Olhou para o lado e ela já não estava, embora pudesse vê-la claramente. Via-a, sabia perfeitamente onde aquele corpo havia tocado, milímetro por milímetro. Fechou as janelas para conservar o perfume. Respirou o mais lentamente que conseguiu para se manter lúcido enquanto abastecia o cérebro com cada vez menos oxigênio. Economizou aquele ar que havia sido contaminado com o cheiro dela. Afundou o nariz naquele lado do travesseiro, para tentar impregnar-se com as micropartículas do aroma que tão bem (e tão mal) lhe fazia.
Queria guardar aquele cheiro para sempre.
Fechou os olhos. Inspirou (economicamente) fundo.
Lembrou-se daquela noite, daquele momento em que ela, dançando com as amigas, se posicionou estrategicamente na frente dele. Ele, agora deitado na cama, repetia timidamente os movimentos que a viu fazer.
Deixou-se hipnotizar por ela naquele instante. E perdeu a consciência quando percebeu que ela, a cada cinco ou seis compassos, torcia discretamente o pescoço para o lado e deixava com que os olhos dela se cruzassem com os dele, por menos de um segundo.
Ela sorriu? Aquilo foi um sorriso?
Nunca soube.
Sempre soube.
Teve vontade de esticar o braço e puxá-la para dançar. Deixar-se levar pelos movimentos que ela conduziria com curiosa destreza - sem qualquer referência técnica, guiando os corpos da maneira que melhor lhe conviesse. Desejou espalmar-lhe a mão sobre as costas lambuzadas de suor, fazendo força para trazê-la ainda mais para perto de si e para não deixar que a palma escorregasse.
Pensou em tirá-la para dançar. Uma, três, nove, 50 milhões de vezes.
Nunca se arrependeu por não havê-lo feito.
Abriu os olhos. Expirou, soltando a menor quantidade possível de ar. Não podia deixar que o cheiro dela saísse de seu corpo.
Olhou para o lado e ela ainda não estava.
Não havia mais ela.
Não havia mais luz, mais festa, mais povo, mais noite.
Gritou, gemeu, tocou, valsou, (não) dormiu, cansou(-se).
Levantou-se e andou.
Rumo a ela. E para longe dela.
Nenhum comentário:
Postar um comentário