quinta-feira, 25 de janeiro de 2007

Mata a alma e a envenena

- Tio, dá 1 Real?
- Pô, cara, num tenho nada.
- Vai, tio, dá 1 Real. É pra mim comer!
- Num dá, brother, eu num tenho nada.
...
- Vai, dá 1 Real, agora!
[susto] – Quê?
- É, dá o dinheiro porque eu quero comer.
[bolsos pra fora] – Já disse, num tenho nada! Tô indo trabalhar!
[raiva, olhares analíticos] – Então dá o relógio!!!
[raiva] – O quê?!
- Dá o relógio, eu quero comer!
- Num vou te dar nada, caralho! Tô indo trabalhar, vê se não me enche!
- Vai, eu quero comer!
- Vai se foder, some!
...
...
...

Não bastasse acordar cedo no feriado, ficar dez minutos na plataforma esperando a droga do metrô chegar e ir trabalhar, ainda tenho que ouvir uma dessas. Sempre achei que o horário mais seguro pra andar na rua era das 3 às 10 da manhã, quando todos os trombadinhas-vagais-abasreta-filhos-da-puta estão dormindo. Quer dizer, quem é vagabundo de verdade não acorda às seis da manhã pra assaltar. Um ladrão dos velhos tempos não é aquele que madruga, pega oito baldeações e bate cartão logo cedo pra assaltar. Malandro é aquele que assalta quando acorda, ao meio-dia.

Deixando isso de lado, o fato é que eu fiquei com raiva. Ah, onde já se viu? Molequinho petulante, com pouco mais de 1,10 m de altura e acha que é gente porque anda sozinho na rua. Tomar no cu. Quando vi de longe, acenando pra mim e começando a grunhir seu pedido de merda, imaginei que não seria fácil me livrar dele. Havaianas, boné branco, calça de moletom, blusão de zíper... boa coisa não deveria ser. Minha mãe sempre me disse pra não ser preconceituoso e essas coisas, mas não dá. Sinceramente, não dá. Ou isso ou eu seria assaltado umas 20 vezes por dia.

Não que eu não seja daqueles que não dê esmolas e ainda dê uma lição de moral no pedinte. Dependendo do olhar da criancinha, ou do velhinho, até fico feliz em dar um trocado. Esse bostinha, no entanto, me deu raiva só de ter virado a Brigadeiro na Paulista. Confiante, cabeça erguida, voz imperativa... não daria nem uma moeda, se eu tivesse uma no meu bolso.

Pra falar a verdade, eu até tinha um dinheiro na minha carteira, na minha mochila. Ele pediu R$ 1, mas eu só tinha uma nota de R$ 50. Preferi dizer que não tinha, acho que seria menos estúpido do que dizer “Eu tenho cinqüenta, cara, você tem troco?”. “Não, mas me espera aqui que eu vou trocar ali e já venho”. Idiota. Não daria um centavo praquele filho da puta nem que isso me custasse uma vaga no céu, ou seja lá onde for.

Mas me deu mais raiva mesmo foi ele pedir o meu relógio. Pra começar, meu relógio deve ser mais velho do que ele. Tenho essa coisa há 12 anos, e não irei me desfazer dela tão cedo. Tá certo que nenhum botão funciona mais e ele ta fadado à aposentadoria com o fim do horário de verão, mas e daí? Se o filho da puta tava com fome mesmo, o que ele ia fazer? Comer o relógio? Ou não, se ele vendesse, o máximo que ele ia conseguir é um pão com pouca manteiga na padaria. Seja lá como for, quem tá com fome não pede dinheiro na Brigadeiro x Paulista, mas sim em todos os restaurantes, bares e tudo mais que tem por lá.

Minha vontade não era sair andando, como eu fiz. Queria ter gritado, dado um tapa na orelha do moleque e mandar ele ir estudar. “Caralho, vai se foder, filho da puta! Eu tô indo trabalhar, não tô vadiando como você. Eu tô indo trabalhar pra ganhar dinheiro, pra não ter que sair pedindo, ô seu bosta. Vai estudar e virar alguém na vida, seu arrombado. Você não vai ser ninguém se continuar assim, ô seu merda. Seu filho da puta, ouve o que eu tô falando. Vai tomar no cu, cacete!”...

