sexta-feira, 27 de março de 2015

Helter Skelter

Muitas vezes me reprimiam quando eu franzia a testa, apertava o botão para mudar de faixa e dizia não suportar Helter Skelter. Sempre ignorei o fato de “ser um clássico, conviva com isso” e batia o pé com meu melhor argumento: “é uma barulheira sem o menor sentido”.

Assim foi até 26 (ou já 27) de novembro de 2014, quando eu estava vendo o segundo show seguido do Paul McCartney em dois dias seguidos. Era tarde, muita gente já tinha ido embora sem ligar que a apresentação ainda não havia terminado.

Eu olhava com um pouco de dó para aqueles que simplesmente se levantavam de seus lugares, esticavam as pernas e se dirigiam à saída do estádio. É, era uma sensação de dó, algo como “cara, mas ainda não acabou, fica aí por favor que você vai gostar!”. Só não senti isso de um casal de velhinhos, que estavam próximos a mim e que também se levantaram e começaram a ir embora ao final de Yesterday.

E aí o Paul começou a tocar Helter Skelter. Sem falar nada, apenas consentindo com todas as pistas não-verbais de que dispunham, ambos se detiveram naquele mesmo lugar onde estavam quando o primeiro acorde de Mi soou. E começaram a chacoalhar os corpos e a balançar as cabeças de cabelos brancos.

When I get to the bottom I go back to the top of the slide, where I stop and I turn and I go for a ride ‘till I get to the bottom and I see you agaaaaaaaain yeah yeah yeah.

Não vi o Paul tocar Helter Skelter aquela noite. Parei e dediquei toda minha atenção à dança do casal de velhinhos. E eu, que já havia chorado de todas as formas possíveis durante o show daquela noite, abri a comporta para o volume morto de lágrimas que me restavam.

“Aprende com a experiência”, me falaram certa vez que contei essa história.

Acho que aprendi.

Hoje, alguns meses depois disso, ouço Helter Skelter e me arrepio. A música acabou se tornando uma das minhas (dezenas) favoritas da minha banda preferida.

Ainda é uma barulheira, eu sei. Mas com o maior sentido.


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