quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Encontrei teu Facebook


E quando dei por mim estava vendo tuas fotos, querendo mergulhar na tela do computador para te dar um abraço cheio de saudade. Olhar o teu sorriso e sorrir com ele, gargalhar das histórias que você tem pra me contar.

Foi lindo ver teu rostinho sorrindo para mim, me olhando, me chamando. Sim, você estava me chamando – mesmo sabendo que foi você quem escolheu essa distância incômoda e inconveniente entre nós. Era um teste. Eu não poderia novamente tentar atrapalhadamente me aproximar de você e estragar tudo. São as regras do teu jogo, que eu aceitei jogar ainda tão pequeno sem saber que seria tão longo, complexo e agoniante.

Somos personagens de um livro, você e eu. Minha amada de sotaque exótico, passados obscuros e histórias desencontradas, que sempre procurou o garoto inocente e romântico nos momentos mais improváveis. Que lhe ensinou o quão lindo pode ser o toque de uma mão feminina. Um abraço apertado. Um andar de mão dadas que parou o trânsito.

Reluto e refuto acreditar que apenas o acaso me tem traído. As cartas que nunca foram respondidas. A minha saída de casa no único dia em que eu deveria ter ficado para receber tua visita surpresa. O teu falso endereço que nunca esteve errado – e a falha imperdoável da minha memória. A tua ligação inesperada, ouvir a tua voz e ver que a linha havia caído.

Por você aprendi a falar tua língua. Vivi no teu país, morei na tua cidade, achei que te veria a qualquer momento e pensava que todos ali te conheciam e poderiam me ajudar a te encontrar. Amei alguém pensando que era você. Dei a ela o apelido que era teu, sem nem me dar conta – você vai me matar se souber que um dia te chamei, para mim mesmo, de cucarachita.  

Olhei novamente tuas fotos. Lembrei das minhas fotos. Aquelas que você tirou só para mim dizendo que me amava quando não sabíamos o que era o amor. Quando você me ensinou o que era se sentir amado. 

Já faz dez anos. Acho que eu posso aguentar mais dez se um dia souber que vou te ver de novo.

Olhei mais uma vez tuas fotos.

Decidi quebrar as tuas regras e te procurei. Prometo que vai ser a última vez. 

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Mais além do horário de verão


Duas datas no ano me fascinavam quando eu era pequeno: as vésperas do começo e do fim do horário de verão. Eram dias tão especiais para mim como o Natal, meu aniversário e o Dia das Crianças.

Mal terminava de almoçar, saía pela casa da minha avó e pela minha casa adiantando ou atrasando os relógios, meticulosamente em uma hora. Ali me aclimatava para o novo fuso – um dia era tempo demais para eu me acostumar. Só deixava um relógio, o meu despertador, no horário antigo. Gostava de acordar ainda zonzo, ter a sensação de que havia dormido demais e só depois me dava conta da hora verdadeira.

É mais do que sabido que a vida naquela época era mais fácil. Mais linda. Mais suave e mais divertida. Era uma puta duma vida. E eu sabia disso.

Naquela época eu sabia aproveitar da melhor maneira as pequenas felicidades da vida. Não era raro eu colocar o despertador para tocar às 3 da manhã, me levantar no susto, olhar o horário e virar para o lado extasiado. Mais três horas para dormir. Aquilo sim era o paraíso.

Houve momentos difíceis, também. Lembro quando havia caído no sono um dia de dezembro no sofá da sala e o telefone de casa tocou por volta das duas da manhã. Ouvi meu pai receber a notícia que eu já sabia. Ele desligou o telefone, e eu continuei ali fingindo que dormia. Fingi tão bem que em dado momento acreditei em mim mesmo e só acordei no dia seguinte.

Meu pai, então, me contou que minha avó havia morrido. Era a pessoa de quem eu era mais próximo naquele 1999 esquisito. Não chorei, não de cara. Eu já estava preparado. Não foi doloroso. Foi uma transição fácil, para falar a verdade. Apesar da saudade, da tristeza, da oração, do adeus que nunca nos dissemos. Eu sobrevivi.

