sábado, 31 de maio de 2008

Onde está Wally? – parte 5 (Outono em Porto Alegre)

Porto Alegre (RS) - Não sei como, mas a moça da recepção conseguiu fazer uma gambiarra ligando a torneira da pia, regulando os registros quente (que na verdade era frio) e frio (que posteriormente descobri ser o quente) e fazendo sair a mágica da água quentinha para o meu banho. Sobre como foi meu banho no hotel, o Mario Prata explicou tudo nesta crônica.

Fui dar uma volta pelo quarteirão novamente para tomar um café e encontrei um carro com um adesivo ‘Bronzauto’. Na hora tentei mandar uma mensagem para o Bronzatto, com a imagem anexa e o texto “Bah, mas até em Porto Alegre tu me persegues”, mas lembrei que não sabia de cor o número dele e não consegui. Droga.

Pouco depois encontrei a juuuliana, que foi de fato me apresentar a capital gaúcha. Percebi que apenas na Avenida Independência os ônibus eram pequenos (conhecidos aqui como lotação, assim como em São Paulo). Sim, aqui em Porto Alegre há ônibus quase normais, mas com roletas em vez de catracas.

Passamos a tarde na beira do gasômetro, onde havia um ‘hippie de Cristo’ – como ele mesmo se identificou. Passamos pelo centro velho, andamos de metrô (que na verdade é trem), fomos à geladíssima São Leopoldo, cidade onde se encontra a gigantesca Universidade do Vale do Rio dos Sinos (a famosa Unisinos).

Nunca senti tanto frio como em São Leopoldo. Apesar dos vários casacos, do corpo encolhido, da barba e do cabelo grandes, putz, como fez frio. De volta a Porto Alegre, saímos para jantar em uma lancheria com hambúrgueres gigantes (que aqui no Sul são de tamanho normal, enquanto os de São Paulo são apenas um aperitivo).

Merece destaque aqui a conversa que tivemos a caminho da tal da lancheria (não, aqui não há lanchonetes), assim que vi uma loja com um toldo onde se lia 'Fruteira':

Eu: Fruteira aqui é loja de frutas?
Juuu: É, loja de frutas.
Eu: Humm, em São Paulo é quitanda.
Juuu: Quitanda?
Eu: É.
(...)
Eu: E mandioca, como que é aqui no Sul?
Juuu: Aipim.
Eu: Ah, verdade, que nem na música do Mamonas.
(cinco minutos para tentarmos lembrar que aipim aparecia em Chopis Centi)
Juuu: Bah, pega o cardápio ali naquela mesa.
Eu: O quê?
Juuu: Cardápio.
Eu: Ah, isso aqui se chama cardápio no Sul? Nossa!
Juuu: Sim, cardápio. Como é em São Paulo?
Eu: Cardápio, hahaha.
Juuu: Besta.

De madrugada, ainda fomos tomar vinho em um dos pontos alternativos/de garagem aqui em Porto Alegre. Aqui, vinho mesmo é vinho tinto seco. Suave, aqueles docinhos e delícia que a gente toma em São Paulo, é coisa pra criança aqui. Humpf.

Bom, o dia aqui não está tão frio hoje. Talvez esteja uns 10 graus lá fora e, infelizmente, não geou como dizia a previsão do tempo.

Vou tomar café da manhã/almoçar. Hoje, acho que ainda vou a um churrasco tipicamente gaúcho e, se tudo der certo, aprendo na prática como funciona um chimarrão. Onde está Wally? retorna em breve, eu acho. Bah!

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Ondes etá Wally? – parte 4 (Era do gelo)

Porto Alegre (RS) - Abri os olhos por volta das 10 da manhã e a primeira coisa que vi não foi minha janela, minha televisão, meus pôsteres do Palmeiras e minha guitarra. Lembrei instantes depois que estava em Porto Alegre, a mais de mil quilômetros do meu apartamento. E tentei pensar no que fazer.

Pensei em tomar um banho. Liguei um registro, o outro... e a água continuou absurdamente gelada. Desliguei, liguei um, outro, depois outro, um. Nada. Abortei a missão banho, voltei para a minha cama.

Liguei a televisão, vi alguns desenhos e fui dar uma volta pelos arredores. Apesar de ter passado uma noite bem quentinho sob dois cobertores e não estar com frio, coloquei duas blusas e fui andar. E, ao abrir a porta do hotel, que frio! Minha mão gelou, bem como minhas orelhas, nariz e qualquer do meu rosto que estivesse descoberta. Maravilha!

Dei uma volta pela Avenida Independência, passeei por algumas alamedas no entorno, comprei um Correio do Povo e notei que havia inclusive uma notícia do Marcos Daniel (para quem não sabe, tenista gaúcho) – ontem, ele havia perdido em Roland Garros.

Parei em um bar, pedi um café com leite e comi um salgado. Pela primeira vez no dia me senti extremamente quente, por causa do café com leite. Ganhei até mais fôlego para continuar andando pelo bairro.

Encolhido e com as mãos nos bolsos, passei por várias mulheres. E sim, aquilo que falam de que mulheres gaúchas são sensacionais é verdade. Até as que aparentam ser mais feinhas, coitadas, têm um quê de belas. Interessante, a cidade. Também vi alguns moradores de rua - dão um pau nos de São Paulo. Muito mais educados, bem vestidos. Tinha até mendigo loiro, haha.

O trânsito daqui também parece ser muito melhor do que o de São Paulo. Os ônibus daqui são do tamanho das lotações paulistanas, e a faixa de contenção dos carros é a mais de um metro da faixa de pedestre: por mais que o motorista queira, não tem como parar sobre a faixa. E os pedestres não precisam ziguezaguear entre os carros.

Retornei ao hotel e comuniquei à recepcionista sobre a minha saga para tomar banho. “Ah, normal. Tu liga o registro do quente e deixa escorrer um pouco”. Não acreditei muito, mas voltei ao meu quarto preparado para tomar banho.

Liguei um registro, o outro... e a água continuou absurdamente gelada. Desliguei, liguei apenas o quente e deixei a água escorrer. Escrevi este texto enquanto a água escorria gelada. Acabei de dar uma olhada, ela continua na mesma temperatura. Quem se ferra com isso é o mundo, que deve ter perdido alguns litrinhos de água enquanto um turista paulistano em Porto Alegre fica com medo de encarar um banho gelado.

Vou lá falar com a recepcionista, volto com a parte 5 de Onde está Wally? mais tarde.

Onde está Wally? – parte 3 (Terra prometida)

Porto Alegre (RS) - Dono de uma fábrica de artefatos de couro (eu não sei o que é um artefato de couro), o tal do Ronaldo se mostrou um cara extremamente bacana. Enquanto eu escrevia o relato anterior, ele enfrentava a fila de check-in da Gol e pegava a minha passagem para Porto Alegre.

Assim que ele voltou ao saguão e me deu a passagem, continuamos conversando. Ele disse um pouco mais da vida dele: tinha filhos, recentemente havia viajado para Itália e Alemanha, não ia mais a estádios, simpatizava com o Cuca como treinador e achava que o problema do Grêmio não era o Celso Roth, mas sim a diretoria.