Com raiva, tive uma idéia melhor enquanto atravessava a Joaquim Eugênio. Um miliquinha, eu tinha que encontrar um miliquinha! Mas o problema é que ninguém encontra um quando realmente precisa. Muito menos na manhã de um feriado. Apenas os idiotas trabalham, os miliquinhas... sabe-se lá o que os miliquinhas fazem.

Em todo caso, eu tinha uma arma mais importante comigo. Peguei na mochila o meu celular, e tive vontade de ligar pra polícia. Não pra denunciar um crime e ajudar na segurança pública, mas pra foder com a vida do meliantezinho. Celular na mão. Asterisco, jogo da velha, teclado liberado. 1 (eu vou mesmo ligar?), 9 (sim, aquele filho da puta) 0 (legal, agora só falta o verde).

Botão verde. Alô, polícia? Então, eu tô aqui na Avenida Paulista, número 900... esperei chegar aqui porque é mais seguro pra ligar. Então, eu tava na Brigadeiro, no lado par da Paulista, e um moleque de 1,10 m (talvez um pouco mais, não sei), de boné branco e casaco azul tentou me assaltar. Ele tentou forçar meu relógio, mas eu resisti e, com medo, ele foi embora. Acho que tem mais gente envolvida, alguém mais experiente e mais perigoso. Ele ainda deve estar lá, se quiser eu vou junto pra reconhecer. Sim, sim... Dez minutos? Certo. Desliga. Close em mim. Qualquer coisa, devem ter meu telefone. Corta. Miliquinhas chegando em uma viatura, fazendo ronda pela avenida; corta. Passam ao lado do filho da puta; corta. Descem do carro, o moleque se assusta; corta. Leva um tapa na cabeça, chora; corta. Eu apareço no cruzamento e dou um sinal com a cabeça; corta. Ele é levado pro reformatório, onde aprenderá todos os segredos e virará um bandidão que não assalta aos feriados. Corta.

...

Botão verde. Alô, polícia? Eu sou jornalista da Gazeta, acabei de ser assaltado no cruzamento da Avenida Paulista com a Brigadeiro. Sim, um moleque tentou roubar meu relógio, ele estava armado e me apontou um estilete enferrujado. É, enferrujado. Se eu vi direito, tinha até uma marca vermelha, parecia ser recente. Sim, sim. Como? 1,10 m (um pouco mais, eu não sei, não olhei direito). Boné? Branco. Aham... não, chinelos. Casaco azul, azul não muito escuro. Isso. É. Aham. Faz, faz cinco minutos. Corta. Miliquinhas chegando em uma viatura, fazendo ronda pela avenida; corta. Passam ao lado do filho da puta; corta. Descem do carro, o moleque se assusta; corta. Leva um tapa na cabeça, chora; corta. Apanha mais, mais e mais. Apanha até morrer; corta. Ele morreu; corta
.

No visor, 190. Não, botão vermelho. Quer saber, não tenho idade ainda pra decidir o futuro de ninguém. Estive com a vida de um filho da puta nas minhas mãos, e deixei que ele mesmo traçasse seu futuro. Ou não. Talvez eu mesmo selei seu futuro. Ele vai assaltar o relógio de outra pessoa que ia para o trabalho, vai vender e vai comprar um papelote. Vai vender, vai se dar bem na vida, vai abrir uma boca. Vai matar muita gente, vai comandar uma quadrilha que vai dominar o tráfico na região da Avenida Paulista. Vai trocar tiros com a polícia e vai morrer, com um tiro na testa.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

Notas sobre nada

Imagine um mundo sem palavras.
Seria esquisito, e o olhar regeria a vida. Mas, sinceramente, seria muito melhor. Sim, não haveria mentiras, barulho depois das 22 horas... não haveria panfletos e (conseqüentemente) nem poluição nas ruas, entupimento de bueiros e as enchentes nunca aconteceriam.

Pode até parecer uma coisa meio primária, só que quando penso nas pessoas se comunicando por meio de olhares, imagino um cara barbudo, cabeludo, de tanga e com um porrete na mão. Quando estou mais bem humorado, penso no Capitão Caverna.

No entanto, teríamos que pagar um preço pela inexistência das palavras. Sim, os livros jamais existiriam. O conhecimento, tampouco. O poder seria uma coisa de que nunca ouviríamos falar (até porque jamais ouviríamos alguém falar alguma coisa). Poderíamos, contudo, até ter moeda de troca, que seria o dinheiro como hoje em dia.

