quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Momento de glória

A música Chariots of fire nunca fez tanto sentido para mim como naquela tarde. Estava quente, bem quente, quando dobrei a esquina da Brigadeiro Luís Antônio com a Paulista. Estava cansado, já praticamente exausto, mas respirei fundo e acelerei com a música ao fundo.

Não sei de onde tirei o último aquele último pique, mas respirei fundo e não parei mais de correr. Foram os 400 metros mais gostosos da minha vida, correndo pelo asfalto com a cabeça erguida, até cruzar a linha de chegada, arquear as pernas e respirar fundo antes de receber um copo d’água.

Instantes depois, o segundo colocado da corrida veio me cumprimentar. Deu os parabéns pelo meu sprint final, me parabenizou pela corrida de recuperação e pelo fôlego que eu esbanjei após correr 14 km. Apertei a mão daquela figura conhecida, com as orelhas quase do tamanho de toda a cabeça, e falei que ele que era um verdadeiro campeão.

Logo em seguida, tirei a camisa e me olhei no espelho. Deveria ter perdido uns dois, três quilos só naquela corrida. Olhei meu rosto, acabado, margeado por mechas do cabelo encharcado. Não lembro se sorri pela vitória.

Meu celular, então, tocou. Atendi, era o Mané me ligando para confirmar o almoço que tínhamos marcado há alguns dias. Eu não tinha nenhuma marca de cansaço na voz quando ele me perguntou se estava tudo bem: “Tô sim, cara. Acabei de ganhar a São Silvestre”, contei.

Tentei voltar a dormir e não consegui. Estava em êxtase por ter ganhado a prova mais tradicional do atletismo brasileiro. Passei mais dois minutos tentando reconstruir a cena que eu tinha acabado de presenciar e só fui notar que tudo não tinha passado de um sonho quando lembrei quem tinha sido o segundo colocado: o Lima Duarte.

Eu fui o vencedor da São Silvestre e o vice-campeão foi o Lima Duarte? Aí então eu percebi que aquele tinha sido o sonho mais bizarro da minha vida. E olha que eu nem contei da ultrapassagem que fiz sobre o Fernando Gaia Solera na subida da Brigadeiro...

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Latrocínio de carros

Depois de quase um ano dirigindo meu humilde carro com o maior cuidado do mundo, não sei de onde apareceram nele hoje os dois primeiros riscos na lataria. Percebi pela manhã, saindo do clube após dar uma corrida (mal-sucedida) pelo Ibirapuera.

Parei em frente aos arranhões com um grande penar quando o flanelinha desdentado apareceu perguntando o que tinha acontecido. “Putz, apareceram dois riscos aqui do lado esquerdo, não sei de onde”. O cara se sentiu o maior ofendido da história (e não eu, que tive meu patrimônio depredado) e começou a argumentar de todas as maneiras possíveis. E me lançou essa:

“Olha, eu fui chamado aqui pelo presidente do clube e pelo general do exército (meu clube fica próximo a um quartel militar) pra tomar conta dos carros, porque aqui tava rolando um alto número de latrocínio de carros”, argumentou o cara, que, segundo ele próprio, foi soldado-alvo (atiravam nele?), tenente, faixa marrom em caratê, professor de alguma coisa, amigo dos manos e mais outra patavina que não me lembro (a única coisa que ele não conseguiu ser, a meu visto, era cliente assíduo de dentista).

Não entendo como um local próximo a um quartel militar e à Assembléia Legislativa possa ter sido, alguma vez, região visada para ladrões de carros. Mas o mérito da questão não é essa, mas sim o fato de um novo crime assolar a região: latrocínio de carros. Na hora, entendi que o meliante roubava o automóvel e, no afã de fugir, deixava o veículo morrer. Ou fazia questão de fazer o motor morrer. Aí sim seria um latrocínio de carros.

Entendo que o flanelinha tenha querido mostrar erudição, fazendo uso de palavras bonitas para me convencer. Velho recurso, este, que em muitos casos funciona. Mas latrocínio de carros é algo que não me entra na cabeça. Enfim.

Esse papo me lembrou, também, da zona que rolou no final de semana por causa das confusões entre as torcidas no clássico de São Paulo e Corinthians de domingo. Depois que o pau comeu mesmo nos arredores do Morumbi, o promotor público Paulo Castilho apareceu para dar entrevistas com um discurso todo empolado.

Entre termo bonito pra cá e discurso pronto pra lá, um termo que não parava de aparecer era o celeuma quando tentava eufemizar a palavra ‘treta feia’. Celeuma, até onde eu sei, é usado para designar uma confusão que não tenha porrada, mas sim uns... desentendimentos, uma discussão mais acalorada.

