quinta-feira, 27 de março de 2008

Questões capilares

Aquilo que eu mais temia aconteceu. E justamente em um dia desses de manhã, quando eu menos esperava (por mais constrangedor que possa parecer, vou contar tudo da forma como as coisas se sucederam, sem rodeios).

O dia não havia ainda ultrapassado as sete horas quando meu cachorro começou a chorar à porta do meu quarto. Ciente que eu estava lá enclausurado, o massacote pedia por companhia e, ao mesmo tempo, pelo conforto de dormir na minha cama, sobre as minhas canelas.

Levantei meio cambaleante e abri a porta. Enquanto o cão corria para se perder entre o cobertor da minha cama, passei antes no banheiro para tirar o aparelho móvel que machucava a minha gengiva e para fazer um bochecho rápido. Mas, ao me olhar de relance no espelho, notei algo diferente.

Não, aquele do outro lado do vidro não poderia ser eu. Estranho. Era o mesmo olhar, o mesmo narigão, o mesmo contorno do rosto, o mesmo pescoço comprido, a mesma orelha, o mesmo sorriso mambembe... mas não me identificava comigo mesmo. Faltava algo em minha cabeça. E eu logo percebi: cabelos.

Como assim? Nunca havia percebido que meus cabelos tinham começado a cair. Quer dizer, vez ou outra eu notava uns fios sobre os teclados dos computadores do trabalho e de casa. Mas... era um fiozinho aqui, outro ali... nada de mais. Como não havia notado o começo das entradas? E... e como não havia notado essas falhas que mostravam o couro cabeludo? E como meu pai mentiu pra mim aquele dia 15 anos atrás, quando disse que eu não ficaria calvo por causa da genética?Não era possível, eu estava... eu estava calvo.

Eu estava calvo. E justamente eu, que sempre tive uma cabeleira hirsuta, volumosa e rebelde. A partir de então, deveria dividir os fios, alocar um aqui, cobrir um vãozinho com outros ali... tudo para tentar esconder essa calvície que eu não havia notado anteriormente.

Era uma nova vida que se iniciava naquela manhã. Eu, calvo, teria como esconder essa careca? Boné? Não, muito informal pro trabalho. Boina? Não... ainda não tenho idade para isso. Chapéu? Ah, qualé, estamos no século 21!

Restou-me, então, ficar conformado e voltar para a cama. Dormi mais alguns instantes, acordei apenas com uma amiga no telefone me chamando para um almoço. Pensei em contar-lhe a notícia, mas preferi não falar nada. Quer dizer... ela me via quase todos os dias, já deveria ter percebido o que eu não havia notado.

Levantei, abri a janela do quarto e, no reflexo do vidro, notei algo diferente no meu rosto. Não, aquele do outro lado do vidro não poderia ser eu. Estranho. Era o mesmo olhar, o mesmo narigão, o mesmo contorno do rosto, o mesmo pescoço comprido, a mesma orelha, o mesmo sorriso mambembe... mas não me identificava comigo mesmo. Havia algo em minha cabeça. E eu logo percebi: cabelos.

Corri para o banheiro e lá estava a minha vasta cabeleira hirsuta, volumosa e rebelde. Bastante rebelde após uma noite de sono. Sorri ao rever os meus cabelos de volta. Sorri, ri, gargalhei. E gargalhei ainda mais ao ver o meu cachorro deitado no sofá da sala olhando para a minha cara sem entender.

3 comentários:

Alemão disse...

Maldito, eu ia te zoar por ter ficado careca...

Qualquer problema, transfere um pouco da barba.

Mas afinal, que raios é hirsuta?

Caroline Arice disse...

Para uma mulher, o pior dos pesadelos.
E, olha, você posta quase todos os dias. Pois não disse que era muito mais certinho do que eu?

Anônimo disse...

Pô, sacanagem... Também já estava me preparando para te zoar, hehehe!