sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

Notas sobre nada

Imagine um mundo sem palavras.
Seria esquisito, e o olhar regeria a vida. Mas, sinceramente, seria muito melhor. Sim, não haveria mentiras, barulho depois das 22 horas... não haveria panfletos e (conseqüentemente) nem poluição nas ruas, entupimento de bueiros e as enchentes nunca aconteceriam.

Pode até parecer uma coisa meio primária, só que quando penso nas pessoas se comunicando por meio de olhares, imagino um cara barbudo, cabeludo, de tanga e com um porrete na mão. Quando estou mais bem humorado, penso no Capitão Caverna.

No entanto, teríamos que pagar um preço pela inexistência das palavras. Sim, os livros jamais existiriam. O conhecimento, tampouco. O poder seria uma coisa de que nunca ouviríamos falar (até porque jamais ouviríamos alguém falar alguma coisa). Poderíamos, contudo, até ter moeda de troca, que seria o dinheiro como hoje em dia.

O problema é que tudo tem uma palavra. Hoje, fui depositar alguns trocados na minha conta e comecei a pensar como seria a cédula sem palavras. No nosso 'novo modelo', não teríamos quantia alguma impressa nela, apenas a cor seria para definir o valor. As cores mais gritantes seriam pras notas de valor mais elevado. Como isso já acontece mais ou menos atualmente (tirando o fato de que a nota de 100 não tem muita diferença pra nota de 1; e as notas de 10 e 20 têm as cores mais gritantes), teremos um valor impresso em cada. Mas de uma forma diferente. Aquele rosto com uma coroa de louros na cabeça teria uma expressão pra cada valor. A nota de 1 poderia ser um olhar desiludido. A de 2, uma sem jeito. A de 50, seria um sorriso bobo. E, logo, numa nota de 100, ele teria um olhar orgulhoso e esperançoso, com um sorriso de orelha a orelha mostrando todos os dentes (se ele tiver).

Besteira. Só que as mentiras não seriam tão freqüentes, a menos que você utilizasse os óculos escuros. Não, melhor não. Os óculos escuros seriam apenas para lugares onde o silêncio fosse importante. Uma biblioteca, por exemplo. Ninguém poderia se comunicar utilizando os olhos escuros. Voltando às mentiras, seria impossível. Ninguém conseguiria mentir com o olhar. Sabe, é muito difícil, até porque o sorriso também é cúmplice dos olhares. Viveríamos em um mundo de verdade.OK, e viveríamos num mundo primitivo.

Seja lá como for, viveríamos no mundo dos sons (afinal, o mundo é sempre das coisas que nunca conseguimos ter, ou fazer. Não vivemos hoje no mundo das sensações? Então, hoje em dia, ninguém mais consegue ter sensação nenhuma. Ou vivemos no mundo do poder. Alguém tem poder de verdade? Talvez o mundo do dinheiro... deixa pra lá).

Não sei por que estou dizendo isso tudo. Acho que é porque foi essa a sensação que eu tive há alguns instantes e fiquei com medo de perder uma idéia fabulosa. E também porque, a cada dia que passa, venho me comunicando com mais pessoas à medida que me comunico menos. Blah, perdi uma idéia fabulosa e alguns minutos escrevendo sobre nada. Escrevendo uma besteira.

Pronto, parei. Até porque está na hora de eu começar meu trabalho. Palavras, palavras, palavras. Textos, comunicação.

Seria melhor se nosso pensamento não fosse regido pelas palavras. Quer dizer, pense em alguma coisa sem pensar em palavras. Sem formar uma frase... não dá!

Pronto, parei. De verdade.

Um comentário:

Karina Tambellini disse...

"Seria melhor se nosso pensamento não fosse regido pelas palavras".

Eu penso nisso direto, acredita?

Só discordo de uma coisa - tem gente que sabe mentir até mesmo com o olhar/sorriso.

Ou será que sou eu que me deixo facilmente enganar?

[saudade]
bjs =*