Mas enfim, celeuma é uma palavra que me remete muito aos tempos de colégio (três anos atrás, não é tanto tempo assim). Sempre que ouço essa palavra, me recordo das aulas de biologia, quando tentava decorar o que era um celoma (termo de biologia embrionária que dá origem a uma boa parte do nosso corpo). Ou, então, os xilemas das aulas de botânica (vasos condutores de seiva, rivais dos floemas).

Celeuma me lembra celoma, e não confusão. Mas é mais bonito de usar em discursos e tal. Latrocínio de carros me remete a um ladrão que não sabe dirigir. E os riscos no meu carro devem ter sido obra de algum belo filho da puta que não tem mais o que fazer da vida. =/

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Páprica

Descobri que não como páprica. Quer dizer... não que eu tenha descoberto algo que vá mudar a minha vida ou tenha percebido que não posso mais comer a coisa mais gostosa do mundo.

Pra falar a verdade, acho que nunca comi páprica. Sabia que isso, popularmente conhecido como tempero, existia por meio da televisão. O Beakman, por exemplo, sempre usava o pozinho vermelho meio alaranjado em algumas experiências malucas, ou então o Jerry sempre fazia o Tom espirrar com a tal da páprica.

O máximo de contato cara-a-cara que tive com a páprica foi tê-la visto uma vez em um vidrinho de temperos da minha mãe. Até abri e cheirei um pouquinho achando que espirraria feito um condenado, mas não. A páprica ficou na dela e eu, na minha.

Nem lembrava mais que existia páprica até esta sexta-feira, quando fui a um restaurante alemão com a Bonie, em alguma quebrada maluca de São Paulo. O lugar era bem legalzinho e comemos lá algum schdruwaitkenstiennitzer com hufflepuff, ou alguma coisa semelhante. Tudo bem gostoso e tal, até que... até que...

Até que tínhamos terminado nossos pratos e eu decidi pegar aquela tirinha de tomate que enfeitava os bifes de schweinsteigernitzer para experimentar. Coloquei na boca e engoli por obrigação, já que não senti um gosto muito bom nas mastigadas. E então segue o diálogo que antecede a tragédia.

“Nossa, Bo, os tomates na Alemanha têm gosto de salsinha”, eu disse.
“Mas isso não é tomate, Fe, é cenoura”, ela respondeu, mostrando outra tirinha.

“Claro que não, isso aqui é vermelho. E olha, tem a parte mais vermelha, da casca, e a menos vermelha, do miolo do tomate”.
“Não, cabeção, isso é laranja e é uma cenoura. Olha só”, ela sugeriu.

Olhei bem e vi que a tirinha de vegetal era mais laranja do que vermelha e... bom, poderia até ser uma cenoura. Chegou então o garçom alemão, perguntou se havíamos gostado do jantar e eu disse que sim. Mas, claro, não consegui segurar a dúvida.

“Eu só não descobri se isso é tomate ou cenoura”, comentei.
“Non, isso ér paprikka”, explicou o oba (garçom em alemão)

“Ah, isso é uma páprica? Nunca parei pra pensar, mas se bobear eu achava que a páprica era produzida já em pozinho na natureza”.
“Non, non... paprikka ér... ér… como se diz aqui em Brasil? Pimentão, isso”, e saiu.

Ou seja, eu tinha acabado de comer pimentão – um dos três ingredientes que eu mais odeio, ao lado de melancia e peixe cozido. Cheguei em casa e vi que páprica nada mais é do que um pimentão seco e ralado...

...urgh, odeio páprica.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

A nova voz do Chaves

Faz um tempo, cheguei em casa numa sexta-feira à noite e me decepcionei com a versão dublada de O show de Truman – um filme que eu cansei de ver com o áudio original e com legendas em português, espanhol e sem legendas. Dentre outras coisas, fiquei reclamando do fato de que era complicado ver as mesmas coisas de sempre com outro ‘tempero’ (no caso, voz).

Blábláblás à parte, esses dias fiquei sabendo que as Lojas Americanas estava fazendo uma baita promoção fenomenal de DVDs do Chaves e do Chapolin. Depois de muito ter vontade de ir ver o que eu poderia conseguir para alimentar meu vício de infância com a série mexicana, acabei comprando duas coletâneas – ambas do Chapolin, já que vira e mexe o SBT resolve tirar o Polegar Vermelho do ar sabe-se lá porquê.

Voltei para casa feliz da vida com as minhas novas aquisições e com a chance de ver episódios como os impagáveis como os da corneta paralisadora, dos aerólitos, do mini-disco-voador, do vazamento de gás e da o honorável cobrador da companhia elétrica. Foi o melhor negócio que eu poderia ter feito, com apenas 25 pratas desembolsadas. E já estava até pensando em voltar lá nas Americanas para comprar todos os outros DVDs à venda.