O problema é que tudo tem uma palavra. Hoje, fui depositar alguns trocados na minha conta e comecei a pensar como seria a cédula sem palavras. No nosso 'novo modelo', não teríamos quantia alguma impressa nela, apenas a cor seria para definir o valor. As cores mais gritantes seriam pras notas de valor mais elevado. Como isso já acontece mais ou menos atualmente (tirando o fato de que a nota de 100 não tem muita diferença pra nota de 1; e as notas de 10 e 20 têm as cores mais gritantes), teremos um valor impresso em cada. Mas de uma forma diferente. Aquele rosto com uma coroa de louros na cabeça teria uma expressão pra cada valor. A nota de 1 poderia ser um olhar desiludido. A de 2, uma sem jeito. A de 50, seria um sorriso bobo. E, logo, numa nota de 100, ele teria um olhar orgulhoso e esperançoso, com um sorriso de orelha a orelha mostrando todos os dentes (se ele tiver).

Besteira. Só que as mentiras não seriam tão freqüentes, a menos que você utilizasse os óculos escuros. Não, melhor não. Os óculos escuros seriam apenas para lugares onde o silêncio fosse importante. Uma biblioteca, por exemplo. Ninguém poderia se comunicar utilizando os olhos escuros. Voltando às mentiras, seria impossível. Ninguém conseguiria mentir com o olhar. Sabe, é muito difícil, até porque o sorriso também é cúmplice dos olhares. Viveríamos em um mundo de verdade.OK, e viveríamos num mundo primitivo.

Seja lá como for, viveríamos no mundo dos sons (afinal, o mundo é sempre das coisas que nunca conseguimos ter, ou fazer. Não vivemos hoje no mundo das sensações? Então, hoje em dia, ninguém mais consegue ter sensação nenhuma. Ou vivemos no mundo do poder. Alguém tem poder de verdade? Talvez o mundo do dinheiro... deixa pra lá).

Não sei por que estou dizendo isso tudo. Acho que é porque foi essa a sensação que eu tive há alguns instantes e fiquei com medo de perder uma idéia fabulosa. E também porque, a cada dia que passa, venho me comunicando com mais pessoas à medida que me comunico menos. Blah, perdi uma idéia fabulosa e alguns minutos escrevendo sobre nada. Escrevendo uma besteira.

Pronto, parei. Até porque está na hora de eu começar meu trabalho. Palavras, palavras, palavras. Textos, comunicação.

Seria melhor se nosso pensamento não fosse regido pelas palavras. Quer dizer, pense em alguma coisa sem pensar em palavras. Sem formar uma frase... não dá!

Pronto, parei. De verdade.

terça-feira, 16 de janeiro de 2007

A marcha e a Avenida Vermelha

O bom da vida é que ela pode nos proporcionar as coisas mais diferentes em pouco tempo, fazendo tudo parecer ser diferente do marasmo que realmente é (e o bom de não ter inspiração para começar alguma coisa é que um clichê abre muitas portas). Digo isso não só por mim, mas... Quer dizer, digo isso simples e unicamente por mim.

Após uma manhã bem comum para uma pessoa bem comum – acordar às seis da manhã, tomar banho, brigar com o cabelo, fazer a barba, tomar café da manhã na padaria e pegar metrô lotado –, algo um bocado incomum se passou. Não incomum, porque isso vem acontecendo até que com uma certa freqüência, mas... não sei, tive mais um acesso repentino de confiança. Com um som estimulante nos ouvidos, senti meu nariz formigar durante três segundos. Dei um sorriso quando lembrei que estou tomando remédio contra a rinite e percebi que não seria um acesso de espirros que eu ia ter.

Aos poucos, fui levantando a cabeça e vendo o brilho do sol quase sobre a Avenida Paulista. Não sei se isso realmente aconteceu ou se eu tô colocando isso só pra enfeitar o texto, mas até senti um raio de sol através das lentes do óculos, fazendo com que minhas pupilas se contraíssem um pouco.

Senti minhas pernas mais leves e achei que era mais importante engrossar o passo. Deixe de pisar cuidadosamente na calçada irregular e, com o nariz em paralelo com o solo, marchei sobre o tapete que se estendeu sobre a Avenida Vermelha. Marchei, e sentia que as pessoas que passavam ao meu redor veriam toda a confiança do mundo concentrada no meu olhar. Com um ponto fixo, encarava qualquer pessoa que virava a esquina da Consolação com a Paulista e ela (a pessoa, não a avenida) se sentia intimidada com um olhar tão confiante – embora eu estivesse apenas atravessando a Joaquim Eugênio de Lima.