O Ronaldo também disse que não morava em Porto Alegre, mas em São Leopoldo – uma cidadezinha próxima. Pelas minhas contas, deve ser tipo São Caetano do Sul em relação a São Paulo. Ele, aliás, conhecia São Paulo e até me contou uma história de que estavam querendo construir uma ferrovia São Paulo – São José dos Campos. Onde foi que eu ouvi essa história antes?

Ficamos batendo um papo legal até a hora do embarque. A caminho do avião, um sábio comentário: “Bah! A gente passa por tanta merda na vida e se vê em situações tão fodidas que, quando melhora um pouquinho, tudo já tá perfeito, não?”. Não tinha como não concordar. Estava extremamente empolgado por ter conseguido aquele vôo-surpresa na madrugada.

Minha poltrona no novo vôo era a 25C, e a do Ronaldo era na fileira 11. Fui para o meu lugar e não nos falamos mais durante o vôo. Até aproveitei para tirar um cochilo e tirar um pouco do atraso do meu sono. O avião decolou, pousou, todos os passageiros foram embora e eu era um dos últimos da fila.

Fiquei uns belos minutos, já sentindo o frio porto-alegrense, esperando pela minha mala na esteira. Assim que ela apareceu, coloquei-a sobre o carrinho e parti rumo à saída do Aeroporto Salgado Filho (haha). E até um pouco chateado. “Incrível como eu conheço pessoas que vão embora e não se despedem. O Ronaldo e o outro cara (cujo nome eu não conhecia, mas ficou nosso colega durante o primeiro vôo) desapareceram. Bom, é a vida”, pensara.

E não é que, no mesmo instante, ouvi uma voz com sotaque gaúcho? “Pois é, Felipe. Quem diria que tudo daria certo?”, destacou o Ronaldo. “É, então. A essa hora a gente ainda nem teria saído de Floripa, se viesse de ônibus”, respondi. Ainda falamos mais algumas trivialidades, até que chegamos à porta.

“Você vai pegar um táxi?”, perguntou. “Uhum, vou”. “Bom, se você fosse pros lados de São Leopoldo eu te dava uma carona. Mas boa volta pra casa, foi um prazer. E boa sorte na tua carreira”. Desejei o mesmo a ele. Trocamos tapinhas nas costas e cada um seguiu seu caminho.

A sina insana do meu trajeto São Paulo – Porto Alegre chegou ao fim, e agora escrevo da minha cama no hotel. Mas a viagem, e a saga Onde está Wally? deve ganhar mais alguns capítulos.

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Onde está Wally? – parte 2 (O farsante)

Florianópolis (SC) - Tive medo. Confesso que tive muito medo. Achei que tudo daria errado. Mas aí entrei na sala de embarque e fui me empolgando aos poucos. No ônibus que me levaria ao 737 da Gol, ainda encontrei com Dáfani de Figueiredo, carateca que disputou o Pan no ano passado e uma das primeiras pessoas que eu entrevistei. Não falei com ela, que estava acompanhada do seu marido.

Entrei na aeronave e, ao encontrar a fileira 13, ouvi um chamado. “Pó, mas tu também está aqui?”. Olhei para o lado e lá estava o tal cara de uns 45 anos, com quem eu tinha falado em sotaque gaúcho. Guardei rapidamente a mochila no bagageiro, sentei ao seu lado e começamos a conversar.

O avião começou a andar, inclinou, levantou vôo. Acho que lancei o maior sorriso pueril de ver a cidade iluminada lá embaaaaaixo, e eu lá em cima. E voando. E com dor de ouvido, claro.

Continuei o papo com o gaúcho, que disse se chamar Ronaldo. Ele perguntou onde eu trabalhava, e eu disse que era repórter do Clic RBS. Vai entender? Então percebi que deveria inventar uma história. Uma vida nova.

Disse que havia nascido em São Paulo e ido para Porto Alegre um pouco mais velho. Em São Paulo, tinha vindo cobrir Corinthians x Botafogo, pela Copa do Brasil. “E o pior é que eu t... digo, gosto mais do Palmeiras”, gaguejei. O Ronaldo era Tricolor, e eu também disse torcer para o Grêmio.

O avião passou por uma turbulência, eu morri de medo. Pensei na minha mãe. O avião pousou, eu liguei para ela. Já em solo catarinense, o Ronaldo, um gaúcho e mais três mulheres decidiram alugar um carro para irmos daqui a Porto Alegre (as passagens rodoviárias estavam esgotadas até amanhã). Topei.

Encontrei de novo com a Dáfani. Ela me reconheceu, comentou que eu tinha deixado a barba crescer e conversamos rapidamente. Cumprimentei o marido dela. Desejei boa sorte na carreira, que a gente se veria no próximo Pan ou então de novo no Clube Pinheiros. Profissionalmente, mas é claro.

Peguei minha bagagem, sentei no saguão esperando o aluguel do carro ser concretizado. Então o Ronaldo voltou sorridente dizendo que tinha conseguido um vôo de Floripa para Porto Alegre, saindo à meia-noite.

Estou indo para lá. Porto Alegre, aí vou eu. Eu? Eu quem? O farsante que trabalha no Clic RBS? Não sei. Por que diabos eu fui inventar essa história?

Onde está Wally? – parte 1 (O terminal)

Congonhas (SP) - Folga tripla no trabalho, decidi aproveitar para tirar o atraso. Já que não estou em Paris como havia planejado, decidi comprar uma passagem aérea e me mandar para Porto Alegre, cidade que há alguns muitos meses eu já planejava conhecer.

Tudo ocorreu (mais ou menos) conforme o esperado, e cheguei ao aeroporto com uma hora de antecedência – obedecendo ao mantra que constava no meu e-voucher. Mas mal tive tempo de entrar na fila do check-in e veio a notícia: todos os vôos para Porto Alegre foram cancelados.

“Pegadinha, né?”, pensei. Não, infelizmente não era. A frente fria, a mudança do tempo, a neblina... tudo isso e mais um pouco havia conspirado para que o Aeroporto Salgado Filho fechasse suas portas para mim. Instantaneamente abri a mochila para sacar o celular e ligar para a minha comissão de recepção avisando que atrasaria – alguns dias, talvez. Mas aí me lembrei de que meu celular fora furtado horas atrás, na Paulista.

“Bom, o jeito é me virar”, disse para mim mesmo. O gaúcho que estava atrás de mim na fila, um cara que devia ter lá uns 45 anos e não saía do celular com a esposa, pareceu ouvir. “Puta merda, brincadeira! Bah, mas e agora?”. Comecei a conversar com o cara, que disse se chamar alguma coisa-Naldo, e inconscientemente forcei um sotaque gaúcho. “Ah, mas e tu é de onde?”, ele perguntou. “Bom Fim”, menti, papagueando o único bairro cujo nome eu sabia. Acho que não sou tão mau ator assim.