Ao colocar o primeiro disco para rodar, percebi que poderia conferir algo ainda mais incrível: a possibilidade de ver os episódios com o áudio original, em castelhano. Para mim, que acabei me interessando extremamente por portunhol depois de passar uns dias em Buenos Aires, teria uma chance e tanto de entender o sotaque mexicano.

Mas... mas... mas coloquei o disco e, assim que rodou a primeira cena, a maior decepção dos últimos tempos: todos os personagens tinham a mesma voz da dublagem original, mas... justamente o Chapolin... não. Nada daquela voz característica do Chaves e do Polegar, que guiou a minha infância, adolescência e início de fase adulta, mas... não. A voz era aquela do desenho animado do Chaves, uma voz... que... não tem nada a ver com o Chaves. Urgh.

É difícil entender, sou muito conservador nesse sentido. As piadas são as mesmas geniais de sempre, mas... sem a voz original do Chaves, fica tão difícil ter o mesmo prazer intenso em assistir aos episódios originalmente dublados pelo Marcelo Gastaldi – dono da Versão Maga e que morreu há 14 anos, tendo no currículo a voz, também, do Charlie Brown no Snoopy e da música final da dublagem de A vida de Brian.

A voz do Chaves feita pelo Gastaldi era única, sabe-se. Mas tem uma coisa: o cara morreu em 1995 e... até hoje, ninguém nunca conseguiu imitar a voz do Chaves? Em toda esquina se encontra um imitador do Sílvio Santos, em todo bairro tem três ou quatro arremedando a Dercy Gonçalves... e ninguém como Gastaldi? E pior, me colocam uma outra voz no melhor seriado de todos os tempos? Não me entra na cabeça.

E... ok, passou meu momento de indignação. Mas passei a ter essa sensação: alguém que saiba imitar perfeitamente o Chaves e fizer um curso de dublagem ganharia rios de dinheiro dublando no lugar do atual dublador original. Que, convenhamos, é um vexame.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

O amigo do meu pai

O Moura é um cara gente fina, não tenho como negar. Conheci o tal Moura quando eu ainda era bem pequenino, tinha acho que uns cinco ou seis anos. Mas nunca tinha reparado nos últimos 15 anos o quanto ele pode ser... útil? Talvez seja isso.

Perguntei uma vez para o meu pai quem era o Moura, e ele logo respondeu que era um grande amigo. Curioso pra danar, perguntei também o que o Moura fazia da vida, e o meu pai logo disse que era um famoso oculista. Ou oftalmologista, sei lá. Alguém que cuidava dos olhos.

Eu, para falar a verdade, não gostava do Moura. Era bem desagradável meu contato com ele, embora fosse grande amigo do meu pai. Tamanho era meu desagrado com o tal Moura que nunca tive muito contato com ele, ainda bem, nos anos que se passaram.

Até que vários anos se passaram, eu ganhei barba na cara e uma rinite que derrubaria até um rinoceronte selvagem. Uma rinite que resolveu me atacar em pleno final de semana de folga, quando eu estava no meu canto jogado no sofá da sala vendo tevê e esperando o mundo acabar em barranco para eu morrer encostado (notei ultimamente que tenho usado muitas gírias da minha avó, por sinal).

Se não me engano, nunca tive um ataque tão forte de rinite. Meu nariz doía, minha garganta arranhava, meus ouvidos reclamavam e, por fim, meus olhos coçavam como nunca. E eu, que nunca fui lá de conter minhas vontades, não parava de coçar os olhos. Uma besta, eu sei.

Depois de um sábado espirrento, o domingo chegou ainda pior. Até que, à noite, eu mal conseguia abrir o olho direito. Foi horrível dirigir voltando para casa com um olho meio fechado e o outro coçando absurdos. Mas deu certo, cheguei aqui em casa e minha rinite deu uma trégua. Mas meus olhos, que já não coçavam mais, agora ardiam. Demais.

Nem mesmo uma noite de sono, com algumas horas além do esperado, salvaram meus olhos. Acordei segunda-feira com o olho direito roxo, coçando e ardendo. Pouco tempo depois, o esquerdo apresentou os mesmos sintomas. E eu já não sabia mais o que fazer.

Então saí do banho, abri o armário secreto no espelho em cima da pia e lembrei do Moura. Peguei o colírio que meu pai deve usar há uns 50 anos (não o mesmo frasco, imagino), chequei a data de validade... e pinguei uma gota do Moura Brasil em cada olho. Meia hora depois eu já não tinha mais nada – só uma coceirinha bem leve, pra falar a verdade.

Estou indo dormir e passei mais uma dose de colírio Moura Brasil em cada olho, que não me incomodam mais e não possuem um vaso saltado em vermelho. Meu pai estava certo: o Moura era um cara bem legal. E grande amigo meu, também.