quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Faixa de pedestres

Parou para atravessar a avenida movimentada de sempre, faltavam oito para as duas. Não precisou olhar para os dois lados, os carros zunindo à frente indicavam que não poderia passar. Ergueu o tronco, olhou para a frente. E ela estava lá, do outro lado, querendo atravessar.

Tirou os óculos escuros para vê-la melhor. Não estava do mesmo jeito que antes, de quando a tinha deixado. Estava... estava mais bonita? Parece que sim. Tinha perdido os dois quilos de que ela tanto se queixava. Tinha tirado a tinta do cabelo. Também usava óculos de sol (e como mulheres ficam lindas com óculos de sol!). Mas tinha o mesmo sorriso de sempre.

Então ela estava lá, depois de tanto tempo. Fazia tanto tempo que nem parecia. Não se falavam desde esse muito tempo, que não valia a pena ser medido em horas, dias, semanas ou meses terrestres. Nada da Terra fazia mais sentido uma vez que ela estava... ali, logo à frente.

Era o reencontro mais inesperado que podia esperar, embora o que mais esperava. Claro que fantasiou cruzar com ela novamente um dia, e tinha como principal fantasia um esbarrão naquela avenida. O mundo passa por lá, por que ela também não passaria? E... estava passando... justamente... naquele momento... por ali.

Torceu para o semáforo não mudar. Queria continuar ali, olhando para ela à distância. Até recolocou os óculos escuros para não parecer que estava mirando, observando, visando, admirando... cobiçando, desejando e até secando. Ficou ali o máximo que pôde, ensaiando algumas palavras de efeito. “Oi, você vem sempre aqui?” foi a primeira que pensou. Não conseguia pensar e olhar ao mesmo tempo, duas tarefas extremamente complicadas.

Os minutos que separaram o mudar de cores do semáforo nunca foram tão rápidos e nem tão demorados – prova de que o tempo terrestre não fazia sentido algum. As pessoas ao lado começaram a atravessar. Não sabia se ficava parado, se andava, se saía correndo, se pulava ou se se atirava ao chão. Não sabia nem se chão era com x ou ch. Não disse que pensar e olhar era muito complexo?

Levou um esbarrão e começou a andar, as pernas ainda tremiam. Continuaram tremendo. Os joelhos quase não suportaram a pressão e por pouco não estouraram. O coração, intruso em sua traquéia, também – e bloqueava a respiração. Apenas as mãos não ficaram na iminência de uma explosão. Simples: estavam tão molhadas, não tinham tempo para outra coisa.

Ela se aproximava. Fala, não fala, fala, não fala, fala, não fala... ... ... fala, não fala, fala, não fala... falou. “Hey”. Sorriu, tirou os óculos escuros para ser reconhecido. Ela se virou, fez dos óculos tiara. Não sorriu. Desvirou o pescoço, ajeitou os óculos novamente sobre o delicado nariz e seguiu o passo lento até chegar à outra calçada.

“Não me reconheceu”, pensou. “O cabelo, só pode ser o cabelo. Sabia que devia ter mantido o mesmo penteado”.

Tolo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Voltei, porra!!!

:)

E você continua inspirado como sempre, rapaz.