Enfim. Acabei chegando ao balcão de informações e fiquei sabendo que só poderia embarcar para Porto Alegre na tarde de sábado – sendo que meu final de semana termina no domingo, como o de todos os mortais. Olhei o mapa na parede, perguntei se não havia nenhum aeroporto próximo. “Florianópolis, tem um vôo pra lá às 21h37”. Aceitei sem pensar muito nas conseqüências.

Fiz alguns cálculos, percebi que daria tempo de chegar a Floripa a tempo de pegar um ônibus na rodoviária com destino a Porto Alegre. Liguei para a minha mãe para avisá-la das novidades e, também, para o meu comitê de recepção. Depois, andei alguns quilômetros, comprei um celular novo para me manter comunicável e retornei ao aeroporto. Fiz o check-in e descobri uma área com wi-fi.

Agora estou aqui, sentado no meio do saguão, vendo pessoas de vários tipos e sotaques passando à minha frente. Minhas roupas estão a caminho de Floripa. Eu também, dentro de uma hora (embora meu plano inicial fosse estar em Porto Alegre há uma hora). A minha 11ª viagem ganha ares dramáticos.

Mas não perca, no próximo capítulo de Onde está Wally, as novidades que se darão com a minha pessoa. Assim que possível atualizo meu diário de bordo virtual. Isso se o medinho de andar de avião pela segunda vez não tomar conta de mim.

Atualizo assim que possível.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Eternizando 26 de maio

Nunca tive muitos motivos para fazer de maio um mês fundamental para o meu ano e, pelo que me lembre, nunca aconteceu nada lá de muito relevante para que algum dia fosse eternizado. Mas o dia 26, inevitavelmente, vai ser difícil de passar em branco nos próximos anos.

Por mais que não pareça, 26 de maio é um dia relativamente importante para a história mundial. Em 1805, por exemplo, Napoleão Bonaparte se autoproclamou Rei da Itália. Na mesma data, mas 23 anos depois, um moleque esquisito de nome Kaspar Hauser, que mesmo com 14 anos mal conseguia falar, foi encontrado nas ruas de Nuremberg, na Alemanha. Em 26 de maio de 1889, Paris viu a inauguração do primeiro elevador da Torre Eiffel.

O 146º dia de um ano normal (ou 147º de um bissexto) também ganhou destaque na geopolítica do século 20. Em 1918 foi proclamada a república na Geórgia, pequeno país do Leste Europeu que durante oito séculos viveu sob regime monárquico. No ano de 1966 foi a vez de a Guiana se tornar independente da Grã-Bretanha.

Ainda no século 20, ganha destaque também o 26 de maio de 1986, é claro. Foi nesse dia em que a Comunidade Européia chegou a um acordo sobre a bandeira do Velho Continente – hoje, da União Européia. Aquela coisa azul cheia de estrelinhas.

Mas não será nenhum desses dias 26 de maio que vão me fazer lembrar de alguma coisa, e sim o de 2008. E eu explico por quê: foi neste dia que liguei o computador por volta das 12 horas e vi estampada na capa do site aquela que, antes mesmo de nascer, eu achava que seria a ‘matéria mais importante da minha carreira até então’. Claro, meu ego profissional foi às alturas.

Guga sai de cena: e o tênis brasileiro, onde fica?, é o título da saga à qual me dediquei durante duas semanas e meia, bolando pautas, pensando em entrevistados e, o mais difícil: por onde começar (após a publicação, no entanto, imaginei um título melhor: Guga pára: e o tênis brasileiro, para onde vai? Mas já era tarde demais).

Tive algumas (muitas, até) desventuras ao longo dos últimos dias: não consegui entrevistar Guga ou Larri Passos e nem alguns outros tenistas que estavam disputando torneios mundo afora. Perdi preciosas horas de sono e dois almoços com a mamãe, fui ‘obrigado’ a recusar uma balada, praticamente não tinha tempo para ler um blog sequer, sofri de um cansaço mental enorme...

... mas está lá. Todas aquelas horas de decupagem de entrevistas, os 30 mil caracteres de declarações e algumas horas de pesquisas renderam 16 páginas de matérias, divididas em cinco retrancas e, ainda, em uma entrevista exclusiva com Thomaz Bellucci (que, para o fim da curiosidade do Fábio, responde o que fora perguntado aqui).

Cheguei a me questionar, e também à juuuliana, se alguém leria tanta coisa. A resposta veio pouco tempo depois de a matéria ir para o ar, e do outro lado do Atlântico: o Lucas Sampaio, estudante de jornalismo que atualmente está em Portugal, rasgou elogios à reportagem. É bom ter reconhecimento.

E, finda a saga, deixo aqui de forma singela alguns obrigados: Carol Canossa, por ter indiretamente sugerido que eu bolasse uma reportagem especial e ainda enfrentou pessoas perigosas do mundo jornalístico por mim; aos assessores de imprensa de CBT, Comcept e Gallas, que conseguiram contatos e marcaram entrevistas para a especial; aos ex-tenistas Fernando Meligeni, Chico Costa e Thomaz Koch, que me concederam excelentes entrevistas; e, também, ao Tio Raul, que não vai ler isso aqui, sobretudo depois de ler toda a reportagem em pleno domingão à noite antes de publicá-la.

Por incrível que pareça, o 26 de maio de 2008 foi mais interessante do que eu achei que poderia ser. Comemoremos! E com uma garrafa de vinho caro na minha próxima folga, haha.

sábado, 24 de maio de 2008

Como transmitir segurança

Já comentei aqui (exatamente neste espaço) que um dos meus maiores defeitos é passar a confiar bastante em uma pessoa quando recebo algum sinal de confiança por parte dela. E um dia desses acabei lembrando de um dos episódios mais marcantes dessa minha característica negativa fatal.

Não sei por que acabei relembrando desse caso, que há um bom tempo eu tive vontade de transformar em um dos relatos mambembes deste blog e não consegui. Pouco mais de um ano depois, a história ganha a sua oportunidade.

Era 4 de maio do ano passado quando cheguei em casa morrendo de medo após o trabalho. Escrevi este texto para tentar passar o tempo e, então, peguei um ônibus e fui para o posto de saúde onde passaria pela minha terceira cirurgia (antes, já havia tirado dois sisos): tiraria o freio da língua.

Chegada a hora do abate, sentei-me na cadeira da médica que faria a intervenção cirúrgica. Começou o processo de anestesia e, para meu desespero, ainda sentia parte do assoalho da minha boca. Então tomei mais uma picada – putz, e como doeu! – e minha boca ficou completamente dormente.

Mas não foi por isso que fiquei tranqüilo. Ainda estava bastante inseguro quando começou a cirurgia. Corta daqui, corta dali... e minha mão continuava suando frio.

Até que começou a tocar uma música do Maroon 5, This Love, no rádio do consultório (eu nem tinha percebido que havia som por ali). Não foi a canção em si que me acalmou, mas sim o fato de a médica ter começado a cantarolar o refrão.

