domingo, 29 de junho de 2008

Sobre o riso

Dizem por aí que o tempo é o melhor dos remédios. Discordo. Que me desculpe o dito popular, mas o riso... o riso é indubitavelmente o melhor dos medicamentos. É um alívio, como sugere o Word no dicionário de sinônimos para a palavra ‘remédio’.

Mas há vários, vários tipos de risos. Tem o riso falso, que não leva a lugar algum. Há também o irônico, que muitas vezes machuca o interlocutor. Tem o desesperado, que é a porta de acesso para a loucura. O melhor riso mesmo é aquele que vem de dentro, sem explicação alguma, às 5h38 da manhã de um domingo.

Foi mais ou menos a esse horário que meu cachorro latiu anunciando para o restante da família que eu estava chegando da rua. Sóbrio, completamente sóbrio após passar horas em um bar tomando Coca-cola. Lei seca, lei seca... nada de álcool se estiver dirigindo, ou carro apreendido e motorista na cadeia.

Estava bem sóbrio quando abri a geladeira e peguei uma cerveja, sentei no sofá de casa e liguei a televisão, esperando assistir ao jogo da seleção brasileira feminina de vôlei. Mas sequer cheguei a vasculhar os canais a cabo: logo de cara, vi que o SBT estava transmitindo aquele quadro do Bolaños que não emplacou, o Pancada Bonaparte (que tem Chespirito e Professor Girafales como loucos e o jargão ‘não há de queijo, só de batata’). Bem sem graça, diga-se, mas que não me deixou de mudar de canal.

As piadas eram as mesmas de sempre. Previsíveis, corriqueiras e algumas até forçadas, como ‘escovar os dentes do serrote’. Mas foi o bastante para me fazer rir, e só não me fez rir alto em respeito a minha mãe, meu irmão e meu cachorro, que estavam dormindo.

Sabe o que é mais legal nessas horas? É que não é preciso fazer alguma piada, seja inteligente ou escrachada, para rir sem motivo. Em horas assim a gente apenas... ri.

Quando se tem um riso assim, é inevitável que todos os problemas ou as dores passadas sejam esquecidos. Reclamações, constrangimentos, lamúrias e coisas do gênero? Ah, que nada! O momento era mesmo de rir. De rir alegre, de rir empolgado, de rir aliviado.

Nota da redação: Putz, e Chaves acabou de começar. A grade de programação do SBT é deveras interessante a esse horário.

sábado, 28 de junho de 2008

Palavras que valem a dor do mundo

Estava aproveitando o banco vago no metrô lotado para colocar em dia minhas leituras universitárias um dia desses. Perto do ponto final, com o trem já vazio, notei que ao meu lado havia um papel dobrado, escrito com uma bela, bela letra feminina.

Era um longo texto. Ousei tomar posse e lê-lo, e acabei tendo conhecimento da carta de amor mais bem escrita que já vi. Não tinha o nome daquele que receberia aquelas lindas palavras, e nem quem a tinha escrito. Mas isso, certamente, seria papel secundário.

Peço desculpas à autora, que por certo tem sua veia de escritora e teria todo o direito de cobraros direitos autorais. Mas publico aqui, neste humilde blog, a mais bela carta de amor que esses meus olhos míopes já leram.

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(Primeiramente: meu amor por você é tão grande que as palavras fogem com medo da responsabilidade. Mesmo assim vou tentar.)

Hoje faz duas semanas que meu coração começou a bater em ritmo acelerado e diferente. Duas semanas que você não me sai da cabeça. Duas semanas de noites de sono reduzidas. Duas semanas de diálogos constantes. Duas semanas que parecem dois anos. Hoje faz exatamente duas semanas que eu descobri que estava completamente apaixonada por você.

Qualquer pessoa normal duvidaria da nossa história e da intensidade dos nossos sentimentos. Confesso que até eu me assustei e duvidei a princípio, afinal, nunca tinha vivenciado ou conhecido algo semelhante. Mas quer saber? O amor não tem regras e o desejo não tem limites. E eu aceito sentir sem entender.

Meu coração acelera só de pensar em você e fica pequenininho toda vez que você vai embora, seja da rodoviária ou da internet. Meu coração, assim como eu, é exagerado e faz drama. E ele precisa de você o tempo todo. Dois egoístas. Meu coração e eu.

O fato, amor, é que a sensação que eu tenho é que a gente se ama há muito tempo. Não consigo me sentir precipitada, ou exagerada, muito menos falsa quando afirmo que você é o amor da minha vida. A verdade é que eu tenho vontade de dizer isso o tempo todo... e eu senti isso quando os nossos olhares se cruzaram pela primeira vez. Bastou o seu olhar que economiza palavras e eu tive a certeza de que isso tudo é real.