Não sei o que me bateu, mas esse excesso de confiança foi bom. Fiquei aliviado por ter apenas que passar o cartão sobre o leitor. Por um instante, achei que estava com excesso de um milhão de substâncias proibidas no sangue e seria pego pelo comitê antidoping do sindicato.

Sete horas depois, sabia que deveria apertar o único botão que não estava enfileirado e que me levaria pra casa. Sem entender por que, apertei o 5 e, sete andares abaixo, tudo voltaria ao normal.

É quando o elevador abre as portas e uma sombra de pensamento corre sua cabeça de uma ponta a outra. Uma previsão, dessas que deprimem qualquer um. Encontrar pessoas que não se quer encontrar e abalar ainda mais a imagem bonitinha que eu tenho guardo. O constrangimento do primeiro olhar, o desânimo no cumprimentar, o monossilabismo ao – educadamente – retrucar e o alívio ao – enfim – saudar dizem por mim.

Não sei, isso me deprime um bocado. Essa coisa de adivinhar o mundo, saber que as coisas acontecem. Falam que pensar coisa ruim atrai, mas por que eu vou fazer boas previsões se eu não encontro quem eu realmente quero encontrar? Mudo caminhos, corro perigos e conto todas essas mentiras só para rever um olhar e, tendo a certeza de que não acontecerá, volto pra casa achando que no dia seguinte, talvez...

Além de que o mundo é previsível, como se tudo fosse obra de um roteirista de quinta ou do Paulo Coelho, tem-se a idéia de que nada vai mudar. É, nada vai mudar. Por um momento, ao olhar de cima, todas as pessoas são iguais. De baixo, também. São os mesmos medos, os mesmos sonhos, os mesmos fracassos, os mesmos assuntos, as mesmas mesmices.

Aos poucos, novamente na Paulista, o sol se esconde atrás de uma nuvem. Minhas pupilas dilatam e, cuidadosamente, volto a pisar na irregular calçada. Olho para baixo para não tropicar, para não tombar – no sentido de rei da palavra – e para mostrar que toda a confiança não é nada perto de um mundo todo igual.

Sinceramente, uma raça em extinção
[não a humanidade contemporânea, mas a de garotos do anteontem]

domingo, 14 de janeiro de 2007

Teorias sob o abajur

Todas as pessoas passam a semana inteira esperando a noite de sábado chegar para que elas façam sei lá o quê. Às vezes, acho que o mundo vive em função da noite de sábado. No entanto, seja lá o que o sábado à noite represente, sinto como se isso não me importasse tanto.

Pra falar a verdade, nunca fui tão fã assim de um sábado. Claro que é bem melhor do que um domingo e tal, mas eu sempre achei a sexta-feira o melhor dia da semana. Aquele clima de que o fim de semana vai começar e é o último dia de acordar cedo e tudo mais. E sempre tem alguma coisa ou outra mais interessante pra se ver na tevê, caso eu não fizesse faculdade à noite.

Agora veja o sábado à noite: a pessoa que não arranja nada de interessante pra fazer vai ficar em casa vendo Zorra Total, que é o programa mais deprimente da televisão brasileira. Não bastasse o cidadão perder a noite de sábado – o sentido da vida –, ainda tem que ficar entediado. Coitado.

Pior que isso é passar o tal momento mágico com apenas você. Ou nem isso, porque sua cabeça está curtindo uma noite de sábado de um jeito bem mais útil do que você – sua mente não está entediada. Lá no fundo, ela sonha com tudo aquilo que não tem e deseja (aquilo que mais lhe faz falta). Por mais que eu não seja lá muito ligado a sair de casa e tal, sinto como se fosse iminente a eminência disso tudo.

Na verdade, não é bem sair de casa. Só queria ter alguém com quem conversar, ou com quem passar o tempo de uma forma bastante útil e nada constrangedora. Tudo bem, pode me achar um imbecil por ter várias opções e não mencioná-las. Pois bem, vou eliminá-las uma a uma até que consiga o entendimento alheio:

Família dorme, como qualquer família normal que acorda no domingo de manhã pra morrer de tédio.

