quinta-feira, 31 de julho de 2008

Por trás da caixa alta

Sinceramente, não sei qual é a estranha ligação da humanidade com o desejo incansável (e incompreensível) de escrever determinadas palavras em caixa alta (ou com a primeira letra em maiúscula, traduzindo para quem não faz parte do mundo do jornalismo).

Aprendi logo nos primeiros anos de alfabetização a hora certa de escrever um ‘A’ assim ou um ‘a’ assim. A professora, não lembro bem se era a Valdívia (sim, eu tive uma professora com o nome de Valdívia) ou a Márcia, disse mais ou menos assim: “As letras grandes, as maiúsculas, a gente escreve para nomes próprios ou no início de frases. As menores a gente usa... no resto”.

Simples assim, não? Humm, nem tanto. Pensei que havia incorporado uma das regras mais simples da língua portuguesa, mas observando mais atentamente alguns anos depois, percebi que... bom, tem muita gente que simplesmente esquece essa regrinha bem simples.

E olha que eu nem estou falando da crase, que foi uma das coisas que eu mais demorei pra aprender no português. Mas com 13 anos, quando de fato saquei como usar o acento grave corretamente, tive a sensação de que estava tendo acesso a algo como o terceiro segredo de Fátima.

Besteiras à parte, toda essa minha paranóia com a caixa alta começou uns quatro anos atrás, quando passei a ter dúvidas sobre como escrever um título de livro ou música. Por mais que o nome inteiro do livro seja considerado próprio, como escrever nomes compostos?

Pegando exemplos práticos. Tudo bem escrever aquela do Tianastácia, Conto de Fraldas. Mas e quanto a Eu Não Matei Joana D’Arc, do Camisa de Vênus? Poxa, escrever títulos longos com caixa alta dá a sensação de você estar em uma montanha russa, não? Mas... e escrever apenas a primeira letra da primeira em caixa alta, e o resto em caixa baixa? Conto de fraldas? Ok, mas... e quanto a Eu não matei joana d’arc? Mas neste caso Joana D’Arc não seria caixa alta?

Essa minha piração acabou mais ou menos quando aprendi que poderia usar também o itálico ou, então, as aspas. Muito melhor representar Eu nasci há dez mil anos atrás (sic), do Raulzito, e Cabrobró, do Tianastácia. Simples, né? E ainda mostra que é um título.

Só que passei a ficar encanado quando comecei a trabalhar e a receber alguns releases. Ficava meio encucado quando via palavras como brasileiro, tênis, futebol, basquete, beisebol, etc., etc. e etc. em caixa alta bem no meio da frase. Por que, cara-pálida? Tudo bem querer destacar algumas coisas, mas... se quer destacar, estoure a caixa alta. TIPO ASSIM, sacou?

Mas foi ontem, tomando um chope no Boteco Brasil (Alameda Santos com Bela Cintra), que algo ainda mais engraçado me chamou a atenção. No cardápio, estava escrito assim: "Não servimos Chopp sem colarinho. O colarinho faz parte do Chopp". Mais abaixo, outra: "Sem colarinho, temos Cerveja". Engraçado, né? Não só pela aula de degustação chopeira e cervejeira, mas também pelo destaque às bebidas.

Caixa alta em tipos de bebidas eu vi também há pouco tempo, recapitulando alguns passos para fazer chimarrão. No site, a bebida gaúcha era sempre grafada em caixa alta.

Antes achava que era apenas no português que via coisas assim. Durante meus dez dias em Buenos Aires, um dos exemplos que mais me chamou a atenção foi o anúncio de empanadas na porta da confeitaria onde eu comprava os deliciosos pasteizinhos portenhos: “Aquí, Empanadas caseiras ruquísimas”. Tá certo que as empanadas eram deliciosas, mas... não mereciam caixa alta, vai.

Seja lá como for, em português ou espanhol, deve ser impossível padronizar. Agora, em inglês, eu nunca entendi por que diabos o pronome pessoal da primeira pessoa do singular (vulgo eu, ou I para os gringos) é sempre grafado em caixa alta.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Final)

São Paulo (SP) - Vi o tempo ruim de Porto Alegre sumir por sobre as nuvens e se transformar em um belo de um céu azul. Vi Florianópolis do alto e várias montanhas de Santa Catarina. Vi alguma praia de São Paulo e, de quebra, ainda vi meu condomínio. Ah, como é bom voltar para casa!

Mesmo minhas férias tendo sido bem interessantes, nada se compara àquele clima que você já conhece. Às emissoras de rádio, ao sotaque, ao trânsito caótico... tudo. Assim como não tem preço aquela sensação de sair do portão de desembarque e ver a sua mãe ali, encostada, te esperando com um sorrisão no rosto.

Admito que foi estranho chegar à minha casa de novo, tomar um banho no mesmo boxe dos últimos 20 anos e ouvir meu sussurro de que “amanhã começa tudo de novo”. A mesma coisa que meu pai me dizia nas noites de domingo quando eu era mais novo, e me deixava deveras deprimido. Por que tudo tem que começar de novo? Não reclamo da minha rotina, mas recomeçá-la não é das coisas mais interessantes de se fazer.

Seja lá como for, tiro um saldo positivo apesar dos pesares que marcaram meus 17 dias de férias. É bem certo que sofri meu primeiro assalto à mão armada e tomei um enorme cano da minha antiga paixão argentina de infância, mas em contrapartida... bom, conheci um outro país, pude passar uns dez dias sem praticamente falar português, mas sim arranhando um portunhol ou, então, em inglês. Conheci pessoas bem interessantes, voltei a Porto Alegre, vi Palmeiras x Grêmio no Olímpico. Foi bem legal, diga-se.

Ainda tive tempo de jogar um futebol com os amigos de infância do meu condomínio. Depois, ainda aproveitei para me reunir com alguns outros amigos para tomarmos as Polares que eu contrabandeei de Porto Alegre. A cerveja, que tem a latinha nas cores da bandeira do Rio Grande do Sul, é a número 1 por lá porque não é “exportada” para nenhum outro Estado do Brasil.

Contando algumas de minhas aventuras e desventuras em terras portenhas e sulistas, ainda tive que ouvir de um amigo que eu estava com cabelo de argentino e sotaque gaúcho. Era tudo o que eu não queria ouvir, bah (embora reconheça que, depois da minha primeira ida a Porto Alegre, demorei algumas semanas para deixar de falar tão cantado).

Mas agora... agora estou de volta a São Paulo, e amanhã começa tudo de novo. Pelo menos no trabalho, já que do purgatório da faculdade ainda tenho mais alguns preciosos dias de folga. Muito embora tenha batido uma sensação bem ruim quando programei o despertador para me tirar da cama às 6h10.

domingo, 27 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Avalanche)

Porto Alegre (RS) - Não foi o motivo principal e nem um grande diferencial para meu retorno a Porto Alegre, mas a passagem do meu time à capital gaúcha justamente no meu último final de semana de férias me empolgou. Tanto que, para mim, a partida entre Palmeiras e Grêmio ganhava importância ainda maior do que meu reencontro com o Guaíba, no Gasômetro (reencontro que dificilmente acontecerá, humpf).

Acordei no domingo cedinho para tentar ir ao lago ou rio (até os próprios gaúchos divergem sobre essa definição), mas o barulho da chuva lá fora me fez ficar na cama por mais algumas horas. Levantei de fato pouco antes do meio-dia, e ainda tive tempo de tomar um café-com-leite e comer alguma coisa na pequena padaria de garagem que se tornou para mim o lugar mais agradável aqui em Porto Alegre (depois do Guaíba).

Em meio a uma garoa bem chata atravessei o Parque da Redenção e fui parar na Cidade Baixa, onde me encontrei com o Rafael, o paraibano que eu conheci em Buenos Aires e que mora aqui em Porto Alegre para fazer sua pós-graduação, e com quem eu já tinha visto Inter x São Paulo na quarta-feira. Já sob uma chuva bem forte, tomamos uma Polar e pegamos um ônibus rumo ao Olímpico Monumental.

Para dar vida longa ao meu celular, comprei uma capa de chuva e fiquei em uma das entradas do estádio, esperando a Elga e a Juliana. Enquanto esperava, tomei mais algumas Polares e ainda vi a chegada do time do Palmeiras. Mas não foi nem um pouco agradável ouvir o coro gremista para o ônibus alviverde: “uh, uh, uh; paulista pau no cu”. Era eu contra 36 mil, achei melhor ficar quieto.

Só falei alguma coisa quando um gremista ao meu lado comentou, todo empolgado com a recepção amigável: “A primeira vaia é a mais importante”, disse o gaúcho. Concordei sem mais, e já cortando o papo. Embora tivesse uma curiosidade enorme de falar para alguém no estádio que era paulista e, ainda por cima, palmeirense. Só que acabei indo para dentro do estádio.

Infelizmente meu ingresso era para as cadeiras atrás do gol (quando fui comprar, não havia mais entradas para as arquibancadas), e não pude ficar no meio da torcida gremista. Uma pena, porque a festa gaúcha era bem bonita na geral atrás do gol (o único ponto não-morto do Olímpico). Seja lá como for, acabei adotando de vez o Grêmio como meu xodó em Porto Alegre (confesso que antes eu ainda gostava um pouco mais do Inter).

O jogo começou e eu, baixinho, às vezes deixava escapar um “Palmeeeiras” inaudível para os 36 mil gremistas no estádio. Sinto que as pessoas ao meu redor desconfiavam do fato de eu não bater palma depois de um lance de perigo do clube porto-alegrense ou xingar o ex-gremista e hoje palmeirense Diego Souza, mas... não me importei. E o primeiro tempo terminou empatado sem gols, apesar das duas bolas na trave do Grêmio.

A segunda etapa começou e, com ela, o Palmeiras esboçou uma melhora – apesar do brejo que tinha se tornado o gramado do Monumental. Até que, aos 17 minutos, o juiz marcou um pênalti para a equipe visitante. Enquanto toda a torcida xingava o apitador, eu quase vibrava.

Aí o Alex “Caju-Castanha” Mineiro cobrou o pênalti e marcou o primeiro gol para o Palmeiras. Já que estava no Olímpico, estádio que vê a torcida gremista comemorar seus gols simulando uma avalanche nas arquibancadas, esbocei a Avalanche Verde. Por falta de mobilidade nas cadeiras e por motivos lógicos de segurança pessoal, minha avalanche foi apenas uma descida de degrau. Mas consegui cumprir minha promessa.