Fico imaginando hoje, como seria minha reação. Eu, tão vulnerável que perco o sono por coisas tão menores. Acho que passaria uma noite inteira sem dormir. Acenderia um cigarro e depois outro cigarro e depois mais um cigarro. Sentiria um vazio no estômago, no peito, no cérebro, na alma, na vida, no mundo. Talvez levasse meses, um ano, quem sabe, para me recompor.

Eu já fui mais forte.

Sei disso porque ainda não ajustei meu relógio para o novo horário – ele continua no fuso do verão.

Talvez seja eu quem não queira enfrentar os problemas de frente. Ainda queira, de uma forma ou de outra, viver no passado. E empurrar minhas angústias para debaixo do tapete me dá essa impressão, de que vivo uma vida amena e tranquila. E ainda tenho tempo para ser nostálgico.  

Acho que isso me corrói. 

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Desembarque

Não tinha expectativa alguma quando soube pela primeira vez sobre você. Minhas exigências eram baixíssimas, a bem da verdade, mas a primeira impressão foi péssima. Não fazia meu tipo, não me enchia os olhos, não me chamava a ponto de parar minhas atividades para te ver.

Falavam que eu estava me fazendo de difícil. Que não custaria nada te dar um voto de confiança, acreditar que as coisas desta vez seriam diferentes – diferentes de todos os fracassos de tempos atrás, com pessoas cujo nome hoje sequer me lembro. Não era isso. Nada contra você, repito.

Até para provar para mim mesmo que não era você quem eu queria, aceitei te conhecer melhor. Saber um pouco mais de onde você era, o que havia feito até então... e confesso, acabei gostando um tantinho de você. Já conhecia um pouco da tua cidade, das tuas manias, dos teus costumes, da tua cultura, do teu sotaque. Poderíamos ser bons amigos, nos dar bem até onde o tempo permitisse. Por que não?

Mas com o passar do tempo, oh! Dia após dia você foi me conquistando. Gostava de te ver, gostava da tua roupa, que combinava perfeitamente com você dia após dia. Gostava da tua simpatia, dos teus gestos, das tuas artes, dos teus êxitos, do teu humor peculiar, da maneira que você me entendia quando eu te falava. E, eu sei, eu era quem melhor te entendia. Deixei que isso preenchesse todos os vazios da minha vida.

Acompanhei de perto a tua escalada, a tua evolução. Você, uma pessoa totalmente desconhecida quando chegou, desbravou terras para conquistar teu espaço. Venceu, me encheu de orgulho. E que orgulho eu tinha de saber que havia uma parte de mim em todos os teus triunfos. Sei que o mundo já não me aguentava mais falando única e exclusivamente de você.

Hoje é difícil especificar um momento, mas sei que foi rápido que comecei a... te amar? Sim, foi isso. A palavra era forte, mas eu não tinha dúvida disso. Era real o que eu sentia. E tive total certeza disso quando você também disse, para que todos ouvissem, que você também amou.

Reconheço que, apesar de tudo, aquele não era o meu melhor momento. Não sei por que, fui menos do que poderia. Mas me escorava em você, naquele momento difícil, para me manter em pé. Você não sabe o quanto isso foi importante. E o quanto você foi importante.

Temi meu primeiro tombo. Achei que fosse te perder – naquele momento, você já era muito mais do que eu. Tudo conspirava para que você me deixasse. E eu entenderia, não guardaria mágoas. Mas você foi diferente. Jurou fidelidade, jurou lealdade. “Estamos juntos”, você dizia. Ah, quanta esperança isso me dava! Você me havia ganhado.

Por mais que aquele tombo me houvesse ferido, consegui começar a me reerguer, pouco a pouco. E te ver ali, no lugar de sempre, com as mesmas atitudes de sempre, me revigorava. Renovava meus ânimos. Sabia que, nos piores momentos, estaríamos juntos. E nos recuperaríamos para nunca mais esquecermos um do outro.