“Caramba, se ela consegue cantarolar em um momento tão tenso como este, quer dizer que sabe mesmo o que está fazendo na minha boca”, comentei comigo mesmo. Então respirei fundo e relaxei pela primeira vez naquele dia.

Claro, isso não fez com que o pós-operatório tenha sido menos dolorido: fiquei dois dias sem falar e mal conseguia tomar água. Uma semana depois, voltei para tirar os pontos com uma tranqüilidade enorme: passei a confiar cegamente na médica. Não que tenha me preparado para mais uma cirurgia, claro (tenho que desviar o meu septo, mas sinto que vou passar os próximos 50 anos com o coitado em forma de S).

O problema é que a médica fez o trabalho tão bem feito que, hoje, mal dá para ver a cicatriz que ficou na parte inferior da minha língua – marca da minha coragem por ter encarado tal cirurgia maluca. O nome da cirurgia, aliás, é frenectomia. Só de ler a palavra, já parece uma coisa bem fora do normal.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Jogada de sorte

Chega um e-mail na redação:

De: MA 51, brlf@hotmail.com

“Essa quarta vespera de feriado o atacante kleber do palmeiras foi visto na casa noturna cabaret arrumando briga com um grupo de amigos que no final da festa foram cobrar e houve mais briga, entao ele entrou no carro, deu a volta no quarteirão e voltou atropelando esse grupo de rapazes que se feriram alguns com gravidade. eh verdade essa historia se quiserem checar procurem nas delegacias B.O. ou entrada no hospital sirio libanes que verao como eh veridica a historia. meu email nao esta correto”

Levantei e logo comentei com o Pierre, editor de plantão em pleno feriado assim como eu. “Cara, olha o e-mail que chegou aqui, que viagem”. Li o relato e logo completei. “Algum outro site já deu isso daí?”. “Humm, não, não vi nada”. “Estranho, né? Mas beleza, vou atrás disso aqui”, respondi, com um misto de incredulidade por tal mensagem absurda e uma ansiedade ligeiramente grande.

Entrei no site do tal Cabaret, peguei o endereço e saí em busca de telefones de delegacias na região da casa noturna. Após algumas ligações, uma confirmação. “Olha, tem o Boletim de Ocorrência (B.O.) aqui sim, mas quem pode te passar todas as informações é a Secretaria de Segurança Pública (SSP/SP)”, disse o investigador.

Liguei para a SSP e lá falei com a simpática assessora de imprensa, que prometeu me retornar a chamada assim que o B.O. estivesse concluído. É claro que a minha ansiedade ficou ainda maior: passei a monitorar todos os sites concorrentes, com medo de que algum desse a notícia antes de mim. Contatei novamente a assessora de imprensa dez eternos minutos depois da primeira ligação e ela foi compassiva: “Eu prometo que te ligo assim que o boletim ficar pronto”.

Dito e feito: minutos depois meu celular tocou e a assessora de imprensa me ditou tintim por tintim do que fora relatado no B.O. Fiz a matéria rapidamente, coloquei no ar e... pronto. Toda a expectativa e o medo de tomar um furo se esvaíram quando a nota foi para a manchete do site e, abaixo do título, a assinatura Felipe Held, especial para a Gazeta Esportiva.Net.

Após alguns instantes, minha notícia foi lida ao vivo na Jovem Pan, que deu os devidos créditos. Nosso concorrente, no entanto, não seguiu a mesma linha e escreveu uma notícia com as informações ‘exclusivas’ que eu havia conseguido (mais ou menos, pois boletins de ocorrência são de domínio público), mas sem dar os créditos. Acontece.

Passada a catarse profissional, fui comemorar comigo mesmo a conquista inesperada em pleno feriado. Coloquei-a também no grupo das mais importantes que já fiz até hoje, ao lado das entrevistas exclusivas com Doni, Mika Hakkinen e Ricardo Navajas. A semelhança entre elas? Todas vieram por acaso, em algum lance da mais pura sorte.

Só fiquei um pouco ‘chateado’ por um motivo: não pude agradecer à fonte anônima que levantou a bola para que eu cortasse com a notícia. Fica aqui, então, meu mais sincero muito obrigado, MA 51, cujo e-mail não é brlf@hotmail.com ... te devo um chope, cara! haha.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Mendicância intelectual

Não sei bem por que, mas sempre defendi a tese de que mendigos são sábios. Claro que há alguns tresvariados, doidos mal varridos, mas a grande maioria é composta por gênios desabrigados.

Duvida? Ora, um dia deixe seu orgulho e seu preconceito de lado e vá trocar algumas palavras com um mendigo com um semblante um pouco mais simpático. Eles sempre têm algo interessante para falar sobre qualquer assunto. E todos eles, aliás, sempre entendem tudo sobre futebol, política e, sobretudo, mulheres.

Só que hoje, antes de entrar no trabalho de quarta à noite, fui forçado a repensar essa teoria. Estava eu no escadão da Paulista pensando um pouco que, se as coisas tivessem corrido de forma diferente, não estaria ali tomando um café em plena Avenida Paulista, mas sim fazendo meu check-in em Guarulhos pronto para levantar vôo rumo a Paris.

Então um mendigo parou à minha frente e me pediu um cigarro. Peguei um no bolso, cacei o isqueiro em outro e me levantei para entregar ao cara. Ele colocou o cigarro na boca, produziu a chama e encostou no cigarro.

“Opa, cara, tá ao contrário. Você vai acender o filtro”, avisei. Ele não ouviu e queimou o filtro. Já era um motivo e tanto para rever minha tese, mas... não. Mesmo o filtro sendo daqueles bege, é normal que haja a precipitação.

Ele então percebeu o erro e corrigiu. Depois da primeira tragada, virou-se para mim e agradeceu pelo cigarro. Quando fui responder, olhei fundo em seus olhos e o reconheci.

Já havia trocado algumas palavras com aquele mendigo alguns meses atrás. Também nos arredores da Paulista, em uma bela tarde de sábado, havia acabado de dar o primeiro beijo em minha ex-namorada quando ele apareceu cantando Gitâ, do Raulzito. Pediu uma moeda para comprar um miojo, cantou mais algumas músicas após ganhar 50 centavos, agradeceu e começou a ir embora.

Antes de ir, no entanto, voltou-se para nós e comentou: “Ah, esqueci de falar: vocês formam um lindo casal. E vão ter lindos filhos”. Se eu achei que ele estava certo? Claro! Ele previra algo que eu mesmo já vinha imaginando inocente e puramente há algumas semanas. E, na minha cabeça, aquelas palavras eram a consolidação de tudo: se um mendigo havia feito tal previsão, nada poderia mudar.

Mas repetindo o que escrevi alguns parágrafos acima, fui forçado a repensar tal teoria, por motivos que não interessam no momento. Frente a frente com o guru do meu antigo relacionamento meses depois, pensei em retrucar “Cara, você errou daquela vez”.