Só que quatro minutos depois o Grêmio empatou e eu fiquei com cara de mate queimado. Ainda mais quando o tiozinho ao meu lado, com quem conversei sobre os estilos táticos do Celso Roth, quis me dar um abraço comemorando o gol do time da casa. Dei um tapinha nas costas, meio sem graça. E sem graça ficou o jogo até o final.

O empate por 1 a 1 entre Palmeiras e Grêmio acabou sendo meu auge na minha segunda passagem por Porto Alegre, e o meu primeiro jogo de futebol fora do Estado de São Paulo. E muito mais interessante do que nos estádios paulistas, dada a enorme oferta de belíssimas gaúchas nas dependências do estádio. Ah... !

sábado, 26 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Canção do exílio)

Porto Alegre (RS) - Passei dez dias em um outro país pela primeira vez em 20 anos. Na Argentina ouvia castelhano o tempo todo. Na televisão, no albergue, nos restaurantes, no teatro, no cinema, nas ruas... me deixava instigado o fato de que até as crianças falavam outra língua, e não o português.

Eu, mais do que acostumado à Flor do Lácio, achava extremamente engraçado ver a gurizada de três anos já falando um espanhol muito melhor do que o meu (também conhecido como portunhol com sotaque portenho, ou engana cabrón). E quanto aos cachorros, então? Eles atendiam a ordens em espanhol! Era bem engraçado.

Além do castelhano, também ouvi muito inglês. Acho que me comuniquei mais em inglês do que em espanhol, para falar a verdade. E tinha uma facilidade muito maior para me expressar quando conversava no idioma britânico. Podia até fazer algumas piadas engraçadas, ter um papo cabeça... era melhor, resumindo.

Lá, tirando os relatos que escrevia neste blog, as conversas por telefone com a minha mãe, um ou outro e-mail trocado com pessoas aqui no Brasil e alguns compatriotas no albergue, praticamente esqueci o português. Não pensava em português, nada. Era estranho. Às vezes me lembrava de uma palavra em inglês ou em espanhol antes mesmo de sua correspondente em português. Daí o motivo para algumas das postagens passadas terem sido recheadas em inglês.

Aqui no Rio Grande do Sul ainda estou tentando me adaptar. Nos dois vôos (Buenos Aires-SP e SP-Porto Alegre), agradecia às aeromoças pela saborosíssima barrinha de cereal da Gol falando gracias. Voltar a ouvir português nas ruas e na televisão me soou um pouco estranho. Algumas vezes até passava por duas pessoas na rua conversando e demorava um pouco para entender sobre o que falavam.

Creio que agora já estou um pouco mais bem adaptado, quase voltando ao normal. Muito embora ontem, na noite gaúcha, ainda tenha trocado umas palavras com um australiano por aqui e tenha sentido uma facilidade tremenda. Estava sentindo falta do present perfect, vai.

Mas não é só disso que sinto falta. Pode parecer loucura, mas passados exatos 15 dias de férias, sinto falta também de escrever um lide. De reproduzir uma aspa, ou até mesmo de fazer uma entrevista.

No fundo no fundo, estou sentindo falta da minha velha rotina. Da poluição de São Paulo, do incansável barulho nas ruas, de dirigir no trânsito caótico da Avenida Paulista em reforma, dos almoços e das cervejas com os amigos de data mais longa. Da minha casa, da minha cama... e de mim, para falar a verdade.

Sei também que vou me arrepender de tudo isso que estou falando, também.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Retorno)

Porto Alegre (RS) - Abri os olhos pela manhã e não sabia onde estava. “Humm, estou em uma cama grande, então aqui não é Buenos Aires. Essa cama é de casal, então também não é nenhuma das minhas duas em São Paulo. Caramba, onde eu estou? E que dia é hoje?”, pensei.

Precisei de uns 30 segundos para lembrar um pouco do que estava acontecendo. “Caramba, estou em Porto Alegre, é verdade! Cheguei ontem no final da tarde, voltei para o mesmo hotel que da outra vez. Tá, mas que horas são? Deve ser bem tarde, já”, segui na minha conversa interna.

Na verdade não era tão tarde assim. Deu tempo de tomar banho (bem mais fácil do que da outra vez) e ainda ver o finalzinho dos Simpsons, antes de sair para explorar o Bom Fim. Tomei café da manhã (tudo bem que já era 1 da tarde) na mesma mercearia de sempre, andei pela Independência com as mãos nos bolsos e cheguei a uma agência do banco para saber se poderia esclarecer os acontecimentos trágicos passados em Buenos Aires.

Com muita sorte consegui vencer algumas burocracias bancárias. Ainda almocei qualquer coisa, segui andando (me perdendo e me achando também) pelo bairro do Bom Fim e tomei algumas Polares em alguns bares. Ah, como me gusta Porto Alegre! E apesar de o tempo ter amanhecido nublado, o sol ainda saiu pela tarde e pude ver o céu claro e único daqui.

Pois é, estou de volta a Porto Alegre. Depois de quase dois meses da minha primeira passagem pela capital do Rio Grande do Sul, aproveitei para fazer uma pausa por aqui antes de voltar à vida caótica de sempre.

Mesmo por aqui, ainda aproveitei para colocar no papel algumas idéias que tive ainda na Argentina. Serão as rapidinhas portenhas que aparecerão neste blog talvez pela única vez (embora minha vontade seja de voltar a Buenos Aires algum dia num futuro não lá muito distante).

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Rapidinhas portenhas:
Bizarrices: Saí no sábado com o Christoph, o alemão, e fomos ao flat de um amigo dele no centro de Buenos Aires. “O cara é meio louco, mas bem legal”, me avisou. E eu deveria ter levado o alerta a sério. Assim que me sentei à mesa para tomarmos umas Quilmes Cristal (haha!), o cara me perguntou se eu jogava xadrez. Disse que sim e montamos as peças. Em poucos minutos, percebi que estava na Argentina tomando cerveja e jogando xadrez com um alemão.

Bizarrices 2: Durante as duas partidas de xadrez (um xeque-mate para cada lado), o alemão esquisito explicou que estava em Buenos Aires gravando seu filme. Sim, ele era diretor de cinema e gastaria 10 mil dólares no total e concorreria a um festival por lá. Começamos a bater um papo sobre filmes brasileiros e o cara era fã incondicional do Glauber Rocha. Não demorou para eu me dar conta de que estava na Argentina jogando xadrez e conversando sobre cinema nacional com um diretor alemão. E tomando cerveja.

Dedo na ferida: Aproveitei que estava conhecendo pessoas de várias nacionalidades em Buenos Aires para ter alguns papos intelectuais com os gringos. O primeiro que tive foi com o Alem, o californiano. Estava passando um documentário na TV sobre o 11 de setembro e perguntei o que ele achava de tudo aquilo. Estava esperando uma resposta do tipo “terrível, temos que matar todos os islãs” quando, para a minha surpresa, ele disse “normal, só houve violência assim contra a gente porque os EUA causaram violência antes”.

Dedo na ferida 2: A Alleen, norte-americana de Minnesota, estava em Buenos Aires há um ano para um período de intercâmbio do curso de jornalismo que cursava nos States. Estávamos numa madrugada tomando umas cervejas quando ela perguntou o que eu achava dos Estados Unidos. Questionei o motivo da dúvida e ela disse que teve algumas aulas de geopolítica na Argentina e se surpreendera com a forma como os EUA eram considerados culpados por todas as crises na economia mundial. “Bem, você acabou de me dizer que os colonizados culpam os colonizadores por todos os defeitos do presente, assim como vocês culpam os ingleses nos US, não? No Brasil culpávamos os portugueses, mas agora é hora de culpar vocês. I’m sorry”. Mas ela pareceu entender.

Dedo na ferida 3: No mesmo dia da conversa com a Alleen, ainda perguntamos ao Christoph sobre o nazismo. Ele, ariano cuspido e escarrado, reconheceu que foi o pior acontecimento da humanidade e disse que a Alemanha terá para sempre esse passado negro e que essa marca será muito forte nas próximas gerações. Que os germânicos tentem se orgulhar do país onde vivem, mas apagam a primeira metade do século passado. Mas o mais curioso de tudo foi ver como o tom de voz dele subiu quando tocamos no assunto. Depois de todas esses esclarecimentos, não fazia mais sentido algum perguntar a um argentino sobre Pelé x Maradona.

Cambiando las pelotas: Disse recentemente a duas amigas que os argentinos homens eram estranhos, pois se cumprimentavam com beijinhos no rosto e se chamavam de boludo. A Ní ainda perguntou se eu estava muito sendo chamado assim e esclareci que não, nunca havia sido. Até que na minha última tarde em Buenos Aires um portenho com trejeitos bem homossexuais me parou na Calle Bolívar e me perguntou se estava no caminho certo para o Parque Lezama. Respondi-lhe que não, que o parque era para o outro lado. Para fingir conhecimento, ainda expliquei que no caminho ele teria que atravessar a San Juan, a Garay e a Brasil. “Puta la madre, como yo soy pelotudo. Estoy caminando y caminando e estoy en otra dirección. Bueno, gracias, boludo”. Comecei a rir na hora e só parei depois de chegar à esquina e ver que eu havia me enganado na hora de sair do café onde estava e também estava na direção errada. E, conseqüentemente, tinha passado a informação errada para o cara. Bateu até peso na consciência.

terça-feira, 22 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Nina)

Achei que já estava acostumado a despedidas depois de quase uma semana em Buenos Aires, mas, para variar, estava enganado. Na minha última noite na Argentina conheci a Nina, uma alemã extremamente simpática e com quem conversei por um bom par de horas.

Com a Nina falei sobre quase todos os assuntos possíveis. Ela ainda me ‘convidou’ para ver um filme blockbuster no albergue e se prontificou a preparar um té com leche para mim antes da película. “Está todo molhado, chico, é muito novinho para se resfriar”, ela disse, em um ótimo espanhol sem quase nenhum sotaque. Ah, a Nina tinha 28 anos, embora parecesse ter uns 24.

Estava pronto para chamar a Nina para jantar depois do filme, mas ela foi se deitar assim que os créditos subiram. Isso às 21h30. Tinha que acordar às 4 para ligar para sua mãe na Alemanha para, assim como eu, pedir dinheiro para a família. Teve problemas com o cartão em Buenos Aires.

