quinta-feira, 30 de maio de 2013

Entenda as piadas sem sentido do Chaves: população gigante quer dizer população ignorante

Interrompendo as postagens de cunho pessoal me levam do nada ao lugar nenhum, venho por meio desta fazer um anúncio – que talvez seja um tanto decepcionante para quem (quem?) esperava avidamente havia tanto tempo por este momento.

A piada que tanto tempo me consumiu na busca de um significado, na verdade, não possui sentido algum. Sabem, aquela que foi tão pedida aqui nos comentários e que eu nunca tinha explicado? Pois então, aí vai, a partir dos 6:00 do vídeo abaixo:


Pois é esta mesma, no episódio do Livro da Chiquinha. Caso não possa/não queira ver o vídeo, segue abaixo o trecho – e assim ganho referência no Google.

"Aposto que você é de uma cidade onde tem muita gente, porque logo, logo se percebe que você é de um lugar onde a população gigante", diz a Chiquinha. O Quico não entende nada – com razão! –, e ela prossegue. "População gigante quer dizer população ignorante, mas também quer dizer que é uma população onde há muitos habitantes".

E então o Quico tenta fazer a piada (piada?) com o Chaves. E consegue fazer pior ainda.

Daí vocês tanto me perguntavam: o que diabos quer dizer essa piada? Nada. Porque, em espanhol, ela também não tem o menor significado: apenas que os termos “gigante” por “densa” e “ignorante” por “mensa (tonta, idiota)”. Olhem aí, por volta do instante 6:30:


Eu já havia percebido isso logo de cara, mas não acreditei. Cheguei até a divagar e cogitei até um comentário meio pesado, do tipo "quanto mais gente, maior a ignorância", ou coisa do gênero. Mas minha interpretação não teria lá muita relevância para vocês, creio eu.

A resposta definitiva para esse enigma só veio há um mês, depois que tomei vergonha na cara e consultei a fonte de inspiração para esta série: o brilhante, genial, fantástico e espetacular site chavodel8.com. Eis a resposta, do nosso colega costarriquenho Esteban Portugues (juro, é coincidência!).

“A piada que você cita é de fato uma piada tonta e sem sentido. O único que se buscava com a frase é que a palavra mensa rimasse com densa. Além disso há pouca lógica no argumento. A partir daí se cria um jogo de palavras, e o Quico termina seu diálogo com o Chaves, mas confunde a oração”.

A moral da história? Até o Chespirito tinha dias ruins para fazer piadas.

terça-feira, 28 de maio de 2013

Fantasia de uma independência *

Era um outono que ainda não havia se estabelecido quando deitaram juntos naquela noite e se despediram com os mesmos rituais de outrora.

Ele se virou de lado, respirou fundo algumas poucas vezes e caiu adormecido com o mesmo impacto de uma âncora de um cargueiro recém-aportado. Nem sequer a percebeu inquieta ao seu lado, piscando com os olhos fechados e respirando de uma maneira acelerada, dissimulando um sono que nunca existiu.

Esperou ele dar o terceiro espasmo com o ombro direito, aprofundar a respiração, entreabrir as pálpebras e explorar o primeiro estágio de REM quando se descobriu, caminhou na ponta dos pequenos e caprichosos pés, com o zelo de não fazer o menor ruído possível e de não chocar as unhas mal pintadas contra o ruidoso e já um tanto desencaixado piso de madeira do cômodo. Despediu-se com uma mirada baixa para trás e um suspiro decidido.

Ela sabia que precisava escapar do coche naquela passarela estreita e escura enquanto ele não enveredasse para a longa e entediante estrada daquele vale deserto para onde se encaminhavam. Saltou e fugiu, sem pensar e nem pesar, para longe da culpa que ficava para trás. Ele sobreviveria: já havia passado por isso e conhecia todos os passos da vergonha derrotada que teria ao despertar.

Em algum momento ela imaginou padecer de remorso, mas rapidamente travestiu aquele sentimento em uma mescla de força e esperança. Seguiu o caminho do vento, que balbuciava a primeira sílaba do seu nome e a inebriava com aquele perfume novo de vida.

Enquanto isso ele se virou de maneira repentina na cama. Buscou-a com o braço estendido para envolvê-la em um abraço quando não a encontrou e abriu os olhos atordoado. Apalpou as dobras do cobertor e acordou sobressaltado.

Escancarou a janela do quarto e, ainda que com os mesmos olhos ofuscados do prisioneiro que acaba de deixar a caverna e se depara com a luz da verdade, enxergou um mundo de ponta-cabeça (ou finalmente em sua posição normal?). Gritou por ela, esvaziou os pulmões de tanto berrar seu nome.