Achei melhor não. Enquanto ele continua andando por aí com a sua sabedoria às vezes equivocada, continuo por aqui em solo brasileiro. Sem viagem para Paris e sem entrevistar Federer, Nadal, Djokovic, Guga e, muito menos, minha musa Nicole Vaidisova.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Sobre olhares e retrovisores

“E aí, quando você estiver dirigindo e for mudar a marcha, descansa a mão na perna dela como quem não quer nada. Se ela não se importar, mantenha: logo ela também coloca a mão dela sobre a sua perna. Você vai ver como dirigir fica ainda mais gostoso e ter um carro vira um enorme adianto com mulheres”.

Todo mundo já deve ter ouvido isso pelo menos uma vida. Pai, tio, amigo do pai ou do tio já devem ter dado tal conselho ao filho que pela primeira vez marcava de dar carona para alguma paquera. Eu mesmo já ouvi, embora nunca tenha vivido tal oportunidade. Mas um dia desses passei por uma situação semelhante, ainda que um bocado diferente.

Era um dia qualquer em que eu estava andando pela rua quando encontrei duas pessoas conhecidas próximas a uma estação de metrô: uma amiga, que na verdade fora uma das minhas grandes paixões há algum tempo, e seu irmão. Buzinei, os dois olharam e perguntei aonde iam. Não iam para o mesmo lugar que eu, mas fingi que passaria lá perto e ofereci a carona – é sempre bom conversar um pouco.

Os dois entraram, e para a minha infelicidade momentânea o irmão dela se sentou no banco do passageiro e ela, atrás de mim. Comecei a bater um papo com o irmão sobre coisas banais até que ela, depois de alguns minutos, também falou alguma coisa. Como não podia me virar e olhá-la nos olhos, dei uma olhada de relance no retrovisor e pude acompanhar também suas palavras.

Mais alguns semáforos à frente, quando o assunto já tinha esfriado, dei uma olhada no espelho para mudar de faixa e nossos olhares se cruzaram novamente. Ficamos alguns segundos nos olhando e voltei a prestar atenção no trânsito. Momentos depois, mais uma espiada – e então chegou a vez dela de desviar o olhar.

Sorrateiramente, descumpri uma das regras básicas do trânsito e ajeitei o espelho retrovisor de modo que ficasse mais fácil visualizar o rosto dela. Quando o semáforo permitia e ela não estava percebendo, aproveitava para admirar um pouco mais suas belas feições.

Ficamos nessa lengalenga de troca de olhares por alguns quilômetros. Até inventei um caminho maior para poder ter alguma desculpa de olhá-la e ser olhado, simultaneamente ou não. Ainda assim, infelizmente, chegamos ao ponto em que eles desembarcariam.

Depois que meus caronas saíram, aumentei um pouco o volume do som e retomei meu rumo. Dobrei o quarteirão, dei mais uma olhada no retrovisor e não vi mais minha antiga paixão no banco traseiro do meu carro. Seu lugar estava vazio. E eu também me senti mais vazio.

Não, não senti nenhum novo acesso de paixão por ela. Nossa história já teve seu tempo para ser escrita, mas não rendeu mais do que algumas crônicas (algumas, aliás, das que eu mais tenho orgulho). Mas foi bom matar as saudades dela, sobretudo de seus olhos.

sábado, 17 de maio de 2008

Fernanda, da Odontoclinic

“Felipe, qual o seu ramal?”, perguntou a Martinha durante uma tarde de terça-feira, com o telefone na mão.

“Eu não tenho ramal. Mas tem ligação pra mim?”, perguntei, tentando mostrar um ceticismo e sem conseguir esconder a incredulidade.

“Tem sim, é uma mulher. Hummmm!”, brincou.

“Ah, passa no 5956 por favor que eu vou lá atender”, respondi, já me dirigindo para a antiga baia, da qual me mudei provisoriamente há cerca de um mês e para onde planejava voltar em um futuro próximo. Recentemente, no entanto, descobri que o antigo computador estava bem pior do que antigamente e minhas chances de voltar diminuíram.

Dei alguns passos para atender o telefone já pensando quem poderia ser. “Talvez alguma das assessorias de imprensa para me passar alguns dos telefones que eu pedi para fazer aquela pauta”, supus, momentos antes de o telefone tocar e eu atender com o habitual “Gazeta” de sempre, e mais uma vez ensaiando um ar indiferente.

“Boa tarde, Felipe. Eu sou a Fernanda, da Odontoclinic, tudo bom?”, apresentou-se a – bela – voz feminina do outro lado da linha. Respondi que sim, mas já desanimado e bolando algum jeito de me desvencilhar de mais um telemarketing.

“Então, nós estamos com uma promoção aqui. Há quanto tempo você não vai ao dentista?”.

“Hmm... dois dias”, menti. Na verdade, não vou há duas semanas e meia, mas era muito melhor falar alguma data recente. Acabei nem pensando no tamanho da besteira que acabara de falar: quem vai ao dentista nos domingos?

“Ah, então você faz tratamento?”, perguntou a mulher. “Uhum”. “Ah, e você usa aparelho?”. “Uso”. “Fixo ou móvel?”. “Móvel, mas só para dormir”. “E é de contenção?”. “Humm... é móvel”, resumi, bem enfadonho.

“Ah, tá legal. E você tá aí trabalhando, né?”. “Sim, sim”, emendei, pronto para desligar e voltar ao noticiário como se nada tivesse acontecido.

“Tá legal, então.Valeu, Helda! Hahahha”.

Até arrisquei um ‘peraí!’, mas era tarde demais: ela já havia desligado. Não percebi que havia acabado de ser vítima de um trote de alguma conhecida – que se deu ao trabalho de conseguir algum telefone da redação, ligar para lá, inventar uma história enorme, me chamar por um dos mil apelidos que meu sobrenome permite e depois rir da minha cara.

Não, não tenho a menor idéia de quem tenha me passado o trote. Mas não custava nada se identificar depois, né?

Droga.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Dificuldades de relacionamento, parte 2

No fatídico 1º de março, tive uma das conversas mais malucas da minha vida. Como citado exatamente aqui instantes depois do acontecimento, durante o treino do São Paulo no CCT da Barra Funda, bati um papo poliglota com um italiano e, por não saber bulhufas da língua da Velha Bota, consegui misturar quatro idiomas em um.

O tempo passou, mas eu não aprendi coisa alguma com o passar das semanas. E recentemente, dois meses e meio depois daquele dia, voltei a misturar várias línguas na tentativa de me comunicar em um idioma que desconheço.

Vamos pelo começo: desde o finalzinho do ano passado, estava planejando uma viagem para a França – que teria início na próxima semana, aliás. Comprei um guia de viagem parisiense e, também, um livrinho que ensinava francês a brasileiros desesperados na iminência de irem para o país gaulês.

As primeiras instruções nos dois livrinhos eram iguais: 'franceses não gostam de falar inglês, a não ser que você mostre que sabe um pouquinho da língua deles. Sempre inicie um pedido por informações com um: Pardon, monsieur. Je suís brésilien et je ne parle pas français. Parle vous anglais?'