Amigos, não. Não há sentido em chamar os amigos para tomar uma cerveja em alguma mesa de bar, falar sobre de política a futebol – claro, sem esquecer as mulheres ou os desenhos animados – e depois voltar pra casa de pileque. Hoje em dia, os amigos de antes não falam mais sobre as coisas de antes. Eles falam de turbinas, de conta-giros, de aspirados, rebaixados, quebrados e toda essa merda de carro velho que mais faz barulho do que tudo. E mesmo que mudem de idéia e decidam ir somente ao bar, ninguém quer ficar na mesa de um bar pagando um pouquinho a mais de se tomar alguma coisa em alguma mesa com cadeiras. É melhor ir a um posto, claro, onde há muitos e muitos carros turbinados com um som muito louco e... ah, claro, e tocando um black. Sinceramente, ao caralho!

Se não os amigos de antes, os amigos de um pouco antes ainda. Tudo bem, vamos evitar o assunto dos carros – embora sempre tenha um que puxe por isso e insista em levar o assunto por esse meio. Mas mesmo assim, não muda muito. É aquela coisa de sair, tomar uma ou outra cerveja, passar de carro, parar num puteiro e qualquer coisa. Como não sou muito fã disso – sinceramente, sempre preferi o método tradicional, higiênico e gratuito da coisa -, fico na minha e sempre dou uma desculpa pra não entrar [e, assim, ninguém entra]. Ora, melhor não sair com eles e estragar a noite agitada que eles terão com algumas mulheres mais experientes.

E as amigas? Ah, era uma boa, né? Quer dizer, não conheço muitas garotas que gostem de falar única e exclusivamente de carros ou então, sei lá, ir a puteiros. Mas chamar uma garota pra sair à noite muitas vezes é uma cantada barata. Como não sou bom nisso e não tenho paciência de explicar que só quero sair para conversar e não pra qualquer outra coisa – inicialmente –, fica mais difícil. E também tem que as que têm mais assunto para um sábado à noite já arranjaram um programa muito mais interessante pra fazer.

O que sobrou, o que sobrou? Infelizmente, o mundo virtual. Não é o melhor modo de passar o momento especial mais esperado da semana, mas é melhor do que ver Zorra Total. Mas, puts, eu conecto e vejo meia dúzia de imbecis com quem eu não sinto nem vontade de falar oi na rua. Um imbecil que se acha o maconheiro e todas as suas frases são relacionadas à erva, um fanático por futebol que sempre foi cuidado pela mãe e que hoje se acha o maioral porque viaja pra praia com os amigos e fuma maconha, um metaleiro idiota que não fala nada além de coisas como moshar e headbanger, uma maluca que se acha a punk mais engajada sociologicamente e defende os ideais do Brasil até que falem da Hungria (se falar mal da Hungria, ela avança. Ela não conhece lá, nunca foi, mas conheceu na internet um garoto de lá e, por isso, ela tem a certeza de que as pessoas lá são melhores do que as daqui. E tudo lá é melhor do que aqui. Na verdade, o Brasil é uma bosta e ela tem orgulho de ser húngara. Ser? Ah, vai pro inferno!) e um moleque de 13 anos de idade, amigo do meu irmão.

O moleque de 13 anos é o que entende mais do mundo do que todos os marmanjos que, de um jeito ou de outro, vão fazer todos os assuntos se afunilarem em um beck. Mas não quero falar com o molequinho. Ultimamente, depois que eu comecei a trabalhar, ele acha que eu sei todas as notícias do Palmeiras um mês antes de todo o Brasil saber e fica meio frustrado quando eu falo que eu sei o mesmo que ele. Ah, quer saber, deixa ele achar isso. Pelo menos ele pode imaginar que conhece alguém ‘famoso’ e ‘importante’.

O que me resta, então, é dormir. E dar graças a qualquer deus que existir por eu ter que trabalhar nos finais de semana. Talvez seja por isso o momento alegre e feliz que eu tive hoje, quando batia meu cartão. É, talvez a noite de sábado para o mundo seja o paraíso para uns, e uma chatice para mim.

Mas não me importo, pra falar a verdade. Tenho a esperança de que alguém, nas profundezas da região metropolitana da megalópole maluca e esquisita, concorda comigo. Ou que pelo menos, com uma palavra – ou talvez duas, ou até três – diga que tudo isso é um dom e me deixe sem graça. Sem graça porque não terei coragem de negar e dizer que não é um dom, mas uma perturbação excêntrica.

Seja lá como for, as pessoas interessantes estão fazendo coisas mais interessantes. E eu, ah, eu me contento com uma latinha, um óculos, um abajur e alguns pensamentos.