Até que me falaram. Não quis acreditar a princípio, preferi manter um mínimo de esperança de ouvir da tua boca que tudo aquilo era mentira. Não sei por que, você preferiu não dizer. Quero pensar que o fizeste porque também sofrias, e não por covardia. Mas ler tuas palavras me feriu como se um gancho me rasgasse o peito, abrindo um corte de fora a fora que jamais seria cicatrizado. Você disse que amou. Me desculpa, você nunca amou. Reconheço minhas falhas, mas nunca vou abrir mão das minhas crenças: quem ama não abandona. E você me estava abandonando.

Ainda incrédulo, te vi partir. Crente de que te arrependeria ao passar da primeira hora. Mas você se foi. E horas depois te vi com outro. Com fotos, e gestos, e promessas iguaizinhas às que, eu pensei, fossem apenas para mim.

Tenho vergonha em dizer que às vezes torço pelo teu fracasso e maldigo teu sotaque, tua cultura, tua terra. Liga não, é apenas a dor da perda. Se te odeio é porque esse amor mal correspondido dói. Se não te amasse, não ligaria para você. Não veria tuas novas mensagens de amor, tuas publicações embebidas de esperança e insegurança, vivendo esse suposto novo amor que acabou de começar.

Um dia passa, como já passou outras vezes, e eu talvez perceba que tenha apenas te supervalorizado. E lembre com carinho de você, vibre com tuas futuras vitórias. 

Ah, Hernán Barcos. Você não tinha esse direito de deixar o Palmeiras.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Entenda as piadas sem sentido do Chaves: Quico não comia em aparelhos sanitários


Que o Quico é almofadinha, todo mundo já sabe – no mundo atual, talvez fosse um coxinha (na real, nunca entendi essa de coxinha; talvez eu também seja um coxinha, você também, todos nós). Só que não precisava jogar na cara do Chaves e da Chiquinha que ele só come em pratos refinados, não é?

Seja lá como for, é difícil entender por que o Chaves se diverte tanto quando o Quico diz que não poderia brincar de comidinha em pratos de papel porque só comia em aparelhos de porcelana. Mas sempre há uma explicação, como veremos aqui nesta elucidação express sobre essa piada mais ou menos sem sentido. Vejam só, em 14:30:


Difícil como ele associa imediatamente o termo “aparelhos de porcelana” a “aparelhos sanitários”. Por mais que não me seja totalmente estranha essa ligação (talvez minha avó tenha falado alguma coisa assim no começo da longínqua década de 1990), a piada original não se perde no tempo. Pelo menos, não no México.

Na versão original, é quase imperceptível essa piada. Vale citar que, nos episódios em espanhol, a dicção do Quico é algo bem mais difícil, já que o Carlos Villagran tinha que falar com as bochechas infladas. E por isso a confusão do Chaves tem lá seu sentido.

Acontece que o Chaves não entende porcelana, mas sim borcelana. E no México, sim, borcelana é uma gíria comum para privada, vaso sanitário ou seja lá como vocês chamam.

Ah, mas então. Ainda assim, o Quico fica meio constrangido e tenta explicar que os aparelhos de porcelana não eram a privada, mas sim baixelas – ou seja, pratos, travessas, molheiras e afins. Na continuação, ele associa “baixela” à Chiquinha, baixinha. Tem lá seu sentido, convenhamos.

Em espanhol, porém, a associação “baixela” e “baixinha” é mais lógica. As palavras, por mais que se escrevam de uma maneira diferente, têm a mesma sonoridade. Eu explico.

Baixela, em espanhol, seria vajilla (leiamos "barrija"). E a Chiquinha, no caso, seria... baja? Bajita? Sim, pode ser. Mas também... bajilla (leiamos... "barrija"!). Isso porque os diminutivos em espanhol podem ser criados de duas maneiras: com o sufixo –ito(a), para chiquito, ou com o sufixo –illo(a), para Felipillo, o amigo da Mafalda. Pelo menos para mim, o –illo é menos usual, mas mais carinhoso. 

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Entenda as piadas sem sentido do Chaves: você comeu a que eu gosto e eu comi a que ela gosta (lagosta)

Muito embora o Chaves tivesse visto o mar apenas pela televisão até ir a Acapulco/Guarujá e mal tivesse o que tomar de café da manhã, é totalmente plausível que ele já tivesse comido lagosta. E ele mesmo admite isso, de uma maneira tortuosa, no episódio Peixe cru faz bem para a memória.