Ah, meu amor, se você pudesse ter escutado o meu coração quando eu olhei nos seus olhos... cheguei a acreditar que era um faz-de-conta moderno, mas de “faz-de-conta” não tem nada. Todos os meus sintomas patológicos e psicológicos provam que nada disso é ilusão ou mentirinha.

Pois se eu sinto dor de saudade, palpitações, frio na barriga, ansiedade, vontade, necessidade... pois se minhas mãos já se acostumaram com as suas, meu beijo quer só o seu beijo, os meus braços procuram o seu abraço, minha pele necessita do seu toque, meu coração abriga o seu...

E, sinceramente, eu não vivo o futuro. Eu não sei que caminho seguiremos, o que iremos conhecer, viver, provar. Eu só sei o que quero. O que devo. Agora. E agora você é a minha certeza. O meu bônus da felicidade e da sorte. O meu presente. A minha alegria. O meu amor. Agora eu não me imagino mais sem você e te quero louca e perdidamente.

Você é a melhor poesia do meu dia. E eu não sei mais quem eu sou, mas eu gosto de mim assim. E vou. Enquanto isso, meu coração me engole. Engole minhas palavras, meu desejo, me alimenta.
Existe uma frase linda da Adélia Prado que diz: "uma noite estrelada vale a dor do mundo". Amor, você vale a dor do mundo. Nossos beijos valem a dor do mundo. Nossos toques, nossos sorrisos, a nossa cumplicidade, nossos abraços, a nossa saudade, nossas frases, cheiros. O amor que existe dentro da gente vale a dor do mundo.

Só sei, meu bem, que com você eu descobri que a vida pode ser muito mais fácil quando se tem alguém para somar e planos para dividir.

Como você faz tudo parecer tão fácil?

Amar nunca foi tão bom. E eu te amo.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Nostalgia fotográfica

É inegável que as câmeras digitais revolucionaram o mundo da fotografia, e também nas relações sociais e na vida pessoal de cada um.

Hoje em dia tornou-se algo extremamente banal tirar uma fotografia. Pode-se tirar no metrô, no meio da rua, no cinema, na praça, na balada, em qualquer ponto turístico... onde a sua imaginação desejar e seu senso-crítico permitir.

Tudo isso porque, hoje em dia, não há mais aquele trabalho de comprar filme, mandar revelar... economiza-se uma grana e tanto. As fotos não queimam, e melhor ainda: se você não gostou de como saiu na imagem, basta apagar a foto anterior e tirar uma nova. Prático e interessante, não é?

E agora todos podem ter quantas fotos desejarem, sem ocupar espaço físico: basta alguns kbytes no computador, e voilá. Um, dois, dez... quantos álbuns diferentes forem necessários, com milhares de fotos sobre inimagináveis cenas. Até mesmo uma parede branca pode virar uma fotografia, por que não?

Hoje em dia, todo mundo tem pelo menos uma foto sequer no computador. Anos atrás, quando a internet ainda engatinhava, eram raríssimos aqueles que tinham uma imagem pessoal armazenada. Dava um trabalhão tirar a foto, revelar... e ainda era preciso escanear. Pior: encontrar alguém que tivesse um scanner! E então você conversava com alguma ‘gatinha’ no bate-papo da UOL e era obrigado a formular na sua própria imaginação com quem você falava. Atualmente... putz, como é mais fácil!

Mas isso não quer dizer necessariamente que atingimos a perfeição, no que diz sentido à fotografia. E eu, particularmente, sinto saudades dos tempos passados, quando as Yashicas manuais eram as máquinas populares e as Kodak com rodagem automática do filme, as de luxo.

Pode parecer antiquado e tudo, mas eu sinto falta das fotos de papel. Aquelas que você ansiava semanas para poder ver ali, de verdade, na sua frente, para relembrar aquele momento especial ou aquela viagem inesquecível. E ela estava ali, palpável, em um papel brilhante. E não na tela do computador.

As fotos reveladas também tinham uma... uma aura diferente (que sequer se compara à aura das fotos digitais que você manda revelar: não têm graça). Aquela foto da amada que você encontrava no fundo da gaveta, segurava em suas mãos, olhava em seus olhos e passava as pontos dos dedos no rosto da garota. Era quase a mesma sensação que passar a mão no rosto de verdade dela.

Hoje, se você encontra uma foto de uma antiga paixão em alguma pasta do seu computador, você faz isso? Passa a mão com todo carinho na tela do computador? Aquela mesma em que você conversa com pessoas no MSN, faz trabalhos da faculdade, vê notícias (algumas bem mal escritas) e sabe-se lá mais o que você vê? Eu, não!