Esteve paralisado pelo vento gélido que explodia contra seu peito até encontrar o bilhete que ela havia deixado sobre a cabeceira, declarando sua independência no verso do recibo de uma passagem de trem. “Sou livre agora. Fui viver minha vida como ela deve ser”.

* Devaneios sobre versos de um grito de independência

sábado, 25 de maio de 2013

Falsa poética


Há dias em que não me permito apenas ficar de mau humor. Não tenho o menor pudor em deixar que ele impere sobre mim.

Perco a calma por pouco e explodo. Para dentro, em silêncio. Me implodo.

E a primeira imagem que me vem à cabeça é de você. Sempre você.

Tento me empenhar para pensar em qualquer outra coisa, em qualquer outra pessoa. Me esforço e faço força em qualquer sessão de regressão a alguma época em que você ainda não existia.

Gasto energia. Esgoto minha mente, que, estafada, não me mente. E me devolve a tua figura.

Meu peito arde e também me rendo. Aceito pensar no que você estará fazendo agora. Sonhei que você iria me ligar hoje, ainda. Mais tarde. Ensaiei todo o roteiro que eu não saberei seguir quando meu telefone tocar.  

Cada vez mais anseio te ver. E tenho ânsia. Meu estômago se revira em movimentos semelhantes àqueles de quando eu esperava ansiosamente por você, nas tardes de sexta-feira, que eu declarei que seriam sempre nossas.

Respiro fundo para tentar manter um mínimo de domínio sobre meu organismo ao mesmo tempo em que ouço, em loop, a música que significa a declaração da tua independência. De independência de você mesma. De independência de mim.

Não, eu não estou fazendo isso certo. Sei disso.

Mas não sei realmente se quero mudar. Ou se não me deixo. 

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Confissão tardia


Somos amigos, certo?

E sei que você continua lendo meus relatos desastrados de vida, então... não sei, talvez este seja o tempo de eu te confessar algo que havia muito eu queria te dizer.

Te traí.

Durante todo aquele tempo eu te traí. Disfarcei, ocultei, neguei, menti, omiti... recorri a todos os artifícios que estavam à minha mão para tentar te persuadir de que você estava errada e eu não tinha outra paixão.

Mas eu tinha. E era uma paixão que, com o tempo, se tornou uma espécie de amor. Doentio.

Eu sabia que não conviveríamos juntos, nós três. Você nunca admitiria. Tentei, em alguns momentos, te sondar a respeito de tal possibilidade mas via, a cada intento, um repúdio cada vez maior nas tuas palavras, nos teus olhos, nas tuas feições, nos teus gestos.

Então fui fraco: sucumbi ao método mais fácil, de arriscar coexistir com aquela dupla identidade mesmo sabendo que, em algum momento, eu mesmo me boicotaria e atiraria ao chão aquela frágil e quase transparente máscara que você insistia em não ver (não via?).

Em determinado instante tentei lutar, te digo. Mas não com o empenho e com a garra que eram necessários e que eu tinha dentro de mim se realmente quisesse fazê-lo. Aquela situação, na verdade, era demasiado cômoda para mim. Segui adiante, mantendo um mínimo de discrição e apenas observando o decorrer dos acontecimentos como um passageiro da minha própria vida.

Mas aquela outra paixão me consumiu – e eu sabia que isso aconteceria, cedo ou tarde. Ela precisava de mim. E eu dela. Cada vez mais. Mesmo quando estávamos juntos, você e eu. E hoje penso que os momentos felizes que tivemos poderiam ter sido ainda melhores não fosse por isso.

Tarde demais, Inês já se decompôs. E não estou argumentando.

Na verdade, houve momentos em que eu desejei ser flagrado. Baixei a guarda, reduzi meu nível de cautela e aguardei até ser pego – e isso de fato aconteceu, mas me esquivei e tentei te driblar como foi possível. Me acovardei.

Com o tempo, hoje eu vejo, fui me afastando de você. Até o momento em que as coisas ruíram e eu pensei que, enfim, teria toda a liberdade que precisava para viver aquela segunda vida pela qual eu, em algum ponto dentro de mim, ansiava. Não nego, a tive. E a tenho, não reclamo.

Apenas... queria ser sincero contigo. E dizer que lembrei dessa pendência em relação a você, esta noite, quando me encontrei com essa corrosiva e destrutiva paixão, que eu persisto em manter.

Foi sem querer, até culpa minha. Comprei, pela primeira vez em tanto tempo, e por engano, aquele chiclete do sabor estranho que você tanto gostava. E o esqueci ali, aberto, no painel do meu carro, sob o último cigarro que jazia no maço.

Saí do trabalho, acendi o cigarro e quase engasguei com o gosto de culpa acumulada daquela tragada. Lembrei que tinha que te contar que sou um fumante. Durante todo aquele tempo, com exceções de dois dias, fui um fumante. E continuo sendo.