Acontece que, por um ou dois motivos, a viagem não deu certo e acabei ficando por aqui. Desanimado, nem continuei mais olhando ambos os livros antes de dormir e os dois foram parar no fundo das minhas estantes. Mas acabei precisando ligar para um hotel na França dia desses por motivos que (ainda) não vêm ao caso e, para não correr o risco de a telefonista do hotel se zangar comigo e desligar na minha cara, tentei arriscar uma conversinha na língua dela para depois arranhar um inglês.

Liguei para o hotel no sudoeste da França e, depois de uma musiquinha do hotel no idioma local, uma moça me atendeu falando algumas frases bem ensaiadas e que, obviamente, não foram entendidas por mim. Então ela parou de falar e senti que era a minha vez. Bonsoir, je suís a brazilië journaliste, maar je ne parle pas français. Parle vous anglais?” (tecla sap: Bonsuá, iê suí a braziliê jourrrnalis, maar iê nê parlê pá françá. Parle vu anglê?).

Na hora, detectei a salada lingüística que tinha feito, misturando três idiomas na mesma frase. Embora a base tenha saído em um francês até que certinho, o 'a' (a terceira palavra da frase) é aquele artigo indefinido do inglês. Já 'brazilië' e 'maar' significam respectivamente ‘brasileiro’ e ‘mas’, só que... em holandês.

A telefonista percebeu a miscelânea e soltou um risinho antes de apertar o switcher de idioma e responder um simpático ‘Yes, I do speak English’. Ficou muito mais fácil para mim: “Well, I’m a Brazilian journalist and I’d like to talk to room seven-fourteen, please”.

Ela disse mais alguma coisa em francês e, então, ouvi barulho de linha. Medo: será que falei alguma bobagem também? O telefone continuou repetindo o universal tuu, tuu, tuu. Até que, do outro lado da linha, atendeu uma voz conhecida e com uma saudação não tão universal: “Alô?”.

Ufa! Deu certo.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Besteiras que o povo fala

Tem coisas que as pessoas falam e que não fazem sentido algum – e não se pode dizer que se trata de mentiras, pois há casos em que é possível detectar um fundo de verdade nisso tudo. E um dia desses, voltando para casa e conversando com o Shrek, acabei me lembrando de um dos capítulos mais marcantes dessas groselhas que o povo fala.

Aconteceu no final do meu primeiro dia de trabalho, relatada previamente neste espaço, na fase talvez mais pantanosa deste blog. Àqueles que não conhecem a história, um resumão: Tinha conseguido meu primeiro emprego em agosto de 2006, com apenas uns quatro meses de faculdade, em uma assessoria de imprensa meia-boca em Pinheiros e, antes de ir embora, pediram para que eu passasse na sala do chefe.

Entrei no escritório reservado e o cara estava lá, com a cadeira giratória de costas para mim. Anunciei a minha presença e o dono da assessoria começou o discurso, mais ou menos assim: “Olha, o nosso cliente acabou de romper com a gente e a empresa vai entrar numa fase de vacas magras. Por isso, nós vamos ter que repensar o programa de estágio”, iniciou.

Dois segundos para processar a informação: “Putz, que ruim repensar o programa de estágio... opa, peraí! Eu sou o estagiário, então isso quer dizer que...”, pensei comigo mesmo.

“Desculpa, Felipe. Tô morrendo de vergonha disso que aconteceu. Você, mesmo tendo trabalhado apenas um dia, mostrou que é um profissional bastante competente e com um futuro mais do que promissor, além de ser um cara gente fina. Tenho a certeza de que esse período vai passar e eu vou te recontratar, mas demos o azar de termos atravessado este momento justo agora”, prosseguiu.

Continuei ali, estático, tentando entender o que estava acontecendo.

“Você tem o perfil profissional de que a empresa precisa. Você foi o melhor estagiário com quem eu já trabalhei, e digo isso com a maior sinceridade possível. Me dói ter que tomar essa atitude, só que... desculpe”.

Ergui a cabeça, virei as costas e saí do escritório para nunca mais voltar. Peguei o elevador, desabotoei um botão da camisa e comecei a rir. “Se ele disse tudo isso, quer dizer que eu mandei bem e a minha parte eu fiz”, comentei para mim mesmo, talvez até em voz alta.

No dia seguinte, os outros funcionários do lugar vieram me deixar mensagens no Orkut: “É uma pena que tenha acontecido isso, mas saiba que você foi um profissional de muito caráter e muito talento”, disse uma das garotas. “Não concordamos com o que aconteceu e estamos do seu lado. Mas agora erga a cabeça e corra atrás do seu futuro”, recomendou outra.

Superei – e com estilo – essa experiência traumática. Embora tenha prometido para mim mesmo não mandar mais currículos tão cedo, um dia depois estava me inscrevendo para o processo seletivo da Gazeta Esportiva.Net. Fiz os testes, as dinâmicas, fui aprovado e estou prestes a completar um ano e meio na redação que me proporcionou crescimentos profissional e pessoal enormes.

Mas não escondo: às vezes, me dá uma vontade enorme de imprimir as minhas melhores entrevistas exclusivas e reportagens especiais assinadas que fiz nos últimos 18 meses e deixar sob a porta daquela assessoria de imprensa. Nunca fiz isso, mas que dá vontade...

O mais engraçado (engraçado?) é que recentemente passei por situação semelhante, mas em outro contexto. O que isso quer dizer? Que o mundo não é um lugar seguro, e as pessoas estão cada vez menos sãs.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

A essência do amor

Se realmente existe amor verdadeiro (e eu, tolo ingênuo, acredito que há), ele é encontrado em sua melhor forma nos casais de velhinhos pela rua.

Lá com seus 70, 80 anos – e depois de viverem uns 50 deles juntos, pelo menos –, os dois velhinhos ainda permanecem lado a lado, seguindo juntos o mesmo caminho da vida. Atravessaram fases ruins e superaram todas as tormentas: as desconfianças, os ciúmes, as épocas de marasmo, as crises conjugais com ou sem fundamentos, os maus momentos financeiros, a moda do divórcio... tudo. E ainda estão lá, firmes e fortes, embora enrugados, encurvados e com cabelos brancos.

O casal ainda está lá, andando pelas ruas, e com as mãos dadas no meio de tanta gente, do mundo inteiro. Uma talvez ex-leitora deste blog comentou neste espaço que “andar de mãos dadas é uma das demonstrações de carinho mais fofas que existem. Fundamental”. E ela estava certa: quando pegava na mão da minha ex-namorada, por exemplo, sabia todos os nuances emocionais pelos quais ela passava: quando estava insegura, feliz, empolgada, explodindo de paixão... até mesmo no dia em que ela pôs um ponto final ao relacionamento, eu havia notado algo diferente nos raros instantes em que ficáramos de mãos dadas naquela manhã: a mão dela estava frouxa, fria, esquiva. E, durante todo esse tempo, os velhinhos continuavam lá, em seus passos lentos e com os dedos entrelaçados.