Olhem só:



Ok, vamos concordar: baita trocadilhozinho fraco esse, né? Por mais que eu seja eterno defensor das dublagens a série, a explicação de que Chaves e Chiquinha tinham duas tortas, ela comeu a que ele gosta e ela comeu a que ela gosta é... ruinzinho.

Não que essa seja uma piada extremamente engraçada na versão em espanhol do Chaves, mas pelo menos o trocadilho é mais bem feito. Vamos ver se vocês entendem, assistindo o vídeo a seguir (preferencialmente a partir de 14:30):



Notaram aí alguma diferença básica para o trocadilho? Em espanhol, lagosta se diz langosta. Nada lá muito diferente da palavra no nosso idioma, né? Mas esse N vai fazer toda a diferença no decorrer da piada. Vamos lá:

Segundo o Chaves, havia duas tortas (que eram de feijão, diga-se). A Chiquinha comeu a mais ancha... ou seja, a que era mais grossa, a mais recheada. E o que restou para o chaves? La angosta! L’angosta! Langosta!

E o que é angosta, minha gente? Não temos essa palavra em português e me atrevo a dizer que não há um termo assim... perfeitamente traduzível para isso. Apenas quem já andou por calles angostistas no interior argentino pode entender melhor o que é angosto, como a minha saudosa e querida Caseros, na Manzana Jesuítica, no centro de Córdoba.



Mentira, apenas estou sendo nostálgico e matando a saudade de um passado que não volta mais.

Agora falando sério: a torta angosta seria... a torta mais estreitinha, mais fininha.

Coitado do Chaves, né? Depois não sabem por que ele fica comendo os peixinhos dourados da Chiquinha...

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Às vezes não penso em você


E é quando vivo meus melhores momentos. Quando amo o mundo e sorrio para o futuro. Quando tenho aqueles ataques gostosos de ansiedade. Quando minha mão tremelica na hora de anotar um número novo na minha agenda. Quando me arrepio por sentir o toque de outra pele contra a minha. Quando fantasio a perder de vista meus próximos dias, meses, anos... 

Não pensar em você é o grande avanço que eu consegui para a minha vida nos últimos tempos. Acho que já até cheguei a passar dias inteiros sem lembrar que você existia. Foram dias alegres, de plena felicidade. Não te odiei por nenhum segundo, não senti falta da tua companhia e nem do teu olhar que brilhava por mim a qualquer hora do dia. Não me senti só. Pensar em você me traz solidão. É estranho. 

Não ter você dentro da minha cabeça me traz muitas coisas boas, sabe?

De verdade. Eu consigo ter sensações que havia muito não tinha, posso ouvir aquelas músicas divertidas que eram minhas e que eu deixei que fossem nossas e não tenho vontade de vomitar escutando aquelas mesmas notas, repetindo aqueles versos desgastados. E posso até ouvir as tuas músicas, que eu peguei emprestadas para mim, e achá-las bonitas por mim mesmo.

Deixar você fora da minha cabeça me traz tranquilidade, me dá a certeza serena de que você não virá me procurar. Não virá me seduzir com a tua doçura, me fazer rir com teu humor único, não transformará minha paz artificial em uma angústia sem fim. É bom fingir que você foi só um sonho, como vários outros que eu já tive e com os quais eu nunca mais sonhei.
  
Não recordar, por um mínimo instante que seja, que você existe... me faz ser um novo personagem. Mais seguro, mais desapegado, mais centrado, mais... evoluído e maduro? Pode ser.

Não pensar em você me faz uma pessoa diferente.

E quando eu percebo que estou mudando demais e perdendo a mão quanto a isso, dou um jeito de pensar em você. De lembrar do teu rosto perfeitamente assimétrico, do toque carinhoso da tua mão, do amor do teu beijo, do tom suave da tua voz, da tua risada de criança inocente. 

Não quero ser ninguém diferente.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Entenda as piadas sem sentido do Chaves: o que vale mais? 1 gol contra ou um oitavo? Uma corrida ou um terço?