E não, não me orgulho nem um pouco disso.

Desculpe pela falta de sinceridade.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Mágoas de um casal


Há algum momento na vida em que os gestos corporais vão além do poder das palavras – afinal, as palavras nada mais são que um emaranhado de letras para representar algo que não sabemos exprimir.

Mas não falo de linguística, senão do casal de noivos que viajavam de trem. Ele, cabisbaixo, pernas abertas no banco do corredor; ela, com um olhar vazio para as paisagens murchas do subúrbio da cidade grande, as pernas retraídas e a testa apoiada contra a janela fria. Os olhos, verdes, tristes. O semblante, trancado.

Ele até tentava algum tipo de comunicação, mas desistia cada vez que ela respondia com um sacudir de ombros ou de uma torção da lateral dos lábios, como se soubesse todas as respostas e não lhas quisesse dar. Ele, então, apertava um dos cantos da boca e se limitava a baixar os olhos para a tela do celular, besuntada do suor dos polegares que a corriam de cima a baixo desesperadamente.

Não sei o que, especificamente, mas ele havia feito algo. Se lhe notava pelo ar arrependido que ostentava a contragosto. E ela, orgulhosa como o brilho dourado dos cabelos para trás, não estava disposta a ceder.

Tudo isso acontecia sem legendas, em qualquer idioma que eu não saberia compreender. Mas tampouco era necessário. Bastava observar aqueles dois para saber que as coisas não iam bem. Especialmente depois que ele tentou lhe tocar os cabelos e ela se esquivou como quem foge de um perigo iminente.

Houve, porém, um esboço de reconciliação. Quando ele, tímida e meticulosamente, cruzou os braços e apoiou a mão direita sobre o encosto da cadeira dela. Sorrateiramente, um de seus dedos rastejou por um vazio imenso até tocar a última falange de um dedo desavisado dela.

E, nesse mínimo contato, estiveram próximos. Próximos como um filho recém-nascido que agarra com todas as forças que ainda nem tem um pequeno pedaço de dedo daquele a quem em algum momento chamará de pai ou de mão.

Ele até tentava aproximar seu polegar para lhe acariciar aquele mesmo dedo, mas era refutado a cada oportunidade. Até que uma coceira na cabeça lhe colocou tudo a perder: os dedos se desencostaram e se distanciaram, para não voltarem a se tocar naquela viagem.

Voltaram a ser dois desconhecidos com uma mágoa em comum.

Ele girou a aliança de ouro branco no anelar direito. Pesava-lhe.

Ela observava a pedra brilhante que brotava sobre o anel de prata que levava no dedo médio esquerdo.

Talvez também não queira se casar.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Tudos, nadas e a receita da felicidade

Muitas vezes nos queixamos por não termos - ou por encontramos dificuldades gigantescas para alcançarmos - nossos tudos. E geralmente sequer sabemos o que esses tudos querem necessariamente dizer.

Mas acalmemo-nos. Toda essa angústia é passageira. E não, esta não é uma fórmula para que você consiga tudo aquilo o que você sempre quis, provavelmente de maneira obstinada.

Acontece que, em algum momento, a vida te mostrará o que você realmente é: nada. Absolutamente nada. Um pequeno ponto que fará pouca ou nenhuma diferença se aumentar, diminuir, continuar igual ou sumir. Desculpe te dizer assim, sem avisar, mas somos nada.

E tudo o que você quer, deseja, sonha, ambiciona, obseda... isso é menos ainda. É um puro nada. O teu tudo é nada. O tudo, nessa vida, é nada. Nada, nada e mais um pouco de nada.

Porque tudo o que queremos é apenas uma ideia fixa. Um objetivo vão que gera novas metas, novos quereres, novas ansiedades e novos fracassos.

Se queremos de fato encontrar algum pequeno pedaço do tudo que a vida tem para nos dar devemos abrir nossos olhos para os pequenos nadas que ignoramos, dia após dia. Algo que nos toque o peito no local exato que trava nossa garganta, nos treme a boca e nos injeta lágrimas de uma maneira instantânea nos globos oculares.

Falo de um grupo de crianças que perseguem bolhas de sabão até estourá-las e então correm para o outro lado gargalhando e caçando mais bolhas de sabão. Falo do menino com paralisia cerebral que os pais empurram na cadeira de rodas e ele observa maravilhado a paisagem de mar, barcos, céu, sol e gaivotas.

Porque esse menino, eu te garanto, é mais feliz em seu interior do que você e eu. Porque, eu não sei o porquê, seus olhos têm o brilho que a felicidade tem. O som da risada dele soa à felicidade. O movimento das mãos e da cabeça orquestram a canção mais feliz que alguém jamais ouvirá.

