Chegar ao final de um livro muito bom é algo triste. É quando você sente um enorme vazio no peito (que, tomadas as devidas proporções, até lembra a sensação de ter que se 'desapaixonar' por alguma garota). Assim que a última página é virada, você percebe que gastou talvez centenas de horas em uma leitura muito boa e que as páginas foram devoradas irracionalmente. Em momento algum você pensou que a história, um dia, chegaria ao seu fim e que aquele assunto estaria esgotado.
Ler livros sensacionais causa um trauma muito difícil de ser superado. É complicado manter o mesmo ritmo de leitura em um livro novo, e o pior: tudo o que for lido a partir de então vai parecer ser mais fraco. E, talvez, chegue um momento em que você sinta raiva do novo livro por ele não ser tão bom como o antigo. E, dependendo do caso, pode acontecer de você ficar meses sem conseguir terminar um livro.
Você simplesmente perde o rumo durante algumas semanas. Quando não tiver nada para fazer, não adianta recorrer àquele livro que você tinha acabado de ler, porque ele não vai estar mais ali. Quando andar de metrô, não adianta revirar a mochila, porque o livro ficou guardado na estante, ao lado de muitos outros que você já terminou e não tem vontade de reler. Por mais que alguns detalhes sejam entendidos em uma releitura, é sempre divertido em em busca de um novo desafio. O problema é quando ele não vem.
Digo isso por experiência própria. Quando tinha oito anos, descobri que o Walt Disney fazia almanaques de 300 páginas de gibis pelo mesmo preço que uma revistinha normal da Turma da Mônica, que, com muita sorte, atingiam as 40 páginas. Minha mãe, que financiava minha leitura naquela época, achou ótima a descoberta e passou a patrocinar também as minhas leituras do Pato Donald.
Naquela época, porém, sentia algo esquisito quando terminava, por exemplo, um especial 1996 do Natal do Pato Donald. Não era a mesma coisa pegar para ler um apanhado de histórias do Mickey, por exemplo. Era sempre algo diferente, cuja adaptação demorava um bocado para acontecer. Mas sempre acontecia.
Aos poucos, fui crescendo e trocando as histórias em quadrinhos por alguns livros. E a mesma sensação de vazio quando virara a última página de uma história legal continuava. No final do último ano, a coisa continuou. Comecei a ler Olhai os lírios do campo, do Veríssimo-pai, e em poucos dias acabei a sensacional história. Foi triste não saber o que ler em seguida, algo que pudesse manter o nível da trama de Eugênio, Olívia e Anamaria. Nem mesmo as crônicas do Veríssimo-filho, sempre geniais, me despertavam tanta vontade de ler.
Até que um dia me indicaram um livro do Marcelo Rubens Paiva. Li e achei bem legal. No mesmo dia que acabei de terminar, fui a um sebo e comprei outros dois escritos por ele. E assim foi até chegar ao Malu de bicicleta, talvez o melhor que ele já escreveu. Quando a história se encerrou, também percebi que havia lido todos os livros do MRP em menos de seis semanas. Foi difícil encontrar alguma coisa tão boa quanto. Li uns três ou quatro muito bons logo em seguida, mas que perderam um pouco de sua essência por não serem iguais à série do Paiva.
Minha sede pela leitura voltou em junho, quando tirei dois ou três livros do fundo da estante improvisada. Retomado o ritmo frenético de leitura, tomei coragem para comprar o último capítulo de Harry Potter, com exatas 759 páginas. Saí da Fnac com a sensação de que tinha jogado dinheiro fora, porque não estava preparado para encarar algo daquele tamanho – e muito menos em inglês. Ledo engano: em sete dias, tudo chegou ao fim depois de um ritmo alucinante de leitura que me surpreendeu de verdade.
Senti, então, que estava pronto para ler muitos livros nas semanas seguintes. E pela segunda vez me enganei a respeito do assunto. Peguei um na biblioteca da faculdade e li as primeiras páginas no metrô. O assunto da história é muito bom, mas a tradução feita é muito ruim. Terrível, se for o caso.
Ainda assim, venho tentando aos poucos terminar de ler essas 170 páginas. Não sei por que, mas sinto que não vou conseguir. Mesmo tendo renovado há instantes o empréstimo para mais uma semana (a terceira no total). Não é a mesma coisa. Nunca é.
Um comentário:
Sabe o que é mais triste? Quando você já leu tudo de um autor que já morreu. E sabe que, tirando um ou outro inédito, nunca mais vai ter algo filé, inédito. Sou assim com Caio Fernando Abreu,
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