E... vai falar que há presente melhor do que ganhar de uma garota a foto, para ser deixada em um porta-retrato na cabeceira da sua cama, ou então para ser perdida na gaveta e encontrada anos depois? Nos dias de hoje, você ganha mil imagens nas transferências de arquivo do MSN... e ainda pode tratá-las no Photoshop. Uma afronta, diga-se.

É inegável que as câmeras digitais revolucionaram o mundo da fotografia. Mas eu ainda prefiro à moda antiga.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Senso de humor, estilo europeu

Matemática não é o forte de muita gente, mas são raras, raríssimas, as pessoas que hoje em dia têm dificuldade para contar de 1 a 10. Mas aconteceu comigo.

Um sábado recente de manhã, acordando com um princípio de ressaca depois de uma leve bebedeira com Antárticas na noite anterior. Levanto às dez da manhã com o cachorro latindo anunciando uma visita em casa.

Deixo rapidamente o conforto da minha cama, escovo os dentes, tento amenizar a cabeleira rebelde e saio do banheiro ainda piscando duro. A visita era o professor de alemão do meu irmão, o mesmo que me ensinou o básico de holandês que eu sei. Um cara do sul da Holanda, dotado de um senso de humor inteligentíssimo e bem diferente. Um amigo, diga-se.

“Your brother should remember this”, disse o professor para o meu irmão. “Come here, Felipe… do you remember numbers in Dutch?”

“Well, I guess so. I haven’t spoken Dutch for a long, long time, but… let’s try”.

“Yeah, let’s try and I help you. This: 1 – een. Now it’s up to you”.

2: “humm… twee?”. “Yeah, that’s it!”.
3: “… drie?”. “Nice one!”.
4: “vier?”. “yeah, vier”.
5: “five, five..? five? Humm…vijf?”. “Yeah, vijf!”.
6: “zex?”. “No, this is German, sechs. Zes, in Dutch”.
7: “zeven”.
8: “acht, acht!”
9: “negen”.
10: “ten? Oh, shit! I don’t remember! Hahahaha! What a shame, what a shame”.

Meu ex-professor foi empático: “Tien, don't you remember? But don't blame yourself, it's 10 o' clock and you've just woken up!”.

“What a shame, my friend!”, reclamei. OK, passei vergonha e tive uma dificuldade enorme para contar de 1 a 10 em holandês.

“Well, you have my number. I’m sorry, I’m joking”, brincou (ele sempre pede desculpas depois de fazer uma brincadeira).

Fui tomar leite e me rendi à melhor piada dos últimos tempos. Não era engraçada, mas sim inteligente e rápida: “Você tem meu número". Justamente eu, que não lembrava os números, e se quisesse reaprendê-los bastava ligar para o professor e marcar algumas aulinhas. Genial!.

Mas eu ainda estava com uma puta vergonha por só saber contar de 1 a 9.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Iminências

Não sou lá muito fã de escrever sobre o amor já consolidado. Não é segredo que me inspira muito mais a idéia de uma paixão romantizada, idealizada, até certo ponto pueril e que raramente dá em alguma coisa. Mas sinto uma enorme necessidade de exprimir essa sensação diferente e reproduzir esse momento que dificilmente é lembrado por amantes ensandecidos.

Todo mundo aqui sabe o quanto é especial, inesquecível, intenso e muitas outras coisas mais um beijo apaixonado. Quando você, de olhos fechados, enxerga qualquer detalhe da pessoa com quem divide aqueles segundos que parecem horas, dias, uma vida. E o quanto a sincronia é assustadoramente perfeita, mesmo sem ensaio prévio algum.

Tem algo melhor do que um beijo apaixonado? Sim, algumas coisas são um pouco melhores. Mas há uma que casais enamorados deixam passar desapercebida: a iminência do beijo. E você, rapaz inseguro, aprenda essa técnica que, certamente, causará arrepios incríveis em você e em sua parceira (não, este não é um texto de auto-ajuda).

...

Um dia esses, estava tentando reconstruir na minha cabeça algum momento marcante com um caso antigo e me lembrei de um amasso. Estávamos, pouco a pouco, liberando nossos hormônios já além da flor da pele quando parei meu rosto em frente ao dela.

Os nossos narizes se encostaram quando ela e eu abrimos nossos olhos e nossos olhares se encontraram. Paramos de nos olhar e os olhos dela se fixaram nos meus lábios, enquanto os meus olhos miravam os lábios dela. Nossas bocas se reaproximaram e nossos corações dispararam novamente. No momento em que nossos lábios se reencontrariam, no entanto, evitei o contato e esfreguei o meu rosto, já com uma barba de três dias, na face dela. Ela suspirou.