Admito que já tive dó de crianças assim. Sempre tive piedade pelo fato de elas estarem neste mundo para serem somente nada. Hoje eu as respeito, as admiro. Porque elas nunca serão um nada. Serão puramente livres de tudo o que há de mau nesse mundo. E serão simplesmente felizes. Porque simplesmente não se preocupam em serem felizes.

Porque a felicidade não está nos planos futuros. Não está naquela casa, naquele carro e nem naquela garota em quem você pensa todos os dias e todas as noites. Ser feliz talvez queira dizer viver o presente. E fazer de pequenos nadas da rotina um tudo cada vez mais sólido. Desapegando-se do passado e despreocupando-se acerca do futuro.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Recaída

Eu pensei que já havia sido capaz de domar minha mente e amortecer os impactos que os pensamentos diários sobre você causam no meu dia a dia. Mas não consegui sufocá-la. Dei-lhe um pequeno espaço de respiro e, sem perceber, me vejo novamente asfixiado pelo fantasma da tua existência.

Não lembro direito como isso começou, acho que foi quando sonhei com você. Ou com a tua família, já não sei. Sei que aquilo me afetou. Me derrubou durante um ou mais dias. Só que, ainda assim, segui soberano de mim mesmo. Tanto que me deixei afrouxar a folga no mecanismo que comprimia e censurava as recordações recorrentes sobre você.

Tudo corria bem, até mesmo quando eu me flagrava lendo e relendo a mensagem de aniversário que você me mandou e eu não respondi. Ou, então, quando ia procurar qualquer pessoa no Facebook e, automaticamente, digitava as três primeiras letras do teu nome. Ato falho, admito, mas nada que merecesse uma atenção maior da minha parte.

O problema foi quando você decidiu reaparecer em um sonho. Sem figura, sem perfume, sem som e nem nome. Era apenas “ela” na voz que morava em meus pensamentos e que me dizia o que fazer. “Não é dela que você sente falta? Não é ela por quem você tanto espera? Não é dela que você não consegue se livrar? Pois não desista! Busque-a novamente, reconquiste-a! Desta vez vai ser diferente”.

Acordei mal-humorado. Me culpava por haver baixado a guarda para mim mesmo e ter me nocauteado. Eu estava certo e eu estava redondamente enganado. Ao mesmo tempo, em todos os contextos e em todas as interpretações possíveis. Minha cabeça doía. Minha garganta se arranhava com cada gota de saliva que eu insistia em tragar. Meus ouvidos se tapavam e me tapavam qualquer som exterior. Éramos eu, meus pensamentos e meu novo resfriado.

Um resfriado, justo agora? Exatamente um ano depois de tudo o que aconteceu? Me obrigando a sentir os mesmos sintomas, na mesma época seca do outono, e a reviver as mesmas dores de antes? No mesmo anoitecer gélido e solitário que o mês de maio me impõe?

Sim. Sim, sim, sim e sim. Tudo de novo, inclusive o renascer das mesmas dores da alma que me abalaram e que se confundiram tanto com as complicações pequenas que um simples resfriado proporciona.

A cabeça que lateja, sobrecarregada de lembranças tuas. O nariz congestionado, que não consegue absorver o ar e que, na verdade, nem se preocupa em completar os movimentos da respiração. Apenas realiza, mecânica e aceleradamente, inutilmente, a ação descontrolada de inspirar e expirar. Inspirar e expirar. Cada vez mais rápido. Nspirar e xpirar, nspirar e xpirar, spirar e xpirar, spirar e xpirar, pirar e pirar, pirar e pirar, pirar e pirar.

A garganta fica seca. Seca por dizer tudo que tem engasgado por ali, arranhada por tantos sentimentos cortantes que lhe foram impingidos. Dói. Inflama. E clama por dizer tudo que deve e que não pode ser dito.

E o peito, que vive o maior paradoxo que poderia encontrar. Carregado e congestionado de tantas impurezas e ao mesmo tempo tão vazio e inóspito, que o coração se amedronta por estar em um lugar tão obscuro - teme o próprio eco das batidas sem ritmo que cisma em realizar sem nem entender por quê.

Nenhum resfriado me dói tanto como estes que vêm acompanhados de você. E queria – e queria talvez mais do que tudo – que fosse tão fácil me curar de você como de um resfriado qualquer.

Mas lá se vai um ano que eu continuo sofrendo desse mal e tendo recaídas e recaídas de você. E, nos meus delírios febris que tenho pelas manhãs sob dois cobertores, já não sei mais se você é um vírus que insiste em corroer meu organismo, um mecanismo de autoflagelação criado pelo setor doentio e masoquista da minha mente, uma assombração ou um vício do qual eu não consigo (e talvez nunca tenha querido) me libertar.