Mas o que dizer, então, do velhinho que com as suas mãos empastela a mão da velhinha enquanto estão tomando café e conversando sobre a vida? Naquele gesto, ele mais do que protege sua esposa de todos os males invisíveis que não a acometerão, mas a assombram. E quando ele dá tapinhas com a palma de sua mão direita nas costas da mão da velhinha, transmite todo o amor e todo o incentivo que seus olhos e sorriso já confessam.

O amor sincero nos casais de velhinhos também se faz presente no respeito que há entre o casal. Um dia desses, em um elevador, um velhinho contava a uma interlocutora com a metade de sua idade sobre o feriado recente: “Ah, eu viajei pro interior. As irmãs da minha senhora não estão muito bem de saúde e fomos ficar um tempo com elas”.

Minha senhora. Minha senhora! Expressão antiga e quase antiquada, mas tão respeitosa e carinhosa! Muito melhor do que o hoje comum “patroa”. Infinitamente melhor do que o tão usado “minha mina”. E bem mais carinhoso do que o “minha garota”, que vez ou outra eu tenho a chance de dizer.

A essência do amor sincero não está em palavras bonitas sussurradas ao pé do ouvido e nem em versos belos rabiscados em uma folha de papel. Tampouco está em um beijo intenso dado em algum momento especial, talvez sob o pôr-do-sol ou uma noite estrelada. A essência do amor sincero está, em sua forma mais verdadeira, nos casais de velhinhos que até hoje estão juntos. Eles sim sabem das coisas mais bonitas da vida – e a fazem mais bela a cada dia.

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Dias desses, inclusive, li uma crônica do Mario Prata sobre tema semelhante. No mínimo inquestionável, que pode ser encontrada aqui e vale (muito) a pena ser lida.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Fio de esperança

Por ter origem britânica e ser destinado geralmente às classes mais abastadas financeiramente falando, o tênis vez ou outra é apontado como modalidade elitista – no passado, inclusive, chegou a ser chamado por aí de ‘esporte branco’.

Recentemente, durante meu giro por Sorocaba na cobertura da Copa Davis, ouvi um discurso parecido também do presidente da Confederação Brasileira de Tênis (CBT) e do capitão da equipe brasileira: “Não adianta fazer uma porrada de projetos sociais para levar o tênis às camadas mais baixas sendo que neguinho tem que pagar 500 paus em uma raquete”. Uma baita verdade, apesar de eu ter gastado menos de 100 pilas na minha.

Enfim. Um dia desses tive expediente matinal na Gazeta e acabei com a tarde livre. Já sem muito o que fazer depois de passar a tarde em casa, voltei mais cedo para a Paulista e por volta das seis da tarde fui dar uma volta pelos quarteirões. Como sempre acontece, acabei parando para espairecer um bocado na Praça Alexandre de Gusmão, inspiração para a trilogia Praça de Pedra e que já me rendeu outras cositas más também.

Não dei mais do que uma volta na praça e acabei parando em um boteco bem do sujinho nos arredores para tomar um café. Aproveitei que a televisão estava ligada no Masters Series de Roma, sentei no balcão e fiquei vendo os instantes finais do jogo entre o russo Nikolay Davydenko com o espanhol Tommy Robredo, pelas quartas-de-final.

Depois de dez minutos, pedi um novo café para o cara do balcão. “Tá bom o jogo, né?”, perguntou. Respondi que sim, e ele continuou. “Ah, tênis é um esporte bem bonito. E esses dois caras são bons mesmo”, complementou.

Fique por lá curtindo a solução imberbe e o garçom do boteco parou ao meu lado e ficou vendo a troca de bolas. “Cara, olha essa esquerda do Davydenko! Que passada, que passada! O Robredo tá cansado, e olha que ele é bom no saibro”. Olhei para o lado espantado: fazia tempo que não ouvia análises de uma partida de tênis longe da redação.

“Que backhand é esse do Davydenko, com slice e tudo? Ah, o Robredo entregou, olha a munheca cansada dele. Assim não dá pra jogar”, continuou o garçom. Cinco minutos depois, quando a partida foi para o tie-break do terceiro set, umas sete pessoas já se aglomeravam em volta da televisão para ver a definição do jogo.

O duelo acabou com o Davydenko sofrendo uma virada incrível no tie-break. Com um pouco de torcicolo por ficar olhando para cima por um tempão, voltei para o escadão surpreso: o pessoal daquele boteco gostava de tênis. E não havia ninguém cheio da grana por lá, pelo contrário.

Um sinal de esperança: alguém deve ler as minhas notícias sobre tênis.

domingo, 11 de maio de 2008

Regime bovino

Há dias em que eu acordo com mil idéias na cabeça e preciso anotá-las para não esquecer nenhuma delas. Então, pouco a pouco, vou tentando amadurecer tais pensamentos antes de bolar uma teoria furada que cedo ou tarde pautará uma das postagens deste blog.

Dias assim são geralmente curtos demais. E eu muitas vezes preciso começar a escrever naquele exato momento para não perder o clima do pensamento (meu desejo blasé é fazer isso tomando um bom copo de café quente).

São momentos assim que me fazem gostar de escrever e achar que definitivamente é isso o que eu quero para minha vida (dinheiro? Pra quê?). Desembesto a escrever e, muitas vezes, deixo textos acumulados para serem postados aqui.

Apesar de vários pensamentos desconexos, que raramente conseguem ser unidos por uma conjunção ou uma vírgula, esses ‘surtos de inspiração’ são geralmente um negócio interessante.

Mas assim como existe o doce há também o amargo, já diz o velho ditado. Logo, assim como a inspiração, há os momentos de seca na plantação. Apesar de saber exatamente o que quero escrever, não consigo ligar duas palavras. É terrível, e isso só consegue ser curado com o aparecimento repentino de alguma idéia.

Ultimamente, tenho atravessado justamente uma fase de vacas magras. Magérrimas, diga-se. Por sorte, deixei essa cascata como curinga para momentos como este. Embora tenha alguns textos guardados na gaveta, não sinto vontade de publicá-los por enquanto - bem como algumas idéias em gestação.

Sim, minha criatividade - que por muito tempo foi a minha melhor companheira - tem me deixado na mão ultimamente.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Profundidade superficial

Fugi da sala no meio da aula um dia desses para pensar na vida e fui passar um pouco de frio no escadão da Gazeta. Sentado no mesmo degrau de sempre, notei que havia um cara qualquer na calçada ostentando um cartaz e o mostrava para determinados transeuntes.

Não pensei em outra coisa que não “hum, o cara está pedindo esmola, bacana. Mas pelo menos é um jeito diferente, com um cartaz”. No entanto, curioso que sou, forcei os olhos (estava desprovido dos meus óculos) para ver o que estava escrito naquela cartolina.

Se você almeja um algo [sic] diferente...

Então o cara se virou e eu não pude ver o resto. Continuei atento para tentar decifrar as palavras restantes, mas sempre que a minha miopia combinada com astigmatismo permitia que as letras entrassem em um mínimo de foco, o homem se virava.

