Não estava fazendo nada de mais por aí um dia desses, um amigo me fez uma proposta: “E aí, Helda, vamos pro jogo do Corinthians?”. “Humm...tá bom, bora”, respondi. Combinamos um horário para nos encontrarmos no metrô e tudo ficou acertado. Não sou corintiano, mas... ir ao jogo não ia tirar pedaço.
Descemos nas Clínicas, fomos conversando sobre futebol e outros assuntos mais até chegarmos ao Pacaembu. Entramos, sentamos na arquibancada verde (pelo menos isso, né?) e continuamos conversando até o jogo começar. O estádio encheu mais, mas não ao ponto de atrapalhar a minha visão do campo.
Ao nosso lado se sentou um velhinho. Colocou uma folha de jornal no concreto e se acomodou sobre o papel. Eu, com minhas observações assaz impertinentes e irrelevantes, não deixei de comentar com o meu amigo: “Cara, você não suja a mão lendo jornal? E... sujeira por sujeira, você pelo menos salva o meio-ambiente, sei lá”, filosofei. Acho que ando pensando muito no meio-ambiente (já até propus um modelo alternativo para secadores de mão, né?).
Meu amigo concordou e seguimos um outro papo. Até que o jogo começou, saiu o primeiro gol do Corinthians e o tal do velhinho veio perguntar quem tinha balançado as redes. “É, foi... foi o Elias. É, ele que é o número 7”. “Golaço, golaço!”, ele vibrou. Sorri e passei a analisar o jogo com meu amigo.
O Corinthians fez mais um gol, e o velhinho novamente me perguntou o autor. “Dessa vez foi o Douglas”, expliquei. Até que o primeiro tempo terminou 2 a 0 para o time da ‘casa’ (embora não tenha casa, haha) e, no intervalo, o tal do ancião puxou um papo comigo para falar do jogo, e da situação do Corinthians no campeonato, e das chances de o Juventude ser rebaixado... e eu, palmeirense, tentei não decepcionar o parceiro de conversa.
A partida recomeçou e não demorou tanto assim para sair o terceiro gol. “Quem fez agora?”, o velhinho perguntou. “Foi o André Santos, senhor”, expliquei. A torcida, então, começou a cantar mais alto. Notei que ele se empolgou bastante, embora continuasse sentado. Logo, se inclinou para mim e puxou novo assunto.
“Ali é que ficam os gaviões, né?”, ele questionou, apontando para outra arquibancada. “Sim, sim”. “Que festa bonita!”, exclamou. “Pois é, não tem como negar”, reconheci. “Você sabia que essas músicas que eles cantam já são ensaiadas?”, ele prosseguiu. “Hum... ah, é, né?”, enrolei, tentando segurar o riso. “Eles ficam treinando antes do jogo, pra não errarem na hora”, ele me ensinou.
Olhei de soslaio para meu amigo, que ouvira tudo e já quase ria. Ele, corintiano, mal torcia também. Estava mais engraçado fazer comentários inúteis sobre tudo e reclamar do moleque mala de uns sete anos na fileira da frente, que não falava nada com nada, não sabia o nome de nenhum jogador e gritava gol quando a bola ainda estava no meio-campo. “Moleque filho da puta, não é pra gritar gol antes da hora que dá azar!”, meu amigo reclamava. E eu ria.
Ainda faltavam alguns minutos para o jogo acabar quando o velhinho levantou da folha de jornal, se despediu de mim e foi embora. Todo orgulhoso por ter visto seu time vencer. Nem viu que o Chicão marcou mais um, o quarto do Corinthians, em uma cobrança de pênalti. Confesso que senti falta de dizer quem foi o autor do gol.
Saí do estádio não muito contente com a vitória do Corinthians, mas... mas ah. Aquele velhinho desinformado e todo perdido, que devia acompanhar de perto os times de 50, 60 e 70, foi realmente algo interessante.
Apesar do gelo daquela tarde, saiu de casa sozinho para ver uma partida de futebol. E talvez ter a única alegria da vida, que é ver ‘os gaviões’ cantarem as músicas que ensaiam antes da partida.
Mas, nem por toda essa festa, o velhinho se dignava a sujar as calças no concreto sujo do Pacaembu.
4 comentários:
O texto tá muito legal, a história do velhinho é boa demais, mas fica a dúvida:
tá com saudade da Segunda Divisão, é?
:-D
Adorei esse velhinho, muito fofo.
E o Pécora do rádio deve ser meu pai.
Beeeeijo
é uma história muito boa.
inclusive, concordo com o velhinho: tbm não sujaria minhas calças...
nem pelo São Paulo!!
P.S.:
Cê gosta da turma da Mafalda, né?
"E talvez ter a única alegria da vida, que é ver ‘os gaviões’ cantarem as músicas que ensaiam antes da partida". Nossa, mas que drama... rs
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