Antes de ir para a cama, no entanto, a Nina pegou uma caneta e um papel e pediu meu e-mail. Me chamou de herói quando viu meu sobrenome, deu uma risada bem simpática e perguntou se eu poderia anotar também o seu contato. Como se fosse necessário perguntar.

Ela escreveu seu e-mail com uma letra bem bonita. Fiz o elogio; ela corou e disse que tinha uma letra horrível. Mentira. Além de muito simpática e muy hermosa, ainda era modesta. Gostei dela, da Nina.

Uma coisa que me chamou a atenção nessa alemã de Hamburgo foi seu sobrenome: Azimi. Perguntei a origem pronto para ouvir Líbano ou Síria, talvez Irã, quando ela disse Afeganistão. Claro que tive que conter meu impulso idiota de perguntar sobre os Talibãs (como eu sou besta!). Mas consegui me segurar e dizer “Pô, mas você não parece afegã. Eu pareço muito mais do que você, e isso porque tenho raízes holandesas”. Ela riu. Simpática.

Estava eu pronto para uma despedida estilo alemã (apenas dizer tchau) quando ela me abraçou, disse que havia sido um prazer enorme me conhecer e que me escreveria assim que chegasse à Alemanha. Respondi que não iria falar nada a ela a não ser “boa noite” porque fazia questão de vê-la na manhã de terça. E foi o que aconteceu.

Pedi para o Pablo, do albergue, me acordar às 7 da manhã para terminar de fazer as malas. Ele me chamou exatamente no horário e, logo que cheguei à recepção, a Nina estava lá, com uma toalha enrolada na cabeça. Tinha acabado de sair do banho. “Oh, nice, very nice to see you again, Nina”, eu disse.

Sentamos em frente à TV e começamos a ver Chaves (sim, passa Chaves na Argentina!). Ela não entendia por que diabos eu ria tanto daquilo, mas pareceu não ter odiado o genial seriado que embalou a infância de (quase) todo o Brasil. Até que meu táxi para o aeroporto chegou e, enfim, tive que me despedir.

Dei-lhe um apertado abraço e disse-lhe que havia sido ótimo tê-la conhecido. Estava prestes a dizer algo bonitinho quando ela se precipitou e disse exatamente o que eu ia falar: “Hasta luego, Felipe, y no adiós”. Repeti o que tinha ouvido e acrescentei. “Se decidir ir a São Paulo algum dia, tem a obrigação de me escrever”. Ela também me falou para fazer o mesmo quando eu decidisse ir a Hamburgo, porque fazia questão de me ver de novo.

Dei mais um forte abraço na Nina, virei as costas, desci as escadas do albergue e entrei no táxi. Com quase que uma tristeza por ter que ir embora e, também, odiando a minha facilidade de me aproximar das pessoas. “Por que ser tão simpático, me apegar e tudo mais tão rapidamente se ainda não sei lidar com as despedidas?”, eu me perguntava.

Seja lá como for, passei a ponderar a hipótese de ir à Alemanha. E à Suíça, e a mais alguns países também. Bom, hora de economizar. Mas não agora, porque minha viagem de férias toma novo rumo.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Novidades argentinas)

Buenos Aires (Argentina) - Um dia desses a Carol Canossa disse que, do jeito que a má sorte estava me rondando, era bem capaz que uma guerra estourasse aqui em Buenos Aires durante a minha estadia pela capital argentina. Curiosamente, no dia seguinte, estava tomando um suco com a Debbie, a suíça, e ela pediu para que eu traduzisse a notícia que estava passando na televisão.

Naquele dia, 225 mil pessoas saíram às ruas aqui em Buenos Aires, tomaram quase todo o bairro de Palermo e protestaram. Protestaram muito, passaram o dia inteiro protestando. No dia seguinte, comprei um La Nación para me inteirar do assunto: pelo que entendi, o governo estava aumentando impostos contra os produtores rurais, que por sua vez pediam um aumento não tão grande. Como não houve acordo, panelaço. Mas em enormes proporções. Depois, tudo ficou mais calmo.

Outra coisa que vem chamando a atenção aqui em Buenos Aires é o show do Los Fabullosos Cadillacs, uma das maiores bandas de rock argentino. Outdoors pela cidade inteira informam que em 12 de dezembro os Fabulosos vão fazer um show no Monumental de Núñez, o maior estádio de futebol da Argentina. Já tinha ouvido falar dessa banda, mas nunca ouvi uma música deles. Boa chance de tentar, não?

Os outdoors também dão conta de que a Soledad está lançando um novo disco, chamado Folklore. A Soledad é uma argentina bem bonita, mas não creio que o novo álbum dela vá me interessar. Pois bem.

Mas o que mais me chamou mesmo nos cartazes publicitários nas ruas da Argentina é a idolatria que se tem pelo Emanuel Ginóbili, que joga na NBA. Inúmeros outdoors diferentes mostram o magrelo narigudo sempre com os dizeres ‘Viví Manu’ ou ‘Jugá Ginóbili’. Não tem um lugar que não tenha uma foto do Ginóbili.

Em lojas de souvenires e artigos esportivos, a idolatria pelo Ginóbili continua. As regatas # 20 do San Antonio Spurs estão sempre penduradas ao lado das de Maradona. Assim como as miniaturas de estante do Manu estão sempre próximas às de Carlos Gardel ou do próprio Maradona.

Riquelme? Aimar? Messi, Tevez? Bom, aqui eles são sim bastante conhecidos. Mas quem é o ídolo mesmo é o Manu Ginóbili. Interessante saber. Assim como foi uma grata surpresa ver que todos os jornais por aqui reservam duas páginas do caderno de esportes para mostrar os resultados dos principais argentinos no circuito profissional. E no Brasil, creio que quase ninguém sabe quem são Leandrinho Barbosa, Nenê Hilário, Anderson Varejão, Thomaz Bellucci ou Marcos Daniel...

Enquanto isso, tento me informar de alguma forma do que rola do outro lado das cataratas do Iguaçu. E não me entra na cabeça que a Dercy Gonçalves morreu. Só pode ser pegadinha.

Dónde está Wally? (Pomelo)

buenos Aires (Argentina) - Não sei o que é um pomelo. Passei 20 anos no Brasil e nunca tive notícia de algo semelhante. Minha avó nunca comprou um pomelo na feira, minha mãe nunca achou um no supermercado... não, nunca tive notícias da existência do pomelo.

Mas logo no meu primeiro dia em Buenos Aires fui apresentado ao pomelo. Tinha pedido por um suco de laranja no restaurante; a garçonete, no entanto, disse que não havia naranjas, apenas pomelos. Aceitei, achando que ganharia um suco de limão. Ledo engano.

Meu primeiro contato com o pomelo foi estranho. Não gostei muito, achei bem azedo e tudo mais. No dia seguinte colhi mais informações sobre o tal do pomelo aqui no albergue. Era uma fruta maior do que uma laranja, bem azeda. De acordo com o pessoal aqui, a Argentina é a sétima maior produtora de pomelos do mundo, e a terceira da América (perde apenas para EUA e México).

Acabei virando fã incondicional do tal do pomelo. Todas as minhas refeições por aqui são acompanhadas de uma gaseosa de pomelo, uma delícia. Já tinha provado algo semelhante no Brasil, mas nada se compara ao que se encontra por aqui. É como se fosse uma água tônica gostosa e com limão, ou então... um refrigerante de citrus mas mais saboroso. Enfim... tem gosto de pomelo.

O pomelo me ajudou a largar alguns vícios por aqui. Não tomei café nos últimos dez dias, por exemplo. Sempre que me sinto entediado, não tomo café (embora o albergue aqui seja open bar de cafeína). Prefiro juntar uns pesos (não muitos), dobrar a esquina e ir à vendinha comprar uma gaseosa de pomelo ou, então, um Gatorade de pomelo. Delícia.

Mesmo quase que viciado em pomelo, ainda não fui apresentado a um. Estou há dez dias por aqui e ainda não vi um pomelo. Passo em frente a dezenas de quitandas diariamente aqui em San Telmo (bairro que tem três lojas de frutas a cada quarteirão) e ninguém deixa um pomelo em destaque, logo na porta. Também não fazem promoções de pomelo. Nem ligam para o tal do pomelo.

OK, bateu o tédio e cansei de escrever. Estou indo pegar um pouco de gaseosa de pomelo, já volto.

domingo, 20 de julho de 2008

Dónde está Wally? (O reencontro)

Buenos Aires (Argentina) - Uma tarde em Buenos Aires. Tinha acabado de subir em um ônibus da linha 152, que vai de La Boca até a província norte, em Olivos. Desta vez eu não iria até o ponto final, apenas até pouco depois do centro para andar pela Calle Florida.

Já dentro do ônibus, informei ao motorista meu destino: “Leandro Alem, por favor”. Cacei algumas moneditas no bolso interno do meu sobretudo e depositei os 90 centavos no cobrador automático, para em seguida olhar os lugares disponíveis.

Foi então que eu a vi. Cabelos castanhos claros, ligeiramente ondulados. Pele clara pero no mucho, olhos verdes, um sorriso formado por dentes perfeitos... e o principal: seios fartos, extremamente fartos.

“Como falar com ela sem bancar o idiota?”, pensei. Decidi apenas sentar-se ao lado dela e, com um sorriso sarcástico, dizer:

– Ei.
– Hola?

– Well, nice to see ya.
– Who are you?

– Don’t you remember?
– I don’t think so.

– Well... is not my voice familiar to you?
– Yeah, it’s familiar, but...

– Nice to meet you, I’m Felipe.
– Felipe, from where?

– Oh, c’mon. You used to call me just, and I…
– Fê? From Jabucao?

– That’s it.
– Oooooooh, Fê! Fêêêê!



– Phillp? Phillip?
– Uhn?
– Hey, guy, good morning! You’re better to wake up, Phillip. It's ten to eleven, you're going to miss the breakfast.

Não, não era aquela paixão de infância. Era a Alleen, a norte-americana de Minnesota, me acordando para o café da manhã.

...

É estranho. Eu deveria ter percebido desde o início que era um sonho. Meu inconsciente tem a incrível capacidade de me dar algumas dicas de que estou sonhando.