Repetimos o ritual até a iminência do contato de nossas bocas. Nossas cabeças, ao mesmo tempo, desviaram-se. Reaproximamos nossos narizes mais uma vez e eu pude sentir o hálito quente, doce e sedento dela. Resolvi parar com a tortura e deixei a ponta da língua à mostra. Ela correspondeu. As pontas das línguas se encostaram brevemente uma, duas, três vezes. Paramos e nos olhamos.

Meus braços, presos em suas costas, comprimiram-na contra o meu corpo. Voltei a passar meu rosto contra o dela. Reencontramos os narizes, comprimimos nossos corpos ainda mais. Suspiramos pela última vez, fechamos os olhos e explodimos em paixão e desejo. Era o beijo mais intenso do nosso relacionamento.

Até hoje, certo tempo depois do fato aqui exposto, me recordo de todos os beijos que demos. Mas este é o que de longe mais me arrepia. Especialmente quando me lembro dela, logo depois do beijo, dizendo ao pé do meu ouvido com uma voz serena, doce: “te amo”.

Não, não era o primeiro “te amo” que ela me dizia e nem o último. Mas era o mais verdadeiro que eu já tinha ouvido.

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Comercial de Nescafé

Uma das primeiras lembranças que tenho da minha infância me colocam na mesa da cozinha da casa da minha avó tomando café da manhã. Não lembro se ela ou se meu tio tinha colocado leite na xícara e derramado um pouquinho de café, mas aquela coisa mágica do leite ficando marrom meio clarinho me despertou uma vontade enorme de experimentar.

Provei o café-com-leite da vovó se não me engano com uns quatro anos. E durante muito tempo fiz da mistura a principal bebida do meu desjejum. Até que um dia, acho que com uns seis anos, enjoei e passei a tomar café-com-leite apenas em raramente.

Outro fato marcante na minha história de cafés da manhã na casa da vovó aconteceu em uma manhã em que havia sobre a mesa um potinho de Nescafé. Já tinha visto o comercial daquele produto algumas vezes e pedi para experimentar. Vovó disse que eu não iria gostar. Teimoso como uma mula aos sete anos, no entanto, resolvi provar. Mas foi batata: não gostei. Ou pior: detestei.

Nunca mais tomei Nescafé. O café-com-leite, contudo, passou a fazer parte dos desjejuns que costumo tomar fora de casa depois de 2006. Quando passava noites em claro no primeiro ano de faculdade, ia tomar um pingado às 6h30 na padaria aqui do lado. Quando tinha que madrugar para ir ao exército, para as aulas teóricas de trânsito... e até mesmo em Porto Alegre - lá, sempre depois de acordar, desafiava o frio, saía do hotel e ia tomar um café-com-leite no boteco da esquina da Santo Antônio com a Independência, lá no Bom Fim. Delícia.

Passaram-se quase duas semanas de minha viagem insana pela capital gaúcha até que eu voltasse a sentir frio. Cheguei a me encontrar esses dias com uma grande, grande amiga para almoçarmos e ri do fato de ela estar toda encapotada, com três blusas, apenas porque os termômetros marcavam 10ºC. “Poxa, eu peguei tipo o zero absoluto da escala kelvin em São Leopoldo. Dez graus pra mim é quase verão”, brinquei.

Acontece que o frio pegou de vez à noite. Em minhas andanças pelo supermercado em plena madrugada, acabei caindo sem querer no corredor de cafés e, pela primeira vez em muito, muito tempo me senti tentado pelo Nescafé. Comprei um potinho de extra-forte e deixei no armário para alguma emergência.

E a emergência veio mais rápido do que eu esperava. Naquela mesma noite, resolvi ferver um copo de leite e tomar com Nescafé. Agora escrevo enquanto me delicio com um nescafé-com-leite, com a janela ligeiramente aberta para aproveitar o vento gelado.

Claro que não é a mesma coisa que o pingado da padaria aqui do lado de casa, nem ao café-com-leite que eu tomava em Porto Alegre e nem de longe o que a vovó fazia. Mas é uma pedida ideal para uma noite fria e solitária.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

O tédio e a noite de domingo

Há coisa pior do que um acesso de tédio em plena noite de domingo, ao som da música do Fantástico? Sim, algumas. Mas quando chega esse momento de calmaria lá pelas 21 horas dominicais, fica sempre aquela sensação de que os nossos problemas não têm solução, de que todo o nosso esforço para conseguir sair com aquela garota será sempre em vão, de que o mundo hostil em que vivemos não tem salvação... e por aí vai.

