sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Paradoxo carnavalesco

Morar próximo à rodoviária que liga São Paulo ao litoral sul nunca me foi útil para muita coisa. Mas hoje, ao ver um mundo de gente com malas feitas indo para Santos, me lembrei de uma outra sexta-feira de carnavais atrás naquele mesmo cenário.

Aquele início de noite de sexta-feira carnavalesca estava tão normal quanto o das de todos os anos: quente, apesar da chuva que havia caído durante a tarde, e com uma certa alegria no ar. Carnaval, oras.

Ao seguir minha tradicional rota para casa, passando em frente a uma das lanchonetes da rodoviária, vi várias pessoas sentadas em volta de várias mesas se esbaldando com chopes em copos plásticos (algo próximo à heresia, diga-se). Todas esperavam o horário de seus ônibus rumo à praia, menos um: um cara sentado ao balcão.

Diferentemente de todos os outros daquele ambiente, o cara, bem vestido, com calça jeans e gola pólo, já beirando os 30 anos, não bebia chope, mas café. Não estava acompanhado, mas sozinho. Não se divertia como os outros, mas claramente se penalizava. Não ria, mas chorava. Copiosamente.

Era estranho pensar que o mundo saía para cinco dias de folga, descanso, farra, folia, libertinagem, libido, luar, putaria, pecados, abstrações e afins, e alguém logo ao lado chorava. Curioso, me sentei a uma mesa um pouco distante, pedi um suco de laranja e passei a observar.

Muitas pessoas que passavam por lá poderiam achar que o tal cara estava apenas bêbado ou drogado. Difícil: ninguém em tais condições tomaria café de uma forma até certo ponto compulsiva. E foi essa a mesma coisa que um policial da rodoviária contou à dona do estabelecimento, que havia estranhado o comportamento do cara do balcão.

Ainda soluçando, o cara pediu mais dois cafés antes de se levantar, com seu passo trôpego e soluçante, e ir embora. Difícil saber o que se passava com ele: se havia sido demitido, perdido algum familiar, terminado um noivado de 15 anos... sei lá, parecia ser alguma coisa grave.

Minutos depois, uma garota, já zureta por causa dos chopes, foi ao balcão reclamar com a caixa: seu sanduíche não tinha palmito. Reclamou, reclamou, reclamou... depois chorou um bocado, fez uma ceninha, ganhou um palmito e embarcou para a praia feliz e contente. Ah, as alegrias sintéticas. Ah... o carnaval!

Um comentário:

Anônimo disse...

É bom saber que algumas pessoas conseguem reparar nesses detalhes, mesmo em meio a tanta bebida e sacanagem no ar.
Aham.