Nesse caso, por exemplo, por que eu estava vestindo um sobretudo sendo que eu nem tenho um? E por que diabos eu estava falando em inglês com a minha antiga paixão argentina?

Eu deveria estar mais bem preparado... humpf.

sábado, 19 de julho de 2008

Dónde está Wally? (People just go away)

Buenos Aires (Argentina) - Estava meio bêbado quando comentei com alguém, ainda no Brasil, que a nossa vida não é nada mais do que uma série de marcas de despedidas. E é assim que eu percebo que estou... ahn... 'amadurecendo' a cada dia aqui em Buenos Aires (embora tenha necessitado de uma enorme ajuda da mamãe para poder curtir as minhas férias) em determinados aspectos.

Eu explico: em albergues, é muito fácil de se fazer amizades com outros mochileiros de plantão. Mas, como são mochileiros, eles raramente ficam muito tempo por aqui. Passam uma noite, talvez duas... e então vão embora. É como se eu perdesse um amigo (ou mais) por dia.

Na minha primeira noite aqui em Buenos Aires conversei bastante com o Aaron, o texano que parecia o Snape. Quando todos daqui saímos para jantar naquele sábado, ele rapidamente se levantou e disse que tinha que voltar para o albergue e dormir, porque seu vôo sairia logo cedo no domingo. Foi apenas o prenúncio do que estava por vir.

Na segunda-feira, primeiro, foram os três brasileiros com quem eu tive mais proximidade por aqui, o Rafael, o Geraldo e a Juliana. Segunda de manhã eles estavam mudando de albergue ao mesmo tempo em que eu estava indo ao banco tentar conseguir, de forma vã, um novo cartão do banco. Até comentei com eles: “Não vou falar tchau para vocês porque ainda vamos nos ver por aqui”.

Combinamos de nos encontrar na Calle Florida, mas assim que saí do albergue para ir ao ponto de ônibus, vi os três dentro o táxi e tive a sensação de que era a última vez que os veria. Nosso encontro aqui na capital portenha não virou, e aquele feeling se mostrou ainda mais premonitório.

No mesmo dia encontrei a Katherine, a canadense, na rua. Ela estava com o mochilão nas costas, indo para o Uruguai. Fiz uma piada com ela, perguntei se estava mesmo indo. “Have a nice trip, see ya”, eu disse. Sem nem um abraço, nada. Não sei como as pessoas do Hemisfério Norte reagiriam a uma despedida brasileira.

Quando achei que estava completamente só, conheci o Alem, um negão californiano. Fomos encher o pandu na janta no Des Nível (uma churrascaria bem suja, mas deliciosa), e na manhã seguinte ainda fomos à La Boca, inclusive à Bombonera. Divertidíssimo, mas... ele foi embora logo depois.

Por aqui também conheci a Anne, uma australiana bem bonitinha que estava no meu quarto e que também fora roubada no primeiro dia por aqui. Passamos uma madrugada inteira conversando, mas quando acordei ela estava fazendo as malas para outro albergue. Ela era bem legal, e ficou me devendo os biscoitos mais gostosos da Austrália.

Logo depois de me despedir da Anne, saí para almoçar com a Debbie, a suíça. Na quarta-feira, pegamos o mesmo ônibus pela manha: eu fui ao Museu de Arte Latinoamericana de Buenos Aires (o Malba, onde tem o Abapuru) e ela, para o norte da Argentina. Outra despedida.

Um casal de amigos norte-americanos de Minnesota já estava no meu quarto na quarta-feira (haviam chegado na terça). Não tinha ido muito lá com a cara deles quando chegaram e achei que iriam embora no dia seguinte, nem tentei me aproximar.

Até que ontem todos havíamos chegado da rua ao mesmo tempo (eles dois, eu e o Christopher, um alemão que também divide quarto conosco). Subimos para o terraço para conversar sem correr o risco de atrapalhar o sono dos demais hóspedes. Bebemos bastante, viramos a noite conversando e paramos apenas quando o dia clareou. E eles (o Sean e a Alleen - sim, um nome bizarro) disseram que estavam indo embora ainda naquele dia.

Não sinto saudades do Brasil, mas sim daquelas amizades mais duradouras. Nada como dizer “até amanhã”, sem sentir que ‘mais um dia’ também significa ‘um dia a menos’.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Clase de tango)

Buenos Aires (Argentina) - Que me atire a primeira pedra o homem que nunca passou vergonha indo atrás de um rabo de saia. E aproveitem para atirar agora, que estou a alguns mil quilômetros de distância.

O fato é que eu, um cara que parece um bode bêbado dançando, estava indo... indo a uma aula de tango apenas para acompanhar a garota da Suíça. Aqui no albergue ainda ganhamos a companhia da Marrrrríííne, uma bela francesa meio doidona que não falava um A de inglês, mas falava espanhol melhor do que muito argentino. Éramos três indo para a aula de tango: Marine, eu e a... a... a...ok, eu tinha percebido que não sabia o nome da suíça. Achei melhor não perguntar, e descobrir de alguma forma.

A aula de tango estava bem vazia. Havia por lá apenas um casal de tiozões brasileiros, um de norte-americanos (o cara inclusive parecia o Arnold Schwarzeneger) e nós três. Para piorar ainda mais a minha situação, ninguém perguntou nossos nomes: ou seja, eu continuava sem saber o nome da suíça.

Começamos os primeiros passos de tango, e a suíça era minha parceira. Poderia dizer que foi a primeira vez que abracei uma européia estrangeira, mas já tinha dado alguns abraços na minha antiga paixão argentina, a argentina que não mora em Roma, 32 – Olivos. Enfim. Aprendemos oito pasitos de tango e fomos embora rindo um da cara do outro. Eu com uma baita dor no quadril; e ela, nos pés.

Logo em seguida, nós três fomos a um show de tango em um centro cultural na entradinha da Boca. Um lugar bem legal, escuro, com velas em todas as mesas. Lembrei do meu último jantar romântico no Brasil, quando o restaurante estava completamente vazio e eu sequer tive a idéia de propor um fondue à luz de velas. Já mais ‘experiente’, resolvi não perder a chance com a... a... (o fato de não saber o nome dela estava me incomodando muito)... a suíça. E também a Marine, claro.

Ficamos um bom tempo lá no centro cultural pertinho da Boca e depois retornamos ao albergue. A Marine se despediu de nós (ia passar dois meses nos Andes logo na manhã seguinte), e a suíça subiu para o salão comunal para ver se sua amiga (que chegaria na manhã seguinte a Buenos Aires para que então iniciassem um giro pela Argentina) havia mandado uma mensagem.

O computador do albergue estava ocupado, e a suíça estava morrendo de sono. Ofereci meu laptop, ela aceitou e ficou toda agradecida. Até abriu a caixa de mensagens e me pediu para ler o e-mail que a amiga tinha mandado, no mais puro swiss-german. Era uma gargalhada dela a cada palavra que eu dizia. Mas continuei: a amiga poderia ter escrito o nome dela em algum lugar da mensagem, e então eu poderia descobrir.

Mas não, nem uma dica do nome da suíça. Só para me vingar, abri uma notícia na Gazeta Esportiva.Net e pedi para que ela lesse. Para minha surpresa, ela falou quase todas as palavras perfeitamente: apenas não sabia pronunciar ‘conseguiu’ e ‘posições’. Compreensível.

Antes de ir para a cama, me deu um papelzinho e uma caneta: “write me down your e-mail, and then we can keep in touch”, ela disse. “If you need to go to Switzerland one day, you can tell me and stay at my house”.

Escrevi meu e-mail e, logo abaixo, minha identificação: Felipe Held, the drunk goat tango dancer. Ela morreu de rir, e eu decidi me aproveitar da situação. “Well, but I must confess you something: we hang out all day long, and… oh, don’t be upset, but I don’t know your name”.

“Oh, don’t mind. You could have asked before, no problem: it’s Debbie”.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Could it be or is it difficult? )

Buenos Aires (Argentina) - Tinha acabado de voltar de La Boca um dia desses quando uma das minhas companheiras de quarto aqui no Sandanzas disse que a tiazona que também dividia quarto conosco estava mudando de albergue e me convidou para acompanhá-las. Sem nada para fazer, topei logo de cara.

Já havíamos passado a última noite conversando, quando descobri que ela era da Suíça. Aparentava ser mais velha e seu inglês tinha um sotaque que lembrava o francês, mas nunca tínhamos tocado no assunto. A única vez que falamos sobre idiomas foi quando ela elogiou meu inglês (o que me surpreendeu bastante, diga-se).

A caminho do albergue da tiazona, a suíça me perguntou se depois a gente poderia sair para beber alguma coisa. Concordei, mas disse que antes precisava almoçar (já eram 16 horas). Ela também disse que estava morrendo de fome, e fechamos de almoçar juntos. A tiazona, também com fome, foi junto.

Mas juro que notei um olhar bem suspeito da suíça quando comprou um alfajor, me ofereceu a primeira mordida e eu disse: “Não, não posso. No Brasil, dizem que se dermos a primeira mordida – ou a última – em algo que não é nosso, vamos roubar o namorado ou a namorada do outro”. Assim que disse isso, a suíça disse “Não se preocupe, não tenho namorado”. Mas enfim...

Passamos o resto da tarde e o início da noite na Plaza Dorrego, aqui em San Telmo. Uma praça extremamente interessante, bem bonita, com música ao vivo e abarrotada de turistas. Depois saímos para andar sem rumo, passamos pela Igreja de San Ignacio de Loyola e, quando vimos, estávamos em frente ao Café Tortoni. Mais uma vez lembrei do guia da Lui, e pedi café com uma medialuna. Putz, o café era extremamente delicioso.

Depois do belíssimo Tortoni, caminhamos mais um pouco e pude perceber que a suíça era bem bonitinha. Parecia francesa. Aproveitei para perguntar se ela era da parte francesa da Suíça. Disse que não, que era de Berna. “Ah, mas... você tem um french accent”. “Isso é mau: meu pai é inglês”. Mas era uma suíça bem legal, não se importou com a barrigada n’água que o brasileiro aqui tinha dado.

Deixamos a tiazona no caminho e pegamos um táxi para o albergue. No táxi ela disse que à noite ia para uma aula de tango perto do Sandanzas, perguntou se eu não queria ir com ela. “Well, I look like a drunk goat dancing, but... I’m in Buenos Aires, why don’t a try?”. “Yeah, I think you should try”, aconselhou, depois de dar uma longa gargalhada com a minha autocomparação a um bode bêbado.