Estava passando por um momento semelhante na última noite de domingo, mas sem um motivo lá muito especial. Acabei encontrando uma amiga online no MSN e, depois das perguntas de praxe (tudo bom, como você tá, novidades, como passou o final de semana?), comecei a desabafar. Meio assim, do nada.

Falei muitas das coisas que mais me incomodavam naquele momento. Digitei, digitei, digitei... e, quando parei para reler, me senti mal. “Mas puta merda, quanta besteira!”, pensei. Reclamei de mim com a Mahh e comigo mesmo.

“No fundo, putz, eu fico aqui reclamando de tanta besteira... e ontem, antes do jogo da seleção de vôlei, vi lá na entrada do Ginásio do Ibirapuera uma mulher em uma cadeira de rodas. Ela não tinha as duas pernas, um braço e uns quatro dedos na mão que restava. Então ela parou para tirar uma foto com um dos animadores de torcida vestidos de jacaré... e lançou um sorrisão, Mahh! Quer dizer... ela lá, toda fodida, mas toda feliz por uma coisa tão besta, enquanto eu fico aqui me queixando meio que à toa! Acho que isso me deprimiu, de verdade”.

“Fê, você quer me ligar?”

“Haha, quero”.

Então liguei para essa minha amiga. Passamos um bom tempo no telefone, e eu simplesmente esqueci que estava em um momento de tédio em uma noite de domingo. E me esqueci de qualquer coisa que poderia me deixar mal àquela hora.

É sempre bom ter para quem ligar em momentos assim.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Elas, sempre elas

(Para uma amiga que faz aniversário)

Sábado de feriado, cidade morta. Por meio de alguns e-mails, consegui marcar de sair com uma grandessíssima amiga, com quem não me encontrava havia mais de ano, de sairmos para tomarmos um café no começo da tarde, na Paulista. E acertamos: 15h30, no escadão.

Deixei a redação lá pelas 14h35, fui almoçar e o telefone tocou. Um número que eu não conhecia, devia ser ela.

– Onde você tá? – perguntou. Era ela.
– Almoçando, e você?
– Também, na galeria 2001.
– Tá, quando sair daqui vou pro escadão. E te espero lá.

Engoli a comida rapidamente. “Galeria 2001 deve ser aquela da locadora 2001, aqui no quarteirão ao lado. Daqui a pouco ela chega lá”, pensei, já me apressando.

Cheguei ao escadão um pouco antes das 15 horas. Sentei na única sombra e esperei, ansioso, olhando para dois lados da calçada. Vários casais, várias garotas sozinhas ou acompanhadas... e nada de ela chegar.

Esperei cinco, dez, 15, 20, 25, 30 minutos. Deu 15h30 e nada de ela aparecer. Continuei lá, sentado. Às 15h40, no entanto, meu telefone tocou mais uma vez. Um número já conhecido, era ela.

– Oi, tô saindo aqui do Conjunto Nacional. Daqui a pouco eu chego!
– Peraí, você não tava do lado da 2001?
– Não, tava aqui no número 2001 da Paulista. Mas tô chegando.
– Hahaha, tudo bem. Só que não precisa ter pressa, tá?
– Não?
– Nah, tá mó delícia ficar aqui fritando no sol, sabe?
– Foi uma ironia isso?
– Hahaha, mais ou menos.

Ela chegou um pouquinho antes das 16 horas e não pôde deixar de tirar uma comigo: “nossa, como você tá corado!”, brincou. Poderia ter respondido mil e uma coisas, mas era tão bom rever aquela amiga que não rebati à altura. “Nossa, você continua baixinha”.

Passamos horas – que na verdade pareceram rapidíssimos minutos – conversando. Na verdade, monologando. Tinha um ano e meio de novidades para contar e ela, como sempre, estava pronta para me ouvir. E se orgulhar de cada entrevista que eu falava que tinha conseguido, se surpreender com cada detalhe de algum outro assunto que eu relatava.

Naquela tarde também ouvi uma das coisas mais legais dos últimos meses. Depois de contar a novela e tanto que vivi há algum tempo, e ela ficou me olhando alguns instantes com a boca entreaberta e disse: “prazer, eu”.

Perguntei como assim e a resposta dela foi de bate-pronto: “nossa, você tá completamente diferente. Tá muito mais seguro de si, decidido. E parece estar tão bem mesmo depois de tudo isso que você me contou!”. Perguntei, já prevendo a próxima fala, se antes eu era apenas um moleque chato e inseguro que reclamava da vida. Ela sorriu: “uh, e como!”.

Deixei-a em casa e voltei para a minha cantarolando alguma música no trânsito, feliz da vida. Tinha sido uma tarde e um início de noite e tanto. E valeu a pena esperar aquela hora a mais no escadão. Muito.

