantenho minha lealdade ao Seu Dito. O velhinho simpático, que até hoje fala que eu sou um garoto com um futuro brilhante pela frente, que não cobra extra por fazer a minha barba, que sempre me reserva um calendário do Palmeiras a cada fim de ano e que diz me considerar um neto.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Descontrole

Quando eu atingi o ápice do meu cansaço mental com estresse combinado na noite de quarta-feira, fiquei tranqüilo ao pensar que já eram 21 horas e que, dentro em breve, seria um novo dia e as coisas tenderiam a melhorar.

Só que quando eu atingi o ápice do meu cansaço mental com estresse combinado na noite de quarta-feira, não sabia que iria acordar atrasado na quinta-feira. E que o dia promissor, bom... não seria tão bom assim.

Tudo começou quando a quarta-feira terminou. Eram 3h30 quando eu me deitei e, ao colocar a cabeça no travesseiro, me dei conta de que teria apenas 2h30 de sono até o despertador tocar. “Puts, e será que eu agüento?”, pensei. “Claro que sim. Fiz isso nos últimos 11 dias, não seria agora que daria errado”, respondi, antes de cair no sono.

O despertador soou pela primeira vez às 6h07. Ainda cambaleando, levantei, apertei o snooze e me recoloquei sob os cobertores para mais nove minutos de sono. Só que, quando abri os olhos novamente, estava mais descansado. Levantei a cabeça, olhei no visor eletrônico do rádio-relógio e vi que o aparelho marcava 49 minutos. “Puuta merda, me atrasei. Mas tudo bem, 6h49 ainda dá tempo de fazer a barba, tomar banho, pentear o cabelo, escovar os dentes e chegar antes das 8 horas na redação”, calculei.

Antes de levantar da cama, porém, ouvi o locutor da Jovem Pan anunciar a hora exata. “Agora são 7h49”. “Repita”. “Sete e quarenta e nove”. Sete e quarenta e nove? Puuuta que pariu, que merda!

Risquei da lista de afazeres a barba, o banho, o cabelo, os dentes... apenas abri o armário, peguei as primeiras calça e blusa que vieram à mão e vesti. Passando pelo espelho da sala, vi um cara com uma barba de duas semanas ao longo do rosto, barba de três dias do pescoço, ao cabelo despenteado. Tudo isso combinado à roupa escolhida a esmo, a única coisa que consegui dizer foi “Puta que pariu, que cara de louco!”. Mas não havia tempo para muita coisa.

Foi descendo as escadas do prédio que me lembrei de que havia esquecido de colocar um livro na mochila. No entanto, logo em seguida veio à cabeça que era dia da coluna do Veríssimo no Estado e... bom, se não tem livro, vou lendo o jornal mesmo no metrô.

Parei na guarita do condomínio e falei automaticamente a frase de sempre. “Opa, bom dia. O Estado do 1013”. O porteiro, depois de um minuto de busca, respondeu: “Olha, a assinatura do 1013 foi cancelada”. “Como assim? Não tem nem uma semana que eu comecei a assinar”, expliquei, elevando o tom da voz automaticamente. “Tá aqui, ó. Cancelada”, respondeu, mostrando um papel.

Atrasado, não tive tempo de discutir. Agradeci, abri a porta da rua e veio à minha cabeça mandar um “Vaitomarnocufilhadapuuuuta” ao periódico que, do nada, havia cancelado a minha assinatura. Ao ver que as pessoas em volta olhavam para mim com cara feia, percebi que não tinha apenas pensado, mas também gritado.

Bom... chovia e eu estava atrasado. Não tardou muito para eu perceber que eu deveria começar a correr. Antes de pensar se eu deveria ou não iniciar a disparada, já estava correndo velozmente em direção ao metrô. Ao mesmo tempo, percebi que, se a barreira entre consciente e incosciente é desfeita durante o sono, quando se perde a hora demora um pouco mais para que tudo seja reestabelecido.

Besteiras à parte, acabou que eu bati o cartão às 8h38. Nada mal para quem tinha transformado um atraso de 1h42 em apenas 38 minutos. A primeira coisa que eu fiz ao chegar à redação foi ligar para a central do assinante do Estado. Depois de muito monólogo do atendimento automático, fui transferido a uma atendente com voz de verdade.

“Olha, senhor... consta aqui que a assinatura foi cancelada porque o nosso controle de qualidade ligou para a sua casa ontem e ninguém atendeu. Por motivo de segurança, decidimos cancelar a assinatura”.

Não adiantou eu dizer que não estava em casa porque estava trabalhando justamente para pagar a assinatura. No entanto, ela pediu meu CPF para reativar a entrega. Percebi que meu dia não seria dos melhores quando esqueci o número do meu CPF e só fui lembrar depois de algumas dezenas de segundos. E, quando ela pediu o número do meu celular, tive que pensar durante uns cinco segundos para responder.

A atendente, que não se desculpou pela falha da empresa, prometeu que o jornal seria entregue dentro de três horas, no máximo, na portaria do prédio da Gazeta. Não preciso dizer que, quando saí do prédio às 14 horas, não havia periódico algum. E o atendimento ao cliente já havia encerrado o expediente. Maravilha.

A tônica do meu dia não foi muito melhor fora do trabalho, para falar a verdade. Mas... agora há pouco, lembrei que hoje é 15 de novembro. E também lembrei que, desde pequeno, os feriados de 15 de novembro são os piores do ano para mim. Algo tão inerente como a chuva no Dia de Finados.

Quer saber? A vida é estranhamente sensata...