Cheguei ao albergue e fui tomar um banho. Na dúvida se deveria ou não fazer a barba, me veio à cabeça uma triste realidade: “Já sou quase um fracasso com mulheres brasileiras, e com uma européia, então? Não, não vou tentar nada com ela... quer dizer, o que eu posso dizer para ela? Hey, girl, could it be or it is difficult ? (que, na mais bela Flor do Lácio, significa: e aí, gringa, pode ser ou tá difícil?)”.

Continua...

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Mãe é mãe)

Buenos Aires (Argentina) - Tinha acabado de cortar o dedo jogando pebolim (totó para algumas partes do Brasil, fla-flu para os gaúchos) com o Rafael no sábado à noite quando desci para o meu quarto pegar um bandeide na minha mochila. “Putz, que sensacional! Nunca entendi por que minha mãe tinha colocado bandeides no meu kit de banho das aulas de tênis, mas... ah, mãe é mãe”.

Mal sabia eu como essa frase teria ainda mais sentido poucos dias depois. Bom, não vamos nos adiantar, tá bem? Comecemos do... de uma parte logo depois do princípio.

Tinha sido assaltado, perdido a câmera fotográfica e, também, a carteira aqui na Argentina. Dentro da carteira não havia documentos pessoais, mas em contrapartida estava lá o meu cartão do banco (que seria usado para fazer saques de la plata aqui em Buenos Aires).

Fiquei bem tranqüilo, apesar disso. Sabia que na segunda de manhã poderia ir atrás da agência do Bradesco aqui em Buenos Aires e conseguir um cartão novo. Ou, pelo menos, fazer na agência um saque generoso e continuar vivo na Argentina sem muitos outros contratempos. Ledo, ledo engano.

Peguei o ônibus na Paseo Colón com destino à Avenida de Mayo, quase que o centro comercial portenho. Lá havia uma agência do banco. Expliquei minha situação para a recepcionista, uma loira brasileira, e ela logo fez uma cara bem triste. Prenúncio de suas palavras: “Aqui a nossa agência não tem dinheiro. Somos apenas para questões burocráticas, para pessoas jurídicas... então não temos cartões, dinheiro... nada”.

“Ah, tá, mas... olha”, redargüi. “Sou cliente Bradesco há dois anos, estou precisando do dinheiro que eu estou juntando desde então. E é questão de emergência, porque tenho 100 pesos para passar uma semana em Buenos Aires. Nada de plata?”.

A moça disse que não, e que para eu conseguir dinheiro, deveria pedir do Brasil pela Western Union – que, pelas contas dela, encerrava o expediente às 15 horas, como todos os bancos da Argentina. Bom... eram 13 horas, eu precisava correr.

Voltei ao Sandanzas e liguei para a minha mãe. Na hora ela pesquisou como se deveria proceder para enviar dinheiro para cá, saiu do trabalho e, menos de uma hora depois, me deixou extremamente aliviado. “Acabei de depositar o dinheiro, você já pode ir buscar”. Passei por umas três agências Western Union, que embora fossem muito próximas ao albergue, não poderiam me pagar sabe-se lá por que motivo. Fui à central, na Avenida Córdoba, e lá peguei a grana.

Agora sim, as férias estão começando. Ok, e graças à minha mãe.

Dónde está Wally? (Brasil x Argentina)

Hora do rush na Avenida Córdoba, uma das mais movimentadas de Buenos Aires. Cansado de parar de semáforo em semáforo, um velhinho argentino motorista de táxi se virou para o turista brasileiro que tinha em seu banco traseiro e reclamou:

(Segue transcrita e traduzida uma conversa em espanhol e portunhol)

– O trânsito aqui está cada vez pior! Já viu coisa assim?
– Ah, sim. Sou de São Paulo, aqui até me pareceu bem calmo.

– Ah, é paulista? Então quer dizer que o trânsito lá é muito ruim?
– Pior a cada dia. Moro a 11 km do meu trabalho, e tem dias em que levo 1h30 para chegar lá de carro.

– Você dirige?
– Humm... tento.

– E a segurança do trânsito de São Paulo, como é?
– A mesma que a das ruas: nenhuma.

– São Paulo é muito perigosa, então?
– Humm... bom, eu vivo em São Paulo há 20 anos e fui roubado por lá duas vezes. Estou em Buenos Aires há dois dias, e já fui roubado uma vez.

(Fim da conversa).

terça-feira, 15 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Roma, 32 - Olivos)

Buenos Aires (Argentina) - Com o 'Roma, 32' na cabeça, peguei o ônibus em Paseo Colón e parti para Olivos. Quando subi no autobus, descobri que os autobuses só aceitavam moedas, nada de notas (billetes, por aqui). Eu tinha apenas 50 centavos, precisava de mais algumas moneditas. Um cara de uns 20 anos, bem solícito a ajudar o gringo perdido, me deu mais 50 centavos e se recusou a aceitar os meus 2 pesos para trocar por moedas. Gente fina.

Quando sentei, vi que no banco ao lado estava uma garota cujo rosto lembrava minha antiga paixão argentina de infância, porém com cabelos e olhos escuros (e a minha antiga paixão argentina de ifnância tinha cabelo castanho claro e olhos verdes). Fiquei olhando e pensei que poderia... sei lá, ser a irmã dela. Sim, tinha tudo para ser a irmã dela, e... e ainda estava indo para Olivos. Sim, era um sinal! Maravilha, as coisas não poderiam continuar tão ruins.

Só por segurança, perguntei para uma mulher mais velha ao meu lado no ônibus se ela conhecia a Calle Roma, em Olivos. Ela não conhecia. Por um momento achei que a rua não existia, mas não desisti. Também não desisti quando uma outra velhinha me pediu para ajudá-la a levantar, já em Olivos, e eu perguntei como fazia para chegar lá. Ela também não conhecia a Calle Roma.

No ponto final do ônibus, perguntei ao motorista se existia a Calle Roma. Ele disse que sim, mas que eu deveria ter descido uns três quilômetros antes. Agora, precisava pegar de novo a linha 152 (La Boca – Olivos). E trocar 2 pesos em nota por moneditas.

Aqui em Buenos Aires as moedas valem mais do que notas. Ou pelo menos é o que parece. Ninguém gosta de dar moedas de troco, mas todos adoram recebê-las. É estranho. Mas consegui trocar uma idéia com um segurança de rua (Hola, soy brasileño, me roubaram la plata e la tarjeta del banco, sabe onde pueso cambiar esta nota por moneditas para pegar el autobus?) e ele se prontificou na hora a trocar. Gente fina, também.

O segundo ônibus da linha 152 me deixou na esquina da Maipú com a Roma. Ah, a Calle Roma! Era o número 1.600 crescendo. Atravessei a rua e parti em busca do número 32, e notei uma rua extremamente residencial, com alguns nomes judeus e casas muito bonitas. Bom sinal: ela dizia que era judia e vivia em uma casa com piscina... é, as coisas estavam ficando melhores.

Passei pelo número 1.300, pelo 1.200, pelo 1.100... quando me peguei em frente ao 900já estava chegando, no 800 estava mais perto, no 700 já era mais que meio caminho andado. No 600 tinha uma casa de cultura italiana (ótimo sinal, ela estudava relações internacionais com base em italiano na UBA, a Universidade de Buenos Aires). O quarteirão do número 500 era cortado por uma linha férrea. Me senti ainda mais perto quando passei pela quadra do número 300... e o do 200... ah, já era o último quarteirão.

Mas o último quarteirão me reservou duas sensações extremamente diferentes. Ao passo em que tinha um sobressalto por estar me aproximando do número 32, percebi que as casas eram muito, muito pobres. Independentemente disso, segui na busca. Número 182, 180, 176, 173, 165, 161, 154, 143, 133, 132, 19, 5... opa, peraí? Perguntei para uma chica na rua onde tinha o número 32. “No hay”. Na hora, só consegui dizer “La puta madre!”.

Demorei uns cinco minutos para compreender o que de fato tinha acontecido. Nada de número 32, nada da antiga paixão. Decepcionado, coloquei as mãos nos bolsos e voltei para a Maipú. Estava no número 500 quando pensei que a memória poderia ter me traído: não era 320? Sim, poderia ser no 320... às vezes minha memória me trai, mesmo... por que não?

Voltei duas quadras, mas... não havia também número 320.

Reencontrar a antiga paixão era um os itens que eu tinha colocado na lista de objetivos a cumprir até fazer 30 anos. Hoje, estou achando que a tal paixão nunca existiu. A mulher mais bonita que eu já vi talvez tenha sido apenas... apenas fruto da minha imaginação. Melhor pensar assim.

Para não perder o dia já perdido, passei em um mercado na Maipú e troquei a nota de 50 pesos que os trombaditas não encontraram. Comprei um gatorade por 3 pesos, uma bolacha por 1,50 peso e peguei todo o troco. Foi o meu almoço, tomado no ponto do ônibus 152, a cara do domingo.

Incrível como domingos conseguem ser bem chatinhos. Seja no Brasil, seja na Argentina.

Dónde está Wally? (A antiga paixão argentina de infância)

Buenos Aires (Argentina) - Já puto da vida, sem a câmera fotográfica, com pouca grana no bolso e pique algum para andar pela cidade, percebi que dificilmente as coisas poderiam ficar pior. Foi quando eu vi um ônibus com destino final Olivos, uma província de Buenos Aires, onde morava a minha antiga paixão argentina de infância. Em vez de me lamentar com os portenhos pelas ruas, decidi ir visitá-la e matar a saudade de... cinco anos e meio.

Ah, a antiga paixão argentina de infância... (suspiro)! Acho que eu tinha uns 14 anos quando a conheci. Ela e mais duas amigas moravam no mesmo condomínio que eu. Três garotas lindas. Todas com quase 20 anos, fazendo uma espécie de república no 1223.

Não tinham telefone em casa, e falavam com um sotaque bem esquisito no orelhão dentro do condomínio. Em um dia de tédio, bolei com uns amigos um ‘plano infalível’ para vê-las: tocamos o interfone do apartamento delas dizendo que um homem tinha ligado para a minha antiga paixão (já sabíamos o nome dela antes), mas que não havia se identificado.

