Tardes quentes de domingos me fazem ficar em casa quando estou de folga, apenas esparramado sobre o sofá em busca de algo na televisão que não seja tão corrosivo para a minha cabeça. Desta vez, sem futebol na televisão por causa das eleições, encontrei Escola de Rock em um dos Telecines. Maravilha.
Acho que foi a quarta vez que vi Escola de Rock, e, como sempre, tive aquela sensação de tirar minha guitarra e meu amplificador de cima do armário e arriscar alguns acordes. Mas, além disso, acabei me lembrando de um dos meus shows mais incríveis. Como nunca falei dele, vamos lá.
Era uma manhã de final de maio ou começo de junho, sexta-feira. Meus amigos de sala e eu, já no terceiro colegial, tínhamos resolvido nos inscrever no show de talentos da semana olímpica da escola. Depois de muitas idéias e desavenças quanto ao nosso repertório (todos eram metaleiros, menos eu), chegamos a um meio-termo que pudesse agradar não só ao pessoal da banda como aos jurados. Iríamos tocar duas músicas do Mamonas Assassinas e, por fim, Rock and roll all nite, do Kiss.
Apareci no colégio logo cedo, umas 7 da manhã, com a minha guitarra nas costas. Andei pelo ginásio praticamente vazio e subi para a sala de aula, onde estavam algumas amigas minhas – uma delas era minha grande paixonite da época, mas não estávamos nos falando já tinha algumas semanas. Depois o resto da banda chegou, assim como as meninas que iriam nos maquiar (parece coisa de viado, eu sei) e fomos para o salão nobre. Vazio, vazio.
Subimos para a coxia e lá começou toda a produção. Desenho aqui, tinta branca ali e acolá, mais tinta branca, pintura preta... peruca (eu era o único que não tinha cabelo comprido), batom (peraí, eu não vou passar batom! Vai, Held, o Chitão também passou. Tá bom, tá bom)... cabo, pedaleira, fonte da pedaleira... guitarra desafinada, afinação… palhetas, onde estão as minhas malditas palhetas puta que o pariu? Ok, uma aqui, uma ali... ok, achei minhas três palhetas. Esparadrapo nos dedos da mão direita (eu sempre me ferro tocando guitarra)… vocês são a próxima banda, vamos lá.
Achei que o salão estaria vazio, já que era manhã de sexta-feira e a presença dos alunos não era obrigatória na semana olímpica. Mas, assim que pisei no palco, vi o salão completamente tomado. Quanta gente tinha ali? 200? 300? Eu chutaria 300, tinha bastante gente em pé. Logo na primeira fila, no entanto, estava aquela tal paixonite. Do alto do palco tentei disfarçar, mas... ok, ela estava na minha frente.
Começamos a tocar, com muito pouca iluminação. Chopis Centi e Jumento Celestino correram bem, sem erros crassos ou acontecimentos fantásticos. Até que as luzes todas se apagaram por completo, o baterista fez a introdução, as guitarras entraram... as luzes piscaram e todos viram que estávamos vestidos de Kiss, tocando Kiss. Uh-la-lá.
Eu, na época, era bem tímido. Muito, muito mesmo. Mas perdia por completo a timidez quando estava em cima de um palco e com a minha guitarra pendurada. E, naquele momento, não tinha resquício algum de timidez ou insegurança. Tanto que, quando estávamos para chegar ao refrão, sugeri por meio de sinais para o restante da banda que ninguém cantasse ou tocasse, exceto o baterista. Deu certo, e o salão inteiro levantou e começou a cantar com a gente. Eu me senti um rock star.
Pouco depois chegou o meu solo. Dei alguns passos para a frente, fui para a beirada do palco e, quando vi, estava pertinho da minha paixonite. Tentei não errar, consegui. Ouvi um elogio da paixonite, dei um sorriso. Putz! Depois o show infelizmente acabou, recebemos aplausos e mais aplausos. Voltei para a coxia, tirei a peruca, limpei o rosto e saí do salão. Em êxtase, ainda.
Nunca fui lá muito popular no meu colégio, admito. Mas naquele dia foi incrível como tanta gente me reconheceu. Até uma menina da oitava série por quem eu tinha uma paixãozinha platônica me parou, perguntou “você era aquele cara que tocou Kiss agora há pouco, né?”. Respondi que sim e ela logo emendou “nossa, você tocou muito, adorei. Parabéns”. Era meu auge, eu estava no topo do mundo e da cadeia alimentar. Eu era um fenômeno.
Curti um pouco meus 15 minutos de fama e voltei para casa. Feliz, feliz da vida. Tínhamos ficado em segundo lugar no show de talentos e fomos convidados para nos apresentarmos na apoteose. Mas a essa segunda apresentação a paixonite não pôde ir. E eu, particularmente, não me senti tanto rock star.
Um comentário:
incrível como precisamos de legitimações tão específicas. somos mesmo nerds, latinha [vc também vai ser latinha, pronto].
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