São José dos Campos (SP) - Quando ouvia falar na favela de Heliópolis, imaginava a maior bocada do mundo. Aquele tipo de lugar aonde se vai e, com muita sorte, não se volta com um pipoco no corpo.
A minha ‘primeira vez’ na Heliópolis foi em 2006, quando fui a São Caetano para passar tardes inesquecíveis com uma amiga já citada aqui anteriormente. E não foi nada punk, apesar de o meu amigo, dirigindo, me pediu para fechar o vidro do carro. “Sacomé, né?”. “Uhum, sei”.
Até que em um dia desses, num domingo qualquer, acabei tendo que voltar à maior favela do Estado de São Paulo. E, ao descer do microônibus reservado à imprensa que cobriria a passagem do astro francês Zinedine Zidane, acabei me surpreendendo. “Nossa, as casas aqui são bonitas, bem feitas. E as lojinhas aqui dessa rua, então... pô, bonito!”, pensei comigo mesmo.
Fui seguindo o caminho até a quadra onde o Zizou daria o ar da graça e entrei em uma ladeirazinha estreita, com casas menos abastadas e muita gente nas portas de seus lares. Ouviam música alta, conversavam... tipo o que se faz no interior, eu acho.
Com a cabeça baixa e as lentes dos óculos ligeiramente embaçadas, tomei um susto quando, repentinamente, um garoto de não mais do que oito anos brotou em minha frente assim como um gato preto sai da moita em uma noite qualquer. Então, olhei para o lado e vi uma outra ladeira, com casas precárias, mas com pessoas nas portas. Gente cansada, acabada.
Enfim. Claro que não fiquei pensando na desigualdade social enquanto estava fazendo a cobertura da vinda do Zidane, mas era curioso ver inúmeras pessoas que sobrevivem de uma forma muito abaixo do mambembe em êxtase por ver um... um jogador de futebol que, certamente, ganha em um dia o dinheiro dez vezes maior do que um morador da favela conseguirá em toda a sua vida.
Mas o carequinha francês, embora tenha evidenciado a discrepância entre o primeiro mundo e o submundo de uma favela paulistana, teve uma importância incrível para aquela comunidade. Embora houvesse uma batalha por cada milímetro mais próximo ao Zidane, mostrou a união de todos. E essa unidade exalava um certo otimismo, explicitava um sonho. Era bacana de se ver.
Mas é claro que não pude deixar de notar um detalhe. Enquanto, do lado de dentro da quadra poliesportiva da Heliópolis o apresentador do evento arriscava uns “Zidane, merci beaucoup”, “Zizou, si vous plais” e um “Bienvenue vers lê Brésil, monsieur Zinedine” em um francês aparentemente decorado, do lado de fora um carro clamava por limpeza: “Lavemi por favor”.
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