segunda-feira, 16 de julho de 2007

Ídolo de um país carente

- Filho. Filho, tô indo na padaria, tá?
- Ahn? Ah... tá, vai lá, mãe.
- Você tá cansado, dorme mais um pouco.
- Uhum...

Antes de dormir um pouco mais, olhei no relógio. Eram 16 horas e alguns minutos. Rodei entre os três canais do Sportv e ia começar a luta do Diogo Silva, na final do taekwondo no Pan. Decidi ver e dormir mais tarde. Talvez à noite.

Achei bacana o cara ganhar, faturar o primeiro ouro do país na competição e blábláblá. Também achei legal pra caramba ouvir o hino pela primeira vez, ver a medalha dourada pintando na tela da tevê e, claro, foi emocionante ver o cara chorando quando começou a tocar o hino.

Depois, as entrevistas. E todos os jornalistas que estavam no Riocentro se matavam pra ouvir as primeiras palavras do grande campeão. Do primeiro campeão do Brasil no Rio-2007, do primeiro taekwondista verde e amarelo campeão pan-americano do século e essas coisas. Mas ele não falou nada de mais.

Hoje, porém, acordei cedo. Cheguei na redação, liguei a tevê e ouvi, ao longo de cinco horas, umas mil entrevistas iguais com o Diogo. A história dele foi repetida um milhão de vezes, a luta decisiva – com a narração do chato do Lucas Pereira – foi reprisada dois milhões. Nada novo.

Agora à noite, consegui fazer com que a televisão daqui de casa voltasse a ter sinal. Sintonizei a Record e estava passando uma especial sobre a vida do Diogo. Foram à academia onde ele começou a treinar, entrevistaram alguns amigos (que logicamente estavam emocionados)... Minutos depois, o Jornal Nacional mostrava o primeiro passeio do campeão fora da Vila Pan-americana. A festa que a galera fazia na praia, as fotos que pediam para tirar do cara e tudo mais.

Por incrível que pareça, a matéria do Diogo durou mais tempo do que a repercussão do título da seleção na Copa América. Mais que o futebol! Tamanha a importância do primeiro campeão do Brasil no Pan do Brasil. Tá certo que convinha não deixar tanto tempo no ar o Dunga, que era criticado pelo Galvão Bueno e por toda a trupe de comentaristas da Globosat, como o grande vencedor. Era mais interessante ver alguém desconhecido, sugar dele tudo o que ele tinha para falar.

Mas não é aí onde eu quero chegar. O fato de o Diogo estar no ar durante tanto tempo tem a ver com o fato de o povo brasileiro não ter motivos para sorrir todos os dias. O esporte, por mais precário que esteja, é um dos motivos de identificação da população. Já havia pensado nisso há alguns meses, quando o Felipe Massa ganhou o GP do Brasil no final do ano passado.

Ver um atleta brasileiro no degrau mais alto do pódio é bacana. Todo mundo se identifica pra caramba com isso. Um cara próximo da gente, que nasceu pobre, via o Casseta & Planeta às terças-feiras, via as videocassetadas no Domingão do Faustão e sentia o trauma da segunda-feira com a musiquinha do Fantástico... a gente fica com a sensação de que pelo menos um teco daquele ouro é nosso.

E acho que até todo mundo tem o direito de pensar isso. Menos o Faustão. Enquanto o Diogo ganhava o ouro e alguns brasileiros vibravam, ele passava o divertidíssimo Circo do Faustão. Ninguém acreditava que o negão ia ganhar, né? Afinal, taekwondo... Pois é, deu no que deu.

O problema é que, daqui uma semana, vão esquecer do Diogo e do taekwondo. Tá, pode ser que a Natália Falavigna consiga alguma coisa amanhã, mas isso não faz com que o imediatismo do esporte saia de cena. Todas as matérias especiais que toda a imprensa fez vão ser esquecidas em agosto. E o Diogo, quando sair nas ruas, com certeza vai ser reconhecido pela galera. Não como o dono do primeiro ouro do Brasil no Pan, mas como o Seu Jorge. Ou como o Falcão.

Digo isso porque, hoje, lembrei de uma coisa que aconteceu quatro anos atrás. No dia 5 de agosto de 2003, o Hudson de Souza surpreendeu e conseguiu o primeiro ouro do Brasil no Pan de Santo Domingo-2003, nos 5.000m masculino. Choveram matérias com ele. Entrevistas e tal. E isso aumentou ainda mais quando ele ganhou também a prova dos 1.500m. O Hudson irá competir o Pan do Rio este ano. E ninguém se lembra do cara e nem da história de vida dele. Nem eu, claro.

É bem provável que o mesmo aconteça com o Diogo, e ninguém se lembre dele nas Olimpíadas de Pequim-2008 ou no Pan de Guadalajara-2011. Talvez, ninguém irá se lembrar dele depois de sair o próximo ouro do Brasil no Rio-2007. A conquista dele foi sensacional, mas... a fila vai andar.

Somos um país carente. Não temos nenhum ídolo de quem possamos nos orgulhar a não ser do esporte. O cara que proclamou nossa independência virou rei de Portugal anos depois. Carmen Miranda, assim que ficou famosa, foi para os Estados Unidos. Não temos nenhum líder político como a Rainha, Eva Perón, Gandhi, Josip Broz Tito, Trostky, Lênin, Che. Temos o Pelé. Em compensação, os times brasileiros não têm mais ídolos....

Assim, só nos resta esperar mais um ouro. E mais um ídolo-mor do país. Durante uma semana. Igual àquela música dos Titãs.

2 comentários:

Lia Lupilo disse...

lovely =]
eu tb não aguentava mais ver a reprise do diogo.
mas confesso que não aguentei o segundo tempo do jogo final da copa américa. Ó VIDA!
e o que eu queria ver, final masculina por aparelho, NENHUM canal passou,
droga!
essa cobertura está deixando a desejar (salvo aquele site ótimo, a gazetaesportiva.net)
^^'

=0**********

Lia Lupilo disse...

ahh, claro.
nós temos heróis: o tiradentes, a princesa isabel, os BANdeirantes =PPP
é por isso que eu prefiro que eles não existam mesmo.
na verdade, a questão não é nem essa.
eles não exstem mesmo.
nós que os inventamos
=]