São poucas as falas do Chaves mais nonsense que as questões que o Seu Madruga resolve fazer para as crianças da escolinha quando o Professor Jirafales vai dar uns pegas na Dona Florinda, né? Por muito tempo quebrei minha cabeça (mentira, só desistia quando não encontrava respostas) até resolver ir mais a fundo. Maravilha um dia de 25 horas com o fim do horário de verão, né?

O que vale mais? 1 kg de tomate ou 1 kg de cebola? Um gol contra ou um oitavo? Uma corrida ou um terço? – e menção honorável para a réplica do Godines, que deixa o Seu Madruga totalmente desconcertado: ao ar livre ou em quadra?



Meus caros, não adianta quebrar a cabeça para tentar encontrar algum sentido lógico nessas piadas em português. É preciso abrir nosso cérebro para o portunhol e tentar ouvir uma, duas, quantas vezes forem necessárias o mesmo diálogo na série em espanhol, no vídeo abaixo a partir do instante 5:00. Ou ter paciência e ler esse texto até o final J.



Acontece o seguinte... primeiro, o Seu Madruga pergunta para a Pópis: qué vale más? 1 kilo de jitomates (calma, isso ainda é tomate, em português ou em espanhol... mas os mexicanos gostam de conservar a origem do nome asteca da fruta: xitomatl) o 1 kilo de cebollas? Nada novo até aí, ok? O tomate tá bem mais caro que a cebola. Então todos aprovados, vamos para a próxima.

Ñono, qué vale más? Un gol de campo o un... doischown? Pois então… inicialmente pensei em um gol de campo, mas... não faz sentido marcar um gol de fora do campo, correto? Mas... lembram que o Seu Madruga era o coach de futebol americano que cocheava o Quico? É isso, meus caros! 

Gol de campo...  nada mais é que um field goal, a jogada em que a galera resolve chutar a bola oval no naquele gol estranhão do futebol americano! Logo, aquela coisa impronunciável que o Seu Madruga pronuncia nada mais é que um... touchdown! (Não julguemos o Seu Madruga, a pronúncia dele em inglês não é tão boa assim, como já vimos aqui antes). E um touchdown vale mais que um field goal, apenas para esclarecimento. Vamos supor que todos aprovaram, certo?

Então chegamos à pergunta final, a mais intrigante do seriado. Godines, qué vale más? Una corrida o una tercia? E então o Godines prontamente questiona: en abierto o en cerrado?

Foi difícil entender isso, mas basta partirmos do seguinte pressuposto da questão anterior: os mexicanos, sabe-se lá por que, traduzem alguns termos ingleses de uns esportes. Como o próprio field goal. Percebi isso vendo o último Super Bowl em uma web telegato com transmissão em castelhano: jogavam os Cuervos de Baltimore (aka Baltimore Ravens) contra Los Cuarenta y Nueve de San Francisco (San Francisco 49ers).

E aí o que temos? Pôquer! Uma tercia, em espanhol, seria o que conhecemos como uma trinca (three of a kind), a sétima combinação mais alta do carteado. E a sexta combinação mais alta é a... corrida! Ou a sequência (straight)!

Daí já sabemos que uma corrida vale mais que uma tercia, certo? Mas o que isso tem a ver com o “en abierto” ou “en cerrado”? Acontece que o pôquer possui uma série de variações, dentre elas a aberta e a fechada – ou seja, todos os jogadores vêem as cartas dos demais.

Honestamente, me limito a saber malemale jogar o estilo Texas Hold’em, por isso não posso sair falando bobagem se a trinca vale mais ou menos no pôquer aberto ou no fechado. Mas... parece que o Seu Madruga também não sabe, por isso aprova o Godines (e se algum especialista souber informar isso, à vontade, por favor).

Ok, entendemos que, na versão original, as perguntas do Seu Madruga têm lá seu sentido, né? Mas então por que diabos a versão em português usou termos tão sem sentido na dublagem?