Tudo isso só me faz pensar em uma coisa: talvez seja por isso mesmo que as mulheres se atrasam tanto. Para que nós, homens impacientes, possamos valorizar ainda mais cada momento ao lado delas.

Humpf, como se precisasse.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Inquietações

Coloquei a cabeça sobre o travesseiro e não consegui dormir. Era um dia frio, tinha trabalhado um bocado nas horas anteriores e estava um bocado cansado, mas não consegui fechar os olhos e partir para uma outra dimensão.

Fiquei virando de um lado para o outro na cama. Me cobri com mais um cobertor, depois tirei os dois de cima de mim. Liguei o rádio, a televisão. Desliguei ambos após alguns minutos. Contei carneirinhos, pensei em coisas tranqüilas e depois em nada. Nada. Não adiantou.

Algo me atordoava naquela noite fria, e eu sabia o que era: tinha errado. Um peso enorme pairava sobre a minha cabeça, que mal conseguia dar conta da volumosa cabeleira que se instaurara após quatro meses sem aparar minhas melenas. E era esse peso extra que me incomodava.

Sabia muito bem que esse erro, causado puramente por causa dos meus impulsos, me traria conseqüências graves. A primeira era esta: perder uma noite de sono por causa da minha inquietação, e isso refletiria no meu trabalho – um expediente depois de uma noite insone seria complicado, pesado, lento.

Esse deslize, essa sombra negra que pairava sobre a minha consciência destoava do meu histórico de criança tímida que tinha medo de errar. Essa escorregadela poderia ser um marco para a minha vida, e fazer com que eu me arrependesse para sempre de tê-la cometido.

Estou inquieto. Preciso desabafar. Preciso confessar esse meu erro. Cometi um maldade, descumpri o oitavo mandamento. Pequei. Desonrei a religião, a Igreja, os santos, os anjos. Desonrei a mim mesmo.

Desculpe, mãe, mas errei. Justamente eu, que (quase) sempre dei motivos para que se orgulhasse de mim e (quase) nunca dei motivo para que se decepcionasse. Vacilei, só que não resisti àquele sabonetinho que eu não usaria em meu último dia em Porto Alegre e o coloquei na mala, trazendo-o para São Paulo.

Agora eu fico aqui, me perguntando o que diabos vou fazer com essa merdinha inútil que surrupiei do hotel que me recebeu em Porto Alegre. Sei que ele vai se desfazer por completo na metade do primeiro banho ou cairá pelo ralo se o deixar para lavar as mãos. E enquanto me faço essas questões, escrevo essas bobagens.

Ah, falta do que fazer...

sábado, 7 de junho de 2008

Sobre as noites de sexta-feira

Ah, a noite de sexta-feira!

O momento mais esperado da semana por toda a população mundial. É quando os universitários saem de suas faculdades e vão encher a cara no bar. É quando os trabalhadores saem de seus empregos e vão encher a cara no bar. É quando aqueles que não trabalham e nem fazem faculdade saem de suas caras e também vão encher a cara no bar.

Eu, com todo esse meu jeito esquisito de ser, tinha uma relação diferente com a noite de sexta-feira quando mais novo: em minha época de estudante no colégio, por exemplo, adorava ligar um Ramones lá pelas 11 da noite, sentar à beira da cama e fazer todas as lições de matemática e física.

Já crescido e afastado do mundo dos números, percebi que esse meu jeito, ahn, exótico de aproveitar uma noite de sexta-feira não se afastou de mim. Prova disso foi como aproveitei a minha última noite mais esperada da semana.

Assim que meu relógio marcou seis da noite, encontrei com o Pilatos pelos corredores do 12º andar do prédio do trabalho e comentei: “Cara, que puta inveja. Todo mundo voltando pra casa e eu aqui, trancado no prédio. E mesmo meu expediente terminando daqui uma hora, ainda tenho mais um tempinho de tortura na faculdade”. Não sei por que, eu achava que havia como ter bom proveito naquela sexta-feira.

Saí da faculdade, fui para o bar para assistir ao jogo do Brasil e voltei para casa no intervalo da partida. Ainda vi os minutos finais da vexatória derrota para a Venezuela (em Boston!), jantei e me vi num marasmo danado. Nada de muito interessante na televisão, MSN às moscas... putz!

Acabei abrindo a geladeira, encontrei uma Bohemia solitária e voltei para a sala. Coloquei a latinha sobre a mesa, abri alguns sites especializados e me pus a adiantar o trabalho de amanhã: fui pesquisar um pouco mais da carreira da Ana Ivanovic, que joga a final de Roland Garros dentro de algumas horas com a Dinara Safina.