Ela desceu logo depois, encontrou o telefone sem linha. Curiosa, ficou esperando a ligação novamente... e aproveitou para passar o tempo conosco. Ficamos amigos, e quando ela voltou para a Argentina para renovar o visto de turista nos adicionamos no ICQ. O nick dela era o nome dela, mas em hebraico. Virou o nome da banda que eu tinha com uns amigos. Continuamos ainda mais próximos, trocávamos e-mails todos os dias... até que ela voltou para o Brasil, em 1º de dezembro de 2002.

Eu estava jogando bola com os amigos quando ouvi um “Fêêêê!” do lado de fora do condomínio. Era ela. Mesmo linda e impecável, não se importou em dar um abraço em um garoto suado e pequeno. Passamos o resto do dia juntos, e a noite também. Ficamos conversando até quase amanhecer. Na manhã do dia 2 estava jogando bola com os amigos novamente e ela apareceu chorando: tinha brigado com as amigas, estava voltando para a Argentina naquele dia mesmo.

Ela foi embora prometendo voltar. Ela de fato voltou, em um dia em janeiro de 2005. Passou três semanas em Ubatuba e, antes de retornar a Buenos Aires, passou na minha casa. Eu não estava, e ela foi embora. Deixou o endereço para que eu mandasse uma carta: Roma, 32 – Olivos, Buenos Aires.

E em 13 de julho, lá estava eu indo para Roma, 32 – Olivos.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Dónde está Wally? (La plata, la plata!)

Buenos Aires (Argentina) - Domingo de manhã, não tinha muito para fazer após acordar e tomar o desayuno. Tomei um banho e resolvi sair para a rua, meio sem rumo pelos bairros e tentar me perder e me achar logo em seguida por Buenos Aires. Peguei a carteira, coloquei nela uns 60 pesos... e ainda pus no bolso de trás uma nota de 50 pesos e mais duas de 50 reais, para poder fazer o câmbio se encontrasse algum lugar por ali.

Antes de sair, lembrei também de pegar a máquina fotográfica. Quem acompanha este blog há mais tempo deve ter percebido que imagem não é lá o meu forte. Acho muito mais bacana escrever do que tirar uma foto, embora a imagem para mim seja algo quase que essencial. Na dúvida, coloquei a mala na mochila.

Passei pela feira em San Telmo, aqui perto do albergue, e tive vontade de parar em todos os cafés de esquina para justamente tomar um café. Acabei andando tanto que, quando dei por mim, estava muito perto da Bombonera. Andando sozinho em La Boca, achei melhor voltar.

Seguindo o ótimo roteiro portenho que a Lui fez para mim (e nem agradeci ainda, que vergonha!), olhei no guia turístico onde era Puerto Madero. Era logo ali, bastava apenas pegar a Martín García, depois a Paseo Colón, a Inginero-qualquer-coisa e pronto, três diques sob o sol de uma manhã de domingo. Bonito, né? Poderia até ter aproveitado mais não fosse a visão estranha que eu tive pouco antes, de um cara com a cabeça toda ensangüentada andando pela avenida de entrada da Boca.

Saí rapidamente e fui conhecer os diques de Puerto Madero. Uma região bem bonita, resolvi até sacar a máquina da mochila para tirar uma ou outra foto. Coloquei-a no bolso logo depois e olhei o guia: estava perto da Casa Rosada, por que não dar uma olhada?

Tinha um prédio bem legal perto da Casa Rosada, tirei mais uma foto e segui no caminho para a sede do governo argentino, logo à minha frente. Mas queria ver a Casa de perto, e poder cumprir uma dívida deixada no Brasil com uma bela, bela foto de lá.

Então comecei a contornar a Plaza de Mayo quando três moleques de uns 16 anos e com roupas bem pobres se aproximaram. Como não tenho cara de turista nem nada, continuei andando normalmente. Eles começaram a falar um espanhol bem sujo, não entendi e segui caminho. Então me cercaram, dois deles sacaram facas do bolso e apontaram para a minha barriga. “La plata, la plata, la plata”.

Mal tive tempo para tirar dois pesos do bolso: o menorzinho deles enfiou as mãos nos meus bolsos, tirou carteira e todos os pesos. E a câmera da minha mãe, o maior prejuízo e que me deixou com mais peso na consciência: era uma câmera bem bonita, e tal. E... dela, né?

Fiquei sem reação e forcei um tom desesperado, tentando achar algum policial por perto. As pessoas ao redor apenas olharam os moleques saírem correndo, ninguém fez nada. Parei um taxista, que me falou para entrar que ele me levaria à delegacia. Perguntou como tudo tinha acontecido, e eu detalhei. “Sacaran el carajo?”, perguntou. Pensei em responder “Eu fui assaltado, não estuprado”, mas apenas disse que sim. “Que tipo? El trinta e ocho?”, perguntou assustado. “No, faca de cocina”. Então eu percebi que carajo é revólver.

Parei na delegacia, e me senti em pleno Brasil. O delegado (tinha cara de viado, me mandou tomar no cu). Voltando, e deixando a música do Raimundos de lado. O delegado disse que não poderia fazer nada, porque eu tinha sido assaltado do outro lado da Paseo Colón. Eu deveria ir até a Secunda Comisionaria e lá fazer a ocorrência.

Burocracia, burocracia. A mesma que eu notei quando parei um carro de polícia estacionado na rua e contei para o policial o que havia acontecido. “Você foi assaltado do outro lado da rua, estou tomando conta deste. Desculpe”.

A caminho da delegacia, um flanelinha me parou e perguntou se eu não tinha um cigarro para lhe dar. Pediu desculpas por me pedir o cigarro, mas fui compassivo: “Já aconteceu coisa pior”. Expliquei para ele o que havia acontecido, e o cara com a camisa do Boca foi bem solícito. “Pibes hijos de puta, no se hace eso com turistas”. Ele também me aconselhou: “Nada vai acontecer na Comisionaria, não vão te dar um cartão novo e nem uma máquina. É apenas burocracia, você sabe”. Profético.

Cheguei à Secunda Comisionaria, fiz a ocorrência e ganhei um papel a mais para guardar. Puto, puto da vida.

domingo, 13 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Globalización)

Buenos Aires (Argentina) - A primeira pergunta que fiz ao cara do táxi foi simples: Boca o River? Ele disse que era Boca, e eu tentei ser engraçado. “No, no! Yo soy Palmeiras em Brasil, no tiengo buenas lembranças”. Conversamos rapidamente, ele ficou quieto logo em seguida. Não era um velhinho de muitas palavras.

Mesmo assim, continuei puxando assunto com ele vez ou outra. Comentamos sobre o preço dos pedágios na Argentina (80 centavos de peso, cerca de 10% do que se encontra no Brasil). Passei em frente à Casa Rosada rapidamente, cheguei ao albergue.

“Café, cervezita... que quieres, Felipe?”, perguntou o dono do albuergue, o Thomás. Aceitei a Quilmes Cristal (haha) e bati um papo com o ele, um cara bem bacana, que acredita que o Brasil explora muito melhor o turismo do que a Argentina e chama a Alca de 'Al carajo'. Fui apresentado às dependências do Sandanzas, coisas de praxe... logo em seguida ainda vi o Daniel, um mineiro de 31 anos, também chegar. Conversamos um pouco, fomos dar uma volta no quarteirão e tal.

Um mendigo se aproximou da gente na hora de atravessar a rua. “Oh, Brasil?”. Confirmamos rapidamente, e o cara começou um discurso já bem conhecido. “Se yo fose de Brasil me vestiria bien como usted”. Dei uma risadinha e então ele pediu uma monedita. Dei-lhe 50 centavos de peso, mas ele continuou. “Em Brasil tienes maconha, no?”. “Si, em todo el mundo”, respondi. “Usted tien ahí?”, perguntou. “No”, respondi. “Pero yo tengo, quieres?”. “No, yo no fumo”. E ele se foi.

Estava meio perdidão no hotel quando subi para a sala comunal para ver se encontrava alguém. Tinha só uma norte-americana falando na webcam e uma chinesa no MSN comendo sanduíche de presunto com mostarda. Conectei na internet também, bati um papo rápido com o Alemão e com o Hugo, até que una latina caliente chegou ao salão.

Fiz uma piada com ela “Poxa, o pessoal vem para outro país e fica na internet”, comentei em inglês, tendo em vista que ela estava sem laptop. Começamos a conversar, ela se chamava Ena e era da Dinamarca, apesar de ter a cara de uma latina, o corpo de uma latina e a voz de uma latina. Logo ela explicou: nascera em El Salvador. “Estamos em todos os lugares”, ela disse.

Estava conversando com a Ena quando um cara desceu também para o salão. Disse um “Hi” geral e se sentou ao meu lado. Abriu A menina que roubava livros. “Ah, brasileiro?”, perguntei. Ele disse que sim, começamos a conversar em português. Chamava-se Rafael, era de João Pessoa e morava em Porto Alegre. Ficamos conversando sobre Porto Alegre e a diferença entre gaúchos e o restante do país.

O amigo dele, o Geraldo, logo apareceu. Olhou minha camiseta e se surpreendeu: “Ah, você ouve Switch Stance?”. Respondi que sim, já tinha até ido a uns dois shows da banda (que é do Ceará). O papo durou por umas duas horas, quando chegou o Aaron, um texano (igualzinho ao Snape do Harry Potter), e começamos a falar de futebol. Todos já éramos amigos há muito tempo.

Estava tudo muito engraçado quando fomos jantar: Rafael, Juliana (também da Paraíba, amiga do Rafael), Dalsin (um canadense cujo nome não sabemos, mas que ganhou esse apelido por ser igual àquele lutador indiano do Street Fighter), o Aaron, uma canadense de Montreal e eu. Logo na rua a canadense acendeu um cigarro. Começamos a conversar em inglês.

“Montreal é a parte francesa do Canadá, né?”, perguntei. Ela disse que sim. “Beleza! Quando chegar ao Brasil, vou falar que enfim vi uma francesa fumar”. “Como assim?”. “Você faz toda a pose de um francês fumando, é engraçado”. Ela, que aparentava ser bem louquinha, gostou. Ficamos conversando, e ela também achou engraçado quando passamos por um corredor mais apertado e deixei que ela fosse na frente, com um simpático “Ladies first”.