Simples: Chaves chegou ao Brasil na década de 1980, quando não havia internet para pesquisar, futebol americano e pôquer eram esportes praticamente desconhecidos por aqui e não tínhamos a ESPN para transmitir essas modalidades.

Estamos entendidos?

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Fortaleza de cartas


Vejo minha vida como um pequeno castelo de cartas, construído por uma criança que não consegue manter a calma nos momentos de tensão e se estabana na hora de equilibrar duas paredes finas e suaves sobre o piso mole e escorregadio das costas do baralho.

Por muito tempo meu palacete esteve lá, firme, imóvel, soberano, exposto orgulhoso para quem quisesse vê-lo e admirá-lo. Mas, querida, ele veio abaixo em uma noite na qual a criança que o havia construído estava dormindo feliz, sonhando coisas lindas. Não foi fácil quando ela abriu os olhos, se errou pela sala e viu que tudo havia ruído.

Ela não se achava capaz de refazê-lo. Não sabia como reconstruí-lo, nem se lembrava direito como havia erguido semelhante fortaleza com cartas tão debiluchas de um baralho que encontrou sem querer por aí.

"Você consegue", alguém lhe disse. E isso era a pior coisa que poderia ouvir. Não queria conseguir de novo. Queria fechar os olhos naquela noite, abri-los na manhã seguinte e ver tudo ali novamente em pé como antes. Era impossível refazer tudo.

Esperou por muitas noites que seu palacete fosse reerguido. Não tocou nenhuma carta, mas elas tampouco fizeram muito esforço para se remontarem uma sobre a outra, naquela mesma ordem que ele sabia quase de cor. Seguiram ali, impassíveis.

Até que, em uma tarde de tédio, decidiu se empenhar naquela aventura. Precisava - e queria - um pouco de emoção.

Criou bases sólidas, com as cartas de 2 e 10 que encontrou. Errou, se atrapalhou todo. Demorou a achar o ponto de equilíbrio para estabelecer as primeiras unidades.

Até hoje, me falaram, pouco avançou. Ainda comete os mesmos erros ao empolgar-se demais quando conclui um andar e parte desastradamente para o outro. A própria respiração ansiosa, os próprios dedinhos incertos e instáveis, trêmulos, lhe colocam tudo a perder. E se deprime a cada implosão de cartas.

Respira fundo. Recomeça e recomeça e recomeça. De novo, de novo e de novo.

A dama e o rei de copas não aguentam mais esperar, separados de todo o resto do baralho, para voltarem ao topo de seu império destruído. E a criança vai dormir, e às vezes sonha com o castelinho tão lindo e gigante e quase perfeito que havia construído e que já não existe mais.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Realidade melhorada

Esqueça tudo o que eu já disse antes.

Esqueça a dor do mundo.

Esqueça as injustiças.

Esqueça que a vida não vale a pena.

Esqueça quem não vale a pena.

Esqueça tudo o que te faz mal.

Esqueça quem te faz mal.

Esqueça as dores físicas.

Esqueça as dores da alma.

Esqueça as angústias que te tiram o sono.

Esqueça as tuas preocupações.

Esqueça as preocupações do mundo.

Esqueça, ainda que por um instante, a fome na África.

Fique bêbado, ao menos uma vez na vida.

E veja como a vida é linda.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Mar de desgosto, ondas de lembranças


Um dia me tranquei no meu quarto, fechei as janelas e me pus a pensar apenas sob a luz das brasas dos cigarros que eu devorava com uma voracidade semelhante à de uma criança com sede tomando um copo de refrigerante gelado.

Precisava achar uma resposta para a pergunta que me atormentava a tranqüilidade. Como eu falhei? Onde, em que momento, com qual palavra, em que instante de segundo?

Respirava fundo, o mais fundo que podia, para tentar captar no ar algum despojo teu. Eles ainda estavam por lá e me traziam incontáveis memórias do teu carinho.

Da tua mão no meu rosto quando me sorrias e dizias “bo...ni...to”, assim suavemente, quase sem completar o som das consoantes – "bvoñito", "uboíto",eu escutava.

De quando eu supervalorizava meus resfriados e repousava a cabeça no teu peito para sentir teus dedinhos despenteando meu cabelo.