Sim: workaholic assumido, passei a noite de sexta-feira trabalhando. Esqueci o mundo lá fora e passei a anotar todos os feitos notáveis da morenaça sérvia, já preparando algumas notícias de repercussão para quando a partida acabar. Esgotada a procura, me preparei para anotar algumas coisas da Safina – feiosa, tadinha. Mas assim como fiz há 52 semanas, deixei de lado a busca da tenista menos credenciada para o título (veja só, no ano passado eu havia pesquisado sobre a Justine Henin e menosprezado a Ivanovic!).

Abri mais uma cerveja, liguei a televisão em um telejornal qualquer (e grande parte das notícias que ouvi eram de Porto Alegre: incrível como as cidades para as quais eu viajei este ano passaram a ganhar um destaque enorme nos noticiários). Abandonei mesmo a pesquisa sobre a Safina e decidi me preparar para dormir.

Bom, vou mesmo dormir. Tenho que estar de pé dentro de poucas horas para transformar em cascatas toda essa minha pesquisa sobre a Ivanovic. Resta torcer agora para que a carismática e bela tenista balcânica não faça com que a minha noite de sexta-feira tenha sido vã e ganhe amanhã. Isso me pouparia um trabalho enorme.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Convite para um jantar

Era quarta-feira quando me colocaram para trabalhar de manhã. Como não dormi muitas horas durante a noite anterior, acabei voltando para casa lá pelas 4 da tarde um bocado cansado e peguei no sono, com televisão ligada e tudo.

Só fui acordar um pouco depois das 7 da noite. Completamente descansado, mas totalmente atrasado para a faculdade. Como já havia perdido a melhor aula do dia e a outra não me acrescentaria muita coisa, resolvi ficar em casa. Fazendo? Nada.

Mas o tédio rapidamente me pegou. Sem muito pestanejar, no entanto, pensei em convidar alguém para fazer alguma coisa. Cogitei um ou outro amigo para um chope, uma ou outra amiga para um café. Só que, como precisava de algo um pouco mais do que isso, resolvi me convidar para visitar e jantar com alguém muito mais especial.

Peguei o celular e fiz o convite. “Pode parecer estranho eu te ligar para propor isso, mas... poxa, você vai fazer alguma coisa daqui a pouco?”, perguntei, com a minha corriqueira insegurança para chamar alguém para sair. Ela poderia estar cansada depois de um dia cheio, ou então poderia ter marcado até alguma outra coisa com alguém.

“Não, por quê?”, respondeu a voz feminina do outro lado da linha. “Ah, não fui para a faculdade e pensei em passar aí, te visitar e jantar com você. Pode ser?”, arrisquei. “Nossa, claro! Você já tá vindo, então?”. "Uhum”.

Antes de sair, tomei banho, coloquei a calça de que mais gosto, vesti uma camiseta que me deixava com cara de sério, fiz ligeiramente o contorno da barba e tentei dar um jeito no cabelo. Precisava estar bem vestido, pois iria jantar com ninguém menos do que a mulher da minha vida.

Saí de casa, entrei no carro, fiz o já conhecido caminho e estacionei na frente do prédio. O porteiro, que já me conhecia de longa data, nem me anunciou no interfone. Abriu a porta, me cumprimentou e falou para que subisse. Toquei a campainha, o cachorro latiu e, assim que a porta se abriu, começou a fazer festa para o visitante.

Jantamos e colocamos o assunto em dia até que, passado um bom tempo naquela noite agradável, chegou a minha hora de voltar para casa. Antes de ir embora, peguei as coisas que havia deixado sobre a mesa da sala e agradeci pela companhia.

“Obrigado, viu? Fazia um tempão que eu não aproveitava tão bem uma noite assim”, comentei. “Obrigado você. Adoro quando você me liga do nada, e o convite foi lindo. Obrigada”, ela respondeu. “Te amo, tá?”, disse eu. “Também te amo. Muito”.

Demos um abraço e um selinho. Entrei no carro, liguei o motor e, antes de acelerar, vi que ela ainda me olhava pela janela. Dei a partida feliz da vida de volta para casa, depois de jantar com a minha mãe.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Frases esparsas em uma coletiva de imprensa

Uma mão firme, guiada por um olhar brilhante e sonhador, rabiscava algumas palavras em um bloco de papel enquanto Ricardo e Emanuel, favoritos ao ouro olímpico no vôlei de praia, contavam suas metas antes de embarcarem para a China. Várias mãos escreviam o que a dupla dizia; mas uma, em especial, simplesmente ignorava os atletas.

Aquela mão, aliás, não escrevia nada relacionado a esporte. Seu dono estava em qualquer lugar, menos naquela coletiva de imprensa. Aquela mão, não; aquela mão estava ali. Seu dono... ah, seu dono sim estava a algumas centenas de quilômetros dali.