Jantamos em um restaurante mexicano. A canadense lá, sob meu conselho, pediu uma caipirinha. Odiou. Eu tomei um jugo de naranja, que tinha gosto de limão e parecia ser de limão. Na volta para o albergue, às 2 da manhã, passamos em frente a um show. A banda que estava tocando se chamava Massacre. Bastou isso para decidirmos não entrar.

Faz sentido: já pensou se eu ligo amanhã e digo para a minha mãe: “Mãe, vi Massacre ontem aqui em Buenos Aires”? Melhor não a deixar preocupada, né?

Tolice. Mal sabia eu o que me reservava para contar a ela...

sábado, 12 de julho de 2008

Dónde está Wally? (Sobrevivendo ao avião)

Buenos Aires (Argentina) - Assim que entrei na fila do embarque, ouvi uma voz conhecia atrás de mim. Logo me virei e encontrei o Fernando Meligeni, um dos caras que eu mais entrevistei até hoje (cinco vezes, no total). Bacana, estava indo para Buenos Aires com o Fininho. Nos cumprimentamos, trocamos uma piada e entramos no avião.

Entrei no avião, sentei na janelinha e, já sem medo, me preparei para a decolagem. Tudo dentro dos conformes, não fosse o fato de a nave ter estacionado na pista na hora em que recebera a permissão de alçar vôo. Não demorou para chegar a explicação do comandante: os freios do avião travaram, não voltavam para o lugar.

Não restava nada se não esperar, mas ainda achei algo mais interessante para me divertir: o inglês do comandante do avião. Por incrível que pareça, ele tinha o famigerado inglês com sotaque carioca (mais explicações, somente ao vivo).

É claro que na hora lembrei do manual de sobrevivência da Carol Canossa. Quer dizer, médio: lembrei que ela tinha elaborado tal guia, mas não lembrava um mandamento sequer. A única coisa que eu sabia era que... que... que quem senta na traseira tem menos chances de sobreviver. Eu estava na asa, não poderia ser tão ruim assim.

Mas o avião levantou vôo, e então serviram o almoço. E eu, que não tinha comido nada até então, pude bater uma chepa delícia. Salada (muita salada), uma mini-panqueca de ricota... e um vinho. Sim, pedi vinho, mas me arrependi quando recebi um copo de vinho tinto seco. Bleh, ainda não sou tão macho como os gaúchos, que dizem que vinho suave é para calouros.

Foi a refeição mais apertada que já fiz: mal podia mover os braços. Era preciso realizar um malabarismo enorme com o tronco e com o antebraço, e sobrecarregar o cotovelo. Mas pelo menos deu para encher o pandu, e depois ainda dormi um pouquinho, para compensar a noite em claro.

Depois de um tempo o avião passou por uma região prateada. No início parecia um lago, mas então liguei os pontinhos e percebi que estava sobrevoando o Rio da Prata. Ou seja, já tinha saído do Brasil há tempos: estava era deixando o Uruguai e me aproximava de Buenos Aires.

Demorou um pouquinho até o avião pousar, o que me ajudou a ter um panorama da capital portenha: quase nenhum prédio, bairros bem elaborados... toda bonitinha. O avião então pousou, freou (sim, ele freou!) e eu desci todo empolgado.

Cozinhei um pouco na fila da imigração, mas comecei a colocar em prática o meu portunhol com o cara do guichê. Acho que não foi tão ruim assim, e eu consegui entrar na Argentina. Peguei minha mala na esteira, passei em frente à casa de câmbio e vi uma Argentina realmente linda no guichê. Resolvi trocar mais alguns Reais por uns pesos só para poder vê-la melhor.

Feliz da vida, ainda tive tempo para me sentir quase que um filme: havia uma plaquinha com meu nome me esperando no portão de desembarque: era o táxi do albergue que estava me esperando.

Agora, já de noite, estou no albergue, sem muita coisa para fazer e esperando surgir algo interessante. Depois conto as primeiras impressões sobre Buenos Aires.

Dónde está Wally? (Sala de embarque)

Guarulhos (SP) - Eram 19h01 quando levantei da minha cadeira no trabalho. “Sem nem um minuto a mais, é com prazer que me despeço de vós e volto um pouquinho antes de Pequim”, resumi. Sim, depois de exatos 19 meses, consegui meus primeiros 16 dias de férias. E com tudo planejado (bem às pressas, admito), estava livre para partir rumo à minha 12ª viagem.

Mas mesmo ‘experiente’ - foram quatro viagens apenas em 2008 (São José dos Campos, São José dos Campos, Tatuí e Porto Alegre) , um recorde para quem conheceu o mar com quase 13 anos) -, percebi à noite que a vivência não tinha feito com que um medo antigo se apoderasse de mim. Não bem um medo, mas uma ligeira insegurança. Eu explico.

Foi com a Bonie que comentei algo semelhante. Sempre criei estigmas em torno das minhas primeiras viagens, e passava as vésperas com algo que se assemelha à ansiedade. “A última vez que tomo banho em casa, o último almoço, a última noite na cama...”. Sempre pensava isso nos dias que antecediam as viagens, e isso me deixava com uma saudade enorme por antecipação.

Nas minhas últimas cinco viagens não havia vivido essa sensação de novo, mas na madrugada de ontem percebi que tinha ‘tomado o último banho’, ‘feito a última refeição’, ‘deitado na cama pela última vez’. Uma droga. Tanto que fiquei acordado até bem tarde, e apenas duas horas foram reservadas para o sono.

Acordei já bem mais... ahn, tranqüilo. Mas como complicação é meu sobrenome, vivi meu primeiro dessabor ainda em São Paulo. Foi por pouco que não perdi o traslado da TAM entre Congonhas e Guarulhos, mas embarquei no ônibus aos 45 do segundo tempo e consegui chegar a tempo aqui em Cumbica.

Ainda passei duas horas contadas na fila do check-in internacional. Até bati um papo com um tiozão uruguaio, que estava morrendo de medo de perder o vôo. Tanto que, quando foi chamado às pressas para despachar as bagagens, sequer me deu um ‘até logo’. Humpf.

Mas consegui fazer tudo a tempo de ainda dar uma passadinha na casa de câmbio do aeroporto e pegar uns trocados. E tive a sensação de dar meu rico dinheirinho para a moça do guichê e receber três notas sem valor, nada mais do que papel. O dinheiro só tem valor para quem o usa diariamente, e como nunca paguei nada em pesos, senti que estava com apenas três contra-vales para serem gastos por aí.

Agora estou na sala de embarque, e a comissária está chamando os passageiros de classe econômica do vôo 8010 para embarcarem. Devo desembarcar rumo ao meu resort de férias dentro de algumas três horas. Prometo voltar com as minhas primeiras impressões de um país estrangeiro.

Arrivederte!
(Ops, acho que não é assim que se fala tchau em espanhol. Tudo bem: nas próximas duas semanas, devo fazer várias miscelâneas lingüísticas).

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Besteirol

Teve um dia em que eu acordei poucas horas depois de pegar no sono (já devia ser umas 9 da manhã). Abri os olhos meio inquieto sobre a cama e sob os dois cobertores e precisei me livrar de alguns pensamentos. Precisei escrever algumas besteiras e só então consegui bocejar de novo e voltar a dormir.

No começo desta semana, vasculhando alguns arquivos antigos no computador, encontrei este texto. Na falta de criatividade posto-o por aqui, torcendo para que a destinatária não saiba da existência deste blog – ela não deve saber, e espero que não descubra dentro de pelo menos... uns 30 anos, sei lá. Melhor assim.


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Já tem um bom tempo que a gente não se encontra, não se vê casualmente e nem se fala, mas é incrível como eu ainda sonho com você. E isso acontece geralmente nos momentos mais propícios, quando minha cabeça está absolutamente vazia de quaisquer pensamentos – vãos pessoais, profissionais ou amorosos.

Pelo menos uma vez por mês tenho você em um dos meus sonhos, em situações quase sempre inesperadas: na sua rua, no metrô, na Paulista... uma vez, até cruzei com você nos corredores da minha faculdade. Da última vez, estava bebendo sozinho em um bar e você apareceu para conversarmos.

Passo o sonho inteiro com um sorriso enorme, mas naquele bar foi diferente. Conversáramos sobre nós, coisa que fizemos apenas umas duas vezes durante o tempo que passamos mais próximos um do outro. Quase sempre tínhamos algum assunto mais interessante, como por exemplo quem de nós era o mais alto ou, então, a discussão sobre alguma piada casual que eu fazia sobre você. Papos que sempre me faziam voltar para casa com um sorrisão no rosto e mil sonhos na cabeça.

Por que você ainda aparece nos meus sonhos? Jurei para mim mesmo que não era mais apaixonado por você. Até me apaixonei algumas vezes depois da nossa formatura – algumas paixões até muito mais intensas e mais bem correspondidas do que aquela que tive por você –, mas você é sempre a primeira (ou, hoje em dia, divide a primeira com uma outra paixão arrebatadora) nas minhas melhores lembranças femininas dos últimos tempos.

Nas últimas duas vezes em que nos encontramos você não estava mais como antigamente. Seu cabelo, antes loiro e brilhante, já não tinha mais aquele brilho intenso que o teu sorriso também tinha – e como brilhava aquele teu sorriso! Não tínhamos mais aquele papo tão legal como quando tínhamos 16 anos... tanto que, putz, passei nosso último encontro casual conversando quase que o tempo inteiro com a sua mãe, que me confessou ser fã do Roger Federer e não ir muito com a cara do Rafael Nadal. Tua mãe também não foi com a cara do teu último ex, né?

No fundo no fundo, adoro me lembrar de você. Não tenho nenhuma lembrança sua que me machuca, diferentemente do meu último caso amoroso. Gosto até de contar por aí sobre o dia em que falei uma coisa bonitinha no teu ouvido, você virou as costas para mim, deu três passos e se virou com um baita sorrisão.

Na verdade, tenho apenas uma lembrança tua que me machuca. Nunca mais consegui sequer sentir o cheio de vodca depois que, segundo você mesma, “eu tive a minha chance contigo e a troquei por um(ns) copo(s) de vodca”... ah, como eu era idiota quando tinha 17 anos!

Agora vou voltar a dormir, e torcer para não sonhar com você. Nada pessoal, mas prefiro assim: sonhar com você apenas de vez em quando, para te conservar por mais tempo na minha lembrança como a melhor paixão platônica que já tive. Até.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Vozes femininas

Não sei por que, mas não consigo ouvir muitas bandas que têm vocal feminino. Talvez um Cramberries, mas nada em excesso. Uma vez por mês, algo assim, não muito mais. Parei para refletir sobre isso, que vai exatamente na contramão de uma das coisas de que mais gosto: ouvir uma voz doce feminina.