De quando terminavas de me beijar, ficavas nas pontinhas dos pés e me asfixiavas com um abraço de saudade. Me enforcavas, eu não podia respirar. Era como se eu morresse e voltasse à vida, mil vezes, sempre do teu lado.

Suspiro. Olho para o lado e vejo o pinguim de pelúcia com cara de mau que você me deu um dia. E que eu sempre levava quando ia dormir natua casa para que ele pudesse encontrar os amiguinhos, teu cachorrinho e tua porquinha, e passassem horas confabulando.

Agora ele me mira, com a cara ainda mais maldosa. Franze as sobrancelhas e afina o bico. Tenho medo dele, mas o trago mais pra perto. Tento encontrar nele algum vestígio dos teus perfumes. 

Sinto o cheiro da tua casa e ouço ao fundo aquele country que você pôs para tocar quando estávamos na tua cama. Repito e repito e repito na minha cabeça a lembrança de quando eu te disse "ei", e você me respondeu "hey, I'm Johnny Cash". 

Relembro dias e mais dias em que estiveste por aqui e eu por aí. Uma força me comprime o peito e me vibra a garganta.

Respiro fundo, aos solavancos, tembladamente (isso existe?).

Talvez eu tenha simplesmente te perdido.

Era mais fácil pensar que eu havia falhado.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

O abraço induzido

Há milhões de tipos de abraços na vida: o partido, o vazio, o falso, o bem intencionado, o mal intencionado, o de bêbado, o de amor, o de consolo, o de apoio, o de saudade, o de reencontro, o de tchau com uma sensação de adeus (e esses doem demais, confiem em mim)... Todos eles merecem uma análise, mas são poucos os que me empolgam tanto quanto o abraço induzido.

Vamos falar sobre paixões. Passageiras, efêmeras, ansiosas, platônicas (ah, as platônicas!), duradouras, empolgantes, fulminantes, inesquecíveis, inventadas... não importa qual, todas elas alcançam um novo patamar no primeiro abraço. Que é um abraço induzido, pode acreditar - ou ao menos se você for uma pessoa extremamente atrapalhada lidando com novas paixões.

Na verdade, não sei muito como explicar essa situação, então... vamos inventar uma história que pode ser que tecnicamente eu tenha vivenciado.

Havia uma garota. Linda. Quase inatingível, até que você é flagrado olhando de longe para ela. E ela responde. E há uma troca de olhares. E isso se repete várias vezes, até que você faz uma ligeira mudança na tua rotina para poder trocar olhares com ela algumas vezes. Aí um dia ela te sorri. E no outro muda o caminho para te ver. E vocês começam a conversar.

Essas conversas se repetem, várias vezes, durante algumas semanas. Um dia vocês se dão um beijo no rosto; no outro, toca as costas dela. Depois ela te toca o ombro, e você retribui espalmando a mão sobre a bisteca (termo técnico: região lombar, meio palmo abaixo da última costela) dela. O terreno está pronto para o primeiro abraço.

Mas ainda assim há uma insegurança, agonizantemente gostosa. Até o momento em que os corpos clamam por se aproximarem, se tocarem, se sentirem. Só que algum comando faz com que os músculos, dos dois corpos, titubeiem. Tremem incertos. Ameaçam refugar. Quase refugam. Mas se tocam, em algum ponto se tocam, sabe-se lá como. E aquilo, aos poucos, se torna um abraço.

O que era incerto a princípio se torna a primeira chance de testemunhar que aquele coração bate única e exclusivamente para você naquele instante, contra teu peito que igualmente lateja ao ritmo da mais pesada música de trash metal que você jamais ouviu. De aspirar profundamente aquele perfume, de absorver aquele aroma que te inebria mais do que um lança-perfume. De sentir um calor em cada milímetro das tuas costas acariciadas por aquelas mãos suaves. E de realizar, por dois ou três segundos que seja, que a vida é boa quando os seios, suaves, dela se espremem contra o teu peito.

A eternidade desse curtíssimo abraço faz tudo até ali ter valido a pena.  

Não interessa o que virá depois.

Não interessa o que veio depois.