E relatava, com letras firmes e ininterruptas por uma rasura sequer, um pensamento qualquer:

Costumávamos nos corresponder com uma sintonia tão perfeita que até me assustava. Pensávamos nas mesmas coisas ao mesmo tempo, mandávamos mensagens ao mesmo tempo e ríamos da mesma piada no mesmo ritmo.

Hoje percebi o que quer dizer um dia ruim de verdade. É aquele em que eu me pego pensando em você, tenho a vontade de te ouvir e, ao tirar o telefone do bolso para te ligar, ele toca. Mas quem me liga são meus amigos, meus chefes, minha mãe... e até mesmo um bêbado ligando errado.

Um dia ruim é aquele em que eu olho para o celular o tempo inteiro e você não liga. Um dia ruim, meu bem, é aquele em que eu não ouço a tua voz.

Aquela mão só tremeu em um momento naquele evento de imprensa: quando a resposta daquelas palavras, transformadas em e-mail, chegou. Mas não foi um tremelique vão. Tinha bons e grandes motivos, resumidos em duas frases:

Um dia ruim é pensar, mesmo que por um segundo, que eu não vou mais te ter...

Ah, amor, como eu preciso de você...

domingo, 1 de junho de 2008

Onde está Wally? – parte 6 (final)

São Paulo (SP) - Aproveitei a tarde de sábado para dar uma volta nos arredores. Saí sem rumo e fui parar no Parque da Redenção, uma espécie de Ibirapuera em escalas menores. Com as mãos nos bolsos, sobretudo por causa do frio cortante, andei por uma feirinha que rolava por lá, o Brique, margeei os lagos que há por lá e acabei caindo na parte central do parque.

E foi justamente na parte central que uma gaúcha com vozeirão e mais de 1,80m de altura me intimou, no bom sentido da palavra, a assistir a uma peça de teatro que começaria por ali. Depois descobri que era do grupo de rua Oigalê. Peça típica, extremamente bem feita e com atores talentosos e engraçados. Muito bom.

Não demorou muito para experimentar o chimarrão. Embora um bocado amargo, passei a gostar da bebida por ser quente (e naquele fim de tarde era mais do que necessário algo bem quente) e por causa das tradições, e regras, e coisas do tipo. E a coisa mais legal em Porto Alegre é ver quase todas as pessoas andando na rua com cuia, bomba, garrafa térmica e pacotinho de mate para preparar a bebida e tomá-la onde der vontade.

Também aprendi que um bom bebedor de chimarrão não pode encostar na bomba. E se demorar muito para beber todo o conteúdo da cuia, certamente vai ouvir que está com um microfone na mão. Mas chimarrão é legal, e lamento muito ter esquecido de comprar um kit para mim também e começar a tomar durante o inverno.

Aproveitei minhas últimas 24 horas na capital do Rio Grande do Sul e provei um churrasco – feito, aliás, apenas por mãos femininas. Ainda tive tempo de ouvir gozações por causa do meu ‘sotaque’ paulistano: ao descobrirem que havia um paulista na mesa, alguns dos presentes viravam para mim e lançavam um “E aí, meu, sussa?”. Inocentemente respondia “Opa, sussa”, para alegria geral.

Meu dia derradeiro em Porto Alegre teve a cara de um domingo. Enrolei até o último instante (12h45) para sair da quente e agradável cama do hotel, tomei café da manhã às 13h30, peguei as malas no hotel e fui para o aeroporto. Fiquei tomando chimarrão com a juuuliana até praticamente a hora do meu embarque.

Foi deveras agradável andar de avião sob a luz do dia pela primeira vez em meu currículo de viagem. Foi ainda mais legal chegar ao saguão de desembarque de Congonhas e ver minha mãe lá, me esperando, com um baita sorrisão. Também foi legal andar no trânsito caótico de São Paulo, entrar em casa...

Mas quer saber? Foi triste deixar Porto Alegre. E me dói um pouco imaginar que amanhã não vou tomar café com leite na vendinha perto da Independência, não vou ouvir palavras como tu, bergamota, aipim, negrinho (que na verdade é brigadeiro), lomba (ladeira), sinaleira (semáforo) e, muito menos, roleta. Ou, então, que amanhã não vou tomar chimarrão e nem sentir um frio cortante. Nem ver aquele céu de puro azul que só Porto Alegre tem.

Não há melhor forma para encerrar a série Onde está Wally?, que contou quase detalhadamente a minha inesperada e insana 11ª viagem, do que fazendo uso do refrão do hino porto-alegrense: “E quem viu teu sol poente não esquece tal visão. Quem viveu com tua gente deixa aqui o coração”.