terça-feira, 13 de novembro de 2007

Febre

Alguns meses atrás, preparei um post cujo final não me senti à vontade para escrever naquele momento. Deixei o arquivo encostado para algum período de vacas magras e acabei esquecendo o probrezinho nas profundezas do meu pendrive improvisado. Mas recentemente me lembrei daquelas palavras e senti que a hora de publicá-lo era esta. Só que acabei não o encontrando mais. Melhor.

Lembro que minhas primeiras palavras eram “Se o Pink e o Cérebro não conseguiram conquistar o mundo foi porque não tiveram a idéia de lançar um jornal gratuito”. Por quê? Bom... achei que tinha chegado a essa conclusão por causa da febre e da acirradíssima rivalidade entre o Destak e o Publimetro, que polarizavam a distribuição nos semáforos das principais avenidas de São Paulo.

Tudo isso começou quase ao mesmo tempo em que iniciei minha jornada matutina na Gazeta. Logo no metrô Jabaquara, via cerca de 90% dos passageiros munidos de um Destak. O tablóide de raízes lusitanas era rapidamente devorado e algumas de suas notícias invariavelmente eram comentadas ainda dentro do vagão do trem. Isso começou a me assustar um pouco.

Mas foi na Avenida Paulista que talvez por pouco não tenha rolado uma guerra. Vendo o sucesso do Destak, o Metrô decidiu aumentar a tiragem do Metronews, que há tempos era distribuído em quase todas as estações, mas que nunca chegou a cair no gosto do leitor. A destakmania, porém, fez com que o pequeno diário voltasse à ativa.

Em junho, no entanto, o capítulo mais notável foi escrito. De um dia para o outro, brotaram garotas vestidas de um verde marca-texto distribuindo um outro tablóide: o Publimetro, originado na Suécia, mas no Brasil vinculado ao grupo Saad – o mesmo da Bandeirantes.

Com uma diagramação diferente e uma impressão muito próxima da perfeição, o Publimetro praticamente matou o Metronews e passou a ganhar parte do público do Destak com uma tática infalível: quando os semáforos da Paulista ou de suas alamedas fechava, um batalhão de vaga-lumes distribuía um exemplar.

Batata: sucesso na certa. E não era para menos. E na própria redação ouvia vários elogios ao jornalzinho dos Saad, que aliás eram clientes de foto e texto da Gazeta Press.

Vendo isso o Destak não ficou para trás. Comprou uniformes de um tom vermelho-florescente, carrinhos iguais ao do Publimetro e também passou a fazer a distribuição nos semáforos. Tinha dias em que ia trabalhar de manhã e via uma disputa luminosa ao longo de toda a Paulista. Era até engraçado. Mas, no fundo, me perguntava uma coisa: será que a moda ia pegar mesmo, e os jornais gratuitos substituiriam os da banca?

Tive a resposta para essa pergunta em setembro, quando o editor-chefe do Destak (um jornalista cujo nome eu esqueci) realizou uma palestra na Cásper e, para o terror do coordenador do curso e para os universitários mais inocentes, quase me convenceu de que o Destak era a oitava maravilha do mundo. Por quê? A tiragem era enorme, o ganho com publicidade mais ainda, a circulação de um exemplar era muito maior do que as de Estado e Folha, por exemplo, e que uma boa fatia da sociedade paulistana estava migrando para os novos impressos... e o melhor: o formato tablóide, muito mais prático do que o standard.

De fato o formato tablóide é algo relevante. Leitor assíduo do Lance! na sétima série, tinha muito mais facilidade para me organizar no metrô. Prova mais concreta disso hoje em dia é testemunhada por centenas de pessoas diariamente, que devem até achar engraçado a luta atrapalhava que eu travo com o Estado todos os dias dentro de um metrô no horário do rush.

Só que... é tudo? Comecei a ver que as publicações gratuitas não eram tão boas assim na mesma palestra. Primeiro, perguntaram para o editor do Destak como era feita a apuração pela reportagem do jornal. A resposta, que eu já intuía, foi simples: as notas eram chupadas de outras mídias. Matérias in loco? “Não, eh.. .veja bem...”. Estava respondido.

E, ao mesmo tempo, todos os dados apresentados pelo experiente jornalista se tornaram irrelevantes para mim. Será que o Destak de fato tinha todo aquele número de leitores ou eles achavam que todos que pegavam o jornal no semáforo eram clientes assíduos da publicação? E também... é muito fácil dizer que você despacha 100 mil exemplares diariamente sendo que você não os vende.

A prova real foi tirada em uma segunda-feira de manhã, quando peguei um Publimetro pela manhã: as notícias não passavam de simples notinhas de, no máximo, dois parágrafos (geralmente o lide e uma aspa). Profundidade? Humm...

Ao mesmo tempo em que percebi que os jornais gratuitos não eram tão perfeitos assim, comecei a trabalhar à tarde e perdi os rituais da distribuição dos tablóides. Nas últimas semanas, com meu retorno ao expediente matutino, percebi que não havia mais disputa. O Destak acumulava nas mãos das distribuidoras de calçada. Na avenida, era raro ver alguém entregando nos carros. E o Publimetro? O Publimetro tinha desaparecido?

Achei que o tablóide Saad tinha desaparecido como muitos outros. Até hoje, quando, coincidentemente, recebi um exemplar. Fazendo uma rápida comparação entre os destaques do Estado e do Publimetro, bom... para se ter uma idéia, o gratuito tinha como uma das manchetes “Tropa de Elite é o filme nacional mais visto do ano”. Humm... tá. E a notícia, cadê? Dentro das páginas, outra coisa: o conteúdo, que já era pouco, perdeu ainda mais espaço para os anúncios publicitários.

Passei o dia tentando refletir sobre o caso e percebi o quão enganado estava ao imaginar que os jornais gratuitos eram o segredo para se conquistar o mundo. O fenômeno dos tablóides for free não passou de uma febre passageira que não durou nem um ano. Talvez por isso o Pink e o Cérebro sequer tenham pensado em tentar tal plano infalível.


Se você perdeu todo esse tempo, leu tudo isso e, assim como seu, sentiu que esse texto não tem conteúdo algum, confira a opinião do André. Menos crítica, mas muito mais embasada do que a minha.

Um comentário:

Carolina Maria, a Canossa disse...

Eu duvido que a grande mídia, especialmente os jornais, um dia vão desaparecer. É uma cascata tão grande quanto a que dizia que a TV acabaria com o rádio. Tudo pode conviver junto.

Desde que o jornalismo nasceu, há quem diga que ele está em crise...