Levei uns cinco minutos para conseguir avançar na leitura, mas apenas com algumas palavras.

Se você almeja um algo diferente e importante...

E novamente o cara se virou. Alguns minutos depois, mais três palavras de brinde.

Se você almeja um algo diferente e importante para sua vida...

“Humm, não parece pedido de esmola. Aliás, o cara nem parece estar pedindo esmola. Está todo sorridente e tem até um celular no bolso dele”, pensei comigo mesmo. E comecei a imaginar o que poderia estar escrito no cartaz.

Na hora lembrei daqueles filmes em que os mendigos aparecem sempre com umas mensagens filosóficas em um cartaz. E, putz, tudo levava a crer que o cara ali na frente do escadão também estava realizando algo do tipo. “Tem louco pra tudo na Paulista, vai saber...”, continuei.

Alguns minutos depois, entretanto, consegui ler as palavras finais do cartaz. E qual não foi a minha decepção quando li:

Se você almeja um algo diferente e importante para a sua vida, me dê um beijo.

Tudo, então, passou a fazer sentido: o cara só mostrava o cartaz para as mulheres (desacompanhadas, aliás) que passavam encolhidas de frio. E por isso que todos os transeuntes passavam por ele com um olhar estafado.

Ok, que o cara deveria ter uns oito parafusos a menos não há dúvidas. Mas agora me custa a acreditar que ele estava lá para fazer uma campanha por um mundo melhor, por mais amor ou qualquer coisa do tipo.

“Nem eu, que sou quase que um fracasso com mulheres, precisei nem chegar perto de uma apelação como essa”, explodi comigo mesmo. “Puta cara escroto”.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Detalhes corriqueiros

Sempre gostei de extrair os pequenos detalhes de cada momento e fazer deles os principais responsáveis por uma felicidade momentânea e/ou intensa. É claro que há contra-indicações, pois o inverso também é válido: qualquer coisinha pequena pode me colocar em uma fossa profunda. Mas... não vamos falar disso agora, ok?

De todos os pormenores que eu supervalorizo, um dos que mais gosto é a música. Até hoje me lembro, por exemplo, que um dia no final de 2004 ouvia a popzinha The Reason, do Hoobastank, enquanto esperava para me encontrar uma antiga paixão no metrô. E sempre que escuto tal canção meu pensamento é remetido à garota e àquele momento solitário na Estação Saúde do metrô.

Mas um dia desses um outro pequeno detalhe me fez esquecer dos problemas (aqueles que eu mesmo construo). Era domingo de manhã quando passava por uma estradinha de terra entre Tatuí e Itapetininga no retorno da minha décima viagem. Ora ou outra, cruzávamos com moradores locais que, ao verem o carro, acenavam e desejavam um bom dia.

Depois de três ou quatro cumprimentos recebidos, passei eu mesmo a acenar quando passávamos por tatuienses desconhecidos. Era bacana, e até engraçado. Totalmente diferente do meu dia-a-dia na Avenida Paulista, quando, com sorte, alguém pede desculpas por pisar no seu pé ou te dar um empurrão.

Não estou defendendo a tese de que todos os seres humanos do mundo devem se cumprimentar como loucos – parando para pensar, seria um negócio bem chato e forçado. Mas que um pequeno gesto inusitado como um aceno e um ‘bom dia’ podem tornar o dia um bocado melhor, não há como negar.

E meu dia, de fato, foi bom – e terminou com o título do Palmeiras no Campeonato Paulista.

Ah, já ia esquecendo: a música que tocava enquanto trocava acenos com os tatuienses era aquela do Titãs: O mundo é bão, Sebastião.

segunda-feira, 5 de maio de 2008

De fato, campeão

Fazia um tempo e tanto que não tinha uma grande emoção no futebol. A última talvez tenha acontecido em 30 de junho de 2002, dia da final da Copa do Mundo entre Brasil e Alemanha. De lá para cá...

Admito que torço para um time que não me deu muitos motivos para sorrir na década de 2000. Depois de ganhar o Torneio Rio-São Paulo de 2000 (último grande título do clube alviverde), perdeu o patrocínio da Parmalat, teve um desmanche no elenco abastado de estrelas e deu vexame atrás de vexame. Listemo-los:

. 2001: de líder do Brasileirão no primeiro turno e franco-favorito para a classificação às quartas-de-final a maior decepção do torneio, ficando de fora da fase eliminatória.
. 2002: eliminação na primeira rodada da Copa do Brasil para o ASA de Arapiraca e rebaixamento à Série B do Campeonato Brasileiro.
. 2003: derrota por 7 a 2 para o Vitória nas oitavas-de-final da Copa do Brasil.
. 2004: eliminação nas semifinais do Paulistão ante o Paulista de Jundiaí e nas quartas-de-final da Copa do Brasil, diante do Santo André em pleno Palestra Itália. Além disso, o clube vendeu o Vagner Love, maior revelação alviverde depois do Marcos.
. 2005 e 2006: eliminações para o São Paulo nas oitavas-de-final da Libertadores. Em 2006, o time por pouco não foi rebaixado para a Série B novamente.
. 2007: não-classificação para a Libertadores de 2008 graças à derrota por 3 a 1 para o Atlético-MG na última rodada, novamente no Parque Antártica.

Ou seja, fazia um tempo e tanto que meu time de coração não me alegrava. Mas este ano, com o início da parceria com a Traffic, as chegadas da Fiat e do Wanderley Luxemburgo me deixaram um bocado mais otimista. A ponto de ir à estréia contra o Sertãozinho em Barueri – com Allan, Mané, Tomi, Luquinhas e Renata – e em mais dois jogos na primeira fase (contra Rio Preto e Ponte Preta), além de ter trabalhado no clássico com o Corinthians.

A classificação do Palmeiras para a final do Paulistão me motivou a aproveitar o domingo de folga e acompanhar de perto a primeira final que o time disputava desde a decisão da Copa dos Campeões de 2000. E embora tivesse adquirido um certo ceticismo em relação ao futebol depois de tantas decepções com o meu time e de começar a trabalhar na área, tive uma das maiores catarses futebolísticas de toda a minha vida.

Podem falar o que for: o título não viria sem as parcerias (alguém mais maldoso poderia chamar o time alviverde de Traffic/Fiat/Palmeiras, lembrando clubes de vôlei e basquete lotados de patrocinadores para não serem fechados) ou então muito menos sem o Luxemburgo (sem ele no time, o Palmeiras não fatura um troféu estadual desde 1976 - há 32 anos!) e a torcida ficaria mais muitos anos na fila. Reconheço tudo isso, mas, por ora, não me importo.

Por quê? Ora, vi cinco gols em um estádio lotado, acendi sinalizadores, desentalei o grito de campeão, tremulei bandeiras na Turiassu após o jogo e, voltando para casa de carona com o Chitão, fiz buzinaço e perdi o pouco que me restava de voz ao entoar o hino do Palmeiras.

Resumindo: fui campeão!

Foto: Marcos Ribolli/Globo