Assim como comentei por aqui uma vez sobre a importância das mãos femininas, venho por meio desta exprimir algumas sensações sobre esse dom da mulher, que consegue dizer apenas uma palavra e acalmar todas as inquietações de um homem. Ou, então, deixá-lo ainda mais enlouquecido – mas, neste caso, por um bom motivo.

Um exemplo ‘bobo’ disso aconteceu comigo há alguns meses. Deitado na cama, irrequieto e com pensamentos que me consumiam, liguei para uma amiga minha (a mesma deste post). E tão confortante foi ouvir a voz dela rindo das minhas piadas forçadas que acabei esquecendo que havia algo que me afligia.

Outro dia também. Encontrei um vídeo antigo da minha ex e pude ouvir sua voz após certo tempo. Uma voz bem doce que me tranqüilizou nos momentos mais inquietantes, mas que eu não escutava já há tempos. É bom matar as saudades; e ter a lembrança de um timbre suave que eu praticamente já havia esquecido conforta.

O que é melhor: ouvir uma voz feminina momentos antes de dormir ou logo após acordar? Acabei aprendendo que não se deve escolher nada disso, e sim tê-la. Nada como saber que sempre haverá uma voz doce preparada para nos dizer apenas uma palavra e nos confortar.

E para mim basta apenas uma palavra bem curta: “Fê”. Pois é, confesso... não resisto ser chamado de Fê ao pé do ouvido.

domingo, 6 de julho de 2008

Curtindo adoidado

Estou cansado de ver o mundo dizer que a tecnologia evoluiu a comunicação. Pode ter facilitado, mas isso não significa necessariamente que as coisas tenham ficado melhores. Explico.

Apesar de escalado para trabalhar no final de semana, estava disposto a passar meu último sábado no Brasil (sim, estou de malas prontas para sair por aí) fora de casa. Aproveitar, e sexta-feira até aceitei passar a madrugada de sábado para domingo em uma balada – contrariando o que havia escrito por aqui.

Pois bem. Era cerca de 1h30 de sexta para sábado quando a tal balada foi combinada. “Eu te ligo amanhã”, disse a garota, pouco antes de fechar a porta do meu carro. “Liga mesmo, é?”, questionei eu, desconfiado. “Sim, de noite eu te ligo pra gente combinar”, ela garantiu.

Acordei poucas horas depois, trabalhei, voltei para casa, almocei e passei o resto da tarde com a minha mãe – que, por sua vez, não se cansava de perguntar se eu sairia à noite. “Não sei, pode ser que sim”, desconversava, até mesmo para não criar expectativas em mim mesmo.

Acabei deitando no sofá para ver Atlético-PR x Santos e, como pedia o jogo, dormi profundamente. Acordei lá pelas 11 da noite, com o celular à minha frente e nenhum registro de chamada não atendida ou mensagem recebida. Fui tomar um banho quente para acordar (embora devesse ter ido dormir na minha cama), abri a internet, fiquei vendo alguns roteiros de viagem... o tempo passou, e o dia virou.

Então olhei meu celular, e o silêncio dele me incomodou. Digitei uma mensagem rápida e curta (amigos íntimos sabem que eu expresso minha decepção com frases extremamente curtas): “Muchas gracias pela ligação, tá?” e coloquei para enviar. Acendi um cigarro, peguei uma revista para terminar de ler e vi meu celular piscando: “A mensagem não pôde ser enviada”.

Notei que o celular tinha perdido o sinal temporariamente, e por isso não despachou o recado. Entrei no site da Claro e digitei mensagem semelhante. “Não sei por que, mas achei que desta vez você iria me ligar. Devo ter me enganado”, sintetizei e enviei.

No mesmo momento, vi que o sinal não havia voltado. Prevendo o que havia acontecido, desliguei e liguei o celular, que retomou o sinal e me mostrou uma mensagem: “Meu querido, não me esqueci de você, viu? A balada está de pé... vamos, né? Beeeijo”. O horário da mensagem: 21h30.

Agora estou deitado no sofá de casa, com a janela da sala aberta curtindo um belo dum frio. Só que o vento que gela meus dedos e as minhas pernas não me incomoda tanto como a quase-decepção por imaginar a garota a essa hora na balada. Depois ela vai sair, ver a minha mensagem curta e grossa... e com certeza não me ligará no domingo. E eu aqui, vendo Altas Horas.

Ah, como eu odeio as telecomunicações.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Dubieade

Dúbio é uma palavra bacana, que tem um som bem legal. Por mais que uma pessoa não saiba o que está dizendo em alguma conversa, e ‘dúbio’ é lançada eu geralmente acabo dando um pouco de crédito para o interlocutor. “Poxa, ele falou dúbio... deve ter um vocabulário bacana”.

Para quem não sabe, o Cavaleiro com Solitária vem por meio desta explicar, antes de continuar o relato: dúbio, segundo o Tio Aurélio do meu irmão, quer dizer: duvidoso, incerto, ambíguo; difícil de explicar ou definir. O Word ainda dá mais alguns sinônimos: impreciso, equívoco, além do sensacional anfibológico. Anfibológico me lembra um sapo em uma aula de biologia, mas não alguma coisa dúbia.

Mas voltando. Gosto da palavra dúbio, mas nunca a usei, seja em um texto escrito para o trabalho, para a faculdade, para este blog, em papos por MSN, em mensagens de celular, em recados do Orkut e muito menos em conversas ao vivo. Isso sim é dubiedade: gostar de uma palavra e jamais tê-la usado.

Para isso, contudo, há uma explicação: nunca lembro da palavra ‘dúbio’ quando penso em dizê-la, ou escrevê-la. Não sei por que, mas as letras fogem da minha cabeça, embaralham-se de tal forma que eu só consigo pensar em ‘bíguo’ ou ‘dual’. Se juntar as duas certamente se obtém algo parecido a ‘dúbio’, mas... não é o dúbio de fato.

Aproveito, agora, para inaugurar o uso do ‘dúbio’ na minha vida escrita. Justamente no momento em que eu quebrava a cabeça para produzir alguma cascata partindo das palavras ‘paulatinamente’ ou ‘silviídeo’, um texto sobre o ‘dúbio’.

Dual isso, né? Digo... dúbio, não?

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Efemeridades

Gosto de reencontrar as pessoas depois de um certo tempo de distanciamento. É sempre bastante legal cruzar casualmente com alguém na rua após alguns meses sem encontrá-la, e sempre acabo me sentindo... sei lá, bem animado com esses encontros casuais.

Um dia desses, não faz muito tempo, encontrei a Maria. Não lembro direitinho a história, mas eu tinha ido a um sítio de não-sei-quem e, durante a noite, tinha levantado para beber água e trombei com ela. Passamos o resto da noite conversando, dando risada... foi legal, ela com a voz rouca dela e eu com as minhas piadas sem graça.

Passou algum tempo e, certo dia, uma ex me ligou e disse que tinha me visto na rua naquela tarde. “Você estava sentado no escadão da Paulista lendo um livro, sei lá. Não fui falar com você porque estava atrasada para o trabalho, mas me deu vontade de parar para conversar”.

Foi aí que eu me lembrei que também a havia visto naquela tarde e preferi não ir atrás, mas desconversei: “Puxa! Não te vi, , que pena... queria mesmo ter falado com você. Mas tudo bem, fiquei contente por saber que você não me apagou por completo da tua vida”, rebati. “Magina, nunca que eu faria isso”, ela treplicou. E... bom, não lembro mais o que aconteceu.

Tive vários encontros como esses dois nos últimos dias, mas os citados são os únicos dos quais eu me lembro - e dos quais gostei de que tivessem acontecido. Como disse antes, é sempre bom rever certas pessoas depois de um tempo.

Mais legal ainda é quando os encontros casuais acontecem da mesma forma como ambos aconteceram: na calada da noite, durante o meu sono. Sim, sonhei esses dois encontros. E no fundo foi bom que tenham acontecido: acordei com a sensação de que tinha de fato reencontrado tanto a Maria como essa minha ex; matou um pouco a saudade.

E os encontros sonhados têm o lado bom de serem efêmeros. No final de semana seguinte, você não fica com aquela responsabilidade de levar a cabo aquela promessa feita na hora da despedida: “E nesse final de semana, vamos fazer alguma coisa? Pô, me liga”.

A única coisa que resta a fazer é acordar, esfregar os olhos, bocejar, espreguiçar, levantar da cama, tentar se lembrar de algum detalhe do sonho... e, como já dizia o Paul, mentalizar: “It’s just another day, du du du du du du”.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Quase-decepção

Quase todos os atletas com 20 anos são promessas: aparecem com um ótimo condicionamento físico, uma boa resistência, uma disposição ainda melhor. A tendência é que, entre os 25 e 29 anos, dependendo da modalidade que praticam, atinjam o auge.

Acontece que eu, do alto dos meus 20 anos, não me sinto mais tão jovem. E prova disso eu tive alguns finais de semana atrás, quando uma garota me perguntou o que eu faria naquela noite. Respondi que ainda não tinha nada planejado e fiquei esperando receber um convite para irmos novamente ao cinema, tomarmos um açaí ou, sei lá, qualquer outra coisa. Já tinha preparado na ponta da língua um “beleza, te pego em casa às oito”.

Mas, infelizmente, não foi bem isso o que aconteceu. “Vamos pra balada? A gente chega lá umas 23h30. Acho que lá rola até umas 4, 5 da manhã. Vamos, né?”. Embora o convite tenha sido, hum, interessante, confesso que desanimei na hora e desconversei. “Putz, faz dois dias que eu praticamente não durmo, você bem sabe. Acho que não tenho pique pra ir hoje, mas... fica pra próxima, você não se importa?”.

No fundo era verdade, mas admito que fiquei decepcionado comigo mesmo, e também senti um pouco de vergonha para propor o que eu realmente queria fazer. O que uma menina mais nova do que eu iria imaginar se recebesse um convite para tomar um café no comecinho da noite? Aposto que ela pensaria “que panaca, a mamãe não deve deixar que ele volte tarde pra casa”.

Blah. Esse negócio de balada não é pra mim.